Capítulo 2

Maria Eduarda

Há dois anos eu não sei o que é ter paz. E aqui estou, me olhando no espelho do banheiro, tentando esquecer o meu pior pesadelo. Desde aquela noite eu não comemoro mais o meu aniversário. Não tenho razão para festejar. Como eu gostaria de ter morrido! É errado eu ainda ter esses tipos de pensamentos? É errado eu ainda me sentir suja? São tantos sentimentos contraditórios que eu ando sentindo!

No início, eu não conseguia dormir devido aos acontecimentos. Eu era sedada e também era restringida no leito do hospital. A dor que eu sinto na alma é tão grande, que acabei tirando o soro da veia que estava me hidratando e machucando-me mais ainda, só via o sangue saindo novamente, e sorria entre as lágrimas que já estavam escorrendo.

Para mim era tão bom, porque a morte viria e me levaria do meu sofrimento. De uma coisa eu tinha certeza: eu não saberia como viver com aquilo. Só que eu não contava que as enfermeiras fossem entrar tão rápido e gritando. E apaguei novamente.

E aqui estou eu novamente posicionada no mesmo lugar, onde eu tentei me matar da primeira vez. E mais uma vez não funcionou. Minha irmã foi avisada que eu tinha tentado novamente me matar. Agora ela me olha chocada.

— O que você fez, Duda? — ela me questiona, com lágrimas nos olhos.

— Você não entende! — sussurro.

— Então me faça entender! — ela diz, séria. Tento me mexer, e não consigo. Vendo o que eu estava fazendo, ela explica: — Eles tiveram que te amarrar.

— Deu para perceber — resmungo.

— Então, vai ou não me fazer entender o que está acontecendo com você?

— Há quanto tempo eu estou aqui?

— Há quase dois dias. Você se lembra daquela noite?

— Sim… — sussurro.

— Então é verdade? — ela me questiona, e sinto meu sangue fugir completamente do meu rosto.

— Sim… — volto a sussurrar, com vergonha de mim mesma.

— Duda, você não quer saber o que aconteceu com você?

— Sinceramente, acho que você não precisa me lembrar do que aconteceu exatamente comigo! — sem querer, sou grossa, e logo estou me desculpando: — Me perdoa, não queria ser grosseira.

— Eu sei que não! Você não sabe o que eu senti quando te vi no chão do banheiro toda ensanguentada.

Minha irmã linda… Ela não tinha ideia de como eu a admirava, me criou desde pequena, a nossa diferença é de dez anos.

— Me perdoa! — peço novamente, e ela me abraça, colocando a cabeça em meu colo. Começa a chorar. Muito.

— Eu pensei que você estava morta! — ela sussurra.

— Era o que eu queria naquele momento — confesso, sentindo as lágrimas dela em minha barriga.

— Não, eu não quero que você atente mais contra a sua vida! — ela diz, brava, e se levanta. Assim pude reparar em como ela estava abatida.

— Eu preciso morrer!

Ela me olha chocada.

— Nunca mais fale uma merda dessas!

— Você acha que é fácil?

— Eu imagino que não deva ser fácil.

— Não, você não imagina! — praticamente grito, e tento me controlar: — No dia do meu aniversário eu fui estuprada!

— Duda, fica calma — ela pede, ao ver como estava agitada.

— Eu não posso ficar calma! — olho firme para ela. — Além de ter sido violentada, posso estar grávida e ainda correr o risco de ter pegado uma DST.

— Eles fizeram o teste de gravidez e DST.

— E qual foi o resultado? — pergunto, com medo.

— O resultado mostra que você, Senhorita Sanches, não está grávida e também não contraiu o vírus — ouço uma voz de um homem e fico tentando saber quem é. Não preciso muito, pelo jeito da minha irmã, que ficou muito vermelha.

— Oi, doutor Leão — minha irmã diz, ainda corada.

Ele abre um sorriso que acho sensual e nos cumprimenta.

— Então eu não estou grávida?

— Não senhorita! Mas isso não significa que a senhorita não tenha que tomar a pílula do dia seguinte e muito menos o coquetel, pois vai tomar como prevenção.

— Mas o senhor não disse que eu não estou grávida e também não contraí DST? Por que eu tenho que tomar? — questiono, já ficando nervosa.

— Senhorita, como eu estava dizendo, a senhorita tem que tomar, e vamos fazer mais exames. Você também vai ser acompanhada por um psicólogo.

— Eu não preciso de nenhum psicólogo — respondo, grossa, e a minha irmã me olha feio.

— Ela vai, sim, doutor Leão!

— Ótimo, a enfermeira já vai trazer as medicações, e vamos fazer logo mais exames.

— Eu estou bem! — resmungo.

— A senhorita passou por um grande trauma, e sei que está abalada, mas precisa fazer mais exames e também começar a tomar a medicação, tudo bem? — aceno a cabeça em concordância. Não demora muito, ele sai, e vem uma enfermeira, e sou tirada da restrição. Foi assim que comecei a minha longa jornada para esquecer o meu pesadelo.

— Dudaaaaaa! — ouço a minha irmã me chamar e sou tirada do passado. Logo desço as escadas e vejo-a toda arrumada.

— Aonde você vai? — pergunto, curiosa.

— Eu vou trabalhar, esqueceu? — ela brinca. — E a senhorita tem que ir para a aula, e não se esqueça de vir logo para casa.

Ela me dá um beijo e sai correndo como louca. Minha irmã ama e ao mesmo tempo odeia o trabalho como secretária do Senhor Leon Vitorino. Sinceramente, eu ainda não o conheci, e nem quero. Minha irmã diz que o homem é um gato e que eu deveria arrumar um namorado.

Decidi que nunca vou me relacionar com ninguém. O medo ainda bate em mim quando algum homem se aproxima. Mesmo sabendo que não pode me fazer nada de mal, eu ainda fico com um pé atrás.

Pego a mochila e sigo para o curso, pedindo mais uma vez a Deus para me fazer esquecer de tudo que me aconteceu. Será que é pedir muito? Solto um longo suspiro triste.

Leia este capítulo gratuitamente no aplicativo >

Capítulos relacionados

Último capítulo