Capítulo 2

Carlo dormiu pouco durante a noite. Estava preocupado com a garota.

Com cuidado redobrado ele a colocou na pick-up e a levou para casa, evitando ir muito depressa por causa dos solavancos.

Queria lhe dar um banho, mas ficou com medo de piorar sua situação. Retirou a roupa que ela vestia, um macacão azul e botas pretas.

Estava encharcada e infelizmente ele teve que retirar as roupas de baixo também. Usava uma camiseta fina branca e uma calcinha que parecia um shortinho, branca também.

Limpou os ferimentos e buscou com atenção se havia algo quebrado. Tentou não notar como ela era bonita depois de limpa.

Agora não era o momento de observar isso. Ela estava machucada e indefesa.

Descobriu que se chamava Amina F. , estava na etiqueta de seu macacão.

Talvez fosse o uniforme da empresa de aviação, embora não tivesse reconhecido o desenho e nem as iniciais.

Não encontrou nenhum documento de identificação em seu macacão.

Ela tinha uma corrente delicada no pescoço e no braço um relógio muito diferente de qualquer outro que já vira, mas com certeza era muito caro. Parecia um modelo feito por encomenda.

Retirou e os guardou em uma caixinha que era de sua mãe. Devolveria depois quando ela acordasse.

Aumentou o fogo na lareira e se ajeitou na poltrona grande de frente para o sofá onde ela dormia.

De tempo em tempo ele acordava, checava sua temperatura, sua pulsação e as pupilas. Não parecia haver nada mais grave.

Ela tinha batido forte a cabeça, o que lhe causara uma concussão, mas de resto os ferimentos não iriam lhe causar maiores problemas.

Em outra checagem ele parou e fitou seu rosto. Com toda certeza era uma mulher muito bonita e atraente.

_ E eu não deveria encará-la enquanto dorme.

Balançou a cabeça e voltou para a poltrona, pensando que ela tinha tido muita sorte.

E que ele deveria ter ligado para a polícia, mas esquecera totalmente. Olhou em volta e lembrou que o celular havia ficado no carro.

A chuva ainda estava forte, não se animou a sair de novo. E se ele tinha visto a queda, claro que outras pessoas teriam visto também. Alguém ligaria.

Ficou olhando a chama tremulante na lareira, os olhos quase se fechando. A única luz agora vinha dali, da lareira. O ambiente assim com luz suave seria melhor para ela.

Que diabos ela fazia andando sozinha? Seria a única sobrevivente”?

Ela disse que não havia mais ninguém. Então ela estava voando sozinha? Seria uma pilota particular que estaria voltando de um voo encomendado?

Ou talvez ela trabalhasse para a Força Aérea. Não conhecia o símbolo do macacão azul.

Ele bocejou e inclinou a cabeça no encosto fofo da lateral e a olhou. Sorriu de leve.

O rosto dela era muito bonito. Não conseguia entender o que sentira quando ela tocou seu pescoço na estrada.

A boca dela também era muito bonita, bem definida e um pouco bicuda. Infelizmente estava um pouco inchada pelo corte, mas se via atraente.

Os olhos eram cinza, uma cor difícil de se ver. O nariz pequeno era arrebitado e as maçãs do rosto eram marcadas.

O cabelo era de um castanho muito forte. Ele tinha retirado o elástico que o prendia para apalpar sua cabeça em busca de cortes ou pancadas e por sorte não achou nada.

Não devia estar notando todas essas coisas sobre sua imagem agora, mas foi involuntário.

Carlo puxou a manta por cima do corpo e bocejou. Teria que acordar em pouco tempo para checar seus sinais vitais de novo.

Abriu bem a boca em um bocejo maior, cansado, mas pensando que ela ficaria boa e então poderiam conversar.

Ele também estava se sentindo cansado e o banho rápido que tomou pra se livrar da lama o deixou relaxado.

*******

Amina abriu os olhos devagar.

Viu um teto de madeira. Virou o rosto e apertou os olhos quando uma pontada forte de dor percorreu sua cabeça.

Sentia a testa latejar. E cheiro de madeira queimando.

Reabriu os olhos e viu a luz que vinha das chamas de uma lareira. Ouviu a chuva forte. Ainda estava viva. Suspirou aliviada.

Recordava a queda, o momento da colisão. Estava muito escuro e não sabia onde havia pousado. Ficou com medo de cair na água e morrer afogada.

Lembrou que o solavanco forte havia deslocado seu ombro quando bateu de volta na cadeira, os cintos a prendendo para não ser jogada em cima do painel de controle.

Quando acordou estava tonta e tirou o capacete, jogando-o no chão, o que foi um erro porque estava em uma posição inclinada para a frente e quando soltou os cintos de segurança, o peso de seu corpo a jogou contra o painel e ela bateu a cabeça com força, gritando de dor.

Ficou desorientada e saiu da nave com dificuldade. Estava escuro e foi tateando até a porta.

Pressionou o botão e caiu de vez no chão de pedras e terra molhada misturada com grama e galhos quebrados.

A gravidade ali era diferente, mais pesada, se sentiu estranha.

Puxou o ar com força para encher os pulmões. Tudo bem, ela podia respirar, a atmosfera era semelhante...

A dor na cabeça dificultava seu pensamento, mas queria lembrar... Saiu se arrastando e sentiu ardor no rosto, queria se afastar da nave caso ela pegasse fogo.

Se arrastou uns metros, tonta e com dor. Levantou e andou cambaleando sem saber qual a direção seguir.

Lembrava de uma luz... Uma pessoa correndo... Um homem que falava. Tocou a testa e recordou.

Estava no planeta Terra.

Quando o entendeu sentiu sua voz dividida entre a calma e o nervosismo, suas mãos a tocando devagar, tentando tranquilizá-la.

E gostou daquilo.

Sua cabeça latejava e um som estranho lhe chamou a atenção. Moveu a cabeça e viu o homem á sua frente. Com certeza tinha sido ele quem a salvara.

Deitado em uma poltrona grande com os pés esticados em um banco, uma manta vermelha escura por cima até o pescoço.

Olhou em volta devagar, a cabeça pesada. Não havia mais ninguém por perto.

Olhou-o de novo. O cabelo loiro escuro caía em sua testa larga. Rosto quadrado, nariz grande, lábios bem delineados e o que a fez sorrir, um furo no queixo.

Achou engraçado... E atraente.

Ela abriu mais os olhos quando ouviu de novo o som estranho. Era ele quem roncava. Dormia e seu peito se elevava e abaixava no ritmo tranquilo do sono.

Ele estava mais perto da lareira e o fogo iluminava seu rosto marcante. Bocejou e voltou a cerrar os olhos, caindo no sono novamente.

Um tempo depois Amina acordou de novo. Esfregou os olhos e sentiu algo em sua testa. Tocou devagar com a ponta dos dedos.

Era um curativo que descia pela lateral de seu rosto. Lambeu o lábio e sentiu ardor. A cabeça ainda doía, mas agora não como antes, dava para suportar.

Tinha um inchaço na testa. Não sabia quanto tempo ficara desacordada. Pode ter sido horas ou até dias. Nem sabia onde estava.

Olhou para a poltrona e a manta estava dobrada em cima do banquinho e o homem não estava mais lá.

Se segurando no encosto elevou o corpo e a cabeça latejou forte. Fechou os olhos se sentindo fraca ainda. Respirou devagar.

Não apenas pelo acidente, mas sabia que a diferença de gravidade ali fazia seu corpo reagir de outro modo. Teria que ir se adaptando aos poucos.

Fez esforço e sentou bem devagar, jogando a manta colorida de lado e ficou um tempo quieta, respirando lentamente, aliviando a pressão da cabeça. Respirou fundo e devagar. Repetiu.

Olhou o cômodo com cuidado.

Uma sala de concreto e madeira com a lareira de um lado. Portas grandes e janelas altas com cortinas. Muito diferente do que estava acostumada, mas lembrava de ter visto imagens de lugares assim.

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