O Velho Sábio

                                                            Capítulo II

  Nzambi - Era um velho que sempre estava no mesmo lugar, olhando atentamente quando Kuzola passava para o trabalho e também na volta para a casa.

  Sempre com um singelo sorriso nos lábios e um olhar penetrante, ele trazia consigo certa calmaria, porém ela nunca havia parado para conversar com o tal senhor de cabelos brancos.

  Kuzola, “Rosa Baila”, após esse fatídico dia de voluntariado juntos aos idosos sentiu em seu coração um grande e sombrio vazio.

  A conversa com dona Eleonora deixou seu interior completamente destruído e fez com que seus pensamentos girassem, imaginando como seria seu futuro, a sua velhice. 

  Com a cabeça baixa e o olhar fixo no chão, ela caminhava sem notar que era seguida de longe pelo olhar do velho, ele que permanecia no mesmo lugar, mas nesse dia algo diferente aconteceu.  

  O velho levantou-se e de longe foi seguindo Kuzola. Ela sentindo que estava sendo seguida apertou os passos e caminhava mais depressa, aumentando o ritmo a cada passo.   

  Estranhamente ao virar em uma das esquinas notou que o velho não mais a seguia desaparecendo sem deixar rastros de seu paradeiro. 

   A imaginação de Kuzola traía seus instintos e a sensação de ainda estar sendo seguida era constante, porem nada mais ela via.

  As ruas já começavam a ter as luzes dos postes sendo acessas, uma após outra.  A noite trazia consigo a escuridão que aos poucos turvava visão.

  Finalmente chegou à sua casa. E mais que depressa adentrou em seus aposentos, jogando-se em sua cama na tentativa de adormecer logo. Com isso fazendo com que sua mente parasse de torturá-la com tais pensamentos e quem sabe viesse a sonhar com aquele que a visitava todas as noites enquanto dormia. 

  Nessa noite seus sonhos tornaram-se um tanto confusos.

O Sonho 

  Rosa Baila estava caminhando como sempre fazia pelas ruas da cidade.

  Via diversas pessoas e por muitos olhares era acompanhada, assim como de costume.

  Procurava por alguém em especial, aquele que todas as noites ali a encontrava, num canto parado, apenas observando suas curvas sedutoras desfilando e despertando olhares como de costume, seu vestido longo e vermelho cor de sangue quente ia acenando com o soprar do vento que vem do Leste.

  Como de costume lá está o homem de cabeça baixa, apenas a acompanhando com um olhar de canto de olho, sem expressar reação. E essa atitude a deixava ainda mais curiosa em saber quem é esse estranho homem.

  Dessa vez ela pensava em se aproximar, tentar puxar uma conversa para saber um pouco mais quem é esse estranho e quem sabe quando acordasse ela pudesse procurar por ele.

 Lentamente caminhou na direção daquele homem, sentindo seu coração bater mais forte.

 Sentiu um arrepio que percorria seu corpo e um frio na barriga que gradativamente aumentava. Enquanto se aproximava sentiu as suas pernas tremulas e suas mãos começando a transpirar.

  Quando estava prestes a se aproximar e desvendar esse misterioso homem, sentiu uma mão segurar fortemente em seu braço esquerdo. E ao retornar o olhar para a mão que a segurava, percebeu então ser a mão de um idoso, com seus dedos longos e uma pele muito fina branca como a neve, sendo possível notar até mesmo as veias dessa mão que a segurava, impedindo que continuasse a aproximar-se do estranho.

  Olhando para o dono dessa mão ela vê ser o velho que sempre estava no mesmo lugar, sentado apenas olhando ela passar.

  O velho não diz uma palavra sequer... Apenas olhava fixamente em seus olhos e assim sinalizou negativamente com a cabeça de um lado para o outro dando a entender que não deveria seguir em frente.

  Nesse momento Kuzola acordou assustada sem entender que sonho havia sido esse, que era tão estranho quanto os outros sonhos, ainda sendo possível sentir seu braço dormente, exatamente onde o velho colocou a sua mão, segurando-a firmemente. 

  O dia já está amanhecendo e Kuzola levantou-se da sua cama indo direto para o banheiro tomar um banho, tentando acalmar o seu coração que ainda batia forte e acelerado. Seu corpo nu arrepiou-se quando a água quente o tocou.  Suas mãos passearam num deslize constante, ensaboando e deixando-o perfumado e refrescante. Escolheu uma roupa leve e mais que depressa seguiu para o local onde o velho sempre estava. 

  Ao virar a esquina da Rua 14 lá estava o velho sentando, assim como em todos os dias ele sempre esteve. 

  Kuzola se aproxima, para em frente ao velho, olha fixamente em seus olhos sem dizer uma palavra sequer.

  O velho lhe devolve o olhar, parece entender todas as perguntas de Kuzola. 

– Eu sei o que lhe atormenta. – disse o velho. 

– Como pode afirmar saber o que me atormenta, se nunca lhe disse nada? - perguntou ela com ar de desconfiança.

– Conheço todas as coisas. Conheço todas as criaturas.  Conheço até mesmo seus sonhos e pesadelos. - completou o estranho de cabelos brancos.

  Kuzola não diz mais nenhuma palavra e simplesmente deixa que uma lágrima escape de seus lindos olhos, lágrima esta que lentamente desliza por sua face.

  E o velho estende a mão apanhando com a ponta do dedo indicador essa gota de sentimento...

  Quando seu dedo tocou a face de Kuzola lhe fez sentir uma sensação de paz muito grande em seu coração, seu peito novamente sentiu-se repleto de alegria sem realmente entender o motivo. 

  – Não temas e não chore! Simplesmente confie em mim. - disse ele.  

   O olhar do velho era penetrante e quanto mais Kuzola o encarava mais se sentia segura ao seu lado. 

  Notou em sua mão direita, no dedo anelar, que o ancião carregava um lindo anel cravejado de pedras brilhantes, aparentava ser uma joia muito preciosa e bem no centro desse anel havia uma em especial que se destacava das outras, por ser de um tom azul como o céu, algo jamais visto por ela. 

  A voz serena, um sorriso singelo, gestos calmos e suaves que a faziam sentir-se segura enquanto eles conversavam. 

  Ela se viu perguntando a ele, de onde ele havia vindo e o que fazia ali sentado todos os dias apenas olhando as pessoas passarem apressadamente de um lado para o outro, tendo como resposta simplesmente que ele olhava o caminho da humanidade.

  – Estou aqui há muito tempo. Já vi muita coisa ruim acontecer... Presenciei o bem e o mau. Já vi o sol nascer no horizonte e também  diversas vezes vi o pôr do sol.  E cada vez eu sinto uma emoção especial por isso.  

  Nesse momento Kuzola vê que seus olhos se encheram de alegria, mas também sentiu o tom de preocupação em suas palavras.

  – Qual o seu nome? - perguntou ela.  

   O velho não respondeu sua pergunta e simplesmente olhou para o céu dando um forte suspiro enchendo os pulmões de ar e soltando suavemente...

   Nesse momento algumas nuvens começam a se formar dando a sensação de que brevemente a chuva estará por vir. 

   Como num passe de mágica a gota de lágrima que o velho recolheu de sua face simplesmente flutuou na ponta do seu dedo e assim como o vapor de água ela se desfez na frente de seus olhos, deixando Kuzola ainda mais confusa, porém dessa vez mais calma e tranquila...

   Não entendia o porquê, mas sentia que poderia confiar naquele estranho senhor. 

   Kuzola deu-lhe um beijo em sua face repleta de rugas e seguiu seu caminho em destino ao centro onde iria encontrar a senhora Eleonora. Estava muito ansiosa, queria vê-la e contar-lhe tudo o que aconteceu.

     Quando estava prestes a virar a esquina lembrou-se que o ancião não lhe dissera seu nome, virou-se na intenção de retornar e lhe repetir a pergunta, mas viu que o velho já não estava ali. Ele simplesmente desapareceu, assim como aquela gota de lágrima que evaporou.

   Kuzola seguiu seu caminho, assim como sempre acontecia, recebendo assovios e olhares pelo caminho. 

   Enquanto isso um homem caminhava distraído em sua direção, mexendo num tipo de caixa de madeira ou um pequeno baú que trazia em suas mãos, parecia até estar falando sozinho enquanto caminhava. Não dava para saber muito bem o que era, pois tudo aconteceu muito rápido e impacto ente eles foi inevitável. 

   Os corpos chocaram-se e a caixa que o rapaz trazia em suas mãos caiu em direção ao chão,  fazendo-o se jogar, tentando pegar antes que se despedaçasse com a queda. 

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