Capítulo 4 - Alexander

Fiquei mais tempo do que eu previa no jardim e quando percebi já estava anoitecendo. Eu ficava tanto tempo sozinha comigo mesma que era normal aquilo acontecer: eu perder completamente a noção do tempo.

Quando estava voltando para adentrar no castelo, vi Alexander vindo em minha direção e não pude deixar de observar o quão lindo ele havia ficado com o tempo.

- Você está louca? – ele perguntou.

- Quem você pensa que é para falar comigo desta maneira?

Ele me encarou e pareceu tentar se acalmar, ficando alguns minutos em silêncio. Mas eu sentia sua respiração acelerada:

- Desculpe, Alteza. – ele curvou-se, mas eu sabia que aquilo era de forma irônica.

- Do que você está me acusando exatamente, Alexander?

- Por que você quer sair de dentro do castelo? Acha mesmo que isso é prudente?

- Meu pai permitiu. Você não manda em mim...

Andei de novo e ele me segurou levemente pelo braço:

- Satini, isso é loucura.

- Alexander, não é. Eu tenho cinco meses para viver antes de me casar com uma pessoa que eu não conheço... E talvez ir embora de Avalon para sempre.

- Lembra quantas vezes eu lhe disse o quanto o mundo é perigoso fora destes muros, Satini?

- Ainda assim eu não me importo.

- Você é o futuro de Avalon. Não entendo como o rei Stepjan permitiu isso.

- Pense pelo lado positivo, Alexander: ele confia muito em você.

- Eu não posso assumir esta responsabilidade. Você é a futura rainha de Avalon e estará sozinha, sob minha proteção... Unicamente minha proteção.

- Não se acha capaz, Alexander? – desafiei.

- Você não mudou nada... – ele disse.

- Mudei... Eu beijo melhor que você agora. – me atrevi, olhando para seus braços fortes sob a camisa.

- Satini, você não tem nada na cabeça... E isso não muda nunca.

- Eu vou sair e você será meu guarda, Alexander. Assim meu pai decidiu. E assim você fará.

Puxei meu braço das mãos dele e saí. Quem ele pensava que era para falar comigo daquela maneira? Antes de entrar na porta, virei para ele, que me encarava:

- Saímos amanhã mesmo. – eu disse.

- Que horas, Alteza?

- À tarde... E depois à noite novamente.

Ele fez uma reverência propositalmente errada e saiu. Eu teria problemas com Alexander. E já previa isso. E talvez por este motivo meu pai escolheu ele para me proteger.

Tomei um banho na banheira de hidromassagem do meu quarto. Eu tinha tantas criadas quanto eu quisesse, mas eu sempre recusava todas. Gostava de ficar sozinha. E era acostumada à solidão quando minha amiga Mia não estava comigo. Eu senti meu coração palpitar de tanta felicidade enquanto sentia a água morna no meu corpo.

Saí da banheira e olhei-me no espelho gigantesco, me analisando. Embora eu fosse morena, minha pele era clara devido ao pouco sol que eu pegava. Tomava frequentemente reposição de vitaminas pela vida que eu levava. Eu era magra, embora comesse bem. Meus cabelos castanhos iam até o meio das costas e não eram completamente lisos quando eu não os secava com o secador e não escovava. Embora meu pai tivesse lindos olhos azuis, eu não havia herdado isso dele. Meus olhos eram castanhos claros, por vezes definidos como cor de mel e eu os via exatamente como os de minha mãe em alguns poucos quadros que havia dela. Eu não era uma garota comum. Sempre fui muito bem cuidada e mesmo que minha beleza não fosse natural, eu tinha todos os meios para ficar bela caso quisesse, podendo ter tudo que eu precisasse para isso. Eu era vaidosa, mas não muito. Era um ponto que eu precisava tentar melhorar.

Deitei na cama nua e me cobri. Tudo que eu queria era dormir e esperar ansiosamente pelo dia de amanhã: minha liberdade e exploração fora do castelo.

Acordei com Mia e Léia me trazendo o café da manhã.

- Podem pegar uma roupa para mim? – pedi.

Mia abriu a coberta e me olhou:

- Você dormiu nua, princesa?

- Sim... O que tem isso?

- Menina, você está rebelde nos últimos tempos. – disse Léia.

- Sou uma garota de 17 anos. Isso não é normal?

- Não para uma futura rainha, com toda uma responsabilidade sobre você. – ela disse.

- Eu só quero ser uma garota normal por alguns dias. – me limitei a dizer.

- Você não é uma garota normal, Satini Beaumont. E nunca será. Você nasceu princesa e herdeira do trono uma nação.

Eu expirei, revirando meus olhos. Ela riu:

- Você não revire os olhos para mim, garota.

- Minha mãe está brava, princesa. – disse Mia sentando na minha cama e me entregando o roupão, que eu coloquei.

Fui até o toalete e fiz minha higiene.

- Hoje é o primeiro dia da minha liberdade. – falei enquanto entrava no closet e procurava uma roupa sem saber exatamente o que vestir.

Mia pegou um vestido rodado floral e me entregou:

- Eu não sei se você tem algo apropriado para vestir lá fora. Mas acho que por enquanto isso vai dar. Suas roupas são caras e chamam a atenção pelas marcas.

- Eu quero usar jeans. – falei ansiosa.

- Não pode, querida. – falou Léia.

- Eu... Tudo bem. – falei colocando o vestido sem contestar. Eu usaria jeans da mesma forma e Léia não saberia.

Léia arrumou a pequena mesa de café da manhã nos meus aposentos e saiu. Mia sentou na outra cadeira, na minha frente.

- Está ansiosa?

- Claro, Mia. Acho que hoje é um dos dias mais felizes da minha vida.

- Minha mãe não entende como seu pai permitiu. Ela acha que pode haver algo por trás. Ela sempre desconfia das atitudes do rei.

- Não acho... Léia que é muito zelosa e preocupada.

- E seu pai não deveria ser ainda mais?

Dei de ombros:

- Não me importo. Eu estou feliz e nada vai tirar isso de mim hoje.

- Aonde você quer ir?

- Por enquanto qualquer lugar que seja fora destes muros. Sei que já saí algumas vezes, mas somente para algumas compras. Eu nunca soube o que é realmente fazer algo que uma pessoa normal faz. Entende o isso significa para mim, Mia? É uma oportunidade única. Neste momento eu até agradeço meu pai por ter me escondido a vida toda da mídia.

- Sim... Agora ninguém sabe que você é a princesa Satini, futura herdeira do trono de Avalon. Eles sequer sabem que você vive aqui dentro, depois de seu pai ter espalhado que você estudava em outro país.

- E nem a filha do rei odiado. – lembrei.

Nos viramos ao ouvir  Alexander.

- Como você entra aqui sem bater, Alexander? – critiquei.

- Eu bati. Vocês que não ouviram.

- Mentiroso.

- Preciso acertar os detalhes de onde iremos e como vou organizar sua segurança.

- Ainda assim não tem o direito de entrar no meu quarto desta forma. – provoquei.

- Desculpe, Alteza. – ele disse se curvando.

Eu odiava quando ele fazia aquilo. Embora soubesse que era o correto, nunca o considerei um súdito. Nos criamos juntos e mesmo que brigássemos feito cão e gato depois que crescemos, ele era como um irmão para mim e às vezes eu ficava ofendida quando ele ironizava o fato de eu ser a princesa.

Levantei e disse firmemente:

- Saímos depois do almoço.

- Você vai com esta roupa? – ele disse me analisando.

- Foi o melhor que eu consegui no gigante closet dela, acredite. – disse Mia.

Ele veio até mim e pegou uma mecha dos meus cabelos, colocando atrás da minha orelha. O fitei confusa com o toque gentil dele.

- Retire os brincos. – ele disse seriamente. – Os anéis, a pulseira... Tudo.

Fiz o que ele mandou. Deixei tudo sobre a mesa.

- A roupa dela vale mais que uma casa da Coroa Quebrada. – ele disse olhando para Mia.

- Seu idiota. – eu falei. – O que mais você quer de mim? Vai lá e diga para o meu pai que não quer o trabalho e pronto, já que acha tão ruim fazer a minha segurança.

- Se eu me recusar a protegê-la, você não sai. – ele disse ironicamente, cruzando os braços.

- Saio sim.

- Não mesmo. Ele disse que só permitiria você fora dos muros do castelo de Avalon comigo. – ele se gabou.

- Vendido.

Ele pegou meu braço com força e olhou nos meus olhos:

- Nunca mais me diga isso.

Mia retirou o braço dele e disse:

- Chega. Vocês não podem sair por aí brigando deste jeito. Isso não vai dar certo. Temos alguns meses juntos... E fora do castelo.

- Quando eu assumir o trono vou bani-lo para outro país. – eu disse.

Ele riu divertidamente:

- Você não tem este poder, nem enquanto rainha. Não estamos na era medieval, onde reis e princesas faziam isso. Verá quando sair lá fora. Seu mundo de contos de fadas não existe.

- Me desculpe. – falei abaixando meus olhos. Eu não deveria falar que iria bani-lo. Aquilo foi cruel.

- Eu que peço desculpas, Alteza. – ele disse.

- Eu... Não quero brigar, Alexander. Eu preciso de você, por pouco tempo, eu prometo. Será que pode fazer isso em consideração ao tempo que vivemos juntos, enquanto éramos crianças e nos amávamos e nos respeitávamos?

- Eu... Posso. – ele disse.

- Meu pai o compensará sendo o capitão da guarda pelo que sei.

- Sim...

- E isso o deixa feliz? – perguntou Mia.

- Sim... Muito. É um privilégio ser o capitão da guarda. Sei de muitos homens que quereriam este lugar.

- Aonde vamos? – perguntou Mia empolgada.

- Pensei em primeiro darmos uma volta no mercado público. – ele disse. – O que acha, Alteza?

- Pode ser.

- E eu soube que você também deseja sair à noite. – ele observou. – Aonde seria?

- Uma casa noturna.

Ele expirou, colocando a mão na testa:

- Isso é muito para mim.

- Não é nada, Alexander. Eu sei que você consegue. – animei ele.

- O que vai usar para proteger a princesa? – perguntou Mia.

- Uma arma... Escondida.

- E... Você sabe usar? – perguntei curiosa.

- Claro que sei, Alteza. Ou não me atreveria a usar.

- Já matou alguém, Alexander?

Ele riu:

- Não... Mas tenho permissão para matar se alguém se aproximar de você.

Eu sorri:

- Não vai precisar. Tudo vai correr bem, eu garanto.

Por incrível que pareça a manhã demorou tanto a passar que fui várias vezes até o relógio para me certificar de que ele estava funcionando corretamente. Ao meio dia desci para o almoço e comi sozinha, como sempre. Meu pai geralmente comia no escritório ou na sala de jantar das visitas, pois era raro o dia que não havia alguém importante politicamente no castelo. Fora os homens que pertenciam à corte real, que com frequência estavam pelos corredores do castelo.

Não tínhamos o hábito de termos os pratos servidos por criados. A comida era posta na mesa, de acordo com nossos gostos. Havia uma pessoa de confiança do meu pai que provava todos os alimentos que se destinavam a mim e a ele antes de serem ofertados a nós. Meu pai tinha um incrível medo de qualquer coisa que fosse destinada a ele estar envenenada. Então ele usava alguém, que ele pagava imensamente bem, para morrer primeiro em seu lugar caso alguém tentasse acabar com a vida dele. Eu achava pouco provável que alguém fizesse aquilo, afinal, as excentricidades do meu pai já eram conhecidas em praticamente todo o mundo. E o fato de ele ter aquele hábito já havia sido noticiado em vários tabloides internacionais. Porém, o fato de meu pai ter medo de veneno na cozinha acabava assustando todos os convidados para se alimentar no castelo. Então passou a ser tradicional a comida ser servida em travessas e não nos pratos individualmente.

Comi tão rápido que cheguei a ter um pouco de mal estar quando levantei.

- Estou pronta. – falei para Léia.

- Estou nervosa. – ela disse.

- Vai dar tudo certo, mamãe. – Mia disse pegando a mão da mãe.

Eu abracei Léia:

- Eu sei que você se preocupa comigo, Léia. Mas é o mesmo que quando Mia sai do castelo.

- Não é, querida. Você é a princesa e eu não entendo como seu pai permitiu isso.

Eu dei de ombros e desci junto de Mia. Alexander nos esperava na porta principal. Assim que vi o sol lindo na rua, aspirei profundamente o ar dentro dos meus pulmões e disse:

- Avalon, se prepare para receber Satini Beaumont.

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