Naomi - Sob a Mira do Destino
Naomi - Sob a Mira do Destino
Por: Katherine C. De Almeida
Capítulo 1: Um pequeno esbarrão

Naomi Benedict desfilava com sua bota alta acima do joelho e moletom cinza, pelo seu shopping preferido em Bristol, quando de repente esbarrou com um jovem de olhos castanhos, cujo nem o inexplicável universo poderia explicar tamanha beleza.

— Esqueceu os óculos de grau em casa, gracinha? 

Ela fitou-o por longos segundos. Depois piscou rapidamente e deixou que um desdenhoso sorriso formasse em seus lábios. 

— Eu enxergo tão bem quanto você, usando esses óculos falsos. A Convenção de nerds fica do outro lado da cidade, sabia? 

— Olha garota, pra sua informação, tem muitas vantagens em ser nerd. E você nem queira imaginar quais são. 

Um sorriso que deixou Naomi perturbada surgiu nos lábios do jovem de beleza inconfundível. Ele voltou a andar, deixando ela mais intrigada e com cada célula do corpo em alerta. 

Os olhos cinzas reluziam como a prata, enquanto ela observava ele caminhar. Até mesmo seus ombros eram perfeitamente alinhados sob o sobretudo preto que usava. Ella, a amiga que acompanhava Naomi, precisou estalar os dedos algumas vezes bem a frente de seus olhos. 

— Terra chamando Naomi! 

— An, o quê? 

— Tem um pouco de baba aí no canto amiga. 

Naomi balançou a cabeça, passou a língua nos lábios e se virou para voltar a caminhar. Ela deu uma última olhada no jovem e, para sua surpresa, ele também virou o rosto, com o canto dos lábios levantado em um meio sorriso. 

— Pra onde estávamos indo?

— Hum, antes de você se esbarrar com o pedaço de mal caminho e babar? Acho que na praça de alimentação. 

Ela deu de ombros, erguendo a cabeça e caminhando com tranquilidade, mesmo que por dentro pudesse sentir suas pernas enfraquecerem e sua mente navegando na lembrança daquele sorriso. 

— Ele nem é tão bonito assim. 

— Naomi Benedict Heather Noah, eu sou sua amiga a o quê? Sete? Oito anos? Conheço seu olhar de interesse!

Ella sentou em uma das cadeiras, encarando a amiga com a expressão de quem já esperava ouvir isso. 

Naomi apenas suspirou e balançou a cabeça em negação.

— Ele é um idiota. Já tenho um na minha vida. 

— O Andrew também é bonito e idiota, espera, não, nem se compara. Seu pai é um monstro.

— Como vou saber se ele também não é um? 

Ella ficou em silêncio, fixou seu olhar e depois deu de ombros, mudando de assunto. 

***

Steve estava atrasado pra sua primeira aula do novo semestre de espanhol. 

Preciso chegar lá antes que a porta seja fechada, pensou. Ele acelerou os passos, desviou rápido das pessoas que ultrapassou e conseguiu chegar a hora exata que a professora entrou. 

Apesar de ter conseguido se concentrar durante os primeiros minutos, logo sua mente foi formada pela imagem da garota do shopping. Tão bela e insolente, pensou ele. 

Aquele olhar... Tinha algo sombrio e doloroso nele. Algo profundo que Steve se pegou querendo descobrir. 

Ele balançou a cabeça e afundou na cadeira, tentando se concentrar no que estava escrito no quadro. 

O destino não permitiria um novo encontro. Ele e aquela jovem de cabelos verdes e sorriso desdenhoso jamais se encontrariam novamente. 

***

— Hoje não tem curso de espanhol? 

Ella tomava seu milkshake quando lembrou, depois de vagar em pensamentos. Naomi não pensava em outra coisa a não ser no jovem belo e audacioso. 

— Não que eu saiba. 

— Bem, minha coordenadora mandou mensagem pra mim dizendo que houve mudanças no dia. Verifica o seu no site. 

Naomi pegou o celular e em menos de dois minutos descobriu que perdeu seu primeiro dia de espanhol, já que estava atrasada demais para conseguir chegar no curso. 

— Droga, meus dias foram trocados. Eu adoro espanhol, mas por que tem tantas complicações nesse lugar em? 

— Eu não entendo porque não faz faculdade. 

— Andrew não quer que eu tenha esse tipo de "convivência e liberdade".

Disse fazendo as aspas, depois deixando seu celular à mesa. 

Ela e seu pai tinham um relacionamento extremamente complicado e perturbado. Andrew era um homem não apenas perigoso, mas cruel e implacável. E Naomi não tinha nada que pudesse fazer para se livrar da influência do pai. Mesmo que ela tentasse fugir e recomeçar, ele a encontraria e, quando a encontrasse, ela viveria novos pesadelos... Nas mãos do homem que devia amá-la e protegê-la. 

Naomi e Ella voltaram a circular pelo shopping até a hora de voltar pra casa.

Ella iria ajudar sua mãe com algumas atividades domésticas enquando pensava no enredo da sua próxima história. Naomi planejava fazer alguma coisa que não envolvesse pensar no garoto. Mas fora inútil. Tentou arrumar seu guarda roupa, tentou dançar e ouvir música sem ele em sua mente e, até comeu pão de queijo com panquecas. Mas quando acordou no dia seguinte, ela ainda tinha aquele sorriso passeando por sua mente. 

A manhã de quarta-feira estava ainda mais congelante em Bristol. Como estava no início de fevereiro, os dias seriam terrivelmente frios e chuvosos na cidade do interior da Inglaterra.

Naomi nem queria sair da cama, mas fora avisada que seu pai desejava ter uma conversa com ela e, a última coisa que ela desejava é tê-lo invadindo seu quarto para uma conversa fútil. 

Depois de colocar algumas peças de roupa para ajudar a amenizar o frio, ela foi levada até a empresa. Noah Empreendimentos. 

— É um nome horrível, não acha Jerry? 

Perguntou ela ao motorista, ao vê-lo entrar na garagem do prédio. 

— Não poderia dizer senhorita. 

Ela respirou fundo, esfregou suas mãos e foi. Não gostava de ficar a sós com o pai, mas infelizmente não tinha escolha. O destino dera a ela uma prisão em forma de vida. 

— O que quer Andrew? 

Disse ao entrar na sala sem bater. Os olhos azuis a fitaram e depois se direcionou à secretaria. 

— Não tente culpá-la por entrar sem aviso, eu tenho mais poder aqui do que ela gostaria de ter só pra evitar minhas entradas. 

A jovem olhou para o homem desesperada e apenas saiu segundos depois. Andrew desligou rapidamente o telefonema e encarou sua filha, com um sorriso cínico. 

— Não já falei pra me chamar de papai? 

— Quando eu estiver dentro de um caixão talvez. 

— Que bicho te mordeu? 

— O último está bem a minha frente. 

Ele levantou, sua postura ereta, o terno que devia custar um ano do salário de todos os funcionários, impecável e feito sob medida, de um azul escuro, apenas menos brilhante que seus olhos. Um brilho escuro e profundo reluziu. Naomi não demonstrava temê-lo, mas suas pernas queriam falhar a cada passo dele, porém depois de tantos anos aprendera a controlar cada célula nervosa de seu corpo mediante a qualquer situação como aquela.

Ele parou diante dela. Seus olhos percorreram o corpo da filha com a malícia no olhar de deixar Naomi tonta e enjoada. 

Enfim, depois de segundos preciosos e tensos, ele segurou o rosto dela, os dedos grandes e finos em volta do pequeno queixo. 

— Se não quiser relembrar os velhos tempos, sugiro que me trate com respeito, entendeu?

Ela fixou o olhar nele. Os olhos brilhando de raiva. Ela desejava com toda força bater naquele homem diante dela, espancá-lo até a morte como ele certamente já fizera com alguma mulher, mas se ela o provocasse demais, acabaria criando novas lembranças. E essas não eram boas. Eram do tipo que não se deseja nem para seu inimigo. 

— Você entendeu Naomi Benedict? Ou deseja que eu repita no... 

— Eu entendi, papai. 

Um sorriso satisfeito atravessou o rosto dele. Ele a soltou e passou a mão carinhosamente no cabelo dela. Naomi sentiu a repulsa tomar conta de cada parte de seu corpo. Era como se aquele simples toque pudesse reacender tudo que já viveu. Todas as marcas, as dores, as lágrimas derramadas. 

Ela deu um passo para trás. Não conseguia suportar ficar tão perto. Só o cheiro dele lhe trazia memórias que ela desejava apagar.

O queixo retangular e firme se ergueu, mas ele não disse nada. Passou a mão em seus cabelos perfeitamente alinhado e voltou para sua cadeira. 

Apesar de estar na casa dos quarenta, Andrew apresentava uma aparência de invejar qualquer homem. Tinha belos olhos, boca fina, cabelo castanho liso e uma barba de dar inveja. Se colocasse óculos de grau e afinasse o rosto seria o próprio Henry Cavill. 

— Não tinha aula de espanhol hoje? 

Ela passou a língua nos lábios e desejou respirar fundo, mas se manteve quieta. Pra sair logo dali tinha que encurtar a conversa. 

— Meu horário sofreu mudanças. Irei ver isso amanhã. Deseja mais alguma coisa? 

Ele começou a mexer em alguns papéis e não estava mais com os olhos sombrios na direção dela, o que foi um grande alívio.

— Por enquanto não. Mas não aproveite demais o dia. Está fazendo tanto frio que melhor seria passar o dia em casa. 

— É claro papai. Mais alguma coisa? 

— Era só isso, pode ir. 

Ela se virou e saiu o mais rápido que pôde. Agora que sabia o desejo dele, que era que ela ficasse em casa, ela iria inventar qualquer coisa para que quando ele chegasse do trabalho não a encontrasse.

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