CAPITULO V

                                   CAPITULO V

A

li, as voltas da grande clareira, as sentinelas pareciam estar um pouco perturbadas.  Acauã foi até onde estavam algumas delas e ali permaneceu por algum tempo. O mesmo sentimento de perigo que lhe havia roubado o sono estava da mesma forma permeando a alma daqueles nativos. Alertas aos menores movimentos e sons, pareciam apavorados pelas sombras da noite, que escurecia tudo e não deixava ver além de alguns metros a frente. Estavam apenas orientando-se pelo cheiro e pelo barulho da floresta. Sabiam que as feras estavam por ali e mais do que as feras, temiam a chegada inesperada e mortal de Kaluanã.

     De repente, ao longe, os sapos silenciaram-se... O som de asas, batendo rapidamente, denunciava que aves noturnas voavam afugentadas. As sentinelas agora estavam angustiosamente assustadas. Acauã silenciosamente foi retornando a entrada da grande clareira. Ficara também preocupado com o silêncio repentino. Podia ser tanto um jaguar a procura de uma presa ou até mesmo os Guaicurus.  Enquanto caminhava silenciosamente, procurava ouvir alguma coisa. Tudo parecia normal. Mais alguns passos e ouviu um zunir sobre sua cabeça. E depois mais um... Ágil e em boa velocidade corria agora entre os cipós e a mata cerrada.   

   Ao chegar à clareira, deu o alerta. Todos que descansavam rapidamente acordaram e procuraram suas armas.

Felipe Santa Cruz pediu que apagassem as fogueiras. Foi quando os primeiros nativos da tropa caíram alvejados pelas setas que saíam, como raios, de dentro da floresta.  

As sentinelas certamente haviam sido mortas e nem puderam dar qualquer aviso. Gritaria e sons dos mosquetes lançando o chumbo para dentro da mata se misturavam com o zunido das centenas de setas que atingiam a clareira.  Os nativos retesaram seus arcos e se enveredaram rapidamente para dentro da mata. Os mosquetes eram recarregados e novamente apontados em todas as direções.

    De todos os lados parecia que surgiam setas mortíferas. Acauã olhava ao redor para ver se via alguma coisa. A densa fumaça dos mosquetes acabou atrapalhando ainda mais a visão. As setas continuavam a castigar as tropas de Felipe, que avançou em direção à mata tendo a frente os nativos e uma leva de mestiços. Os brancos ficaram ainda na clareira atirando com seus arcabuzes e mosquetes. Acauã, munido de sua pistola, saiu atrás de seus homens, embrenhando-se na mata cerrada. As setas continuavam a zunir por cima de sua cabeça e avançando rapidamente pode enxergar agora os vultos, ainda disformes, dos Guaicurus.

 Os primeiros guerreiros que estavam adiante caíram ferozmente sobre as tropas que avançavam pela floresta e os embates diretos agora eram com tacapes, bordunas e machadinhas. Acauã avançava sobre os Guaicurus e conseguia derrubá-los ao chão enquanto seus homens os golpeavam. Ao seu lado havia seus amigos mestiços, em torno de uns trinta homens, que o acompanhavam. Continuando a avançar, se deparou com mais inimigos, que agora, não eram os Guaicurus.

Acauã os enfrentou energicamente com sua adaga, novamente conseguiu aniquilá-los, porém desta vez perdera alguns de seus homens. O barulho vindo da clareira era intenso.

Os arcabuzes não paravam e se ouvia os gritos dos Guaicurus praticamente em todo o redor. Acauã resolveu voltar com o restante de seus homens um pouco mais próximo a clareira. Andou cerca de uns cem metros e ouviu passos apressados que passavam praticamente ao lado. Pediu para que seus homens parassem e ficassem em silêncio absoluto.

Sabia que os Guaicurus estavam indo em direção à clareira. Pareciam ser muitos. Para todo o lado que olhava, podia ver os embates entre os inimigos e as tropas de Felipe. Continuou depois de alguns minutos o caminho de volta a clareira.

O barulho ensurdecedor dos mosquetes parecia ter diminuído seu ímpeto e os sons de gritos e o barulho seco, dos tacapes, bordunas e machados se digladiando, aumentava conforme se aproximavam das tropas.  Achava que certamente os Guaicurus haviam adentrado a clareira e estavam agora em combate corpo a corpo com Felipe e seus homens. Quando finalmente pode ver a clareira, sentiu-se mais aliviado. Muitos corpos jaziam ao redor, mas não havia um combate direto entre Felipe e Kaluanã.

Os embates se intensificaram fora dali e Felipe e seus homens estavam até aquele momento, seguros. Acauã então conseguiu chegar até Felipe.

— São muitos senhor, vós mercê precisa se proteger atrás das árvores!

— Malditos Guaicurus... São como sombras na escuridão! Pegaram-nos de surpresa, Acauã! E com os olhos arregalados procurava algo além das sombras e da fumaça. Era Kaluanã.

— Não avançaram até a clareira senhor e acho que estão se retirando.

— Mas como assim? Porque não nos enfrentam?

— Certamente as armas os amedrontaram, mas irão voltar, senhor Capitão... Precisamos aproveitar e nos recompor.

E os Brancos que portavam as armas concordaram com Acauã.

— Senhor, precisamos trazer nossos homens mais perto, dê ordens de recolher; — Disse um deles.

— Sim, faremos isso, respondeu desapontado Felipe Santa Cruz.                                                                       E assim as tropas foram chamadas de volta a clareira. Ao retornarem, o capitão Felipe pode por fim ver o estrago que Kaluanã havia causado. Dezenas de vidas perdidas, principalmente de nativos. Eles relataram que os Guaicurus haviam se retirado tão rapidamente quanto chegaram. Felipe então deu ordem para que colocassem os feridos num local seguro e que mantivessem alerta total ao redor da clareira.

Acauã organizou uma patrulha para ver o que estava acontecendo na mata e saiu rapidamente com ela. Cerca de uns quarenta minutos depois, voltou dizendo que não encontrara nada numa boa distância dali. Parecia realmente que Kaluanã e seus guerreiros haviam se retirado, provavelmente estaria à espreita, observando as condições das tropas de Felipe.

Há algumas léguas dali, Kaluanã e seus guerreiros se reuniam. Havia perdido algumas dezenas de homens e então fizeram uma pequena cerimonia em homenagem a eles. Depois, pediu para que os líderes se Reunissem. E lhes falou:

— Preciso que comam e descansem agora! Estejam prontos para os primeiros raios do sol, será ao amanhecer que voltaremos aos Karaíbas!                                                                                                                                                                                                                                                                                        E aos gritos, seus guerreiros se dispersaram. Ele sabia que infligira perdas consideráveis aos Paulistas, mas ainda assim, tinha receio em relação à quantidade de armas que eles possuíam. Nunca enfrentara uma tropa tão bem armada. Não podia de maneira alguma tomar uma decisão equivocada. Precisava de qualquer forma aniquilar esta gente, não deixando desta vez, sobreviventes.

Queria desestimular de vez os Paulistas a voltarem ao sertão em busca de escravos. Durante horas, Kaluanã repensou seu novo ataque.  Certamente os karaíbas estariam à espera e muito bem preparados com seus mosquetes e arcabuzes. Precisava assim achar um meio de atacá-los sem, porém, expor seus guerreiros ao chumbo mortífero das armas. Resolveu que o melhor ataque seria usar os arcos de longa distância e o cerco fechado em volta das tropas de Felipe. Confinariam assim os karaíbas na grande clareira durante dias se fosse possível

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