CAPÍTULO 03

      — estourando, compadre. Rá, rá, rá!

      — Tu é foda, meu! Eh, eh, eh!

      Avistou dois garotos, ambos na faixa dos 17 aos 20 anos. Um era alto, loiro e magro; o outro, moreno, baixo e também magro. O mais alto segurava uma lata de cerveja. Os dois se posicionaram, cambaleantes, de frente para a parede da loja, a dois metros da calçada, e começaram a mexer nos zíperes de suas calças. Ao mesmo tempo, conversavam, soltando piadas sem graça e dando risadas esganiçadas, enquanto passavam a lata de um para o outro.

      De repente, o mais alto, sem deixar de urinar, parou de falar e olhou para os fundos do terreno. Teria ouvido algum ruído? Naquele instante, seu pescoço fino girava a cabeça cabeluda e seus olhos asquerosos vasculhavam a área, curiosos e intrometidos, como se procurassem algo.

      Notou o olhar do garoto se fixar na direção da goiabeira… na sua direção! O que teria despertado sua curiosidade? O que estaria vendo? O que estaria pensando? E, principalmente, por que continuava olhando??? Já o garoto mais baixo, que segurava a lata, continuava com a cabeça baixa, olhando para as calças, enquanto contava uma piada.

      Sentindo sobre si o olhar do garoto, ficou imaginando, matutando o que aconteceria, se as coisas não dessem certo. E se o garoto resolvesse se aproximar? E se o descobrisse, todo vestido de preto, escondido atrás de uma árvore e com uma pistola na mão? Como reagiria? Gritaria? Fugiria? Pediria ajuda ao parceiro? Os dois teriam coragem de atacá-lo, mesmo estando embriagados? Bem, nesse caso não teria como negociar. Infelizmente seria obrigado a apertar, duas vezes, o gatilho de sua TAURUS, que enviaria a mensagem da morte. Teria, para seu desgosto, dois cadáveres estendidos naquele fétido terreno. Teria, como consequência, que esconder os corpos e sair dali o mais rapidamente possível. Sua missão não se concretizaria, algo que o deixaria imensamente deprimido. Merda! Não queria que isso acontecesse.

      Portanto, procurou se manter o mais imóvel possível, hirto, como uma estátua de gesso, sem mexer um músculo sequer e torcendo para que o garoto não visse nada além de sombras e folhas mexendo ao vento. Contava com a proteção do tronco da árvore.

      Percebeu que o garoto mais alto parara de urinar e, enquanto subia o zíper da calça, havia girado o corpo, ficando de frente para os fundos do terreno. O corpo oscilava, mostrando seu estado de embriaguez. Mas forçava a vista, tentando ver algo diferente naquele matagal. O garoto mais baixo, após terminar de urinar, ao perceber o silêncio do amigo, virou-se, subiu o zíper e o encarou fixamente.

      — O que olhando, cara? — perguntou, sem olhar para os fundos do terreno. Cambaleava. Tomou um gole da cerveja.

      — Ali — disse o mais alto, com sua voz engrolada, apontando para o matagal. Ao ouvi-lo, procurou ficar quieto, sem mexer um músculo sequer do corpo.

      Percebeu que o outro também olhou fixamente para os fundos do terreno.

      — Ali o quê? — ele perguntou, curioso.

      — Ali. Veja — respondeu o mais alto. Não quis dizer o que estava vendo, provavelmente porque não sabia! A dúvida tumultuava seu cérebro embriagado. A dúvida e um relativo receio.

      — Quê? — o mais baixo exclamou. Nada via nada, a não ser escuridão e mato.

      — Perto da árvore. Viu?

      O mais baixo olhou… olhou… e… mais uma vez nada viu. Acabou por desistir.

      — Cê tá bebum, cara. Aí só tem mato e cocô, meu — resmungou, contrito. — Vamo embora que doido pra cacete. Quero dormir, cara. Pega aí.

      Entregou a lata para o mais alto e saiu do terreno.

      O mais alto ingeriu a cerveja e continuou olhando. Teria visto a mochila? Ou um vulto humano, como nos filmes de terror que costumava assistir? Não gostando do olhar do maldito garoto, manteve-se imóvel. Uma gota de suor brotou de sua testa, por baixo da máscara. Alguns mosquitos chatos zumbiam, ao redor de seu rosto. Uns três. Ignorou-os. Suas costas começaram a doer, devido à posição incômoda. Suas pernas formigavam. Não estava suportando essa situação. Afaste-se, garoto maldito! Afaste-se! Não me force a matá-lo, pensou, irado.

      — Vai ficar aí, Pedro? — o garoto mais baixo, de pé, na calçada, perguntou, impaciente. — indo embora.

      — Já vou.

      Pedro, o garoto mais alto, agiu de modo surpreendente. Chegou a dar dois passos cambaleantes na direção dos fundos do terreno. Dois passos! Apertou a coronha da pistola. Se ele se aproximar, irei matá-lo, pensou, com raiva. Vou dar dois tiros nas fuças desse desgraçado. Mas o garoto não avançou. O medo sobrepujou a curiosidade. Em vez disso, ingeriu a última dose da cerveja, amassou a lata e a lançou na direção da árvore. Por um décimo de segundo, pensou que a lata iria atingir sua cabeça. Seu sangue gelou, ante a aproximação do objeto. Ficou imóvel e piscou os olhos. A lata iria atingi-lo? Qual seria sua reação? Desviar o rosto? Erguer o cano da pistola? Acabar com aquilo de uma vez por todas? Prendeu a respiração, angustiado. A lata se aproximou e…

      … passou a cerca de dez centímetros de sua testa. Por um triz não o acertou! A lata amassada atingiu a parede, às suas costas, emitiu um ruído seco e caiu, desaparecendo por entre o capim. Queria suspirar, mas não teve coragem. Esperou. Viu, então, o garoto girar o corpo e... O miserável estava saindo! Saia, saia! Saiu!

      Soltou o ar, profundamente aliviado. Os dois garotos começaram a se afastar, mas pôde ouvir as palavras do mais alto, antes deles sumirem definitivamente de sua vida:

      — Tinha um troço naquele mato. Juro, meu!

      Vendo-se sozinho, respirou fundo e começou a fazer alguns exercícios, para voltar à calma. Primeiro, tirou a máscara e enxugou o suor do rosto. Em seguida, sem largar a pistola, agachou-se, fez flexões de braço, saltitou e “chutou” o ar. Dois minutos depois, viu-se de novo tranquilo, com a circulação do sangue normalizada.

      — Garoto filho-da-puta! — vociferou, baixinho, irado. — Desgraçado!

      Olhou o relógio: 3h32min. Todo aquele inferno durou apenas 10 minutos! Parecia ter ficado ali, a esperar, há horas! Mas tudo bem. O bom de tudo isso é que não perdeu a calma nem entrou em pânico. Mostrou-se frio, o que muito contribuiu para seu sucesso.

      Decidiu dar uma olhada lá fora. Colocou novamente a máscara e se aproximou da borda do terreno. Olhou na direção do clube. Percebeu que três garotos se aproximavam. Rapidamente se escondeu no matagal, dessa vez entrando um pouco mais para dentro. Os três garotos também entraram no terreno. Assim como os primeiros, igualmente urinaram na parede da loja. A diferença é que nenhum deles olhou para os fundos do terreno, à procura de algo. Terminaram de urinar e saíram, entre risos e conversas fiadas. Não teve dúvidas de aquele terreno era comumente usado (além dos toxicômanos) também pelos frequentadores do clube, para saciarem suas necessidades fisiológicas. O mau cheiro que o diga!

      Saiu do mato e mais uma vez se acercou da borda. Então, como se fosse uma premonição satânica, viu duas garotas se aproximando. Não teriam mais que 18 anos. A garota mais alta era morena e gordinha. Usava blusa larga e bermuda jeans sem graça. A garota mais baixa era branca, de cabelos longos, negros e lisos, e extremamente sensual. Tinha curvas, blusa decotada (seios grandes; uau!) e um par de coxas roliças e convidativas, que a bermuda realçava. Desejou aquela garota à primeira vista. Se pudesse ter aquele corpo à sua disposição… Mas estava cedo demais. Sabia que a muvuca só iria sair do clube depois das quatro horas. Sabia que teria que encontrar uma garota displicente, que caminhasse sozinha naquele trecho da rua. E isso era mais normal do que a princípio pudesse parecer. Garotas sempre saíam sozinhas de clubes como o “Murinte”. Só teria que esperar a sua gatinha solitária. Ela apareceria, assim como dois mais dois dá quatro. Escondeu-se, portanto, no mato e esperou (ansioso) que as duas gurias passassem.

      Para sua surpresa, no entanto, elas não passaram. Em vez disso… entraram no terreno. Nossa! As malucas entraram no terreno!

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