Gabriel é injusto

Era um verdadeiro desafio não se apaixonar por Gabriel Jones.

Principalmente quando ele estava tão perto ao ponto de sentir seu perfume amadeirado, ou então de ouvi-lo suspirar enquanto seus olhos castanhos passavam pelas linhas do caderno. Principalmente quando era simplesmente impossível não ficar olhando-o tão de perto, sem conseguir controlar seu coração de bater tão acelerado.

Era simplesmente impossível.

Theodore sentia vontade de se mexer à todo momento mesmo que quisesse permanecer parado. Sua nuca coçava, sua perna adormecia, sentia a bunda adormecer na cadeira. Tudo incomodava.

Não... O que incomodava era a presença do alfa lendo suas respostas com tanta atenção e proximidade.

O que mais lhe perturbava a mente era a incapacidade em não conseguir evitar de olhá-lo. Queria observá-lo.

Theodore rendera-se ao desejo.

Começara a observá-lo pelo canto dos olhos, e quando sentira a área livre, passara a encará-lo descaradamente. Prestara atenção em suas sobrancelhas medianas e escuras, bem delineadas para um garoto. Os olhos escuros, que com a claridade podia notar o tom acastanhado. Sua boca fina e rosada...

Queria beijá-lo.

— Você realmente fez as atividades muito bem feitas... Que respostas completas.

Desviando o olhar rapidamente sentindo seu rosto pegar fogo, Theodore tentava focar em qualquer outro ponto que não naquele garoto ao seu lado.

— B-Bem é o esperado... Não tem motivos para ser preguiçoso com uma atividade dessas.

— Ah, mas essa aqui eu tenho um ponto de vista diferente, quer discutir sobre?

Virando a cabeça para o livro cuja questão era apontada por Gabriel, Theodore inclinou-se para a mesa sentindo o garoto transferido fazer o mesmo ao ponto de suas costas encostarem no peitoral dele.

Um toque ligeiro, nada comprometedor.

Mas o suficiente para disparar um coração sedento pelo amor.

Theodore relia a mesma questão algumas vezes, sem conseguir focar nela direito. O calor do peito de Gabriel crescia em suas costas, estava começando a suar de nervosismo.

— P-Pode complementar a resposta se preferir...

— Se estiver tudo bem por você... — Finalmente olhando para o loiro, Gabriel arqueava a sobrancelha — Você está bem? Seu rosto está todo vermelho...

— É o calor. Está quente aqui, não acha?

— Será que a janela está fechada?

Afastando-se do aluno transferido, Theodore entregava as folhas de resposta e o seu estojo para Gabriel enquanto o outro verificava as janelas.

— P-Pode complementar a resposta se quiser, eu não me importo.

Assentindo ao pedido, Gabriel então se atentou na resposta do exercício silenciosamente. Uma grande vitória para Theodore, que aproveitou a chance para afastar sua cadeira buscando ar fresco na janela.

O vento gélido batendo em seu rosto era simplesmente refrescante, parecendo uma brisa de verão quando se está na beira do mar. Um alívio de ter algo afastando o calor que era tão sufocante. A diferença era de que o calor vinha de uma pessoa e não de uma estação quente.

Apoiando os cotovelos sobre a janela e observando os estudantes praticando esportes, Theodore mergulhava no silêncio calmante. Fechando os olhos para se acalmar, enxergava a imagem que vira no dia anterior de Gabriel sem camisa na quadra de vôlei.

Seus dedos se fecharam em punho contendo o desejo de tocar algo que não lhe pertencia. Respirando fundo tentara esvaziar sua mente dos pensamentos tão perturbadores. A imagem de um abdômen fora substituído pela mão estendida e o olhar preocupante de momentos atrás.

Theodore sorria sem perceber.

— Seu sorriso é bem bonito.

Assustando-se com a voz baixa direcionada para si, Theodore olhava para o lado encontrando Gabriel também apoiado na janela.

— Como é?

— Disse que seu sorriso é bem bonito. — Percebendo que o ômega estava se afastando, Gabriel o segurou pelo pulso. — O que há? Sempre está fugindo de mim.

— Eu? Não estou fugindo... Temos uma atividade para terminar, não é mesmo?

— Theodore...

— É imaginação sua.

Mantendo o aperto em seu pulso, Gabriel tornara Theodore refém do seu olhar. Não permitira que desviasse de si, nem que tivesse qualquer outro tipo de fuga. Mesmo aliviando o aperto em seu pulso e fazendo olhá-lo em seus olhos, não permitira a sua fuga.

— Olha, não precisa fugir de mim como se eu tivesse sete cabeças.

— Sendo bastante sincero precisaria sim, um bicho desse só quer dizer que vai me matar.

Soltando um riso baixo, Gabriel tentara ficar sério novamente.

— O que eu quero dizer é que não precisa fugir de mim. Não irei te julgar pelo o que você é.

Desistindo de tentar se soltar do aperto no pulso, Theodore se mostrara atento às palavras de seu colega de classe. Mesmo assim Gabriel não o soltara.

— Oh... É bom saber.

— Ou será que você não quer ser o meu amigo?

— Não, não é isso. Digo, não me importo de conversar com você e tudo mais, só que...

— Não sou como os outros. Não quero que tenha medo de mim, quero apenas ser o seu amigo.

Aquelas palavras soaram como música aos ouvidos de Theodore. Finalmente ele relaxara sob o aperto de Gabriel, escolhendo escutá-lo e aceitar que era sincero em cada palavra dita. Ainda que houvesse uma pequena sombra que guardava as memórias ruins daqueles que diziam a mesma coisa, mas que no final o traíam, Theodore iria escolher confiar, um pouquinho, naquele alfa.

— Vamos terminar esse trabalho. Temos que entregar na próxima aula.

Assentindo para finalmente libertá-lo do aperto em seu pulso, os dois garotos logo voltavam a se sentar e a preencherem a folha de resposta.

Se havia uma tristeza por não terem se encontrado de manhã, ela não existia mais. A aula vaga concedera um encontro mais precioso para aqueles dois.

「 • • • 」

Você está aqui para ajudar Nico, isso mesmo, repetia Theodore em pensamento. Comprimindo os lábios e apertando os dedos, repetia a justificativa diversas vezes em todo o seu trajeto até a quadra coberta de vôlei no pátio da escola.

No instante em que pisara ali dentro e ouvira os sons dos tênis contra o amadeirado, sua mente silenciou qualquer outra desculpa esfarrapada. Seus olhos foram direto para o jogador alto de cabelos escuros e uniforme de educação física, que dedicava toda a sua atenção para a bola no alto.

Não deixara de sorrir no instante em que percebia o quão concentrado Gabriel era durante o treino.

Silenciosamente o garoto loiro se sentara no chão, encostando suas costas na parede abraçando suas pernas onde poderia assistir ao treino.

Theodore não se considerava um grande conhecedor de vôlei, apesar de ter lido algumas coisas à respeito para ajudar Nicolas com o time. Mas era fato que assistir os treinos era sempre prazerosa. Geralmente para ver seu melhor amigo agindo como capitão do time, ajudando seus colegas a terem bom desempenho em quadra.

Agora havia mais um motivo para estar ali.

E seus olhos não desgrudavam desse motivo.

— A princesa chegou para escolher o seu mais novo pretendente.

A voz repleta de malícia arrepiara a pele de Theodore. O sorriso desapareceu no instante em que o garoto alto de cabelos loiros lhe dirigia um sorriso zombeteiro ao ficar ao seu lado, fazendo questão de espalhar seu cheiro.

Milles Mckenzie era alfa e irmão mais velho de Sadie, que estava no seu terceiro ano prestes a fazer o vestibular. Assim como sua irmã, ele era popular por seu carisma e fama de galã por sempre estar acompanhado de alguma garota ômega nas festas. Se Milles não beijasse uma garota em uma festa, alguma coisa estava errada.

Theodore não respondera a provocação, tornando a assistir ao treino silenciosamente.

— Ora, não me ignore. Estou apenas dizendo que entendo que aqui seja um excelente lugar para você escolher o seu novo marido.

— Estou aqui apenas para ajudar Nicolas, Milles.

— Ah certo, você já tem o seu marido, me esqueci desse detalhe. — O olhar fulminante que Theodore dera a Milles apenas aumentara sua malícia. Sentando ao lado do loiro, o jogador apoiava os braços sobre os joelhos e olhava para a quadra. — Você é fiel ao seu marido.

Bufando, Theodore coçara a cabeça tentando manter a calma. Logo a mesma se fora quando a garota com saia curta e cabelos longos se aproximara do irmão. Virando a cabeça para o lado, Theodore evitava a todo custo olhar para aqueles dois.

— Milles não está treinando ainda?

— Estamos fazendo rodízio, logo entro em quadra. Por quê?

— Está perdendo seu tempo sentado aí... — Os olhos de Sadie foram até o outro garoto ao lado, que já estava emburrado. — Oh... Não sabia que tinham se amigado.

Milles olhou de canto para Theodore e então sorriu ao abraçá-lo pelo ombro.

— Estávamos conversando sobre como o nosso time é constantemente observado. Parece que os melhores pretendentes se encontram aqui.

— Me deixa em paz. — Retrucava Theodore empurrando o braço de Milles antes que seu cheiro ficasse impregnado em suas roupas.

— Milles, você faz parte do time, não sabia disso?

— Ah, parece que não me adéquo aos requisitos do garanhão aqui. Sou muita areia pro seu caminhãozinho.

A risada repleta de malícia daqueles dois irmãos irritavam Theodore. Fechando o punho contendo a súbita vontade de dar-lhes um murro, tentou ao máximo em criar uma distância entre eles.

— Sabe Theozinho, você deveria ir ver o time de futebol. Garanto que os garotos de lá adoram chutar... Uma bola.

Baixando a cabeça sem dar uma resposta, Theodore apenas se arrependia de estar ali. E então uma bola de vôlei simplesmente acertara a testa de Milles, tão repentinamente. O grito do rapaz ecoara por todo o ginásio, tendo todos parado o que faziam para olhar Milles acariciando a própria testa.

— Foi mal, parece que minha mira é péssima.

O olhar irritadiço de Milles sobre Nicolas criara uma tensão no ginásio.

— Seu baixinho maldito.

— Que foi? Tá doendo a cabeça? Deveria ir na enfermaria pra ver se os chifres ainda estão em pé. — Brincava Nicolas, se agachando para pegar a bola a deixando debaixo do braço.

Theodore já temia que a situação perdesse o controle no instante em que Milles marchou para o centro da quadra agarrando a camisa de Nicolas e o erguendo. A troca de farpas entre os dois obrigara o técnico a interferir junto com os demais colegas do time, interrompendo por completo o treino.

— Você está bem?

A voz baixa e rouca sussurrada próximo de seu ouvido surpreendia Theodore. Virando a cabeça ele via a mão estendida pela segunda vez em sua direção, junto do olhar preocupado.

— Estou bem, obrigada — Intervinha Sadie puxando o pulso de Gabriel e lhe dirigindo um sorriso infantil. — Apesar da bola daquele projeto de pessoa ter acertado meu irmão e depois a mim aqui no braço.

— Deveria tomar cuidado então. O que veio fazer aqui?

— Bem... Eu estava prestes a te convidar para sair...

— Sinto muito, mas depois do treino devo ir para casa ajudar meus pais com algumas coisas. — Sorria Gabriel, voltando-se para Theodore. — Se levante.

Piscando algumas vezes, Theodore logo segurou a mão que ainda era estendida para si. Sentira os dedos longos e quentes de Gabriel segurarem sua palma e lhe puxar para ajudá-lo a se levantar.

— Eu to legal, não precisa se preocupar.

— Quase que o capitão te acerta também. Ficar nesse lado do ginásio é perigoso, isso costuma acontecer com certa frequência.

Theodore não conseguia responder diante da preocupação tão eminente naqueles olhos escuros. E mesmo quando Sadie rapidamente abraçara o braço do atleta o puxando para longe de Theodore, o loiro não fora capaz de desviar o olhar.

— Está certo. Obriga...

— Eu te acompanho até sua casa, Gabi!

Gabriel desviou o olhar para a garota que sorria animadamente ao seu lado. Concordando com a cabeça silenciosamente, os dois se afastaram do loiro estando ainda abraçados.

Observando as costas do alfa, Theodore acariciava a mão que há instantes recebia o calor e um aperto afetuoso. Suspirando ao baixar a cabeça, ele acariciava a própria nuca com pesar.

— Isso é muito injusto... Por que teria que ser você?

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