Capítulo 06

Duas semanas. Dean Salvatore conseguiu viver duas semanas sem demonstrar afeto ou repudiação por Luc. Era sábado, mais um fim de semana daqueles o qual passaria o dia inteiro trancado no quarto lendo um livro de leis e mais leis, aonde encontraria brechas e, até mesmo, duvidaria da capacidade humana de fazê-las cumprir.

Luc, àquela altura da manhã, estava deitado na cama próximo à janela e assistia um programa aleatório na televisão. Os dois não eram tão próximos, mal trocavam meia dúzia de palavras durante um dia, isso quando não discutiam e alguns verbos inapropriados saíam como flechas num único alvo.

Luc baixou o volume da televisão e abandonou o livro que estava lendo. 

— Posso te fazer algumas perguntas, Dean? 

— Desde que não sejam misóginas, sim.

Ele sentou na beirada da cama e desligou a televisão definitivamente.

— O Lee perguntou por você hoje. Cê e ele estão juntos?

— Quem?

Claro que ele sabia de quem se tratava, mas fingiu demência e tratou de arquitetar um teatro nada convincente.

— Ele é meu melhor amigo, Dean. Eu vi como você olha para ele. Tem um ar meio... estranho.

— Estranho é essa obsessão em saber detalhes da minha vida, Luc. — ressaltou o mais novo, também se sentando. — Mas alimentando sua curiosidade, não. Eu e o Lee não estamos juntos e acho difícil algo entre nós dá certo. Se conversamos mais de dez minutos somando todas às vezes que nos encontramos, é muito tempo.

Luc, nada disse. Mas que era estranho, ele não tinha dúvidas disso. 

— Mas se ele está perguntando de você justamente pra mim, é porque o cara tem esperanças. — instigou o rapaz, novamente. — O Lee faz teu tipo? 

Dean sentiu calafrios. Ele estranhou a pergunta, já que nem tão íntimos eles pareciam ser.

— Faz. Claro que faz. — Ele respondeu com naturalidade.

Luc arqueou uma sobrancelha, curioso.

— E eu faço o seu tipo? 

Dean gargalhou alto. Depois, Luc sentiu-se um pouco constrangido por perguntar aquilo.

— Não, nem um pouco. 

Isso não era verdade, mas Dean jamais alimentaria o ego do colega de quarto.

— Por que você acha que o Lee faz seu tipo, e eu não?

— Sei lá. Gosto da virilidade do seu amigo, mas você não se compara. Nesse caso, nem se tu fosse o último homem do mundo, iria querer ficar contigo.

— Oh, magoou em! — Luc fingiu está sentido. — Mas o seu namorado ou ex-namorado, aquele da foto, era bem diferente do Lee.

Dean apertou os olhos e logo após os repousou sobre Luc, ao fundo.

— Não compare o Luan, com o Lee. Pelo Luan eu tinha um amor inconsequente e insaciável, já pelo Lee, se um dia der certo, ou formos pra cama, ele só me dará prazer.

— Que nojento, cara. — Luc fingiu uma crise de vômitos. 

Ele levantou da cama e começou a pegar as peças de roupas espalhadas por cima dos poucos móveis. 

— Já alimentou à curiosidade? — Dean questionou.

— Não. Só mais uma pergunta. Por que você é gay? 

Dean deu um meio sorriso.

— Bom, por que você é hétero?

— Ei! Não responda a minha pergunta com outra pergunta. — fungou o mais velho, voltando-se para a cama. 

— Ué! Você fez uma pergunta, queria que a respondesse na mesma proporção que a minha. Por que você é hétero? — Dean insistiu no questionamento.

Luc revirou os olhos e tentou lutar, mas respondeu.

— Porque eu nasci assim? Bom, se você vai usar a minha opinião para distorcer o contexto, é melhor ficar por isso mesmo.

Silêncio. Dean não faria isso, ele queria que Luc absorvesse por conta própria o quão imaturo fora ao perguntar aquilo. Ninguém escolhe ser hétero, da mesma maneira que ser gay não tem vontade própria. É algo natural da vida!

— Esse cara, o Luan, que houve com ele? — Luc perguntou após alguns segundos de silêncio. — Ele foi embora e deixou você para trás como se fosse um objeto descartável? — emendou.

— Isso não é da sua conta. 

Luc deitou sobre a cama e colocou a mão na fronte.

— Vocês pareciam super felizes. O amor de vocês, somente naquela expressão, tinha tudo para ser perfeito. — Luc comentou, ele desejava destrancar àquela lembrança do colega. — Por que não toca no assunto? 

Dean pensou se valia a pena contar tudo detalhadamente a Luc. Ele não parecia ser alguém que julgava as pessoas por conta própria, fazia aquilo na tentativa de se defender, criar um escudo contra inverdades. Determinado a dizer tudo, Dean revelou.

— Ele morreu!

Luc sobressaltou da cama, ficando de pé.

— Morreu? Como assim morreu? Mataram ele?

Dean sacudiu a cabeça em negação. Preparou as palavras corretas para se expressar e, por fim, começou o relato.

— Ele morreu afogado. Tiramos um fim de semana há quase um ano, e estávamos na baía de Ashton quando uma tempestade inesperada nos pegou desprevenido e trancou às rotas. Ficamos a mercê dos ventos fortes, dos raios e trovões, nossa lancha era de pequeno porte e quando o Luan tentava uma manobra afim de nos tirar daquele breu, uma onda gigante o jogou para o mar. — Dean secou os olhos, mas prosseguiu. — Eu fui atrás dele, consegui levá-lo para cima de algumas pedras, porém, ao sentir que não havia batimentos cardíacos em seu coração, uma parte de mim foi embora juntamente com aquela infame tarde tempestuosa. Na necropsia, ficou claro que Luan tivera batido a cabeça em alguma rocha, ou na lancha. Oito meses depois, tudo ainda parece um sonho, um sonho estranho.

Luc, então, caminhou até a cama de Dean e sentou-se ao lado dele. Mal sabia o que fazer, mal sabia se expressar, falar palavras de conforto ou, até mesmo, pedir desculpas. Dean continuava a fitar a janela do quarto, as lágrimas proviam como sussurros da morte dos olhos, secou-as. Não iria chorar. Não iria demonstrar fraqueza. Se blindaria, como sempre fez quando revelava aquele assunto.

— Espero ter satisfeito tua curiosidade. — ele falou algum tempo depois. — Agora sabe o motivo de não tocar neste assunto.

Luc engoliu em seco, sentia-se idiota por levar adiante à sua curiosidade de merda.

— Sinto muito, cara. — Luc juntou as mãos e prosseguiu. — Deve ter sido duro para você enterrar um grande amor. Um amor inconsequente e insaciável, como cê mesmo disse.

Dean nada disse. Fez-se silêncio mais uma vez.

— Acha que o Lee é a pessoa certa para curar a ausência do Luan? Ou se quer embarcar nessa jornada apenas por desilusão?

— Isso não é da sua conta. Eu sei o que é melhor pra mim.

Luc sacudiu a cabeça. Levantou-se e caminhou até à sua cama, onde pensou bastante na história que o colega de quarto lhe contara. Minutos depois, insistiu novamente num outro papo.

— Você não tem jeito de gay. 

— Mas eu sou gay. Como você ver o homossexualismo, Luc? Igual aos atores das suas séries preferidas?

— É, quase isso. Sempre pensei que o lance dos homo, não passava de uma noite de sexo.

— Tem gays com sentimentos, Luc. Assim como existem héteros carinhosos, que pensam no bem-estar de suas companheiras, e não ficam transando para satisfazer seu próprio ego e achar que isso o fará mais homem. — Dean, prosseguiu. — Amor e sexo, é bem diferente. Eu estou entre o fogo e paixão, dividido, mas não controlado. Eu sei o que eu quero.

Luc ergueu a mão em rendição.

— Só acho que isso não combina com você. Nada contra, mas minha paciência é curta demais a ter que aguentar pessoas enchendo minha cabeça e perguntando... baboseira.

— Você é inseguro, Luc?

— Não. Sou muito bem resolvido, Dean. Assim como você, também sei o que eu quero. — ele falou se sentando. — Última pergunta, pode ser?

Dean estava quase de saco cheio, sua expressão entregava tudo.

— Pode!

— Já ficou com alguma menina? 

Luc perguntou como se ainda não tivesse se satisfeito com a homossexualidade de Dean.

— Não.

— E como afirma ser gay?

— Ué! Gosto de homem.

— E por que falou que eu não faço o seu tipo, se gosta de homem? 

Dean riu.

— Simples! Tem homens e tem os garotões. Nada contra os garotões, mas você é ingênuo, desculpa. Ser gay não quer dizer que eu vá sentir atração por qualquer homem, sendo esse homem bonito ou não. — Dean respondeu.

— Mas eu sou bonito? 

Dean cruzou os braços. Suspirou inquieto e se perguntou se as perguntas que Luc o fazia agora, levaria a algum lugar.

— Você é bonito. Muito bonito. Mas tem uma coisa que diferencia você dos demais homens bonitos.

— E qual é?

— Talvez, só talvez, um pouco de ingenuidade. Não basta ser lindo, sarado, bom de papo, se a mente é pequena, Luc!

— Isso não foi um elogio, certo?

— Certo! 

— Hum. Por que não muda esse teu jeito? Tenho certeza que se cê fosse só um pouco menos metido, encontraria um amor rapidamente. — fungou Luc. — Eu sou experiente nisso.

— Ah, é? E tu namora? 

Luc sorriu e atirou um travesseiro em Dean, que o segurou.

— Idiota. 

Dean riu alto. Pela primeira vez desde que chegou há duas semanas, estava tendo uma conversa prolongada com Luc, era um pouco difícil pela irracionalidade do garoto, mas Luc não fazia por mal. Mesmo sem demonstrar carinho, parecia ser uma pessoa leve e com astral restrito.

— Agora me responda, garanhão: por que vocês, héteros, sempre são carrasco? Não demonstram sentimento por nada? Ou só de vez em quando?

— De quando em quando. Não é uma coisa que se diga: oh, minha nossa, como somos carinhosos. Porém, diferente de vocês, gays, temos um humor instável.

— Eu percebi. Que pena, queria muito te dá um abraço, mas já vi que se fizer isso, vou perder sangue e alguns dentes, estou certo? Mas, lembre-se: aperto de mão, beijo no rosto, e abraços, também funcionam, é uma maneira de demonstrar carinho, afeto e, amor.

— Isso é brega, isso sim.

— Você nunca abraçou seu pai? 

— É diferente.

— Seus primos?

— Não.

— Seus irmãos?

— Não tenho irmãos.

— E seus amigos?

— O Lee, não gosta de afeto e eu acho isso um bom sinal.

— Nossa, Luc, você não tem sentimentos. — Dean balançou a cabeça em reprovação. — É uma pena, queria muito te abraçar.

— Quanto a isso, vai ficar querendo. Não abraço homens. 

Dean mordeu os lábios e revirou os olhos.

— Não tem problema. 

Luc analisou a expressão de desânimo na cara de Dean, mas não compadeceu. Deitou sobre a cama e abriu o livro, voltando à leitura. 

Dean, então, preferiu fazer a mesma coisa e o silêncio voltou a se instalar no ambiente.

Sete horas da noite. 

Dean dirigiu-se o refeitório sozinho, já que Luc mal fazia companhia para ele. Dessa vez, sentou numa mesa sozinho, sem ninguém para interrompê-lo. Jantou sossegado, e voltou para o quarto, mas não notou Luc, por lá. 

Acendeu o abajur, tomou um banho, mudou de roupa e sentou na beirada da cama. Secou os cabelos e resolveu ligar para William, que não atendeu, quiçá porque tivesse ido a algum encontro com Lia, ou estava atarefado demais.

Sem nada para fazer, Dean trocou a roupa de dormir por uma esportiva fina, e calçou um tênis. Pegou a carteira, os fones de ouvido a bluetooth, saiu do quarto e desceu o lance de escadas. 

Já na rua, Dean começou a caminhar em sentido oposto a universidade, queria queimar algumas calorias, para manter a forma e o corpo ganho com muito esforço. 

Caminhou até chegar a uma praça, onde com alguns rostos conhecidos no local, mas um, em especial, lhe chamou atenção. Lee, diferente das duas últimas semanas, sorria. Estava numa roda de amigos com Luc, Brandon e Cole, colegas próximo de seu vínculo. Passando por ali, com o volume do celular baixo, ouviu Luc o chamar. Não sabia se ía ou não, mas resolveu matar à curiosidade.

— Oi. 

— Oi, novato. — disse Brandon, amigo de Luc, além de colegas de curso.

— Dean! — Lee exclamou com um entusiasmo na voz. — Que faz por aqui?

— Atrás de algum "homem". — atentou-se Luc, intrometendo-se. — Tenho certeza. Vocês sabiam que o Dean é gay? 

O grupo riu, o único que pareceu não demonstrar sarcasmo, era Lee, impassível no degrau da escada aonde estavam assentados, conversando.

— Já deu minha hora. Boa noite.

— Dean? — Brandon o chamou antes que o rapaz fosse embora. — Fica, vamos conversar. Não liga pro Luc, isso é paixão misturado com ciúme. Que me diz, topa uma conversa?

Dean olhou para Lee, com aquele mesmo olhar amargo no rosto de quem tanto faz se a presença dele era agradável ou não, no grupo.

— Tá bom, eu fico.

Brandon comemorou, aplaudindo. Abriu espaço na calçada, e Dean sentou entre ele e Lee, quem não estava nem um pouco feliz em sentir o perfume extasiante e o cheiro de um homem mais novo, ao seu alcance era Lee, afinal, mal conseguia dominar seu vício: o sexo.

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