JANTAR DE BOAS VINDAS E CAVALGADA NOTURNA

Uma semana se passou desde a chegada de Lidia e da senhora Diana Elliot-Crowford, uma semana tranquila, a comunidade da Ilha Sul poderia dizer, obviamente que as convidadas do governador eram o assunto do local. Como é possível prever, não havia muito para se ver ou falar em Ilha Sul.

 Diana, a fama já lhe precedia, mas ficara ocupada de mais, cuidando dos assuntos da propriedade que o marido deixara, fora um ou outro comentário sarcástico e a recusa total de frequentar a missa, a senhora Elliot-Crowford não causou muito alvoroço.

 Antes que se perguntem sobre Lidia, é preciso informar que nada para ela era espantoso ou incomum. É claro que haviam assuntos incômodos e que a levavam a choques momentâneos, esses normalmente eram resolvidos com intervenções acaloradas da própria Lidia. Por tanto, se algo ocorreu que possa ter chocado aos cidadãos locais, Lidia ignorou totalmente…

 Talvez, não fosse um pequeno jantar de boas vindas dado um dia após a chegada das duas senhoras a Ilha Sul. Na opinião de Lidia havia sido bastante regular, despretensiosamente dramático e se ela fosse se arrepender de algo, seria apenas do transtorno que possa ter vindo a gerar para Travis e Kat, apesar de saber da concordância de ambos quanto aos eventos que se passaram.

 A noite começara bem, estranha, porém bem. Uma intrigante mensagem de padre Maugham havia chegado, informando que não poderia comparecer, devido forças além de seu poder. Kat adivinhou que seria algo de cunho religioso, Travis uma dor de barriga devido o habito de comer frutas exóticas, que padre Maugham desenvolvera ao chegar na ilha, Lidia riu de ambos e subitamente lhe ocorreu que a causa por trás da ausência de padre Maugham seria a presença da senhora Elliot-Crowford, mesmo que esta não parecesse se afetar. Travis encerrou o assunto deixando tudo ainda mais curioso para Lidia.

– Estranho é, desde quanto padre Maugham, ou qualquer clérigo, negam comida boa e de graça?

 Kat que terminava a decoração da mesa de jantar, sacudiu a cabeça com falsa reprimenda, chamando-lhe a atenção.

– Governador!

 Lidia ria dos comentários do casal, recebendo em troca um olhar cúmplice do irmão.

 Mais tarde Lidia faria maiores apontamentos sobre a questão. Mesmo preferindo não comentar o assunto, devido sua chegada recente, achara intrigante o comportamento do padre quando próximo a Diana.

 Pode observar também, que padre Maugham parecia extremamente aliviado ao não ver a senhora Elliot-Crowford na missa de domingo, dois dias após o jantar.

 Os primeiros a chegar foram o senhor e senhora Hardy, muito bem-vestidos, muito bem alinhados, muito bem entediantes. Porem convidados, por isso todos sorriram e celebraram a chegada

– Ah a educação dada por Condessa de Lewis tinha surtido efeito – pensou Lidia ironicamente.

 Quando ouviu o barulho da carruagem lá fora julgou ser Peter e Matilda, na intenção de repetir a ação da noite anterior, sentia-se um cavalariço bastante hábil naquela noite, desceu veloz as escadas da mansão em direção aos visitantes. Sua surpresa foi, apenas o Doutor Bysshe descia do veículo.

 Quem conhece Lidia, sabe que normalmente ela costuma ser educada, mas naquela noite, havia algo em seu peito, como se soubesse que o clima não seria de festas e boas vindas, então antes mesmo de cumprimentar polidamente o médico, dirigiu-lhe uma saraivada de questões…

– Oh, onde estão? - Doutor Bysshe observou a jovem com certo divertimento – Pensei que Peter e Matilda viriam com o senhor… - Lidia disse com dramaticidade – Eles estão vindo? Acredita que demorem? O senhor esteve com eles hoje, certo?

 Victor riu da apreensão de sua anfitriã.

 Agora algo mais sobre Victor Bysshe, normalmente os sorrisos não eram arrancados facilmente do médico, tinha visto e ouvido o suficiente de dor e amargura em suas andanças pelo mundo, doenças e fraquezas humanas que haviam lhe endurecido a alma, desacostumara a sorrir.

 O que ele constatou na noite anterior e acabou por se confirmar naquele momento, o impetuoso e também caloroso comportamento de senhorita Lidia, não apenas o surpreendia – Afinal, quanto tempo faz que não vejo paixão nos olhos de alguém? - Mas também o divertia ao ponto de fazê-lo sorrir outra vez.

– Então? - Lidia questionava o doutor que mesmo diante dela parecia não ouvir.

– Também é um prazer revê-la, senhorita Lidia – Victor fez uma leve reverencia, arrancando um sorriso constrangido da garota, aquilo o fez sorrir ainda mais – Sinto informá-la, minha senhora. Creio que o Capitão e Matilda não poderão vir esta noite.

– Por que? - Uma Lidia bastante enfática arguiu Victor.

– Temo que eles não me informaram…

– Doutor, que bom vê-lo – Era Travis, vinha em auxílio de Victor, conhecia a irmã e sabia que, dado o clima no Porto, o comentário feito na carruagem enquanto voltavam para casa quando de sua chegada e o esnobismo clichê da Senhora Hardy, Lidia não desistiria tão facilmente de saber o porque da ausência de seus amigos.

– Governador, é um prazer…

– Vejo que minha ansiosa irmã o entretinha com algumas perguntas.

 Travis caminhou ate eles colocando as mãos sobre os ombros de Lidia, como uma tentativa de fazê-la cumprir o mínimo de etiqueta social, ela se desvencilhou parando ao lado do irmão com um sorriso inocente.

– Senhorita Lidia estava me recebendo – Victor disse com voz suave – como médico já estou habituado a perguntas que nem sempre tem uma resposta fácil, mas admiro o vigor demonstrado pela jovem Lidia.

 Doutor Victor Bysshe fez um aceno reverente e sorriu para os dois irmãos, recebendo em troca o olhar cúmplice de Lidia e a expressão de espanto de Travis, afinal em quase três anos na Ilha, o governador pensou que era a primeira vez que vira o médico sorrir tao francamente.

– Bom, então entremos? – convidou-os Travis com um gesto de mãos.

– Em seguida… - Respondeu Lidia, ao que parecia um misto de aborrecida e distraída.

 Mais uma informação sobre Lidia, dificilmente ela era pega distraída – Ha muito para ver e sentir, não tenho tempo para fingir que não vejo e não sinto – era o seu mote.

 Travis sabia disso, dentro do que é possível um irmao mais velho saber, pois sendo a garotinha da casa, Lidia sempre soubera manobrar seu irmao ao ponto que desejava. É claro ela estava triste pela ausência dos amigos, Travis pensou que ela precisaria de tempo para se recuperar, negando totalmente o instinto que lhe avisava – Lidia, vai buscar outra solução, uma melhor do que apenas suspirar sob as estrelas.

 Assim que os dois homens passaram pela porta de entrada, Lidia agilmente deu a volta na mansão em direção aos estábulos. Lá encontrou os quatro cavalos de tração que conduziam a carruagem da casa, mais dois cavalos de montaria, Nocturno, aquele que seu irmão costumava montar e o de Kat, resolveu ficar com a linda égua marrom que Kat montava, Filosofia.

 Lidia amarrava a sela ao animal quando das sombras viu surgir um vulto.

– Deus! Você quase me mata – Lidia levou a mão ao coração – Você deve ser Allen, companheiro de Selene? Sou Lidia.

 A garota se apresentou estendendo a mão ao rapaz ainda parado observando-a.

– Você é Allen certo? - Lidia sacudiu a mão estendida na direção de Allen para que fosse apertada.

– Sim, sou Allen – Lidia sorriu.

 O rapaz caminhou ate ela, timidamente apertando a ponta de seus dedos e tirando de suas mãos a tarefa de selar a égua Filosofia.

– Oh Allen, eu não sei como agradecê-lo – Sussurrou uma precavida Lidia, olhando para todos os lados.

– É meu trabalho, senhorita Lidia – Respondeu um respeitosamente sério Allen. Lidia deu uma risadinha abafada e respondeu em um cochicho.

– E sem dúvida você é melhor que eu nisso – Lidia checou a segurança da sela.

– Mas lhe agradeço por me ajudar a subir em Filosofia – Já que com esse corset é impossível, pensou Lidia.

– E também por sua discrição ao não informar que acabo de requisitar a montaria da senhora Lewis para um passeio noturno.

 Sorriu para Allen e teve a impressão de quase arrancar um sorriso dele. Lidia e sua nova companheira de aventura, Filosofia, partiram sob as estrelas.

 Matilda morava, Kat havia indicado quando se dirigiam para a casa no dia anterior, não muito longe dali. Filosofia em um trabalho de bastante colaboração para com Lidia, levou-a ao seu destino sem nenhum per causo. Infelizmente, ela não calculara o trabalho que teria para descer da égua quando chegasse a seu destino, saias, corset e botinha.

 Lidia praguejou por não poder usar calcas ou apenas roupas mais confortáveis. Lembrou da insistência da mãe, para que fizesse mais aulas de hipismo e do trabalho que tinha em burlar a companhia das damas para refugiar-se na biblioteca do clube.

– Sua mãe estava certa Lidia… ela estava – Lidia bufava e praguejava – Ao menos você saberia descer dessa altura usando um instrumento de tortura amarrado ao corpo.

 Sussurrava pragas que fariam corar um marinheiro, enquanto descia desastradamente de Filosofia, ainda alisando as saias e alinhando o cabelo bateu a porta de Matilda.

 Foi a própria quem atendeu, atônita pela visão de uma Lidia descabelada e com uma estranha mancha marrom no rosto. Lidia levou a mão até o rosto, no ponto que Matilda fixara o olhar, tranquilizou a nova amiga.

– Ah! É apenas barro… – Riu sem jeito e tentou arrancar a mancha da face.

– Então, vamos?

 Peter com olhos arregalados, porém um pouco mais habituado com os comportamentos pouco ortodoxos de Lidia, em seguida apareceu atrás de Matilda.

– Lidia! Você enlouqueceu?

 Ignorando totalmente o que dizia Peter, apesar de notar o olhar reprovador que Matilda lançou a ele, por chamar a visitante de louca, Lidia continuou a falar.

– Vocês já estão prontos? É possível que eu e Matilda possamos voltar montadas em Filosofia – Apontou para a égua parada a sua espera – grande companheira… Peter, você pode vir correndo ao nosso lado – sorriu inocentemente com a própria pilheria.

– Mesmo Lidia?

 Lidia, ao que parecia, irritara ligeiramente a Peter.

– Calma, estou brincando, é obvio que sei que você tem um cavalo! – Lidia respondeu no mesmo tom, Peter rangia os dentes para conter a carraspana que pretendia passar em Lidia, Matilda notou.

– Oh pare Peter, Lidia entre por favor – Puxou pela mão a garota que continuou a falar.

– Certo? Podemos ir? - Olhou para Matilda, que apertou os lábios em uma linha de preocupação, como se ponderasse algo.

– Não, não mesmo Lidia – Peter estava realmente zangado – Você tem um jantar…

– E vocês também – respondeu uma Lidia bastante autoritária que ao fim, suavizou as feições para convencer ao amigo, lembrando a ele a garotinha impertinente e esperta de 10 anos que Lidia fora.

– Por favor Peter, eu sei o que está acontecendo, mas o jantar é para mim e para Diana, e nós somos amigos. Vocês gostaram da Diana, não?

– Lidia, é complicado… - Peter tinha iniciado a falar, quando foi interrompido pela mão erguida de Matilda. Lidia olhava para a mulher a sua frente.

– Vamos Matilda… o Doutor Bysshe já está lá… Nossos amigos estão lá – Lidia sorriu para Matilda, recebendo em troca um sorriso também.

– Você me ajuda com o corset? - Matilda perguntou erguendo a sobrancelha para Lidia – E você, vá por uma camisa limpa, Peter.

– Será um prazer ajudá-la – As duas soltaram risinhos e seguiram ate o quarto de Matilda, deixando parado a porta um boquiaberto Peter, que logo, para sua segurança, recobrou a atenção e foi trocar a camisa.

 O jantar do governador já estava atrasado em mais de duas horas, quando Lidia e Matilda chegaram de carroça, ao seu lado um alinhado Peter era carregado por uma inquieta Filosofia.

– O que é que há com essa besta? - Peter resmungou com mau humor.

– É exatamente isso que Filosofia tem se perguntado.

 Lidia riu da própria piada, recebendo uma careta de falso desgosto de um Peter bastante corado. Reparou na apreensão de Matilda.

– Não se preocupe, Matilda. Você é minha convidada – Lidia sorriu para a amiga, segurando a mão que guiava a carroça, Matilda sorriu timidamente.

 Lidia não pretendia ser a garota branca que levanta a defesa da garota negra, em absoluto, na verdade o ponto era bem simples, eram seus convidados e ela manteria seus amigos próximos e acolhidos, protegendo-os com amor e, se preciso fosse, com ira, daqueles de mente estreita.

 Assim que acomodaram os animais no estábulo, com a ajuda de um Allen de olhos arregalados, encontraram um apreensivo porém não surpreso Travis na entrada da mansão, aguardando-os.

 Nenhuma palavra foi dita. Lidia notou a surpresa dos Hardy, nada novo quando eram tao óbvios, uma Diana reclamando pela fome, o horário e a idade, mas receptiva e risonha com os recém-chegados.

 Travis mantinha-se sorridente e cortês, mas Lidia sabia, teria contas pendentes com o irmão para acertar mais tarde. Já Kat, continha um sorriso malicioso, mantendo a pompa de primeira-dama, seu olhar era divertido e assim que viu a jovem cunhada lançara-lhe uma piscadela cúmplice.

 Victor olhava de boca aberta os três recém-chegados, depois sorrindo para todos, adquiriu uma estranha expressão de satisfação, que parecia transbordar por seus olhos, ao menos foi a impressão que todos tiveram. Muitos diriam depois, que nunca haviam visto Victor Bysshe tao satisfeito e relaxado em uma reunião social, muitos mais especulariam o porque.

 Kat caminhou até a cunhada e discretamente arrumou o laço de seu cabelo – em um sussurro Lidia confidenciou.

– Porque você não viu o estado em que cheguei lá – Kat conteve o riso para o bem da imagem de esposa do governador.

 O jantar corria tranquilo, assuntos locais e olhares intrusivos, tudo que Lidia estava acostumada, desde que se lembrava. Devido sua cavalgada noturna, Lidia preferiu se abster dos assuntos polêmicos, como a distribuição de terras no território ou a influência estrangeira na estrutura social local, mesmo que para isso tenha mordido a língua incontáveis vezes. Sabia que novas oportunidades se apresentariam, sorriu para si mesma.

 A noite seguia dentro dos limites do tolerável até que senhora Hardy, não se dando por vencida, após várias tentativas de abordar o atraso do jantar, fixou sua atenção no Capitão Pratt, não sem antes, com língua ferina, cutucar a dona da casa.

– Aproveitando a oportunidade de tê-lo em nossa companhia, capitão – a mulher disse, lançando um olhar de esguelha para Kat.

– Se me permite, observei que o senhor e a senhorita Lidia parecem ter um forte vínculo.

 Todos notaram o mal estar crescente que se instaurou. Peter pálido, olhou nervoso para Matilda, que não levantou os olhos do prato. Lidia, indignada ainda formulava as palavras que esbofeteariam a senhora Hardy, quando Victor falou.

– Senhora Hardy… – O médico tinha expressão serena e voz calma, como se falasse com um moribundo.

– Também eu notei isso. Creio que o nome para o comportamento de ambos seja irmandade, afeto, amizade… – A audiência prendeu a respiração, como se soubessem que algo mais viria.

– E também entendo que para mulheres como a senhora, tais sentimentos sejam difíceis de conceber – Olhos arregalados dançavam entre um Victor bastante relaxado e uma senhora Hardy com ares de desmaio – Conheço a história das damas de sociedade da sua geração e anteriores. Me entristece que seja assim, que mulheres não tenham outras opções, como nos temos…

 Victor lançou o olhar para os homens a mesa, então voltou a fixar sua atenção na senhora Hardy.

– Mulheres criadas como servas mas ornamentadas com belos vestidos, é possível que nunca tenham sabido o que é o amor.

 Paula Hardy apertava os dedos contra a toalha branca ao lado de seu prato, fez menção de falar, Victor não lhe deu abertura.

– O que lamento senhora… É que mesmo com tanta frustração, ao vermos novos comportamentos, que poderiam nos libertar desse odioso status quo, julgamos e difamamos. Como se houvesse alegria em estarmos até o pescoço nesse lodaçal de avareza e preconceito.

 Todos seguiam em silêncio. Senhora Hardy pareceu querer balbuciar uma resposta, mas foi impedida por um senhor Hardy, ao que parecia, bastante constrangido. O choque de todos foi interrompido pelos risos e o comentário de Diana Elliot-Crowford.

– Bem dito doutor, bem dito…

 Diana estava quase as lágrimas com seu riso, erguendo uma taca completou.

– Esses dois são apenas amigos – apontou com a mão que segurava a taça para Lidia e Peter – Sei que são, só de olhar pra eles. Mas eu já tive um caso com um primo.

 O delírio dos espectadores se intensificou.

– Ele parecia com você – senhora Diana Elliot-Crowford piscou para o governador.

 Antes de qualquer reação dos anfitriões, uma senhora Hardy bastante contrariada, levantou-se de forma brusca, seguida por seu marido, que permanecia calado. Katherinne tentou acalmar os ânimos.

– Senhora Hardy, por favor, estamos apenas conversando…

– Não primeira-dama, sinto muito. Acabo de ser ofendida e… - Senhor Hardy tentou intervir.

– Paula, por favor, você está exagerando…

– Exagerando? - Paula Hardy gritava com o marido.

– Estão fazendo chacota comigo, eu não vim essa noite para ser ofendida.

 Disse lançando um olhar raivoso para Matilda e Lidia, Paula Hardy virou as costas e saiu apressadamente da sala. Ainda segurando o guardanapo que estivera em seu colo, Karl Hardy, falou.

– Sinto muito. Peço desculpas a todos pelo comportamento irracional de minha esposa. Senhora Lewis – Hardy gesticulou para que Kat voltasse a se sentar.

– Por favor não nos acompanhe, já está suficiente…

 Travis já estava de pé quando também foi interrompido.

– Governador… falaremos amanha? – Com um aceno gentil Travis confirmou.

– É claro, meu caro, amanhã nos vemos na sede do governo.

– Senhoras, cavalheiros… – Karl Hardy despediu-se educadamente.

 Katherinne fez sinal para que Selene os acompanhasse.

 Sem muito o que fazer, Kat convidou a todos para um café na sala de música, tocaria para os amigos. Se realmente as mentes ali estivessem prontas para a calma de um recital, mas elas estavam…

 Era a calma da burguesia, idos os agentes da discórdia, a normalidade se instaurou como se nada tivesse acontecido. Kat, ao piano tocava cantatas de verão, Travis mantinha-se ocupado contra os galanteios quase cômicos de Diana, Peter e Matilda lado a lado observavam a pianista.

 Mas foi Victor quem chamou a atenção de Lidia, ele a estava observando, a garota se aproximou.

– Doutor Bysshe…

– Victor, está bom se lhe for conveniente, senhorita Lidia.

– Então… Lidia está bom, Victor.

Lidia sorria para Victor brilhantemente, ele notou que poucas pessoas que conhecia sorriam assim para ele.

– Quer falar sobre o que acaba de acontecer?

– Apenas agradecer-lhe, é claro que eu adoraria ter sido aquela que levaria luz a senhora Hardy, mas…

– E eu tenho certeza que o faria muitíssimo melhor, principalmente porque falaria de seu lugar de direito como uma jovem mulher – Victor sorria para Lidia – Mas você é a irmã do governador, enquanto eu sou o único médico da ilha…

 Lidia ergue uma sobrancelha e lançou um sorriso de lado para Victor.

– Senhora Hardy não pretenderá se consultar com curandeiros, tenho certeza, creio que minha fala tenha salvo todas as reputações.

 Victor sorriu, mas a expressão estava cansada, Lidia respondeu sorridente.

– Talvez não a de Diana – sussurrou a segunda parte – Mas creio que esse era o objetivo dela.

 Victor não sabia o porque, não na primeira camada de seu ser, mas por dentro algo crescia. Algo doce e quente, como nunca sentira antes.

– É como derreter – Pensou, sentia um tipo novo de prazer. Passou anos com sua vida regular, fazendo o que podia para equilibrar as diferenças, não via razões para os conflitos, apenas fazia sua parte.

 Mas, foi com vergonha que Victor se deu conta, nada efetivo fazia, toda a estrutura social seguiria a mesma se não houvesse uma ação real, a roda social não deixaria de girar, inclusive, graças a manutenção de não conflito do próprio doutor.

 Ao ver o que Lidia fizera, não como uma heroína que resgata alguém, apenas como alguém que deseja estar com os seus por perto, se deu conta que pouco fazia para quebrar aquela ciclo de preconceito e violência em que todos, inclusive ele, estavam presos.

 Seria possível que a coragem de Lidia mostrasse as pessoas suas fraquezas? Lidia acreditava que poderia mudar o status quo, como médico da Ilha Sul, ele sabia que poderia ajudá-la.

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