Capítulo IV

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                                                                                                                                  Ellena

Exceto pelos planos de visitar meus pais aquele dia começou como outro qualquer: acordei as 5:30, o céu começava a clarear, fiz uma lista mental de tudo que teria que fazer, depois chequei meus emails.

Virei na cama e escorei-me em meu cotovelo para vê-lo, sorri. Ele estava deitado de bruços com seu torso nu, o lençol cobrindo-o apenas da cintura para baixo, a barba por fazer contornando seu rosto, cabelo bagunçado.

Aquela era uma visão impressionante, mesmo depois de dez anos juntos, vê-lo daquele jeito ainda mexia comigo, assim como na primeira vez. Aquela lembrança me inundou, o engraçado é que foi completamente ao acaso:

Éramos dois jovens em uma calourada muito louca da faculdade, ele cursava engenharia, eu direito. Nunca havíamos trocado uma palavra se quer, nem ao menos nos esbarrado pelos corredores, mas eu tinha uma amiga, que tinha uma amiga, que era namorada de um amigo dele. Depois das apresentações trocamos olhares a noite toda, por fim terminamos segurando vela e recorremos a companhia da vodca e do beer pong. Depois de muitas partidas acabamos no meu apartamento.

Na manhã seguinte acordei com uma ressaca tremenda, não me lembrava de nada, mas quando abri meus olhos, vi lindos olhos azuis como o oceano emoldurados por cachinhos dourados e um maxilar de tirar o folego. Bem ali, em minha cama, estava um dos homens mais lindos que eu já tinha visto.

Sorri ao me levantar, afastando a lembrança fui vestir minha roupa de corrida, após fui para cozinha localizada no andar de baixo, liguei a cafeteira, selecionei uma lista de reprodução e sai para correr. Como todos os dias a corrida demorou uma hora, quando voltei peguei uma xicara de café, subi para o banheiro, onde fiquei por trinta minutos imersa em sais, lavanda e alecrim, para energizar e relaxar, depois vesti-me e desci.

Ele já havia levantado estava na ilha da cozinha com uma caneca de café e seu jornal. Vestindo uma calça jeans escura, camisa social azul clara e a gravata azul marinho, eu amo vê-lo com aquela cor, realça meus olhos.

Dei um beijo em sua nuca, ele sorriu virando para mim e passando as mãos em torno da minha cintura.

- Bom dia amor, já está saindo?

- Bom dia vida. – ele sorriu e deu um beijo suave em meus lábios. – As coisas estão corridas no escritório. Mas e você de pé tão cedo? Hoje não é sua folga?

Revirei os olhos, estamos casados há sete anos e temos mais três de relacionamento e desde que assinei meu primeiro grande contrato no escritório, a cerca de oito anos atras, tenho folga todas as quartas feiras, fora raros os dias que não a tirei. Mas, toda quarta feira ele repete a mesma pergunta.

- Não vou perder meu tempo de folga dormindo. – respondi como nas semanas anteriores, fui até a cafeteira e enchi minha caneca. - O dia será tranquilo hoje? Vou levar a Laila na casa da mamãe, alguns animais deram cria.

- Tranquilo? - ele fez uma careta. - estamos com o prazo apertado para entregar o projeto daquele edifício do centro. Tivemos alguns problemas com ele, mas agora as coisas estão voltando para os trilhos.

Nessa hora ela entrou, coçando os olhinhos ainda sonolenta e arrastando pelas orelhas o urso, um coelho de pelúcia quase maior que ela.

Ele se levantou e a pegou no colo. Sorri vendo ela o abraçar como se ele fosse todo seu universo. O curioso é que ao contrário de mim ele não queria ter filhos e foi uma lutar convencê-lo, no entanto quando ele soube que eu estava gravida chorou feito criança, contava para qualquer um que cruzasse seu caminho. Hoje os dois são extremamente grudados, dá até um pouco de ciúmes as vezes, como ela sempre prefere o papai, mas acho linda a relação dos dois.

-Bom dia princesa, papai estava te esperando para ganhar um beijo antes de ir trabalhar.

-Você vai trabalhar de novo, papai?

-O papai precisa ir filha. Vai lá com a mamãe. – ele a pôs no meu colo e foi juntar suas coisas para sair.

Ela já se preparava para chorar fazendo aquele biquinho de partir o coração.

- Raio de sol, hoje vamos lá na casa da vovó e do vovô, o que acha???

- Oba!!! Vou arrumar a minha bolsa. Eu posso ficar lá???

Ele veio até nós, deu-me um beijo suave nos lábios e olhou para ela.

- Você tem aula mocinha. Não pode ficar lá.

- Ahhhh pai deixa. – ela o olhava com olhinhos suplicantes.

Eu intervi antes que os dois começassem a guerra. Porque esse era o ponto ruim da reação deles: ela não sabe diferenciar quando ele falava sério ou quando estava brincando e ele não sabe o momento de acabar uma coisa e começar outra.

- Filha se senta, toma seu café e depois vemos isso ok? – entreguei a ela seu desjejum, ela assentiu, eu o acompanhei até a porta, já pronta para guerrear.

- Vou considerar deixá-la lá, você está atolado na empresa, eu também não terei tempo no escritório o resto da semana. Sem falar que tem tempo que não deixo ela com eles, eles já reclamaram.

- Ela tem aula Ellena, além disso tem a natação e o inglês. – enfatizou erguendo uma sobrancelha.

- Eu sei Caio, mas não vai matar ela perder alguns dias de aula. O inglês seria hoje, ela já não vai e a natação, seria na sexta. Pego ela na parte da manhã, então ela já vai estar de volta. – eu respirei fundo e o olhei por alguns instantes. – A verdade Caio é que o problema não é nada disso, é só que você não quer que ela vá, mas se fosse para a casa da sua mãe estava tudo ok!

- Não começa Ellena, eu terei um dia cheio... – disse ele irritadiço. – Eu te vejo a noite. - Ele deu um beijo em minha testa e entrou no carro.

- Te vejo a noite querido. E amor... – ele olhou e pela sua cara já sabia o que eu ia dizer. - ela vai ficar lá.

- Você quem sabe Ellena.

Ele saiu para o trabalho com o maravilhoso "humor" que sempre fica quando contrariado.

Tirando nosso lado aventureiro, nós dois não somos parecidos na maioria das coisas: enquanto ele é na maioria do tempo sereno, eu me irrito facilmente e falo alto a todo momento; ele é mais caseiro, eu amo uma boa balada; mas de todas as diferenças a que mais me incomoda é que ele é super protetor. Reparem que digo super protetor e não ciumento, nossas experiencias passadas já me provaram que ciumento ele não é, mas a super proteção me irrita demais.

Esse tem sido um problema cada vez mais frequente enquanto a Laila cresce. É só falar que ela vai fazer algo que não seja decisão dele e pronto, ele começa arrumar mil desculpas para que ela não faça e aponta cada um dos riscos daquela situação.

Isso apenas piora quando meu pai está envolvido. Ele e meu pai não tem uma relação muito tranquila. Os dois muitas vezes preferem evitar está no mesmo ambiente, o que faz com que ele tenha uma implicância enorme em deixar ela com meus pais.

Motivos esses que na maioria das vezes fazem com que eu tenha mais vontade de deixá-la fazer o que ela quer ou que eu estava planejando . E não por implicância, apenas por que ele precisa aprender desde cedo que não criamos os filhos para que eles cresçam em uma redoma, e que vai chegar uma hora que ela irá precisar descobrir o mundo sozinha. E quanto antes ele descobrir isso, mais fácil será para enfrentar os percalços da adolescência.

Mas por hora tudo com o que tenho que lidar é com as mais de duas horas de carro, que separam minha casa do rancho onde cresci, e um repertório imenso de músicas para uma garotinha de cinco anos.

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