A Favorita
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Por: Nayla Quill
01

Ele passava por entre as mesas do laboratório enquanto entregava as provas que tinha aplicado na classe semana passada. Todos pareciam aterrorizados, o que me fazia sorrir orgulhosa, afinal, eu a tinha feito sem muitas dificuldades. Claro, não podia ser diferente. Química era a minha matéria preferida, o que justificava a escolha pela profissão – o que me fazia perguntar se todos os que tinham ido mal tinham escolhido a carreira errada ou tinham se distraído com sua estonteante beleza.

Ele entregou primeiro a prova de Gaya Flynn, minha melhor amiga e parceira de laboratório. Pelo seu sorriso animado, eu já sabia que ela tinha arrasado. Era óbvio, afinal, eu nunca tinha visto alguém tão esforçado quanto Gy.

Quando ele parou logo a minha frente o meu coração deu um salto – efeito colateral de sua proximidade, o que eu estava aprendendo a lidar aos poucos – enquanto ele olhava a nota com o cenho franzido e aumentava a minha curiosidade.

Ele entregou o papel que tinha uma ou duas folhas anexadas com as minhas respostas. Eu não acreditei – senti até vertigem – quando o enorme F estampava logo o alto de minha prova. Só podia estar errado, era certo. Conferi o meu nome uma ou duas vezes, custando a acreditar que a prova era mesmo minha.

Levantei a mão, insatisfeita. Qual era o problema dele, afinal? Podia aguentar a sua grosseria, ele dando em cima das alunas e qualquer coisa do tipo. O que não podia, era ele me zerar em uma prova que eu tinha ido bem. Qual era o seu critério afinal? Ele me zerava por que não gostava de mim ou por que eu não me deitava com ele? – não que vontade me faltasse, mas seria um tanto quanto esquisito.

Quando acabou de entregar as provas foi que pareceu perceber a minha mão levantada – no momento, eu já estava com ele dormente. Ele passou por minha mesa soltando um longo suspiro e encostou-se à sua, olhando-me com uma sobrancelha arqueada. O que era aquilo? Ele não iria me responder?

- Sim, senhorita White? – ele falou com desânimo. Eu não o tinha visto mostrar desânimo enquanto olhava para o decote das meninas na mesa da frente.

- Deve ter algum erro em minha prova, professor Morris. – ele entrecerrou os seus belos olhos azuis. De fato, ele não parecia ser do tipo que admitia seus erros.

- Pelo que me lembre, muitos. – ele falou cínico. Eu queria socar aquele idiota. – Não é à toa que tirou F, senhorita. – eu respirei bem fundo e contei até vinte.

- Não acho que o senhor tenha sido justo na sua correção. – contra ataquei.

- Sério? – ele perguntou irônico. – Não acha que teria te dado uma nota melhor se não merecesse e me livraria de ter que ficar aqui com você essa tarde? – eu abri e fechei a minha boca. Como assim? Ele só tinha deixado a mim de recuperação? Qual o problema dele, afinal? – Que bom que estamos esclarecidos.

Ele se voltou para o quadro negro e eu reprimi minha vontade infantil de fazer bolinhas de papel com as folhas de seus malditos relatórios e jogar em sua cabeça. Eu peguei a prova de Gaya que me olhava como se estivesse culpada por tirar uma nota maior que a minha – ou por minha situação deplorável – e conferi as minhas respostas. Eu tinha certeza que elas estavam certas! Por que ele tinha me dado F?

Eu estava inconformada. Eu peguei a minha prova e a de Gaya e enquanto ele se virava para explicar sobre reações básicas – que eu já tinha aprendido –, atravessei a sala, levando as provas para a diretoria para que lá pudessem intervir contra ele. Ele acompanhou meu movimento sem nada falar até o momento em que eu saia da sala.

- Senhorita White, se sair agora não poderá voltar. – eu me virei meio pasma, já um tanto possessa. Se eu ficasse naquela aula, saltaria em seu pescoço e o retalharia com minhas próprias unhas. – E descontarei pontos de presença de sua próxima prova.

- Engula seus pontos de presença, Samuel. – eu falei irada e dei as costas para ele. Eu quase podia afirmar que em seu rosto bonito surgira um meio sorriso.

Não sabia como alguém podia ter prazer em azucrinar tanto a vida do outro, mas, com certeza, tornar a minha vida um inferno era o melhor passatempo dele.

Marcela Gear White, Oryon City.

Eu já acordei de péssimo humor. Eu tinha certeza que a música Techno irritante não era o som de meu despertador e por não o ser não adiantaria apenas jogá-lo na parede para que ele se calasse. Abri os olhos amaldiçoando Frederick baixinho, antes de me levantar em fúria, sair marchando pelo quarto e bater à porta ao lado da minha com uma ira sem fim.

Meu irmão mais velho atendeu a porta com sua regata toda suada e calções largos, segurando os dois pesinhos em uma mão. Eu queria dizer para ele que aquela sua rotina de exercícios não estava funcionando, mas eu estaria mentindo sobre seus músculos que já despontavam sobre a camiseta facilmente.

Meu irmão era realmente bonito, o que fazia daquela casa uma transação sem fim de suas namoradas – que ele parecia trocar a cada mês. Bem, ele tinha várias fãs. Ele era grandalhão e há algum tempo a sua vaidade o fazia aprimorar o corpo pálido. Seus olhos de um verde bonito – um tom mais escuros que os meus – pareciam sorrir de tudo e quando estava de bom humor, era fácil me levar por eles e por seu sorriso constante e perfeito – depois de um uso longo de aparelho. Seus cabelos claros agora emplastados pelo suor costumavam ter pouco volume e um topetinho bagunçado que fazia sucesso entre a mulherada – principalmente Gaya, minha melhor amiga que tinha uma paixão platônica desde sempre por ele.

Certo, amava meu irmão, mas não estava com humor para os olhos sorridentes. Eu tinha cara de poucos amigos e ele sorriu largamente. Se ele achava que aquele sorriso iria demover a minha ideia de soca-lo, ele estava bem enganado. Suspirou profundamente e voltou para o quarto, abaixando a música.

- Que bom que estamos entendidos, Rick. – rolou os olhos enquanto deixava os pesinhos sobre a cama e se voltava para mim.

- Para um primeiro dia de aula, você parece bem mal humorada, Mads. – ele brincou bagunçando meu cabeço e me puxando para um abraço. Ew! Ele estava suado.

- Eca, Rick. – eu falei o afastando. – Eu sugiro que tome um banho.

- Ranzinza. – ele se queixou.

- O que esperava de alguém que é acordado tão cedo com uma música dessa? – ele rolou os olhos. – Eu precisava dormir, sabia? Tenho aula mais tarde e...

- Mais tarde? – lançou os olhos para trás, procurando o que achava ser o seu despertador. – Tem ideia de que horas são? – eu olhei confusa para ele. – Espero que vá de pijama para a faculdade, senão está mesmo atrasada.

Foi minha vez de olhar para o relógio. Certo, aquilo não estava acontecendo. Eu respirei fundo. Quem tinha se livrado do meu despertador? Corri de volta para o meu quarto enquanto ele ria e fechava a sua porta. Sim, meu irmão era para lá de irritante.

Tomei o banho mais rápido da minha vida e escolhi a primeira roupa que vi em meu armário, só prestando atenção para que não colocasse um sapato de cada e nada mais – porque eu já tinha feito mesmo aquilo. Joguei todas as coisas que eu poderia precisar hoje dentro da minha bolsa e peguei o meu caderno com pressa, descendo as escadas de dois em dois degraus para chegar ao andar de baixo e à cozinha.

Quando entrei, minha mãe estava lavando a louça, de costas para a porta e o meu irmão comia vigorosamente.

Certo, eu não sabia como tanta comida podia caber naquele corpo, mesmo que este fosse enorme. Ele mordia um pão com manteiga de amendoim e geleia e pareceu engasgar quando eu entrei na cozinha.

Minha mãe se virou para acudir o filho amado – não que estivesse de alguma forma me queixando –, mas parou na metade de seu caminho para rir da minha cara. Fechei mais ainda a minha cara, insatisfeita.

- Bom dia, querida. – cantou, batendo levemente nas costas de Rick. – Brigou com o pente essa manhã?

Peguei a colher e observei meu reflexo. Eu parecia um leão, mas eles não viam que era totalmente proposital.

Peguei uma maçã e a engoli rapidamente, enquanto apressava a minha mãe, sem ter a menor vontade de chegar atrasada no primeiro dia de aula – o que parecia meio impossível.

Nós saímos de casa, deixando um Frederick que zombava por suas aulas só começarem uma semana depois.

No caminho penteava o meu cabelo com os dedos, mesmo que soubesse que não fosse melhorar em nada.

Apesar da faculdade não ser longe de casa, havia um trânsito terrível. Certo, eu não estava ansiosa por aquilo.

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