Capítulo 2 - Fugitiva

O caminho que seguiu após o bárbaro crime cometido contra o pai adotivo dentro de sua própria casa, ao tentar evitar que ele continuasse a espancar violentamente sua mãe era incerto. A menina fugiu pela floresta sem rumo. Durante a fuga perguntava-se sobre o que teria de fato acontecido com Damásio, indagava em seus pensamentos se ele estaria mesmo morto ou sobrevivido ao esfaqueamento no peito.  A densa floresta que seguiu depois de deixar a estrada por onde esteve caminhando por várias horas, para evitar que fosse facilmente localizada por aqueles que porventura viessem ao seu encalço., era escura e fria, apesar de ainda ser dia e o sol está com seus raios a queimar a pele.

 Era um caminhar como se estivesse andando às cegas, tanto pela escuridão que se formava a cada passo dado para o interior da mata, como pelo fato de desconhecer inteiramente o lugar.  Só era possível ouvir o cântico dos insetos e de corujas que ali era noite permanente, parecia que nunca houve dia naquela parte da natureza. De repente parou e ergueu o olhar assustado, viu a muitos metros de altura a ponta das gigantescas árvores centenárias, de caules enormes e com raízes que se podia ver espalhadas sobre a terra.

Pôde perceber a ponta dos altos galhos que mais pareciam com ramos de pequenas plantas, tão distante estavam de onde ela se encontrava.  Lembrou que estava deixando para trás um passado manchado de sangue, então compreendeu que a única saída seria prosseguir com sua caminhada. Esforçava-se para alcançar uma luz qualquer que lhe guiasse para fora daquela mata fechada, na esperança de encontrar um refúgio e onde passar a noite. A caminhada naquela escuridão foi longa, não podia perceber onde firmar os passos. Finalmente o ambiente começou a ser iluminado pela luz do sol.

 Terminava a área mais densa e a alguns passos dali, depois de sair ao limpo, havia uma caverna com aspecto ideal para um bom descanso depois de várias horas caminhando sem saber ao certo para que direção seguia.

 Já era final de tarde e à noite se aproximava, no céu um mormaço se formava, as nuvens cheias de água davam sinais de que um grande temporal se formava. A chuva começou a cair seguida de forte ventania, era típico daquela região aquele tipo de clima, quente e frio. Horas sol escaldante e em seguida repentina quedas de chuvas. A caverna era assustadora, escura, mas ideal para se proteger da ventania lá fora. Estando dentro do lugar, sem adentrar mais ao fundo temendo o pior, assentou-se e recostou a cabeça nas paredes em redor, exaustiva.

 Pensava em todas as coisas que lhe aconteceram nas últimas horas. Seus pensamentos voltaram como um flash ao passado, quando, apesar das constantes agressões sofridas por sua mãe pelo grotesco Damásio ainda foi possível viver ao lado dela bons momentos, quando ambas estavam sozinhas e longe dele, vivendo como duas grandes amigas, uma cuidando da outra. Era seu maior sonho poder concluir os estudos, começar a trabalhar e ter condições de libertá-la daquele cativeiro horrível.

Mas o imprevisto aconteceu e seus sonhos foram impedidos de se concretizarem, agora teria que encarar a dura realidade diante da qual se encontrava.  Tornou-se uma fugitiva, certamente procurada pela polícia como aquela que, depois de adotada pelo casal resolveu matá-los. Nada mais conveniente para deduzir, visto que ninguém poderia imaginar o inferno vivido pelas duas mulheres ao lado de um homem viciado como àquele. Claro que isto não era uma razão para que ela tirasse a vida do violento indivíduo.

 Mas foi a única maneira que encontrou, naquela ocasião, para tentar conter a sua violência.  Com o olhar fixo na chuva e no vento forte que soprava lá for a, balbuciou alguma coisa quase imperceptível, como se falasse a si mesma:

 ― Ele a matou, àquele miserável a matou. Maldito viciado!

Perdida entre tantos pensamentos e ainda bastante assustada, dominada pelo cansaço por conta da longa caminhada que a conduziu até ali, recostou a cabeça na parede de pedra e adormeceu. A tempestade parecia não querer passar, durou a noite inteira.

 O dia nascia e o sol reapareceu depois de várias horas chovendo, sem nenhum intervalo. Os pássaros cantavam nas altas árvores que encobriram a vegetação rasteira do lugar, a menina despertou com um lindo cantar do pássaro colorido que estrategicamente pousou próximo a gruta onde ela dormia.

 Parecia ter sido enviado propositalmente para despertá-la de seu pesado sono e seguir viagem rumo ao desconhecido. Ao acordar, ainda permaneceu de olhos fechados ouvindo o cantar suave dos pássaros. Até que sentiu algo gelado passando por cima de suas pernas, acompanhado por um barulho estranho, era como se um chocalho estivesse sendo sacudido. Conhecia aquele barulho, viveu bastante tempo morando longe da cidade e teve um longo contato com a natureza, sabia tratar-se de uma cascavel, animal peçonhento e altamente venenoso.

Aprendeu nas aulas de ciências que os répteis possuem visão infravermelho, só percebem a presença de suas presas pelo movimento das mesmas. O segredo para evitar seus ataques é manter-se imóvel, completamente quieto, tentar evitar até a respiração ofegante. Ficou ali, paralisada por alguns segundos até que a enorme cobra passasse calmamente sobre suas pernas. Não ficou apavorada, era valente e além de corajosa gostava de répteis, não era à toa que a maioria das pessoas da cidade achavam-na estranha, meio louca.  Ela tinha em casa sua amiga “Flor”, uma jiboia de estimação que criava desde bem pequena. Fo um presente de Otaviano, seu tio, também meio esquisito.

A coitada ficou por lá, abandonada depois da tragédia que lhe sobreveio e mudou radicalmente sua vida. A noite passou, a tempestade se foi, era um novo dia. Agora era o momento de sair dali e seguir em frente, tentar encontrar alguém que pudesse lhe ajudar.

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