A Escolhida
A Escolhida
Por: L. F. Gapfinther
Capítulo 1. Uma Lembrança Distante

"Lindos olhos esverdeados olhavam diretamente para mim, enquanto braços me esquentavam do frio que se encontrava naquela bela noite. Os cabelos daquela que me abraçava firmemente possuíam um tom de castanho escuro, com pequenas mexas rosas, caindo perfeitamente sobre suas costas. Sua pele extremamente alva apenas a tornavam mais bela. Parecia irreal tal beleza diante de mim.

Aquela da qual o nome ainda me era desconhecido, pegou minha mão e beijou suavemente o dorso da mesma, olhando intensamente em meus olhos e se possível, despindo minha alma apenas com aquele olhar. Passei meus braços sobre seu ombro, juntando mais nossos corpos no processo. Ela sorriu em minha direção assim que juntei nossas testas, fechando meus olhos como consequência. Eu podia não fazer ideia de quem ela fosse, porém sua presença me fazia bem, como há muito não me sentia. Por algum motivo, eu sabia que a conhecia de algum lugar, e pagaria para descobrir.

E de repente, senti como se estivéssemos flutuando, com nossos pés sobre o chão. E ao abrir minhas pálpebras lentamente, aquela bela jovem me segurava firmemente pela cintura enquanto planávamos, quase sendo capaz de alcançar as nuvens. Olhei encantada para tudo aquilo. A noite se fazia presente, com uma linda lua sobre nossas cabeças.

— Você fica ainda mais linda quando está admirada com algo. — Ouvi a voz rouca dela murmurar a minha frente. A olhei maravilhada. Aquilo tudo era simplesmente...incrível. Não existiam palavras para descrever meus sentimentos diante daquilo.

— Nós vencemos, amor! — Antes que me fosse capaz de pensar, sussurrei suavemente, enquanto acariciava seus cabelos, observando os belos olhos daquela à minha frente.

Porém, não soube explicar o motivo daquelas palavras ditas por mim tão aliviadamente, eu nem sequer a conhecia. Como poderia ser possível tal coisa?

— Sim, nós vencemos! — A linda jovem do qual o nome ainda me era desconhecido, disse alegremente, tirando-me de meus confusos pensamentos. Sorri verdadeiramente em sua direção, como há muito eu não fazia ou sequer... como há muito não me sentia.

E então, apenas observando seus belos olhos esmeraldas, a escuridão começou a tomar conta. Minha visão havia se tornado turva naquele momento, com a bile subindo por minha garganta. Balancei minha cabeça, tentando em vão espantar o mau estar que atingiu-me tão repentinamente. Aquela bela jovem sumiu aos poucos, até restar somente a escuridão.

[...]

— Elizabeth! — Acordei atordoada, com uma forte batida na porta do meu quarto. Suspirei, massageando levemente minhas pálpebras, procurando algum jeito de, afastar a dor de cabeça que surgiu tão inesperadamente. Sentei-me lentamente, sentindo minha nuca latejar fortemente com tal movimento. Bufei visivelmente irritada após ouvir minha mãe me chamar novamente.

— Já vou. — Gritei alto o suficiente para que ela me ouvisse, com a irritação preenchendo cada célula do meu ser.

— Anda logo! Verônica está te esperando lá embaixo. — Respirei fundo, procurando manter a calma, coisa que, naquele momento, parecia impossível. Minha mãe deu uma última batida na porta, antes de finalmente se afastar lentamente dali. Suspirei aliviada.

Me movimentei vagarosamente pela cama, sentando-me na borda da mesma, sentindo o frio sob meus pés. Tremi levemente com a forte brisa que entrou pela janela, mas principalmente, pelo sonho que havia tido naquela noite com a mesma garota. Era sempre ela. A mais bela mulher já vista por mim, porém, nunca soube a razão pela qual eu sonhava todas as noites com a mesma pessoa. Me perguntei se, por obra do destino, aquela linda jovem poderia ser real. Possivelmente não, seria loucura tal coisa.

Aqueles estranhos sonhos haviam começado no meu décimo quinto aniversário, mais precisamente há três anos atrás. Era sempre a mesma situação, mas diferente das outras vezes, naquela inédita noite, eu havia conseguido ver o rosto daquela que sempre habitava em meus pensamentos. Antes daquilo, nunca me era possível ver claramente a face da bela jovem que me abraçava por entre o céu, apenas ouvir sua voz.

No entanto, ao me deparar com tão rara beleza jamais vista por mim, minha mente havia sido preenchida por aquela em que o nome ainda me era desconhecido.

— Vadia, estou entrando! Espero que não esteja pelada, caso contrário, ficarei sem dormir durante longos meses. — Verônica comentou rápido o suficiente para que eu fosse incapaz de contradizê-la, abrindo abruptamente a porta do quarto, entrando logo em seguida. Ela tapava fortemente seus olhos, impossível de ver qualquer coisa a sua frente.

Revirei os olhos com sua fala, mas um pequeno sorriso se apossou dos meus lábios com sua pequena encenação. Verônica era o que poderia ser chamada facilmente de Melhor Amiga, quase uma irmã, melhor dizendo.

Seu bom humor e a fácil convivência com a mesma fizeram-nos aproximar instantaneamente.

— Pode abrir os olhos, idiota! — Disse brincalhona, vendo-a retirar seus dedos que tapavam sua visão, lentamente.

— Hum... Pela sua cara posso afirmar que o sonho foi bom. Não vai me contar? — Me fiz de desentendida após seu questionamento. Verônica era a única para quem eu ousava contar sobre meus sonhos em relação a aquela linda mulher que habitava em meus mais diversos pensamentos. Sua expressão se tornou maliciosa quando não a respondi.

— Não tive nenhum sonho essa noite! — Comentei o mais verdadeiramente que consegui, apesar de que, Verônica me conhecia o suficiente para reconhecer quaisquer mentiras contadas por mim. Mas, por algum motivo desconhecido, daquela vez, senti que aquele sonho havia sido mais íntimo, uma coisa da qual não me era do agrado de compartilhar com quem quer que fosse. Ela olhou-me desconfiada, mas não ousou me contradizer. Agradeci mentalmente por sua compreensão.

— Então, não conseguiu ver o rosto dela? Estava começando a ficar curiosa. — Verônica disse aquelas palavras emburrada, assim como uma criança faria ao ser contrariada. Perguntei-me que idade aquela idiota poderia ter, porque com certeza não era a mesma que constava em seus documentos. Sorri com esse pensamento, vendo-a se sentar ao meu lado na cama.

— Sinto muito por te decepcionar, baby! — Comentei inocentemente, batucando meus dedos sobre minha coxa, nervosa. Por algum motivo, não era de minha vontade lhe contar sobre o sonho que tive naquela madrugada com aquela desconhecida. Sua beleza era algo que eu pretendia manter apenas na memória. Verônica me olhou de soslaio, levantando-se logo em seguida.

— Bom, quando quiser me contar a verdade, estarei aqui para te ouvir. Para sempre, se lembra? - Afirmei lentamente, lembrando-me do pacto que fizemos quando éramos mais jovens, inocentes.

— Para sempre! — Sussurrei, fixando meu olhar em um ponto qualquer daquele quarto, evitando olhar em seus olhos. — Verônica! — Chamei-a repentinamente, antes que a mesma saísse dali. Observei suas feições confusas quando a chamei tão rapidamente. Suspirei pesadamente.

— Me desculpa, eu só...

— Eu sei, Eliza! E entendo, de verdade. Mas me conta, ela é gata? — Ri abertamente com sua pergunta englobada por uma palpável maldade, também embutida em suas feições.

— A mais linda... — Murmurei, caindo sobre a cama, observando o teto, porém, meus pensamentos estavam naquela mulher que habitava em meus sonhos toda maldita noite.

Senti quando Verônica voltou a se sentar ao meu lado, dando tapinhas em minha coxa.

— Isso é bom! Mas, sem querer estragar seu momento, temos que ir para a escola, caso contrário, aquela maldita professora vai nos esfolar vivas. Literalmente! — Ela comentou entediada, referindo-se à nossa nova professora de Inglês, que por algum motivo, havia se dedicado a em nos infernizar desde o momento em que pisou naquela escola. Que ótimo!

Enfiei minha cabeça sob meu travesseiro, choramingando baixinho. Eu realmente não queria ter que ir para aquele inferno.

— Eu não quero ir! — Murmurei tristemente, olhando-a suplicante.

— Bom, você sabe que não podemos mais faltar aula, Beth. Ou podemos continuar nesse quarto caso queira repetir de ano. A escolha é sua, baby! — Sua voz soou debochada, porque no fundo, ela sabia que eu jamais poderia repetir na escola, em relação à minha mãe. Ela me mataria caso isso viesse a ocorrer. Bufei visivelmente irritada.

— Idiota! — Murmurei aborrecida ao saber que não teria jeito. Eu teria que ir para aquele inferno que muitos chamavam de escola.

— Gostaria de saber o por quê de você odiar tanto aquele colégio!? — Sua pergunta soou curiosa, porém, tudo que me veio a mente foi um idiota que adorava me perseguir pelo imenso corredor da escola, principalmente quando estava sozinha, o que de certa forma, me causa um medo inexplicável. Ele não era normal, eu podia sentir isso em cada célula do meu corpo. Havia algo de tão sombrio naquele garoto que, apenas o pensamento de ficar sozinha com ele causava-me um sentimento de pânico, horror.

Era um sentimento do qual eu não saberia explicar, apenas... Sentia, em meu interior. Ele não era normal, de jeito algum.

— Você ainda pergunta? — Devolvi a pergunta, retoricamente. Sarcasmo escorria por minhas palavras. Verônica olhou-me compreensiva ao entender sobre o que eu falava.

— Aquele babaca não é nem louco de tocar em você, Beth. Relaxa! — Ela passou um braço sobre meu ombro, confortando-me com suas palavras. Sorri em sua direção.

— Aquele garoto não é normal, Roni! — Afirmei levemente distraída. Roni havia sido um apelido dado para a Verônica há alguns anos, quando ainda éramos duas jovens e inocentes. Ela demorou alguns meses para se acostumar com o fato de eu chama-la daquele jeito, porém, se adaptou perfeitamente logo em seguida.

— E quem ali é normal? — Ri suavemente com sua retórica pergunta. De certo ela estava certa, mas com certeza aquele garoto era pior do que todos naquela escola. E aquilo sim me assustava.

Tirei seu braço que ainda permanecia sobre meu ombro, pegando o uniforme que pertencia ao colégio sobre minha cama e andei rapidamente para o banheiro, fechando a porta atrás de mim. Ainda pude ouvir o resmungo de Verônica em meu quarto, devido ao meu movimento bruto em retirar seu braço. Revirei os olhos com isso. Minha melhor amiga era uma completa idiota! Ri diante daquilo.

Retirei meu pijama lentamente, com a preguiça me corroendo por inteira. Quando restaram apenas as peças íntimas, olhei-me pelo espelho que havia no banheiro, observando atentamente meu corpo. É, com certeza eu não estava no "Padrão de Beleza" imposto pela nossa maldita sociedade, porém, pouco me importava com aquilo. Nunca sequer me importei.

Minha barriga era a prova viva disso, literalmente! Eu não era gorda, não mesmo. Porém, também não me encaixava com o que a sociedade sempre julgou ser o ideal para uma adolescente de dezoito anos. Meus seios eram firmes, pequenos, talvez mais uma coisa a ser julgada em mim. Minhas coxas eram grossas, provavelmente pelas aulas de artes marciais que faço duas ou três vezes na semana. Aquilo sempre me ajudou a refletir, pensar corretamente nas coisas ao meu redor. Meus cabelos possuíam um tom de ruivo flamejante. Desfiz rapidamente o coque que havia no mesmo, deixando-o cair como cascatas por minhas costas.

Minha cintura era fina, talvez fosse a única coisa de acordo com a sociedade. Sorri com o que vi refletido no espelho. Apesar de algumas dobrinhas presentes em minha barriga, eu me amava por completo. Porque com o decorrer dos anos, aprendi que, nossa aparência é uma das coisas mais banais a serem julgadas em um ser humano. Qual era o sentido em fazer alguém se sentir mal com aquilo? Acho que nunca serei capaz de entender ou sequer aceitar tal realidade que nos cerca desde o início dos tempos.

Terminei de retirar as últimas peças presentes em meu corpo, sentindo uma brisa fria passar por mim. Tremi com aquilo. Entrei rapidamente no box, ligando o chuveiro logo em seguida. Suspirei aliviada, sentindo a água quente descer pelo meu corpo.

Porém, ao pensar com quem eu teria que lidar naquela manhã de segunda-feira, comecei a sentir um calor imensurável se espalhando por cada célula que havia em meu corpo. Minha respiração se tornou descompensada, rápida. Temi com o que poderia estar acontecendo comigo. Aquilo não era normal, de forma alguma!

Ouvi alguém adentrar abruptamente pela porta do banheiro, mas o calor era tanto que, por alguns instantes, achei que aquele seria o meu fim. Minha visão ficou turva, no entanto, pude ver a silhueta de Verônica à minha frente. Suas feições eram preocupantes, percebi antes de, finalmente, cair na inconsciência.

[...]

"Eu observava atentamente o lugar em que eu me encontrava naquele momento. Era uma pequena cabana rústica, com diversos retratos de pessoas que, por míseros segundos, achei que os conhecesse. Tolice, seria impossível tal coisa, pensei comigo mesma. Espantei rapidamente aqueles pensamentos.

Andei lentamente por ali, observando cada detalhe, cada fotografia. Havia um casal em um dos retratos do qual observei minuciosamente. Eles pareciam demasiadamente felizes. Qualquer um poderia ver o amor estampado em seus olhos. Um sorriso se espalhou por meus lábios. Dedilhei meus dedos suavemente pelo rosto daquele belo casal. Havia algo de familiar neles, mas eu não fui capaz de identificar o que seria.

Um choro tirou-me de meus pensamentos. Um vinco se formou em minha testa, confusa. Até aquele exato momento, não era do meu conhecimento que havia alguém ali, ainda mais um bebê. Subi lentamente nos degraus que haviam naquela pequena cabana, chegando no segundo andar. Vi um longo corredor, com diversas portas.

Caminhei vagarosamente, seguindo o som do choro daquele bebê. Perguntei-me se os pais não estariam em casa, porém, estanquei no lugar assim que ouvi uma linda voz sussurrar algo que não fui capaz de entender. Era uma voz feminina, suave.

Abri lentamente a porta do quarto em que pensei ter ouvido-a murmurar, vendo a mesma jovem das fotografias que haviam naquela casa. Ela tentava acalmar aquele lindo bebê, inutilmente.

— Amor, o que houve? — Ouvi uma voz masculina questionar. Grossa e, ao mesmo tempo, afetuosa. Seus olhos transmitiam todo o carinho que o mesmo sentia por aquela bela jovem e pelo bebê em seu colo.

Ele havia saído do banheiro que encontrava-se naquele quarto. Seus cabelos pretos estavam molhados, indicando seu recente banho. Ao observar seus olhos, lembrei-me rapidamente daquela mulher com que sonhei naquela mesma manhã, cristalinos, brilhantes. Algo se agitou dentro de mim.

— Ele não para de chorar, Henry. Não sei mais o que fazer! — A mulher comentou angustiada, balançando incansavelmente o bebê em seu colo, murmurando uma bela canção, tentando acalma-lo, em vão.

— Deixa eu tentar, amor! — O homem apanhou suavemente o bebê de seu colo, balançando-o afetuosamente. — Você deveria descansar um pouco, sei que deve estar exausta. — Henry disse amorosamente, olhando-a compreensivo. A jovem suspirou pesadamente, esfregando suas pálpebras. Ela resmungou algo incompreensivo, até mesmo para o seu marido, o qual lhe olhou estranhamente.

— Disse algo? — O homem questionou.

— Só disse que tem algo de errado, posso sentir isso. — A mulher falou aflita, olhando em volta. Por alguns segundos, pensei que eles fossem capazes de me ver, mas descartei rapidamente essa opção quando a mesma passou seu olhar por mim, incapaz de me ver.

— Ayla, o que está sentindo? — Henry questionou preocupado, enquanto tentava acalmar o bebê em seu colo.

— É um sentimento de... Morte! — Ayla revelou alarmada. Ela puxou levemente seus cabelos loiros por entre os dedos, inquieta. Seus movimentos eram tensos.

— Morte? — O homem perguntou descrente, porém, suas feições eram puramente atormentadas.

O choro daquele bebê aumentou gradativamente quando, repentinamente, uma densa fumaça surgiu no quarto, surpreendendo o jovem casal.

Uma gargalhada sombria se fez presente naquele pequeno cômodo, fazendo consequentemente, com que o homem apertasse ainda mais o bebê em seu colo, tentando em vão escondê-lo.

— Por quanto tempo acharam que poderiam se esconder de mim? — A voz murmurou, desgostoso. Seu tom sombrio me fez tremer levemente. Henry colocou a mulher atrás de seu corpo juntamente com o bebê, protegendo-os.

Assim que a fumaça diminuiu gradativamente, pude finalmente ver o rosto daquele que era o portador de uma voz tão sombria e... Assustadora.

Aquele homem possuía seus cabelos em um tom de preto, com alguns resquícios de azul marinho. Seus olhos eram opacos, sem vida. Porém, o sorriso macabro de fazia presente em seus lábios, observando o jovem casal a sua frente. Ele gargalhou fortemente ao ver o bebê no colo de Ayla.

— É menina? — Ele questionou, apontando para a criança. Sua voz exalava sarcasmo, uma maldade tão grande que me fez tremer silenciosamente.

— Não te interessa! — O homem disse corajosamente, olhando-o em desafio.

— O que faz aqui, Hades? — Ayla perguntou, porém, sua voz falhou levemente, fazendo um sorriso maldoso nascer nos lábios daquele homem.

Hades caminhou pelo quarto, até se sentar confortavelmente sobre a cama. Henry o olhou desacreditado por tal atitude.

— Ora meus queridos, estou aqui para lhes cobrar a dívida que me devem. — Ele murmurou tranquilamente, se acomodando ainda mais sobre a cama do casal. Ayla olhou para o seu marido com o medo estampado em seu olhar. Temi por eles.

— Não lhe devemos nada, Hades. — Henry afirmou ousadamente, provocando a fúria daquele que estava sobre sua cama. Hades se sentou lentamente, olhando-os enraivecido.

— Vocês começaram com isso, portanto, devem terminar com a bagunça que fizeram neste mundo. Caso contrário, todos irão sofrer com suas ações. Sabem disso! — Ele se levantou, andando apressadamente até o bebê que estava no colo da jovem mulher, observando-a estranhamente.

— É menina. — Hades sussurrou baixinho, perdido. Estranhei aquela atitude do mesmo. Henry se colocou novamente na frente da mulher e do bebê em seu colo, empurrando-o fortemente para longe dos dois.

— Fique longe deles, Hades! É a última vez que lhe aviso. — Henry disse raivoso, olhando-o em desafio.

— Qual será o nome dela? — Henry estava disposto a expulsa-lo de sua casa, porém, Ayla fora mais rápida, respondendo seu estranho questionamento.

— Será Elizabeth! — Abri a boca em surpresa. Henry a olhou contrariado.

— Elizabeth. — Hades murmurou distraído. — É um belo nome! — Ele disse, retornando rapidamente a sua posição de defesa, com os olhos sem vida, opacos.

— Cuidem dela. Ela será essencial para o nosso futuro, se é que desejamos ter um. — E com sua última fala, Hades sumiu novamente por entre a fumaça, até não restar mais nada no quarto, além do casal e do bebê que, naquele momento, havia parado de chorar.

— Isso foi estranho! — Henry comentou pensativo. A mulher abraçou fortemente a criança em seu colo, que descobri ser uma bela menina.

— O que você acha que ele quis dizer com aquilo? — Ayla questionou perturbada, mas o homem nada disse. Ao invés disso, ele abraçou as duas mulheres ali presentes, suspirando pesadamente.

— Eu não sei, amor. Mas uma coisa ele tem razão, precisamos restaurar a bagunça que fizemos, caso contrário, nossa filha não será capaz de viver nesse mundo. — Henry desabafou aturdido, dando um terno beijo na cabeça da pequena criança, que lhe olhou carinhosamente. Ele sorriu ternamente para a mulher ao seu lado, beijando-a afetivamente.

E, repentinamente, senti uma náusea jamais sentida por mim. Bile subiu por minha garganta, embrulhando meu estômago. Após isso, minha visão ficou turva. E, tudo que vi antes de cair na escuridão, foi aquele belo casal abraçados, com a criança no colo de Ayla.

[...]

Acordei assustada em minha própria cama. Lembrei que eu havia desmaiado no banho, levando-me para aquele estranho sonho. Afinal, o que havia sido aquilo? Era real demais para ser apenas um de meus estranhos pesadelos.

— Você me assustou. — Me surpreendi com aquela voz tão conhecida por mim. Verônica.

— O que aconteceu? — Massageei levemente minhas pálpebras, procurando aliviar minha tensão naquele momento juntamente com uma intensa dor de cabeça que atingiu-me tão de repente.

Verônica estava encostada na porta do meu quarto, observando-me atentamente. Estranhei seu comportamento, porém nada disse. Ela caminhou lentamente, até se sentar ao meu lado na cama, suspirando pesadamente.

— Você desmaiou no banho. Fiquei assustada. — Encostei minha cabeça em seu ombro, tranquilizando-a. Apesar daquele sonho ainda estar rondando em meus pensamentos, tentei lhe passar uma confiança da qual eu não sentia.

— Você que colocou essas roupas em mim? — Questionei intrigada, observando as peças em meu corpo. Um short pequeno, que claramente não era meu, juntamente com uma blusa de pijama.

— Infelizmente! Não foi agradável ver minha melhor amiga pelada. — Ri abertamente da careta presente em seu rosto.

— Que isso! Aposto que você ficou tentada. — Provoquei, vendo sua expressão se tornar incrédula.

— E eu aposto que esse seria seu maior sonho, que nunca vai se tornar realidade, amor! — Gargalhei diante daquela nossa brincadeira idiota. Verônica com certeza era a única capaz de me fazer sorrir em meus piores momentos.

— Minha mãe saiu? — Questionei, estranhando o enorme silêncio naquela casa. Verônica deu de ombros.

— Não tenho certeza, mas a julgar pelo silêncio, eu diria que sim. — Sorri com sua fala, porém, tive de concordar. Eu amava minha mãe, mas seu difícil comportamento complicava muito as coisas entre nós. Suspirei, com minha cabeça ainda encostada no ombro da Verônica. Estranhei seu silêncio.

— Tudo bem? — Questionei, observando suas feições sérias, pensativas. Ela sorriu levemente em minha direção ao ouvir minha voz.

— Tudo sim! — Ela respondeu rapidamente, porém, algo em seu comportamento me dizia o contrário. Esperei pacientemente, até ouvi-la murmurar ao meu lado:

— Com o que você sonhou? — Estranhei sua pergunta, observando-a de soslaio.

— Como assim? — Um vinco se formou em minha testa, confusa. Mexi minhas mãos sobre minhas coxas, nervosa. Aquela simples pergunta fazia-me lembrar daquele estranho sonho do casal que, por algum motivo, me eram estranhamentes familiares. Verônica me olhou atentamente. Sua boca estava em linha reta, mostrando seu total descontentamento.

— Eu sei que há algo de errado, Eliza! Só preciso que confie em mim e me diga o que está acontecendo. — Ela se virou rapidamente em minha direção, segurando minhas mãos entre as suas. Seus olhos eram suplicantes, assim como sua voz. Eu não saberia o que lhe dizer, mas sim. Algo estava errado, me era possível sentir isso. Porém, não saberia como lhe falar tal coisa. Seria ela capaz de acreditar em mim?

— Como posso explicar algo do qual nem eu mesma tenho conhecimento? — Questionei, batucando incansavelmente meus dedos sobre minhas coxas. Havia um sentimento de impotência em mim, por motivos dos quais me eram desconhecidos.

Verônica me observou compreensiva, passando um de seus braços ao redor da minha cintura, trazendo-me para mais perto de seu corpo. Me aconcheguei ainda mais no calo que emanava de seu tronco, suspirando pesadamente. Ela não era apenas uma amiga, com certeza não! Verônica sempre foi como uma irmã em minha vida. E, apesar dos obstáculos que sei que enfrentaremos, tenho a leve sensação de que será para sempre desse jeito. Eu e ela contra o mundo.

— Estou aqui, com você! — Ela sussurrou baixinho, enquanto meus pensamentos vagavam livremente por aquele estranho sonho... Ou quem sabe uma lembrança bem distante. Eu sinceramente não saberia dizer.

Fui arrancada abruptamente das minhas lembranças ao sentir um leve tremor sob a cama em que estávamos deitadas. Verônica olhou cautelosamente ao redor, apertando ainda mais seus braços em torno da minha cintura. Estranhei aquilo. Aliás, todas as coisas naquela manhã estavam extremamente estranhas.

— Fique aqui, Elizabeth! Não saia por nada, me entendeu? — Verônica murmurou contrariada. A olhei confusa. O que estaria acontecendo? Ela jamais me chamava pelo meu nome completo, apenas quando havia algo de errado. Mas o quê? Perguntei mentalmente enquanto via ela se afastar apressadamente.

Um outro tremor me fez sentir algo recorrente em minha vida. Medo. Medo do que estaria acontecendo. Medo pela Verônica. Medo por tudo de estranho que estava ocorrendo naquela manhã.

Me levantei lentamente da cama, sentindo diversos tremores sob meus pés. Olhei atentamente para a janela que havia em meu quarto, estranhando a intensa brisa que se encontrava ali. O medo percorreu por minha espinha, arrepiando-me quase imediatamente.

Um grito se prendeu em minha garganta quando observei Verônica atravessar a janela, quebrando o vidro da mesma. Arregalei os olhos, assustada. Porém, apesar do medo, corri em sua direção, ajoelhando-me a sua frente e colocando sua cabeça sobre minhas pernas.

— Verônica, fala comigo! Tudo bem? — Dei leves tapinhas em seu rosto, tentando fazê-la acordar. Haviam diversos cortes espalhados por seu corpo, mas um ferimento em específico me fez questionar como ela ainda poderia estar viva. Era profundo, um machucado que, de certa forma, nenhum humano normal seria capaz de suportar.

Suspirei aliviada quando Verônica abriu abruptamente seus olhos, observando-me com pavor.

— Tem que sair daqui, Eliza! Saia e não volte. — Ela aumentou gradativamente seu tom de voz, transparecendo um medo que jamais vi refletido em seu olhar.

— Ficou louca? Não vou te abandonar. — Afirmei decididamente, vendo seu olhar se tornar angustiado, alarmado.

— Cuidado! — Verônica gritou assustada, puxando-me rapidamente em sua direção, colocando seu corpo sobre o meu, protegendo-me. Pude ver estilhaços de vidros pelo chão, juntamente com um estrondo, que me levou a acreditar que algo havia entrado pela janela, quebrando-a inteiramente.

Verônica saiu vagarosamente de cima do meu corpo, com uma intensa expressão de dor em sua face. E quando vi o que havia a nossa frente, o ar se fez escasso em meus pulmões. Aquilo era simplesmente diferente de tudo que eu já havia visto. Seus olhos possuíam um tom de vermelho flamejante, juntamente com uma enorme raiva presente em suas feições. Seus cabelos eram pretos, caindo por seu rosto. Ele possuía uma beleza rara, de outro mundo, eu diria. Porém, ficar a sua frente, causava-me um medo desmedido, inexplicável. Minha respiração se tornou descompensada.

— Quem é ele? — Questionei para a Verônica ao meu lado, com o medo percorrendo cada célula do meu corpo. Minha voz falhou levemente ao perguntar tal coisa.

O homem do qual ainda me era desconhecido, gargalhou intensamente, fazendo-me tremer tamanho o medo que habitava em mim naquele momento.

— Não contou à ela, Verônica? — O homem à minha frente questionou. Sua voz exalava um deboche jamais ouvido por mim.

— Contar o que, demônio? Acho que você está precisando rever suas ações — Verônica comentou sarcasticamente, provocando a ira daquele a nossa frente. Seus olhos pareceram pegar fogo após sua fala dita tão corajosamente.

Antes que eu pudesse sequer pensar em algo, aquele homem fora mais rápido, segurando o pescoço de Verônica, suspendendo-a facilmente do chão e a jogando janela a fora. Um grito deixou meus lábios, trazendo sua atenção novamente para mim. Ele me olhou maldoso. Tremi de medo com aquele olhar. Me rastejei para o mais longe que consegui, porém, ele fora mais rápido, segurando em minha perna e puxando-me em sua direção. Meu coração acelerou fortemente ao observar nossa perigosa aproximação.

Fechei fortemente meus olhos ao ver sua mão fechada em punho, pronto para me atacar. Por alguns instantes, senti que aquele seria o meu fim, porém, alguém o empurrou violentamente para longe de mim, protegendo-me.

Abri rapidamente os olhos, vendo uma garota loira à minha frente, em uma perfeita posição de ataque. Apesar do fato dela ser baixinha, pude perceber seu poder ao ouvi-la murmurar em minha direção:

— Saia daqui! Encontre a Verônica e saia daqui o mais rápido possível. — Ainda fiquei estancada no mesmo lugar, observando-a levemente assustada. — AGORA! — Ela gritou, tirando-me dos meus pensamentos e medos.

Corri velozmente para fora dali, ouvindo um estrondo no meu quarto, provavelmente devido a briga que estava ocorrendo entre aqueles dois. Não deixei que aquilo me abalasse. Desci rapidamente as escadas, parando no primeiro andar da casa. Caminhei apressadamente, abrindo a porta e fechando-a fortemente atrás de mim. Minha respiração se acelerou gradativamente ao ver a minha melhor amiga e irmã estirada ao chão, inconsciente. Verônica! Não... Não! Pensei enquanto corria em sua direção. Me ajoelhei ao seu lado, tentando de alguma forma fazê-la acordar.

— Verônica, acorda! — Balancei suavemente seus ombros, porém, não obtive nenhuma resposta.

— Acredito que ela não irá acordar nem tão cedo, amor. — Uma voz sombria murmurou à minha frente. Olhei na direção daquele tom um tanto quanto sensual.

Mas me surpreendi ao ver o que havia ali. Sua pele era extremamente ressecada, em um tom nada comum de preto. Seus olhos eram vermelhos, com uma fúria da qual nunca vivenciei. Aquela criarura que ainda me era desconhecida, possuía asas, com pequenas garras na ponta da mesma. Ao sorrir diabolicamente em minha direção, uma fileira de caninos afiados se fez presente. Dei um passo para trás, perplexa com a aparência daquele ser.

— Você fez isso? — Apontei na direção dos diversos ferimentos espalhados pelo corpo de Verônica. A criatura gargalhou. Um tom completamente maldoso.

— Confesso que eu ajudei um pouco! O que acha, amor? — Uma raiva jamais sentida por mim se apossou de cada célula presente em meu corpo.

E com a raiva, algo surpreendente ocorreu. Senti cada membro que havia em mim entrar em ebulição, era como ser queimada de dentro para fora. Gritei, tamanho a dor que me consumiu. Minhas pernas fraquejaram levemente, fazendo com que meu joelho tocasse o chão. Apoiei minha mão, dando-me o devido equilíbrio. Olhei com a ira presente em meu olhar para aquele ser à minha frente, e mais surpreendedor ainda, foi ver aquela criatura com os olhos levemente esbugalhados. Sua expressão era completamente surpresa.

Fechei meus olhos e deixei que aquela sensação me tomasse por completo, trazendo paz ao meu coração. Após alguns minutos, abri lentamente os olhos, deparando-me com meu corpo em chamas. Eu estava literalmente pegando fogo, em cada parte, em cada membro que havia em mim.

— Ninguém machuca a minha irmã e saí vivo para contar a história! — Me surpreendi com o poder que minha voz exalou naquele momento. Poderosa, mas suave.

Soquei o chão sob minhas mãos, fazendo o mesmo tremer violentamente. E com o tremor, uma onda de calor e chamas foi em direção à criatura que me observava perplexa, queimando-a por completo. Ainda pude ouvir seu grito de dor e ódio enquanto ela queimava perante meus olhos, até não restar mais nada, apenas uma densa fumaça que surgiu dela após eu a matar.

Caí quase inconsciente sobre o chão. Minha visão havia se tornado turva. Bile subiu por minha garganta, embrulhando meu estômago. Deitei completamente sobre a rua, tentando focar minha visão, em vão.

Antes de finalmente cair na escuridão que me rondava, vi aquela bela jovem que havia me salvado mais cedo. Sua expressão era preocupada, mas principalmente, surpresa. Ouvi ela murmurar enquanto me observava atentamente:

— Quem é você? — Porém, nem eu saberia responder aquele questionamento. E com isso, a escuridão tomou conta, fazendo-me perder a consciência.

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