Capítulo 05

Marcela Andrade

Acordei sentindo dores pelo corpo inteiro, não pensei que perderia a consciência. Quanto tempo fiquei desacordada? Com dificuldade sentei na cama. Olhei para o soro do meu lado direito e fiquei incomodada, conseguia sentir a agulha enfiada no meu braço. Eu estava realmente em um hospital? Quer dizer, nunca antes havia estado em um leito sozinha e tão elegante como aquele. Os atendimentos pelo sus nunca foram dos melhores, com certeza, era um hospital caro e eu não tinha dinheiro para pagar.

— Merda! Preciso dá o fora desse lugar. — resmunguei, bastante preocupada. Mesmo sentindo muita dor levantei da cama e puxei o soro, tirando-o do gancho de suporte. Caminhei descalça pelo piso frio indo em direção à porta, faltava muito pouco para minha fuga desesperada.

Apenas um momento de distração foi suficiente para ser pega em flagrante. A porta abriu antes mesmo que eu tocasse na maçaneta. Recuei assim que vi de quem se tratava. O destino das causas desastrosas, não cansava de brincar com minha vida. Engoli em seco, sentindo os pelos dos meus braços ficarem eriçados.

— Onde pensa que vai? — questionou de cabeça erguida. Por alguns segundos fitei seus olhos esverdeados, totalmente hipnotizada por sua beleza. O sorrisinho de canto dele me fez despertar para realidade. A culpa era dele por eu estar naquele lugar, seu plano maligno era me falir.

Filho da mãe, foi você que me trouxe pra cá? — perguntei, indo pra cima dele com o soro na mão. — Acha que sou rica por acaso? Não vou pagar essa conta não!

— Sério? Você tá querendo discutir? Na próxima deixo você morrer então!

Uma pessoa sensata agradeceria, mas eu não era essa pessoa! Ele não merecia nada de gentileza, não passava de um carrasco.

— Sai da minha frente, seu merda! Quero ir embora antes que tragam a conta. — disse dando um passo à frente.

— Pode voltar para aquela cama, agora!

Quem ele pensava que era? Meu dono? O imbecil pensou mesmo que poderia me controlar? Talvez sim!

— Vou voltar porcaria nenhuma! Aposto que me trouxe para cá, pra rir de mim!

Claro que ele aproveitaria uma oportunidade daquelas para debochar do meu estado físico e emocional. Sem pensar direito estapeei a cara dele, confesso que sempre quis dar uns tabefes em seu rosto. Minha mão ficou formigando, mas posso dizer que a alegria que senti por dentro compensou tudo.

— Caralho! Enlouqueceu de vez? Volta logo para aquela cama, ou vou te colocar em uma camisa de força! Porra, isso dói, mulher dos infernos!

Ele realmente ficou muito bravo, acabei sentindo-me coagida. Se sua intenção era me intimidar tinha conseguido.

— Meu sofrimento é diversão pra você? — questionei, deixando algumas lágrimas caírem pelo meu rosto. Bernardo Fonseca nunca entenderia o que era ser uma pessoa como eu, gorda e pobre.

Quem me deixou naquela situação foi um dos babacas do setor financeiro, lembro bem tudo que ocorreu minutos antes que eu perder a consciência...

Depois do que aconteceu no elevador meu nome ficou na boca de muitas pessoas, algumas delas passavam perto de mim para debochar. Ele era pra ser só mais um entre elas, no entanto, seus planos eram outros.

— Quanto você quer pra liberar esse traseiro pra mim? — perguntou com um sorrisinho de cafajeste.

— Não entendi, senhor. — falei mentindo na tentativa dele me deixar em paz.

— Eu não acho que o senhor Fonseca tenha pagado muito. — disse ele, fitando-me dos pés a cabeça. — Vamos lá gracinha, uma rapidinha no banheiro, te dou duzentos reais!

— Não sou prostituta! — berrei, não aguentava mais aqueles boatos de que eu tinha transado com o presidente da empresa. Empurrei o desgraçado após ele tocar meu braço.

A partir daquela minha reação deixei ele furioso, o resto tornou-se um grande borrão na minha memória, talvez fosse melhor assim.

— Responde, senhor Fonseca! — exige depois do seu silêncio eterno. Ele tinha voltado para fazer da minha vida medíocre um pouco pior.

Bernardo Fonseca, simplesmente me ignorou e saiu pela porta. O que ele tinha afinal? Ele não parecia o mesmo de sempre, aquele lado covarde não conhecia. Decidi voltar para cama pois não aguentava mais ficar de pé.

Como uma desempregada pagaria cuidados médicos particular? Sentei na cama e chorei. Grande advogada eu era, não conseguia nem manter um trabalho. Eu cansei de ser humilhada e não revidar. Meus pais quando soubessem a verdade que menti todo esse tempo, não sentiriam orgulho de mim. Voltar para o Ceará e encarar toda minha família era vergonhoso demais.

Não sei quanto tempo fiquei me lamentando até ter minha atenção chamada na direção da porta.

— Deitei porque eu quis. — disse evitando contato visual. Fitei o nada enquanto ouvia seus passos. O cheiro do seu perfume quase me fez suspirar.

Ele era um homem horrível e superficial assim como muitos. Caras como o senhor Fonseca costumavam valorizar apenas o dinheiro.

— Assina. — disse ele, entregando-me um documento em mãos.

— Que merda é essa? — questionei, quase tomando a caneta de suas mãos para enfiar em um dos seus olhos.

— Você não pode pagar esse hospital, certo? E eu não faço caridade, portanto, você será uma das minhas modelos plus size, trabalhará para mim gratuitamente finais de semanas e afins.

Qual era o problema dele? Eu, modelo? Sempre vi de longe as modelos plus size que eram usadas em algumas propagandas de cosméticos da empresa. Posso afirmar que eu não era nenhum pouco atraente. Bernardo Fonseca além de um pão-duro, queria me humilhar ao aceitar tal absurdo.

— Fica com o meu salário desse mês. Vou dá um jeito de voltar para meu estado. — disse lhe entregando o documento. — Não estou brincando, pega logo essa porcaria!

— Já disse, não faço caridade. O salário que você ganha não cobre os custos. Pode esquecer essa ideia de que vai embora, assina logo ou vou te processar!

Processar? Isso era possível? Engoli em seco, enquanto pensava sobre o assunto. Quais eram as opções? Fugir escondido? Aceitar sua proposta? Eu era apenas uma gorda feia e não uma modelo plus size.

Lembro bem da época que descobri modelos tamanho GG...

Cheguei em casa com um brilho nos olhos depois de comprar uma revista de moda que encontrei em uma banquinha de jornais. Minha intenção era mostrar para os meus pais que as modelos não precisavam mais ser tão magras pra serem aceitas no mundo da moda. Quando aproximei-me da cozinha dei de cara com meu ex que naquela época era o atual.

— Ricardo, você não vai acreditar no que encontrei. — falei empolgada, meus pais não estavam por perto. Mostrei-lhe a revista.

— Quantas gordas expostas. Por que comprou isso? São todas feias como você, quer dizer, você é fofinha apesar de ser tão gordinha.

Ele soube bem como acabar com minha felicidade, mas eu era cega e pensei que ele não tinha falado por mal, na verdade fiquei defendendo ele durante bastante tempo. Fui uma imbecil que só vi quem ele realmente era quando foi tarde.

Saí das lembranças do passado e retornei a situação em que estava com meu chefe de merda.

— Por quanto tempo vai ser essa escravidão? — perguntei, fitando um sorrisinho em seus lábios carnudos. Eu realmente estava prestes a aceitar aquela proposta maluca?

— Oito meses, senhorita Andrade, por favor, leia todas as linhas do contrato.

Ler pra quê? De qualquer forma assassinaria. Era apenas oito meses e acreditava que quando ele percebesse que não levava jeito pra tal trabalho abriria mão dos meus serviços. Não eu não era uma advogada burra, contudo, que opção eu tinha? Eu era pobre para tentar abrir um processo contra ele! Quem acreditaria em mim envolvendo todo o dinheiro que ele tinha? Acreditava que ninguém.

— Passa a caneta. — pedi e ele me entregou, assinei o bendito contrato, seria por pouco tempo aquela tortura. 

Assinar aquele contrato foi como assinar um contrato com o diabo. Vi nos seus olhos esverdeados satisfação ao receber tal contrato. Se foi um erro assinar sem ler? Provavelmente! Praticamente entreguei minha vida em suas mãos. E adivinha? Aquele nosso acordo traria tormentos para minha vida, acreditava fielmente nisso.

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