Um novo lugar para histórias

Paloma

                - Você pode me dar um pouco de água? – Caleb me pede, interrompendo a sua narrativa.

                - Claro. – me levanto na mesma hora para pegar um copo na cozinha para ele. Quando volto, ele está segurando a cabeça com as mãos. Não consigo imaginar como ele está se sentindo.

                - Você está bem? – pergunto voltando a me sentar do seu lado.

                - Sim. – ele ergue a cabeça e pega o copo – É só difícil relembrar essas coisas. – vira o liquido numa golada só. – Obrigado. – e me devolve o copo.

                Eu o coloco na mesa de centro e passamos alguns minutos em silêncio lado a lado. Tento imaginá-lo mais jovem, se apaixonando por uma garota com namorado e provavelmente sendo agredida. Denis batia em Mia? Eu queria perguntar, mas achei melhor que ele continuasse contando a sua história em seu próprio ritmo.

                -  Quer comer alguma coisa? – ofereço – Eu estou faminta.

                - Não almoçou? -  ele coloca a mão no meu joelho.

                - Não. – confirmo com um sorriso – Você está com fome também?

                - Estou sim. – ele respira fundo e estica as costas – Posso te levar para comer alguma coisa? – oferece.

                - Se não for ruim para você, eu aceito. – sorrio.

                Nos levantamos ao mesmo tempo e vou até o quarto trocar de roupa. Visto apenas uma calça jeans e uma blusa de frio por cima da que já estou, nada elaborado.  Não é um encontro, é quase como dois amigos almoçando juntos e não me sinto preocupada com a minha aparência.

                Descemos pelo elevador e percebo que ele presta atenção em mim pelo espelho. Será que eu o atraio do mesmo jeito que Mia atraiu? Afasto o pensamento porque ele não é justo, afinal Mia deve ter sido seu primeiro amor e, ao que tudo indica, a esposa que faleceu. Não é um patamar fácil de se alcançar e com toda certeza não é uma competição.

                Seu carro está estacionado na frente do prédio e ele abre a porta para mim. Sinto cheiro de perfume masculino assim que entro, um perfume muito suave.

                - Alguma preferência?  - Caleb me pergunta já saindo com o carro.

                - Qualquer lugar que esteja vazio. – tudo que eu não quero é um restaurante super lotado. Quero poder ouvir nossa conversa e meus próprios pensamentos.

                - Fico feliz que tenha dito isso.  – ele parece aliviado. Caleb continua dirigindo até um pequeno restaurante que só tem dois carros parados na frente. É um lugar muito discreto e bonito em sua simplicidade. Eu gosto logo de cara.

                Quando entramos no lugar, apenas duas mesas estão ocupadas e ele me guia para o lugar mais longe possível delas. Nos sentamos e logo um garçom vem anotar nossos pedidos. Peço qualquer coisa, tudo que eu quero é manter a conversa fluindo entre nós dois.

                - Sempre vem aqui? – pergunto assim que o garçom se afasta.

                - Sim, eu evito aglomerações. – ele sorri.

                - Você ainda está sofrendo, não é? – no instante em que a frase sai, eu me arrependo. Que coisa mais estúpida para se dizer!

                - Menos do que antes. – ele balança a cabeça afirmativamente – Mas tem muita coisa ainda para te contar.

                - Sou toda ouvidos. – respondo sinceramente. Quero de verdade saber tudo que aconteceu e como ele ficou tão abalado com toda a história, e fico feliz de ter sido escolhida para isso.

                Quando a comida é servida, comemos em silêncio por algum tempo.  Observo suas mãos segurando os talheres e como os músculos se contraem quando ele mastiga. Caleb é muito bonito e tem um ar misterioso que o deixa instigante.

                - Você quer mais alguma coisa? – ele me pergunta afastando o prato.

                - Não. – afasto meu prato também – Podemos ir se você quiser.

                - Então vamos. – ele diz pegando a carteira – Eu pago dessa vez. – ele ergue a mão quando percebe que vou protestar. Ele pensa em repetir isso mais vezes?

                Voltamos para o carro, mas quando entramos ele não dá a partida, apenas mantém as mãos no votante e o olhar distante.

                - Paloma. – ele olha para mim, que estou parada no banco do carona sem saber porque ainda estamos ali – Você acharia muito estranho ir para minha casa? Realmente não quero encontrar Breno e Aurora hoje.

                - Ah... – reflito por um instante. Seria perigoso ir para a casa dele? Ficamos um tempão sozinhos no apartamento e nada aconteceu... – Tudo bem, vamos. – concordo por fim.

                Ele dá a partida e saímos. Dez minutos depois pegamos uma estrada e começo a ficar nervosa. Ele não mora na cidade? Isso não foi mencionado.

                - Você está quieta. – ele me olha de relance. Estou encolhida com os braços cruzados. – Desculpe o silêncio.  – sorrio por educação em vez de responder que estou assustada – Eu moro um pouco afastado, mas não é longe.

                Poucos minutos depois ele manobra e segue por uma pequena estrada de terra que dá em uma fazenda. O lugar é muito lindo, com um amplo gramado e uma casa de madeira com uma varanda por toda a sua volta.  Caleb estaciona na garagem ao lado da casa e eu abro a porta.

                O sigo até a varanda até um sofá que está suspenso do chão. Quando sento, ele oscila suavemente para trás e para frente me fazendo lembrar dos antigos balanços da infância. Caleb se senta ao meu lado novamente mantendo certa distância.

                - É lindo aqui.  – comento apontando ao redor.

                - Gosto do silêncio e da falta de vizinhos. – sorri.

                - Mora aqui há muito tempo?

                - Na verdade não. – ele encosta as costas – Também morava em um apartamento.

                Olho para ele e ele já estava olhando para mim. Meu coração acelera enquanto penso como seria tocá-lo, não apenas com a mão no peito como fiz noite passada ou o toque que ele me deu nos ombros mais cedo, mas abraçar forte e sentir cada parte do seu corpo junto ao meu. Desviamos o olhar ao mesmo tempo, e me pergunto o que ele poderia ter pensado que o constrangeu.

                - Posso continuar falando? – ele respira fundo, se preparando para mergulhar novamente na história da sua vida. Apenas balanço a cabeça em confirmação.

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