Capítulo quatro

Hoje é minha folga. Acordei bem cedo pois queria passar o dia com minha princesa, mas a nossa casa estava pedindo socorro e como Luz tem problemas respiratórios, pedi para Jô ficar com ela por alguns instantes enquanto dava um jeito na bagunça. Assim que vejo que consegui limpar tudo, pego minha princesa e fazemos um dia das garotas, onde eu faço hidratação em nossos cabelos, nossas unhas e assistimos filmes que sempre são da Barbie ou da Frozen e comemos um monte de besteira que a deixa super feliz. Sei que trabalho muito e não posso dar a ela toda atenção devida. O bom é que Luz, apesar da pouca idade, é muito compreensiva e sabe que não faço isso sem motivo, afinal, ser mãe e pai é trabalho em dobro, mas vale a pena ver o sorriso que ela me dirige nos momentos em que estamos sozinhas. Olho para ela e tenho uma ideia.

– Princesa, que tal você e eu colhermos laranja? – os olhinhos dela se iluminam.

– Podemos fazer um bolo mamãe?

– Claro, meu amor.

– Vamos fazer bolo e dar pra todo mundo.

– Fazer bolo para todos os vizinhos?

– Sim. E vamos dar até pra mãe da chata da Viviane.

– Mas você e ela não são mais amigas? – sinto que aconteceu alguma coisa que Luz não quer me contar. – Meu amor, você sabe que pode me contar qualquer coisa. Além de sua mãe, sou sua amiga.

– É que a Viviane disse que eu não posso participar da festa do dia dos pais porque eu não tenho pai. – Os olhos da minha princesa se enchem de lágrimas.

– E por que você não me contou isso, Luz? O que aconteceu depois disso? Você falou com a tia? – Ela balança a cabeça que não.

– Quando ela falou isso, eu comecei a chorar, aí a Bia me defendeu dizendo que meu pai tá viajando muito longe, mas que o pai dela, tio Ricardo, é como se fosse meu pai e ele vai ir na festa do dia dos pais por nós duas. – Minhas lágrimas começam a jorrar. Como não percebi que minha filha estava sofrendo com isso? Como pude ser uma mãe tão desnaturada assim? – me abaixo e fico à sua altura para poder abraçá-la.

– Meu amor, escuta: se a Viviane falar essas coisas feias de novo, você me avisa, tá? – ela limpa as minhas lágrimas e me abraça apertado.

– Mamãe, não chora. Por isso não queria contar nada, porque toda vez que conto um negócio triste, você chora. Me desculpa, tá? Eu prometo que vou ser mais forte e vou me defender pra poder não ver você chorar assim.

– Deixa de bobeira, filha. Eu que deveria pedir desculpas a você por fazê-la sofrer dessa maneira e independente se eu ficar triste ou não, você tem que me contar tudo. – Toco em seu nariz e ela sorri para mim. – Mocinha, vamos deixar essas coisas tristes de lado e lavar os nossos cabelos para irmos no sítio do seu Toinho catar umas laranjas.

– Mamãe, o vô Toinho tá no céu, então tem que chamar de falecido e não fala “catar” laranja é “colher” laranja. – Sorrio e ela põe as mãozinhas na cintura, zangada.

– Você está muito esperta, meu amor.

– Já vou fazer seis anos, tenho que ser inteligente “ingual” a você.

– Não se fala “ingual”. É “igual”, meu bem. E você vai ser muito mais inteligente do que eu. – Vou cuidar para que ela não caia na mesma armadilha que caí uma vez.

Ela me abraça novamente e a levo para o banheiro para retirar a hidratação. Depois a arrumo e deixo ela no sofá brincando com meu celular enquanto me arrumava também. Fomos caminhando até o sítio e levei uns lanchinhos, já que minha bonequinha come que nem um dragãozinho.

Colhemos maçãs suficientes para fazer bolo para todos, como Luz pediu. Tiro o seu vestido e deixo ela brincar um pouco no rio. Me junto a ela e ficamos um bom tempo na água até seu corpinho pesar. Como já sabia que isso ia acontecer, a seco e a coloco para descansar um pouco. Pego outro lençol e a cubro, passo um tempinho olhando para seu rostinho tranquilo e agradeço ao universo por tê-la me dado.

Aproveito que a bela adormecida está em sono profundo e entro na água para esfriar a cabeça. Não sei o que faria se visse David na minha frente, acho que encheria ele de socos por conta de deixar a nossa filha sofrer sua ausência. Estava nadando quando escuto passos, tento correr para pegar o meu vestido, mas antes que eu o alcance dou de cara com lindos pares de olhos que me fizeram lembrar o passado.

Ficamos nos encarando por alguns segundos e vi um certo espanto em seus olhos, então rapidamente desvio os meus e só nesse momento me recordo que estou de sutiã e calcinha. Coro um pouco e alcanço meu vestido para colocá-lo. O homem continuou me encarando e eu fiquei curiosa em saber quem era o estranho e porquê ele me fez lembrar do passado.

– Boa tarde! Nunca vi o senhor por aqui, está perdido? tento puxar assunto, mas o homem continua a me encarar como se soubesse quem sou, olho para Luz mais à frente dormindo e temo, por mais que ele não tenha cara de psicopata, nunca se sabe. Afinal, já diz o ditado, “quem vê cara não vê coração.”

– Boa tarde! Não estou perdido, estou apenas dando uma volta na minha nova propriedade. – Puta merda. Ele era o novo dono e me pegou em suas terras e ainda me pegou tomando banho só de roupa íntima. Ah, mas ele deve ter visto corpos melhores e barrigas sem cortes gigantescos de cesariana.

– Desculpa estar na sua propriedade dessa forma, é que o finado seu Toninho me deixava vir aqui colher laranjas e algumas frutas que a minha filha gosta muito, mas pode ficar tranquilo que não irá se repetir.

Seus olhos parecem estar emocionados, acho que esse homem é louco, melhor pegar Luz e sair daqui antes que algo aconteça.

– Não precisa se preocupar, pode vir aqui sempre que quiser. Então você tem uma filha, qual o nome dela?

– Ela se chama Luz e está dormindo bem ali. – Aponto para minha pequena que está coberta e vejo o homem esticar a cabeça para tentar vê-la, arrumo as coisas que trouxe na bolsa e ajeito Luz em meus braços cobrindo sua cabecinha.

O homem continua a me olhar e isso me deixa um pouco mais apreensiva que o normal, os noticiários estão cheios de maníacos e você nunca sabe onde um desses irá aparecer.

– Já vou indo! Me desculpe por invadir assim, mas há meses que ninguém aparece pela propriedade.

– Não precisa se preocupar, pode vir sempre que quiser colher frutas. Você quer uma carona para casa?

– Eu não aceito carona de estranhos. – Ah! Mente idiota, aprende a filtrar as coisas. Muito sem jeito tento reformular o que acabei de dizer. – Muito obrigada, mas moro bem pertinho e já estou acostumada a carregar a bela adormecida aqui. – Digo apontando para Luz e torcendo para que o cara não me ache uma maluca.

– A propósito, meu nome é Logan. Já que te disse meu nome, não sou mais estranho. – Ele sorri para mim e fico muito sem graça. – E agora? Será que posso lhe ajudar oferecendo-lhe uma carona novamente? Ele continua sorrindo e por Zeus, que sorriso bonito.

– Igual o do X-men, legal. Não precisa se preocupar, moro bem pertinho. Rapidinho chego e muito obrigada pela atenção. – Ajeitei Luz em meu colo para poder partir e quando estava me virando, ele me chama novamente.

– Você sabe o meu nome, mas eu não sei o seu. – Ele fica me olhando, esperando que eu responda.

– Eu me chamo Cindy Laura, mas pode me chamar apenas de Cindy.

– Ok, apenas Cindy, nos vemos por aí. – Ele dá um sorriso novamente e não sei porquê comecei a pensar no raio do passado novamente, devo estar louca. – Retribuo o sorriso e vou para casa. No meio do caminho sinto meus braços formigarem e percebo como Luz está pesada, bem que eu poderia ter aceito a carona do Logan, balanço a cabeça para esquecer o que aconteceu no sítio.

Chego em casa e vou preparar os bolos que Luz pediu. Assim que ela sente o cheiro do primeiro bolo pronto, acorda imediatamente e pega seu aventalzinho para me ajudar a preparar os bolos. Na verdade, ela mais bagunça que ajuda, mas não a limito e deixo ela a vontade, terminamos os bolos e distribuo eles em pequenas vasilhas. Luz veste a sua fantasia de Chapeuzinho Vermelho e fomos nas casas dos vizinhos entregar pedaços de bolo de laranja. Ela adora distribuir bolo para os vizinhos. Apesar de pequena, Luz faz uso de todos os valores que lhe ensino... fui abençoada pelos céus com uma filha maravilhosa.

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