– Alguém me enterre, por favor

 

Continuo a olhar as fotos do indivíduo de nome Abel de forma desconfortável. Há apenas pedaços de seu corpo, de seu rosto, de seus olhos. Olhando assim, tudo que consigo dizer é que ele é um homem com academia em dia e de olhos muito sérios, além de um cabelo que parece sedoso e é só isso.

– Achei que a gente tinha que curtir uma pessoa para poder haver uma conexão. – Digo em voz alta tentando desvendar o olhar desse homem. Lembro de Kim falando sobre curtir os caras e esperar que eles curtam de volta para criar uma conexão.

– E tem. – Kim responde e eu faço cara de paisagem.

– Então?

– Eu curti ele por você, achei que era o seu tipo. Não precisa me agradecer. – Diz mexendo no meu celular, não sei em que momento do meu torpor de tentar desvendar essas fotos ela o pegou. Ela estica o celular para mim. – Aqui, já baixei o app no seu celular, assim fica melhor para você conversar.

Pego o celular enquanto observo ela pegar o notebook de volta.

– Agora preciso resolver algumas coisas de trabalho. O que vai querer para o jantar? Posso pedir algo para a gente. – Diz despreocupadamente indo até o seu quarto e para na porta esperando que eu responda sobre o jantar.

– O que você pedir está bom. – Digo em estado catatônico.

– Ótimo. Te chamo quando chegar, enquanto isso curta o seu homem. – Ela pisca para mim e entra no seu quarto, enquanto eu continuo a observar a porta que ela acabou de fechar.

– Em que momento ela descobriu minha senha? Ela é algum tipo de mutante? Estou sempre trocando minha senha e ela sempre descobre, a grande diaba. – Digo baixo para mim mesma enquanto caminho até o meu quarto.

Fecho a porta e me jogo na cama de luz apagada suspirando. Desbloqueio o celular e encaro a notificação de conexão dentro do aplicativo. Será que devo m****r uma mensagem?

Clico na notificação e abro a conversa. Em vez de escrever mais do mesmo, decido escrever algo mais original.

“Você é sempre assim misterioso?”

Olho para a mensagem que escrevi e meu dedo para no botão de enviar, mantenho o dedo parado e pondero. Numa atitude covarde, abaixo o celular e jogo ele com a tela para baixo do meu lado na cama e passo as mãos pelo rosto.

– Cazzo! Devo estar enlouquecendo da vida para cogitar algo assim. – Resmungo baixinho para mim mesma e, subitamente, meu celular apita notificando uma nova mensagem. Assim que pego o celular e vejo o remetente, meu dedo escorrega e eu abro a mensagem.

“Por favor, volte para casa. Já faz muito tempo, o seu pai sente saudades.”

Releio a mensagem tentando decifrar a mensagem por trás e fico frustrada. Desde que sai da Itália para tentar a minha vida, a minha mãe tem me mandado mensagens assim, mas eu nunca respondi nenhuma o que deve ter sido um golpe ao seu enorme ego. No começo eram pequenas chantagens do tipo “O seu pai vai te dar o carro que você sempre quis se você voltar” ou “Você vai poder morar sozinha se voltar”, mas eu nunca cedi ou respondi as suas mensagens.

Minha mãe costumava m****r mensagens apenas três ou quatro vezes no ano, mas desde o ano passado ela mudou para, pelo menos, uma vez no mês, o que tem sido um incomodo para mim. Não gosto de me lembrar do tipo de vida que fui obrigada a deixar para poder conquistar a minha independência, fui obrigada a desistir de coisas que eu não deveria desistir já que eram minhas por direito. Estranhamente, eu não me arrependo de nada e só o fato de não ter que dar satisfação de cada passo dado por mim para os outros é incrível.

Como sempre fiz, ignoro as mensagens com um suspiro e volto ao app de relacionamento disposta a apagar a mensagem que escrevi mas tenho um susto assim que abro o app.

– MERDA! – Grito observando o grande erro que cometi de forma inconsciente. Sem querer e sem perceber, acabei mandando a mensagem quando deslizei o dedo pela tela para ler a mensagem da minha mãe.

Incrível como minha família consegue me arruinar mesmo longe.

– Qualcuno mi seppellisca, per favore. (alguém me enterre, por favor.) – Gemo em voz alta para o quarto escuro enquanto tento me sufocar com o travesseiro.

 

Leia este capítulo gratuitamente no aplicativo >

Capítulos relacionados

Último capítulo