Vista

Molly

Comprar um ingresso para a London Eye não foi muito difícil como pensei que seria para um sábado. Mas agradeci internamente por aquilo, não queria ter de enfrentar uma fila gigantesca.

Com a cabeça ainda cheia com o que havia ocorrido mais cedo, nem notei por onde estava seguindo. Eu só conseguia pensar no quanto eu queria ter alguém que me amasse e me entendesse bem, como Ashley, minha irmã Haley ou meus pais. Mas acho que não podemos ter tudo o que queremos, não é?

Finalmente notei que estava no caminho errado, quando parei do lado oposto ao da entrada das cabines, e a observei começar a se mover.

— Droga...! — sussurrei, dando meia-volta e andando em direção contrária.

Faltando alguns passos para a fila, enquanto sentia o vento gelado na minha nuca, escutei o som de um violão e parei de andar. Seja lá quem estivesse tocando, sabia muito bem o que estava fazendo, além de ser uma das minhas músicas favoritas de todos os tempos, o que me fez dar um pequeno sorriso. Fiquei cheia de curiosidade para saber quem tocava, comecei a andar, procurando onde a pessoa estava.

Conforme eu caminhava, mais próximo o som do violão ficava, e quando notei uma silhueta masculina segurando o violão em um canto mais escuro do lugar, o homem começou a cantar, me fazendo travar no lugar.

Deus, aquela voz era uma das mais bonitas que eu já havia escutado em toda a minha vida. Era suave, arrastada e fez com que meu coração batesse com força. Senti meus pés se moverem na direção dele, que não notou minha aproximação, enquanto continuava a cantar com uma emoção gigantesca.

Sentei à sua frente, fechando os olhos e me deixando levar música, sussurrando a letra. Senti pequenas lágrimas se formarem nos cantos dos olhos. So Far Away, do Avenged Sevenfold sempre mexeu comigo de uma maneira estranha, principalmente depois da morte de vovó Grace, mãe de minha mãe. Ela foi a responsável por me fazer entrar no mundo da dança, já que era uma grande apaixonada pela arte. Quando eu tinha por volta de quatro anos, vovó passava os dias em que eu estava em sua casa, durante as férias, colocando música clássica para mim e me treinando como podia.

Naquela idade, eu não via aquilo como algo sério, apenas como uma brincadeira extremamente divertida, mas com o passar dos anos, eu fui entendendo que era o que eu amava. Vovó Grace estava sempre lá, me dando todo seu amor e apoio.

Quando ela morreu, nos meus quinze anos, depois de muitos anos lutando contra um câncer de fígado, fiquei totalmente arrasada. Foi mais ou menos na mesma época em que essa música foi lançada, e eu percebi que ela conseguia descrever perfeitamente como eu me sentia. Notei que a música havia parado e abri os olhos, encontrando o rapaz à minha frente me encarando com curiosidade presa em seus olhos castanhos.

— Ah, meu Deus! — comecei a falar, me levantando rapidamente, desviando o olhar de sua direção e sentindo minhas bochechas esquentarem de vergonha. — Eu devo estar parecendo ser uma louca, parada aqui na sua frente assim, não é? Me desculpa, mas é que eu amo tanto essa música, e depois da noite que eu tive...

— Tudo bem, não tem problema — o rapaz me cortou, com a voz carregada do sotaque britânico, levemente arrastada, fazendo com que eu me afastasse um pouco dele. — Você está bem? Está machucada? — continuou, enquanto eu ficava de costas para ele, limpando os joelhos da calça.

— Não, por quê? — perguntei, arrumando minhas tranças.

— Parece que você estava chorando — respondeu por fim, se aproximando e me deixando muda quando o encarei.

Ele era lindo.

Olhos pequenos e de íris castanhas, assim como os fios curtos de seu cabelo, lábios finos e a pele clara, que parecia ainda mais pálida devido à luz branca do local. As roupas largas e escuras, junto com a case do violão deixada aos seus pés, o deixavam com um ar ainda mais interessante.

Ele se aproximou, limpando minha bochecha com a ponta do dedo. Meu coração se acelerou de uma maneira engraçada, e senti meus olhos se arregalarem. Ok, eu deveria estar parecendo ainda mais esquisita, o encarando da forma que eu sentia que estava: como se ele fosse o ultimo biscoito de chocolate do mundo.

— Hum, eu tive uma noite difícil, mas já estou melhor agora — disse depois de algum tempo, me afastando um pouco e limpando o restante das lágrimas. — Obrigada por perguntar. — Tentei sorrir, e recebi um olhar nada convencido em resposta. — E parabéns, você toca muito bem.

— Obrigado. Mas mesmo eu não te conhecendo, consigo ter a certeza de que você não está nada bem — começou a falar, voltando a se aproximar. — Se quiser conversar com alguém, eu sou um ótimo ouvinte, até porque meu fim de tarde também não foi nada bom e adoraria ter alguém para conversar também — continuou, dando de ombros despretensiosamente e me fazendo dar um sorriso mínimo.

Eu me senti meio idiota e apavorada por me sentir à vontade ali, afinal aquele cara ainda era um estranho para mim, mas mesmo assim disse:

— Claro.

E recebi um sorriso largo e animado em resposta, juntamente com uma mão esticada, enquanto ele dizia:

— Muito prazer, sou Luke Thomas, e você é?

— Molly Parker. É um prazer conhece-lo, Luke. — Aceitei seu aperto de mão, sorrindo largamente também.

— Tem ingresso para a London Eye, Molly?

— Tenho. Eu vim para cá pensando em aproveitar um pouco da vista, para limpar a mente e também porque eu ainda não havia visitado ainda — respondi enquanto andávamos em direção a entrada da roda-gigante. Eu me sentia levemente tonta com a maneira como meu nome soava em sua voz.

— Então, você não é daqui, certo? — falou com entusiasmo, voltando a me encarar a tempo de me ver confirmar com a cabeça.

— Sou de Seattle, mas estou morando aqui agora — expliquei quando paramos na fila de pessoas que esperavam para entrar nas cabines.

— Opa, preciso entrar no meu modo guia turístico! Todo mundo precisa aproveitar o que de melhor Londres pode oferecer! — soltou com entusiasmo, até notar meu olhar nada tranquilo para a sua ideia. — Ou podemos apenas aproveitar a vista da London Eye. Se você quiser, eu toco algo do meu repertório para você, já que ainda não nos conhecemos direito e meu convite de te levar para conhecer outras coisas pela cidade foi um pouco estranho. Meio psicopata, talvez — completou, me fazendo rir.

— Um pouco psicopata, mas adorei — brinquei, o observando mexer nos cabelos, as bochechas ficando vermelhas pelo embaraço. — Porém vou aceitar apenas a parte em que você vai tocar uma música para mim do seu repertório — continuei enquanto entrávamos na cabine.

Pegamos uma das últimas cabines disponíveis, a que estava mais afastada das lotadas e totalmente vazia. Já senti um leve frio na barriga conforme ela começava a se mover.

— Por mim, tudo bem... — sussurrou, mas eu não respondi nada. Estava maravilhada com a vista da cidade conforme a cabine subia, fazendo com que meus olhos se enchessem de lágrimas. Não eram lágrimas de tristeza, mas sim de emoção ao notar como aquela cidade era linda, principalmente durante a noite. Todas aquelas luzes e o movimento noturno das ruas fizeram com que eu finalmente me sentisse em casa.

— Acho que não tem maneira melhor de ser apresentado a cidade do que assim. — Luke falou depois de alguns minutos em silêncio, aparecendo ao meu lado.

— Com certeza não tem. — Sorri, limpando as lágrimas que estavam acumuladas. Ele estava me encarando, com um sorriso de lado.

— Bem-vinda a Londres, Molly Parker.

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