EMILY
Acordei com um barulho chato. Que barulho é esse? Pensei. Parecia um telefone tocando. Foi então que me dei conta que era o meu despertador. Nesse instante, dei um pulo da cama.
MEU DEUS, PERDI A HORA. MERDA, MERDA, MERDA.
É meu primeiro dia no escritório mais importante dos Estados Unidos da América e eu vou me atrasar. Não deveria ter ficado até às duas da manhã assistindo a Suits1, minha série preferida no momento, mas não conseguia desligar a televisão, e a cada novo episódio jurava que seria o último, até que acabei adormecendo com a televisão ligada. Meu pai deve ter desligado no meio da madrugada.
Saltei da cama e corri para o banheiro com o celular na mão, a função soneca já havia apitado três vezes. Por que raios que tenho tanta dificuldade em acordar pela manhã? Desde pequena sou uma pessoa noturna, nunca tive dificuldades para ficar até tarde estudando, mas acordar cedo era um parto.
Liguei o chuveiro e quase entrei de pijama. Acorda Emily, gritei comigo mesma. Fui para debaixo do chuveiro e tomei um banho quente na velocidade da luz. Peguei a toalha para me secar, decidi não lavar o cabelo, havia lavado na manhã anterior e, como ele era cacheado, demoraria muito para secar, e agora não tinha tempo a perder, então o prendi em um coque bem apertado, assim ficaria bem formal. Ainda bem que sempre fui organizada, logo minha roupa para o meu grande primeiro dia já estava no cabide, pendurada na porta do meu guarda-roupa.
Optei pelo meu conjuntinho de saia lápis, terno preto e uma camisa social branca. O básico do básico, mas como era um escritório muito renomado, não tinha erro. Nos pés, calcei meu
único salto scarpin, nunca gostei de salto alto, mas sabia que minha futura profissão como advogada exigiria uma vestimenta à altura, sendo assim seria bom aprender a me acostumar desde meu primeiro dia.
Fazia apenas dois anos que havia entrado para o curso de Direito da Universidade de Columbia, ganhei uma bolsa de 100%. Foi a maior conquista da minha vida, nunca me esquecerei dos olhares do meu pai e da minha avó no dia da minha formatura. Formei-me com honras e ainda o diretor fez questão de anunciar para todos os presentes que eu havia ganhado a bolsa de estudos mais disputada da cidade.
Sempre sonhei em advogar, e queria mesmo me aperfeiçoar com Direito Criminal, amava tudo relacionado a isso. Eu respirava Direito, todavia, foi uma grande surpresa quando, na semana passada, a professora Scarlett me chamou em sua sala para dizer que havia me indicado para uma vaga de estágio no escritório Williams & Simpson. Ela disse que, no primeiro dia, já percebeu um diferencial em mim e, como os donos do escritório eram amigos de longa data, ela resolveu me indicar. Disse que eu aprenderia desde o começo com os melhores, mas me alertou: “Emily, eles são os melhores. Construíram tudo o que tem do zero, mas são extremamente exigentes e não aceitam erros. Então, dê o seu melhor.”
Droga, agora eu corria o risco de chegar atrasada no meu primeiro dia. Acabei de passar uma leve maquiagem no rosto e saí do quarto. Encontrei minha avó já sentada à mesa, terminando sua xícara de chá. Dona Emma, minha avó por parte de pai, era como uma mãe para mim. Desde que nasci, ela ajudou meu pai a me criar, ele sofreu muito com a morte da minha mãe no meu parto. Mas ela, em nenhum momento, em todos esses anos, abandonou o filho. Meus pais se amavam desde o colegial e, mesmo tendo se passado 19 anos, ele nunca deixou de amar minha mãe. Nunca se envolveu com ninguém. Sempre dizia que eu e minha avó éramos a sua família e que ele estava completo. Minha avó até tentou, por algumas vezes, apresentar algumas mulheres para ele, algumas até gostei, mas meu pai não queria ninguém. Insistia que nunca existiria outra mulher em sua vida.
Sabe, algumas vezes admirava o amor que ele tinha por minha mãe. Eu sabia que ela tinha sido uma mulher incrível, e ainda me doía o fato de nunca poder nem ter visto seu olhar, porém, em outros momentos, não queria que meu pai passasse o resto de sua vida sozinho.
Minha avó pensava como eu, ela era viúva desde seus 30 anos, meu avô morreu em um trágico acidente de carro com apenas 35 anos, mas diferente do meu pai e minha mãe, o casamento deles não era um mar de rosas, todavia, mesmo não tendo amado profundamente seu marido, nunca quis se envolver novamente. Dizia que estava feliz assim.
Às vezes, me perguntava se Deus me daria uma história como a deles... um casamento curto. Não gostava de pensar assim. Eu não era uma sonhadora como a maioria das jovens, não queria uma casa, um marido e um cachorro. Queria focar única e exclusivamente na minha
carreira. Queria ser a melhor criminalista dos Estados Unidos, e para isso sabia que não poderia perder tempo com amores.
— Emy, seu pai está terminando o banho e já vem para te deixar no escritório.
— Sério, vovó? Ele não tinha aula agora cedo?
— Disse que foi E ainda bem, pois olha a hora, menina. No seu primeiro dia, não pode se dar ao luxo de se atrasar, o que vão pensar?
— Eu sei, vovó, perdi a hora. Mas se papai vai me levar, não irei me atrasar. De carro até lá, dá uns 10 minutos. Ainda chegarei antes das 8 horas.
Meu pai era professor de literatura em uma universidade pública da cidade. Lá, ele se formou e ficou. Ele era muito feliz dando aulas e, nas horas vagas, escrevia seus contos. Acredito que tenha surgido de sua influência, o meu gosto pela leitura.
Meu pai entrou na cozinha com os sapatos sociais nas mãos. Apesar de seus cabelos já meio grisalhos, era um coroa muito boa pinta. Tinha a pele morena, olhos verdes, como os meus, era alto e magro. Ele se sentou na cadeira ao lado da vovó e começou a calçar os sapatos.
— Bom dia, filha, pronta para o seu primeiro grande dia?
— Sim, mais do que pronta.
— Ótimo, então Eu já tomei o meu café, pois diferente de algumas pessoas, escuto o despertador.
Lá veio ele com aquele olhar de reprovação. Meu pai era um amigão, mas mesmo assim sempre me ensinou a ser disciplinada e aplicada. E eu realmente era, a não ser quando dormia tarde demais.
— Desculpe, pai, eu sei, eu Mas isso não irá se repetir. Bom, então vamos, acredito que conseguirei chegar exatamente no horário. Tchau, vovó, torça por mim, te amo.
— Tchau, minha doce Emy, faça o seu melhor, como Tchau, meu filho, nos vemos no almoço.
— Tchau, mãe, hoje pode deixar que preparo o almoço.
Dona Emma nem disfarçou a alegria ao ouvir aquela proposta, meu pai, além de um ótimo professor, era um cozinheiro de mãos cheias. E ele amava tanto seus livros quanto o seu fogão. Às vezes, desconfiava que ele amasse mais isso do que eu mesma, sua própria filha. Esse pensamento me fez rir.
...
Chegamos ao centro de Manhattan, o centro dos mundos dos negócios de Nova Iorque. Meu pai estacionou em frente ao Edifício One World Trade Center. Era um prédio de 104 andares. E 10 deles faziam parte do escritório Williams & Simpson. Não era à toa que o nome na fachada era o maior.
Respirei fundo, ainda sentada na poltrona do passageiro do nosso velho carro, um Dodge Durango 2001. Meu pai olhou para mim e disse com sua tranquilidade de sempre:
— Vai lá e arrasa, minha pequena.
Ele sempre falava assim desde que me lembro, todas as manhãs, antes de sair para o colégio, ele me olhava e dizia isso. Acho que por isso sempre me senti tão confiante, era como se aquela pequena frase despertasse a vencedora que havia dentro de mim.
— Obrigada, pai, eu te amo.
— Eu também.
Respirei mais uma vez, pedi para Deus me dar coragem, desci do carro e fui.
EMILYEntrei pelas portas giratórias de vidro e logo avistei um balcão de informações, com uma recepcionista que parecia estar gravando um comercial de creme dental, era como se o sorriso dela estivesse congelado no rosto. Ela estava impecavelmente bem-vestida, com um vestido social preto que destacava ainda mais sua pela branca e seus cabelos loiros claros, na altura dos ombros.Fui aproximando-me dela, ouvindo meus saltos fazendo “tec-tec” pelo piso de porcelanato preto. Ela me acompanhou com o olhar.—Bom dia, me chamo Emily Watson, e estou procurando pelo RH do escritório Williams & Simpson.—Olá, Srta. Watson, seja bem-vinda ao One World Trade Center. O RH do escritório Williams & Simpson fica localizado no 102º Logo à esquerda, estão os elevadores. E aqui está o seu crachá de visitante para passar pelas catracas. Provavelme
JAMES— Sério, pai, além de ter que vir trabalhar obrigado, ainda vai me empurrar uma estagiária? Meu pai havia passado de todos os Desde a morte do Patrick, meu irmão mais velho, que ocorreu há 4 anos, dia após dia, meu pai fala que estava na hora de assumir meu lugar no escritório.Formei-me com honras no curso de Direito de Harvard, mas não queria advogar. Bem, na verdade, até queria, mas não ainda. Sabia que, a partir do momento que colocasse os pés no escritório, meu pai iria me deixar ali sozinho e com meus 27 anos, ainda me considero novo para ficar trancado dentro de um escritório e viajando por todo o país em audiências intermináveis. Claro que a parte de viajar não era ruim. Adorava jogar-me na estrada. Conhecer lugares e pessoas, principalmente mulheres. Meu pai, que estava sentando em sua mesa, respondeu-me, me fazendo voltar a convers
EMILYLiandra Robin foi muito atenciosa comigo e me mostrou todos os andares e cada setor do escritório W&S. Era muito maior do que eu achava, além do andar onde ficava o RH e o setor jurídico trabalhista, ainda havia 9 andares do mesmo tamanho que aquele, cada um para um ramo do direito, e, no último, o 104º, além do setor jurídico criminalista, havia a sala da presidência.— Chegamos a nossa última parada, é neste andar que você irá trabalhar.— Aqui? — perguntei espantada, mas me lembrei que ela falou que seria assistente do Dr. Williams, e era lógico que a sala dele era na presidência, aff, Emily, sua burra. Fiquei levemente corada por pensar que Liandra me acharia desatenta.—Sim, Wattson, esse é o setor da presidência, logo a sala do Sr. Williams está neste andar.Tentei parecer fi
JAMESO tempo passou voando, quando percebi, já passava das 13h e eu ainda estava contando as histórias dos maiores casos do nosso escritório para a Srta. Wattson. Desde que comecei a falar, ela não me interrompeu por nenhum segundo, mas escutava com muita atenção e a julgar por seus olhos brilhantes, estava realmente encantada com meu relato. Seu entusiasmo recordou-me meus primeiros dias de aula na faculdade, pois, apesar de ter crescido em um ambiente que respirava Direito, ao pisar em Harvard, fiquei fascinado. Eu sempre amei estudar e sempre sonhei em advogar. Mesmo que ainda me achasse novo para isso. E ver o entusiasmo da minha nova estagiária me fez feliz.A Srta. Wattson era uma beleza, não me recordava de ter visto uma mulher tão linda quanto ela. Alta, com a pele negra, corpo curvilíneo, os cabelos, não sabia dizer se eram compridos, pois estavam muito bem presos em um
EMILYJames era realmente um homem lindo, mas, pior, era incrivelmente inteligente. Não percebi que as horas passaram tão rápido desde que ele começou a falar sobre as histórias de sucesso do escritório. Eu fiquei completamente fascinada com sua postura. Ele falava com uma voz firme e seus olhos brilhavam ao me contar acerca de todos os grandes julgamentos. Ele sentia muito orgulho do pai e do Dr. Simpson, sócio do escritório, também o melhor advogado em sua área, que era Direito do Trabalho.Eu não emiti nenhum comentário, simplesmente fiquei ouvindo e guardando mentalmente todos os seus movimentos e gestos. Seus traços eram perfeitos, ele parecia uma pintura. Nossa, Emily, se segura garota, ele é o seu chefe. Eu nunca fiquei fascinada assim antes, eram emoções totalmente estranhas para mim, o que está acontecendo comigo?
JAMESO primeiro dia passou muito rápido, após o almoço e a excelente companhia da Srta. Wattson, retornamos para o escritório e ambos mergulhamos nos documentos, processos e agenda para as próximas semanas. Apesar de muito nova e de ser apenas seu primeiro dia, Emily demonstrou um excelente profissionalismo. Acabamos ficando no escritório até às 19h, e como já era tarde e não sabia se Emily tinha carona, resolvi me oferecer para levá-la em casa, mas ela disse que não precisava, pois seu pai já havia chegado para lhe buscar.Dessa forma, nos despedimos no lado de fora do prédio, a avistei entrando em um Dodge Durango antigo e vi de relance um senhor no banco do motorista, após entrar e fechar a porta, ela se inclinou, beijou a bochecha do senhor, que abriu um largo sorriso. Ali vi que existia um grande amor entre pai e filha. Ela deveria mesmo ser uma
EMILYOs dias estavam passando rápido, e eu estava cada vez mais encantada com meu estágio, mas principalmente com o meu chefe.James era simplesmente brilhante e não conseguia entender por que demorou tanto para começar a trabalhar no escritório. Diferentemente do que pensei a seu respeito no primeiro dia, ele não era festeiro, pelo contrário, era super comprometido e dedicado. Era o primeiro a chegar e o último a sair. Às vezes, ficava até com vergonha, pois duas vezes nessa semana eu havia atrasado por conta de provas na faculdade e, como ia trabalhar de ônibus, era pior ainda.Amanhã iria com meu pai comprar o meu primeiro carro, afinal, com o meu novo salário, poderia me dar esse “luxo”, e isso iria facilitar e muito meus dias. Eu fiz algumas pesquisas e decidi comprar um Fiat, pois o custo de manutenção era baixo. E, por sorte,
JAMESAquela sexta-feira estava agitada, depois de passar horas ao telefone para conseguir confirmar se o julgamento do caso “Connor” seria ou não na segunda-feira seguinte, ainda tive que organizar as últimas questões para a viagem de última hora.Não tinha ainda certeza se fiz bem em chamar a Srta. Wattson para me acompanhar, ela era ainda muito nova e totalmente inexperiente no mundo dos tribunais, contudo, queria que ela fosse. Queria lhe mostrar a “magia” que envolve um julgamento dessa magnitude e, claro, queria que ela me visse em ação. Afinal, não havia me esquecido de sua cara de decepção ao saber que iria trabalhar comigo e não com meu pai.Mas não poderia me dar ao luxo de levar apenas ela como minha assistente, precisava de alguém com experiência, por isso chamei o Dr. Taylor, ele era o advogado criminalista mais anti