Quatro

— Deixa a boca entreaberta. — era Colin, novamente.

Meu estomago só sabia revirar, de tamanho nervosismo. Eu podia sentir a respiração de Brandon e o cheiro de vodca que ele exalava. 

Percebi que tudo não passava de uma brincadeira, quando aquele liquido começou a ser jorrado em minha cabeça e as gargalhadas explodiram. 

Abro os olhos sem acreditar no que tinha acabado de acontecer e encaro os belos olhos azuis de Brandon. Minha garganta ensaiava soltar um "por quê?", mas ele sorriu e se juntou aos amigos nas risadas. 

— Achou realmente que eu iria beijá-la, empregadinha? — ele pergunta, antes de várias outras risadas.

Me levanto e corro escada acima.

— Feliz aniversário, Lacey.

É a última coisa que escuto, antes de entrar no quarto.

[...]

Mesmo depois de lavar o cabelo antes de dormir, ao acordar, ainda conseguia sentir o cheiro daquela vodca em meu cabelo.  

Após um belo banho, visto short jeans com uma regata e saio do quarto. Passando pelo corredor, avisto a porta de Brandon entreaberta. 

Havia ficado tão preocupada em tirar o cheiro de vodca de mim, que não tinha pensado nas atitudes e muito menos em como agiria perto dele. 

— Bom dia, querida. — sou recepcionada por Úrsula. — Venha tomar café.

— Hm... cadê Brandon?

— Saiu. Aliás, parece que os amigos vieram pra cá ontem. Deixaram tudo desarrumado. Como eu já dei um jeito na sala, você fica com o quarto dele, ok?

— Estou sem fome, então acho vou fazer isso agora.

— Não acho legal a ideia de você ficar sem comer, menina.

— Está tudo bem. Vou lá.

Depois de sorrir para a velha mulher, retorno ao segundo andar e adentro o imundo quarto de Brandon. 

Eram roupas e garrafas espalhadas por todo o cômodo. Parecia que um furacão havia passado por aquele quarto. 

Desço rapidamente e pego um enorme saco de lixo. Voltando ao quarto, jogo tudo o que era e tinha cara de lixo, dentro do saco. Terminado aquilo, começo a catar as roupas jogadas e cheirá-las. As que tinham cheiro de bebida ou algum odor estranho, ia direto para o cesto de roupa suja. 

Após arrumar a cama, vou até a escrivaninha. A zona que tinha no quarto inteiro, tinha em dobro naquela mesa. Eram papeis amassados, livros, cadernos. Um dos, estava aberto em uma página sobre Segunda Guerra Mundial e no caderno, estava escrito algo sobre redação naquele tema. Devido a quantidade de papel amassado, presumo que Brandon não conseguia escrever sobre aquilo.

Sem pensar duas vezes, puxo a cadeira e pego em um lápis. História era minha matéria favorita e eu mandava muito bem em redação.

Assim que termino de escrever a redação, me aproveito do fato de estar com papel e caneta e escrevo uma carta destinada a Vitória e todo o orfanato.

"Querida Tori,

HAHAHAHA, EU SEMPRE QUIS ESCREVER ISSO. 

Mas sério, amiga! Você não tem noção da saudade que estou de você e de tudo aí. Claro que não sinto falta da prisão e muito menos ficar no escuro em relação a minha família.

Continuo no escuro, pois o trabalho que eu arrumei, ainda não me permitiu um pouco de tempo pra tentar entender tudo. Entender aquele bilhete. 

Enfim, estou trabalhando de empregada em uma mansão! Você lembra daquele condomínio de luxo, o qual passamos em frente, vindo da excursão ao banco central? Então... casa dos Lennox. A casa é incrível. A família também. Eles têm um filho mais velho. Deve ter vinte anos. O que ele tem de pentelho, tem de lindo. 

Prometo que logo irei ter um tempo e irei passar aí. Mande um beijo para todos. Estou com saudades.

Lacey."

Dobro a carta e coloco no bolso do short. Ao descer, questiono Úrsula sobre envelopes e selos. Ela logo me consegue um e diz que posso colocar na caixa de correios, que o carteiro a levaria hoje. 

[...]

De madrugada e com fome, resolvo fazer um lanche. 

Pego a travessa com o bolo de morango que estava na geladeira e a coloco sobre o balcão. Após me servir um pedaço, pego em uma das revistas de Úrsula e começo a folheá-la, enquanto como. 

A única luz que iluminava a cozinha, era do pequeno abajur que tinha sobre a bancada. Era assim até Brandon acender a da cozinha. 

— Oh... — murmura, ao me encarar. — Você está aí. 

Eu não havia visto Brandon naquele dia. Ele tinha passado o dia na rua e só havia voltado em casa, para tomar banho e pegar suas coisas para a faculdade. Só sabia disso porque Úrsula tinha comentado durante o jantar. 

— Desculpe... eu vou...

— Ei, relaxa. Fica aí.

Brandon estava me encarando, no momento em que puxou um banco. 

— Preciso te fazer uma pergunta. — diz. 

— Tu-do bem. — merda, não devia ter gaguejado. 

— Limpou meu quarto? — assinto. Sabia que ele iria reclamar. — Bem... então foi você.

— Desculpa. 

— Por que está se desculpando? Olha para mim.

O tom dele não era ríspido, mas eu estava com um certo medo. Depois do gesto dele na noite anterior, não conseguia esperar nada de bom vindo dele.

— Não sei. — respondo, o encarando. — Então se eu mudei algo em seu quarto, que não gostou, eu...

— Ah... não. Estou falando da redação que salvou meu dia.

— Salvou?

— Cara... aquilo estava tão incrível, que o professor perguntou quem tinha feito para mim. Claro que precisei dizer que meus pais estão pagando professor particular. — Brandon ri, e eu acompanho. — Sério, Lacey, por que fez aquilo?

— Quando vi aquele monte de papel amassado, imaginei que você estivesse com dificuldade para escrever. Aproveitei a minha facilidade para tal, e fiz... foi impulso.

 — Mesmo depois do que fiz ontem. — ele não estava perguntando. — Meu Deus, eu não consigo parar de me perguntar, porque você me ajudou. Eu fui um babaca ontem. 

Não respondo.

— Quantos anos você tem? 

— Dezoito. 

— Oh, sim. Verdade. Só quando atinge a maioridade, que pode sair de um orfanato por conta própria. Então como consegue ter tanta sabedoria assim?

— Vivi em um orfanato e estudei em escola pública. A vida já era complicada. Não podia ser burra também. — rio, melancolicamente. — Minha única saída, foi meter a cara em tudo. 

— Sozinha?

— Sempre.

Ele sorri de lado, mas não parecia feliz.

— Faz faculdade de que? — pergunto, mastigando mais um pedaço do bolo. 

— História. 

— O que? — solto uma risada. — Eu podia imaginar qualquer coisa, menos isso. Quer ser professor?

— Ih, longe disso, HAHAHA. Sempre quis ser jogador. Futebol. — Brandon brinca com a travessa do bolo, girando-a, enquanto fala. — Mas meu pai queria que eu me formasse em algo. Achava que história seria fácil, e bem... como pode ver, estou enganado.

Rimos.

— Nunca pensei em que tipo de faculdade faria, porque eu sabia que nunca poderia chegar lá. — falo. — Desde que eu comecei a entender tudo o que estava acontecendo, todos os meus esforços se resumiram em descobrir o que aconteceu para que meus pais me deixassem naquele orfanato. Mas assumo que tenho curiosidade em saber como é por lá. Na faculdade.

Brandon semicerra os olhos e sorri largamente, antes de se levantar.

— Limpe sua agenda de amanhã, senhorita.

— Mas eu não...

— Você vai a faculdade comigo.

É a última coisa que Brandon diz, antes de deixar a cozinha. Ele nem ao menos me deu a chance de lembrá-lo, que sou uma empregada e não tenho agenda.

[...]

Estava no meio de um sono brilhante, quando batidas calorosas na porta do quarto, me fazem despertar. Com cabelo embolado, olhos cheios de remelas e bocejando, abro a porta e encaro Brandon.

— Pois não? — minha fala estava repleta de ironia.

— Vai assim pra faculdade?

— Que? — arregalo os olhos. — São... — viro-me e encaro o relógio. — São oito da manhã. Úrsula me disse que eu poderia dormir um pouco mais.

— Eu treino durante a manhã toda e a tarde tenho aula. Falei que iria levá-la a faculdade hoje e irei. Já avisei Úrsula. Então vá lavar essa cara e vamos.

Dito isso, Brandon me dá as costas e segue pelo corredor.

Eu queria sentir raiva por ter sido acordada cedo e estar sendo praticamente obrigada a sair com ele, mas o sentimento era outro. Era um misto de curiosidade com medo. Medo do que poderia estar por vir.

Após um banho, e escovar os dentes, visto calça jeans, uma blusa qualquer e tênis. Não muito adepta a maquiagem, saio do quarto depois de pentear o cabelo. 

— Bom dia! — Úrsula recepciona, ao me ver entrar na cozinha.

— Bom dia. 

Brandon estava agarrado a uma tigela, comendo cereal com leite. Logo que ele acaba, se levanta.

— Come algo rapidinho. — diz. — Vou escovar os dentes e logo saímos.

Assim que Brandon sai da cozinha, Úrsula diz:

— Eu não sei o que você fez com ele, mas continue fazendo.

— Como assim? — questiono, comendo um pedaço de pão.

— Brandon não é o tipo de garoto que acorda cedo para ir na faculdade. E ontem ele teve uma nota boa em uma redação. Sabe quanto tempo faz, que a mãe dele implora que ele faça as tarefas?

Solto uma risada.

— Não fiz nada. Talvez ele esteja... crescendo. 

Logo termino de comer e me levanto para ajudar Úrsula a lavar tudo.

— O que está fazendo? — me assusto com a voz de Brandon. — Largue isso.

— Mas eu...

— Pode deixar que eu termino, menina. Vá.

— Anda, Lacey. Não posso me atrasar.

— Tudo bem!

Ergo meus braços e acompanho Brandon.

— Tchau, Úrsula.

— Tchau, meninos. Bom dia.

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