Capítulo 2

A semana se iniciava. E como a maior parte dela, Bella chegava na cozinha extremamente desanimada. 

- Bom dia! – O irmão a encara sorridente.

“ Como alguém podia sorrir tão cedo?” – Se perguntava. 

- Bom dia. - O mau humor dela era visível. 

Pegou a tigela e seu cereal favorito.

- Nada simpática você. – Brinca acostumado com o jeito estranho da irmã pela manhã. 

- Acordo cedo ou sou simpática, porque os dois na mesma frase: não rola. – Derrama o leite no copo e depois o cereal. 

- Calma Isabella, falta pouco... É o último ano. – Sabia que a secura dela era acarretada pelos infortúnios que sofria na escola. O que tirava o brilho da caçula. 

- Será que um dia vou deixar de parecer uma extraterrestre? - Todos olhavam para ela como se fosse diferente dos demais; apenas uma menina esquisita com valores esquecidos na sociedade. - E tem mais... como podem querer que adolescentes como eu sejam estudiosos e com um bom raciocínio se nos obrigam a levantar de madrugada, quando a mente só acorda lá pelas dez.

- Não ligue para isso. - Beija a bochecha da irmã. -  Quem perde são eles: você é incrível. - Começa a rir. - Madrugada? Só se for em Marte.

Como era rotina, o irmão a deixou na escola e fez o costumeiro trajeto para o trabalho. 

O dia passou monótono. Entre aulas, implicâncias e muito tédio. 

Antes de acabar o horário escolar, recebeu a seguinte mensagem de Cris: “ Hoje não vou conseguir te buscar. Foi mal! “

A jovem tinha seu lugar reservado na primeira fileira da sala de aula. 

- Santinha... – Patrícia, conhecida como Paty parou frente a sua mesa, encarando-a com desdém. Nutria inveja e ódio gratuito por Bella. - Os deveres tão caprichados, seria uma pena eu passar e sem querer derrubar meu suco em cima de tudo. - Vira o copo e molha todo o caderno. – Ops... desculpa. – Sorriu sínica. 

- Qual é o seu problema comigo garota? – Bella sentiu o sangue borbulhar de raiva.

- Estressou queridinha? Vai contar ao papai Deus. – Zombou.

- O que está acontecendo aqui? - O inspetor Mauricio se aproxima sério.

- Eu acabei derrubando meu suco nas coisas dela. – Paty se faz de inocente.

- Foi isso mesmo que aconteceu Isabella? – A encara desconfiado enquanto Paty e sua corja fuzilam Bella com os olhos.

- Foi de propósito. – Responde ao inspetor.

- É menti...

- Patrícia Albuquerque na diretoria agora! - Diz irritado.

- Isso não vai ficar assim. - Afirma e segue o inspetor.

Os olhos da ruiva se enchem de lágrimas, mas faz questão de segurar o choro. A professora de Física entra na sala e começa passar a revisão para a prova.

- Toma! – Luana, que senta ao lado, oferece algumas folhas de seu fichário.

- Obrigada! 

- Se precisar de mais é só pedir. - Diz tímida como sempre.

Depois de quase três aulas se passarem, Paty entra na sala acompanhada do diretor e arruma suas coisas, mas antes de sair  manda um olhar de : " Eu vou me vingar". 

Isabella passa o intervalo sozinha, ouvindo música e em seu mundo paralelo afastada de todo o tumulto. A música era uma forma de escape,  parecia a levar para outra esfera. 

Entediada, assistia às últimas aulas. Preguiçosa? Sinceramente: um pouco. 

Mas se justificava com o tal pensamento:  Adolescentes bombardeados por idealizações e pressões, aprendiam muitas coisas que não iriam usar no futuro.

O sinal tocava, alertando para o término do dia de aula. Bella pega as matérias com Luana, porque o seu caderno fora molhado.

Caminha sem pressa até o centro da cidade com a intenção de comprar um novo caderno. Tem a leve impressão de estar sendo seguida. Não deu muita atenção: poderia ser apenas uma paranoia. Afinal, assistia muitas séries de suspense e perseguições. 

Entrou na extensa papelaria e procurou o caderno de quinze matérias. Gostou de um específico: notas musicais estampadas na capa. Todo detalhado e delicado. 

- 29,90 $ - Diz a moça do caixa.

Já estava acostumada com o preço exagerado de certas coisas. Se um estojo custava vinte, imagine um caderno.

Após comprar o material, foi em direção a estação. A jovem desatenta não havia conferido o dinheiro que tinha ao certo. Por descuido, percebeu que não teria a passagem para o metrô. Sem querer incomodar seus pais e o irmão, resolveu ir a pé. 

Caminhava na mesma medida que o sol tocava sua pele, formando gotículas de suor. 

Uma sensação estranha a fez apressar o passo. 

- Não precisa correr santinha. – Ouve a voz de Dylan, irmão de Paty, e mais dois garotos da escola.

Ela tenta fugir, no entanto, não conseguiu ser mais veloz que eles. 

- Não precisa ter medo gatinha. - Iago sorri malicioso, segurando-a fortemente.

- O que vocês querem? – Sussurrou temerosa. 

- Deixa eu pensar... - Enquanto Iago a segurava; Dylan se aproxima olhando a jovem de cima a baixo - Até que você não é de se jogar fora... - Morde os lábios.

- Por favor... me deixa ir embora – Suplica. 

Puxaram-na para uma rua estreita. Ficou desesperada ao constatar o quanto o lugar era deserto.

- Quem vai primeiro? - Dylan pergunta sorrindo.

- Não, por favor!! – Grita. 

- Cala a boca! - A empurra fazendo com que caia no chão.

A jovem sente suas forças se esgotarem.

Dylan fica em cima da jovem e começa a colocar a mão debaixo de sua blusa. Isabella Lira se debate sem sucesso: sente uma fraqueza imensa, a ponto de desmaiar pela pancada que teve na cabeça. Com a vista embaçada, notou quando Dylan foi puxado de cima dela e homens começaram a bater nele e nos outros dois.   

- Uma próxima e vocês serão mortos. – Disparou uma voz carregada de rouquidão. 

Mãos fortes a pegaram. Pôde sentir seu corpo aninhado. Estava fraca demais para dizer algo ou tentar ver o rosto de quem lhe carregava; acabou deixando seus olhos se fecharem cedendo todo o peso das pálpebras.

🌻

Não fazia ideia de quanto tempo havia se passado quando finalmente recobrou a consciência. Deu um pulo assustada ao observar o cômodo desconhecido. O sobressalto fez sua cabeça latejar de dor. 

O quarto é grande e tem o cheiro maravilhoso de um perfume amadeirado. Prende a atenção no relógio que se encontra em uma mesinha ao lado e marca três horas da tarde. 

- A bela adormecida acordou. - A porta é aberta.

Os olhares deles se cruzam. Sem sua permissão o coração bate freneticamente. Os olhos tão azuis do rapaz a analisam por completo. Que efeito era esse que " O dono do morro" causava na filha do pastor ?

- Onde estou? - Indagou confusa. 

- Na minha casa. – Allan se assenta na cama. - Como você está?

- Com dor na cabeça. - Baixou o olhar - Foi você que me salvou daqueles garotos?

- Eu e meu parça. – Responde.  - Vou pegar um analgésico para você. - Sai do quarto e minutos depois volta com uma bandeja contendo macarrão e suco que parecia ser de laranja. Ao lado um copo de água e uma cartela de remédios.

- Obrigada! – Sussurra. -  Não posso nem pensar... o que teria acontecido se você... -  Lágrimas começam a rolar pelo seu rosto.

- Fica sussa. - Lhe entrega o copo com água e o comprimido – Deve estar com fome, espero que coma macarrão sem frescuras. 

Com um sorriso fraco toma o remédio e aos poucos saboreia o macarrão.

- Está uma delicia. Obrigada! – Dá um gole no suco.

- Tu conhece aqueles moleques?

- São da minha escola. – Suspira. 

- E porque estavam fazendo aquilo com você?

- Porque não gostam de mim. 

- E por quê? - Diz sério.

- Porque sou filha de pastor e não sou como as outras meninas de lá. –  O encara.

- Mano vai para boca que horas? - Um jovem aparentando ter uns vinte anos entrou no quarto.

- Mais tarde Repolho.

- E aí mina está bem? – A encara. 

- Sim, obrigada!

Ela já se sentia melhor. Allan a guiou até o carro para levá-la para casa. 

- Aqui é sempre assim? – Quebrou o silêncio que estava instalado há alguns minutos. 

- Como? – A fita de soslaio. 

- Movimentado, som alto...

- Sempre. - Responde de uma forma transparecendo não querer assunto.

O restante do trajeto é pesado. Uma cortina de silêncio fora estendida entre os dois. 

- Não ande por aquelas ruas novamente, nem sempre terá alguém por perto. – Estaciona o carro em frente a casa de Bella. 

- Eu não vou. – Afirma. - Muito obrigada pelo que fez por mim hoje.

Se olham por alguns instantes. Ele desvia suspirando. 

- Tchau! - Tira o cinto e sai do carro.

- Boa noite filha do pastor. - Sorri de lado.

- Boa noite dono do morro!

Bella entra em casa e como esperava não havia chegado ninguém. Tomou um banho demorado, logo após colocou uma roupa confortável e começou a passar a matéria para o caderno novo. Ao terminar, se direcionou para o piano que se encontrava no canto de seu quarto. Com delicadeza deslizou os dedos pelas teclas e começou a cantar suavemente. 

- Linda essa canção! – O pai a observava orgulhoso. 

- É sim. - Se levanta e o abraça. 

- Vim te chamar para um rodízio de Pizza, o que acha?

- Ótima ideia! 

A família se deslocou para uma pizzaria que ficava no bairro. A noite estava agradável, a lua dava seu belo show no céu estrelado. 

Horas depois retornaram para a casa. 

- Vou dormir, amanhã tenho que ir numa cidade vizinha cedo. – Cris esfrega os olhos sonolento. 

- E a minha carona? - O encara. 

- Infelizmente não vai dar para te levar e nem buscar pirralha. 

- Então eu não vou na aula amanhã. – Baixou a cabeça.

- O que foi querida? – A mãe afaga o cabelo da jovem. 

- Eu não quero ir naquela escola. - As lágrimas começam a descer na mesma medida que relembra o que aconteceu. 

- É seu último ano. - O irmão se inclina a sua frente - O que foi agora?

Ela revela o ocorrido, deixando-os pasmos. 

- Por quê não disse isso antes filha? – É abraçada pela mãe. 

- Bella, não chore. – Cris se mostra irritado - Não acredito que eles tiveram a coragem de tocar em você ;se eu ver esses caras...

- Não vai fazer nada. - O pai se manifesta. – Filha, vamos dar um jeito nisso, eles não vão mexer com você novamente. Eu prometo. Confia em mim?

- Confio. – Deita a cabeça em seu ombro.

- E não quero você perto desse traficante. – Isaque ordena firmemente.

- Mas ele me ajudou. – Contrapõe. 

- De qualquer forma quero você longe dele, entendeu? 

Bella sente seu coração apertar. Respirou fundo e balançou a cabeça em concordância. 

Minutos depois se dirige ao seu quarto. Assim que se deita seus pensamentos viajam até Allan. 

- O que está acontecendo comigo? – Pensa alto. 

Sem o seu consentimento " O dono do morro " entrou em sua mente e não saiu mais.

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