O Ponto de encontro

                                                           Capítulo I

  Ele  (Kizua) - O mês era Abril e como sempre marcado por chuvas miúdas, estas dispostas a estragarem qualquer compromisso. E eu era um daqueles sujeitos que percebia bem a mensagem das chuvas de Abril, e por isso, tinha sempre encontros marcados com a minha cama, mas só um único motivo me fazia sair para ir naquele ponto em específico, onde em um mesmo horário passava aquela mulher que a silhueta do seu corpo ficou desde a primeira vista tatuada em minha mente. 

  Rosa Baila, nome este dado pelas ruas, pois sempre que passava seu andar gigante despertava a atenção de quem a visse passar, e eu, sempre naquele ponto, como uma constante de uma equação matemática, rendia minha atenção para aquela linda mulher, que por algum motivo eu sentia que ela já se dera conta da minha existência. E quando a perdia do meu campo de visão, voltava para meus aposentos, aprontava-me para ter os nossos encontros em sonhos que eram para mim o lado mais real, prazeroso, não obstante, confuso, de minha vida. 

  Emocionava-me sempre, quando era chegada a hora de recolher-me ao meu leito, momento este que quase sempre antecedia uma ducha bem perfumada, tal como alguém que tivesse um encontro marcado, mas como se tratava de Kizua, eu, jovem desengonçado que não levava jeito para encontros com garotas, chegando até por alguns sendo tratado como  “o sem sal”.  Mas quando se tratava dos meus sonhos, que era o extrato da minha vida que mais me encantava viver, aonde chegava, por vezes, a preparar uma roupa em especial para me deitar. 

  Tudo parecia muito estranho, mas ao mesmo tempo fazia sentido, pois meus sonhos eram mais reais e prazerosos a cada manhã vivida neste universo, onde as últimas estimativas apontavam que existe mais de dois trilhões de galáxias, na qual nós vivemos em uma delas, que tem mais quatrocentos bilhões de estrelas, e dentre elas tem uma chamada Sol, que existe a 4.6 bilhões de anos, o que é mais ou menos, 250 mil anos, que surgiu uma espécie, que somos nós, da qual eu faço parte, por isso ser chamado de sem sal” fazia de mim um ser especial e com características próprias. 

  Voltando para os meus sonhos, assunto pelo qual minha vida ganhará mais sentido. Comecei com um conjunto de indagações sobre a origem dos sonhos, que segundo

Freud os sonhos constituem uma realização (disfarçada) de um desejo (reprimido). Mas nas definições de todos os pensadores estava faltando uma peça, pois em meus sonhos até a marca do perfume eu conseguia detectar e cheguei até a fazer um teste, antes de deitar-me coloquei cinco pétalas de rosas de cores diferentes no bolso do meu paletó. E na manhã seguinte uma das pétalas não voltou comigo, pois havia oferecido uma para a mulher dos meus sonhos.

  Só conseguia sentir-me estranho, mas com o passar do tempo estava me habituando com esta realidade, mas a falta de respostas atormentava minha mente, disto eu não posso negar. 

  Ela- Kuzola sempre se sentiu uma mulher com o nível de imaginação muito forte, mas agora já não sabia se aquilo era fruto de sua imaginação, ou se estava precisando da  ajuda de um psicólogo ou de um padre.  Não que seus sonhos a perturbassem, mas queria respostas.

  Respostas que ela não conseguia obter. Apenas se lembrava da pétala que recebeu na noite anterior em seu sonho, que misteriosamente repousava em cima do seu travesseiro, esta que era a marca de um encontro com o homem que aparecia repetidas vezes em seus sonhos. 

  Era hora de correr atrás de respostas, enquanto pensava em como obtê-las. Como de costume escutava um “podcast no aparelho de celular do canal Escriba Café, onde o tema era “Sonhos compartilhados ou simultâneos”, mas que Kuzola acabou não depositando sua inteira atenção, pois sua mente vagava nos devaneios de seu mais recente encontro (no sonho da noite passada), e que com isso decidiu pensar em vestir-se com uma roupa que combinasse com a com cor da pétala que receberá daquele homem, julgando que deste modo estaria ao alcance das respostas que buscava.

  Antes mesmo que tomasse a decisão do que vestir, percebeu que o relógio já marcava 15:30 H, e faltava menos de trinta minutos para estar no centro em que fazia um trabalho voluntario. No guarda-roupa pegou o vestido vermelho, aquele que denunciava os contornos do seu corpo e que com seu andar teve originou o nome pelo qual era conhecida, Rosa Baila.   

  Kuzola saiu correndo, cuidadosa, pois o pavimento estava escorregadio, resultado das gotas de chuva que caíram na noite anterior. Era vítima de olhares leoninos, jovens e senhores disputavam entre assovios e mil e uma formas de chamarem sua atenção.

  Para ela, os pensamentos simplesmente assentavam-se na busca de respostas para o fenômeno que estava vivendo, “sonhos com direito a flores”, mesmo perdida em seus devaneios não deixava de estender sua saudação ao idoso de semblante simpático que ficava na esquina da Rua 14, que quase sempre sem soltar a voz assentia com  a cabeça, devolvendo a saudação feita pela jovem.

  Logo mais adiante ficava sempre o jovem que a deixava dúbia, porque dele nunca recebera sequer um assobio, nem tão pouco um olhar consumidor. E isso a confortava, chegando por esta razão a lhe oferecer um sorriso, que lançado em sua direção quase não recebia retorno.

  Chegando ao centro, Kuzola recebia sorrisos e beijinhos dos idosos que ali estavam e viviam, devolvia de imediato, isso os alegrava e valorizava. Idosos esses  que muitos de seus filhos decidiram terceirizar a responsabilidade de cuidados dos próprios pais, e eles viam na jovem o amparo que suas idades indubitavelmente denunciavam carecer.

  Mesmo envolvida em suas atividades diárias no centro, Kuzola não conseguia parar de pensar em achar uma forma de resolver a situação, que já não podia ignorar. Neste instante lançou os olhos ao redor e viu a dona Eleonora chegando.

  Dona “Leonor”, como era conhecida, chegou aos prantos, parecendo uma criança abandonada na creche pelos pais. Isso chamou a atenção de Kuzola que desde então decidiu emprestar seu ombro a idosa, todos os dias em suas lamúrias dizia “ngana Nzambe (meu Deus) que me viu cuidar desse menino que hoje me abandonou aqui”.

  Kuzola decidiu aproximar-se mesmo que  receosa. E a sra. Leonor que no mesmo instante abriu seu coração, recuando aos tempos que a felicidade lhe era servida todos os dias como um lar em que não falta o pão. Mencionou repetidas vezes o nome do “SR Joao Batista” como se Kuzola o conhecesse, mas pelo fato de ter experiência sabia que esse era um hábito comum entre os idosos, de falarem os nomes de algumas pessoas, como se todos os conhecessem, mas com a estima com que ela falava dele, percebeu que se tratava do esposo que já havia se despedido desta página que chamamos de vida. E com quem teve um filho, resultado desse amor, filho este que foi criado e cuidado com toda atenção que um filho merece, mas que hoje veio abandoná-la no centro conhecido como “Lar do Beiral”, onde vivem, assim como a dona Eleonora, existem outras senhoras com histórias similares.

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