Capítulo III

João Felipe

Acordei com uma dor de cabeça terrível. Nada fora do normal, pois eu tinha exagerado na bebida ontem e sabia que haveriam consequências. Sempre tinha, quando o assunto era bebida em excesso.

Cheguei à cozinha a procura de alguém que pudesse me dá um analgésico, mas apesar de estar tudo em ordem, não havia ninguém por lá. Lembrei então que era domingo, dia de folga de quase todos os funcionários da casa.

Subi a procura do meu irmão, bati em sua porta e chamei repetidas vezes, mas ele não respondeu. Tentei a fechadura e vi que estava apenas encostada.

Ao entrar em seu quarto e ver que ainda estava dormindo pesado, pensei que ele devia ter exagerado na bebida tanto quanto eu.

Suspirei e fui até o seu banheiro, a procura de algum remédio que pudesse aliviar essa dor infernal na minha cabeça.

Abri um dos armários e logo encontrei o que procurava, já ia saindo quando me deparei com um porta-retratos onde estava uma foto do João Pedro com a Viviane.

Parecia ser uma foto recente, em uma praia, ele abraçando-a por trás, como se fossem um casal de namorados, ou no mínimo, bem íntimos.

Aquilo me desagradou de uma forma que eu já estava habituado. Fiquei com raiva e peguei o porta-retratos de cima do balcão e a vontade era de jogá-lo bem longe foi muito forte, mas me controlei e coloquei de volta no mesmo lugar.

Não lembrei nem de pegar água para tomar o comprimido e só joguei ele na boca e fiz esforço para engolir o remédio, quando já estava de volta ao meu próprio quarto.

Desde que percebi que a filha dos empregados da mansão me tirava do eixo, decidi que o melhor a fazer era me manter distante. Minha mãe jamais aceitaria um relacionamento desse tipo. Ela esperava que eu namorasse e casasse com alguém da mesma classe social que nós.

Eu não queria decepcionar a minha mãe e evitava a Viviane desde criança. O contrário do meu irmão, que não largava a Viviane e nunca se importou com o que minha mãe falava.

Quando minha mãe ameaçava proibir a amizade entre eles, meu pai sempre intervinha e as coisas permaneciam do mesmo jeito de sempre.

Tive alguns relacionamentos nos últimos anos, mas nada muito sério. Não sei o que acontecia, mas todas as mulheres com as quais eu me envolvi, me entediavam com suas conversas e suas manias cheias de frescura.

De qualquer forma, eu também não estava à procura de um relacionamento sério no momento, era ainda muito jovem e não iria me preocupar com esse assunto ainda, queria aproveitar a minha vida de solteiro, pois depois que eu encontrar a pessoa certa, não desejo ser infiel. Quero honrar com meu compromisso.

Voltei a me deitar e assim permaneci por muito tempo, pensando na Viviane e no quanto ela está cada vez mais linda e o seu poder em me atrair.

Ela nunca saiu realmente da minha cabeça, mas eu continuava decidido a permanecer com a minha indiferença, para que ela não se aproximasse de mim e acabasse por me fazer esquecer todos os contras em me relacionar com uma garota como ela, pois me conheço o suficiente para saber que eu não enfrentaria a mamãe para ficar com a Viviane.

O que me confortava era saber que eles jamais teriam um relacionamento de homem e mulher, pois sempre se trataram como irmãos e eu tinha certeza que não deveria ter ciúmes do João Pedro. Eu esperava de todo o meu coração não está enganado. 

Viviane

Acordei tarde naquele dia, o que não era algo comum de acontecer, nem mesmo aos domingos, pois eu gostava de aproveitar totalmente o dia.

Como era folga dos meus pais, a gente passava o dia junto. Além disso, eu também gostava de me preparar para a semana de aulas na Universidade.

- Bom dia, filha! - Me cumprimentou o meu pai, quando eu entrei na cozinha, já as dez horas da manhã. - Dormiu muito hoje, eu e sua mãe já tomamos café da manhã. Mas eu posso preparar alguma coisa para você. - Se ofereceu, já se aproximando da geladeira.

- Não precisa, papai! Eu vou tomar só um café preto mesmo. - Falei, pegando a garrafa de café e uma xícara que já estava em cima da mesa.

- Você bebeu muito ontem, Vivi? - Me questionou, ficando com uma expressão um pouco triste. Ele não gostava que eu saísse com o João Pedro, pois sabia da implicância de Dona Marta comigo. Mas, assim como mamãe, eles aceitavam as minhas escolhas e apenas me davam conselhos, jamais me impondo suas opiniões.

- Não papai! Ontem era a minha vez de dirigir e não coloquei nem um gole de álcool na boca. - Falei sorrindo para descontrair um pouco. - Onde está a mamãe?

- Foi ao mercado. Mas já deve estar voltando, já faz algum tempo que saiu.

Fiquei na cozinha mais um pouco, conversando com meu pai sobre minha semana de aulas na faculdade e colocando outros assuntos em dia e depois fui para meu quarto, precisava me organizar para mais uma semana de aulas, mas acabei mesmo foi deitando em minha cama, o pensamento de volta ao encontro inesperado com o João Felipe.

Ele estava ainda mais bonito, com seu corpo de músculos na medida certa, seus lindos olhos verdes e cabelo claro. Era um homem já, com seus vinte e quatro anos, e em breve deveria assumir seu cargo na empresa do pai.

O senhor Rodolfo já estava na casa dos 60 anos e Dona Marta era dez anos mais jovem que seu marido, e apesar de ser uma mulher muito ligada às convenções sociais, não poderia dizer que era uma má pessoa. Apenas supérflua. Muito diferente de seu Rodolfo, que era extremamente gentil e controlava os excessos da esposa. Eles se equilibravam dessa forma e eram felizes juntos, eu não podia negar.

O João Pedro parecia com o pai, tanto fisicamente, pois os dois eram morenos, de olhos e cabelos pretos, como também na personalidade, enquanto o João Felipe era mais ligado a mãe e estava sempre atendendo aos seus desejos.

Ver o João Felipe de volta ao Brasil me fez ter ainda mais certeza dos meus objetivos, que era terminar minha faculdade, conseguir um emprego e ir morar sozinha, em outro lugar, longe daquela casa e longe do João Felipe.

Não queria nem pensar na possibilidade de ele ter voltado de vez ao Brasil. Não aguentaria vê-lo por aí, com seus amigos arrogantes e suas namoradas cheias de piadinhas sobre a filha da empregada, como sempre aconteceu antes.

****

Já haviam se passado alguns dias desde que o João Felipe havia voltado para São Paulo e nós estávamos conseguindo nos evitar.

Eu tinha certeza que ele também procurava evitar a minha presença. Parecia até que eu era uma mosca, pois quando estava perto de mim, ele só faltava balançar a mão para me afastar de perto.

Isso me magoava, mas eu havia aprendido a lidar com o sentimento sem propósito que sentia pelo João Felipe, que antes era apenas o carinho de uma criança por seu amiguinho e que, com o tempo e o início da adolescência, se tornou um sentimento mais profundo e carnal.

Estava pensando sobre ele enquanto voltava da aula com um colega da minha turma, o Arthur. Dividíamos muitas aulas e fazíamos vários trabalhos juntos, o que me levava a sempre que as aulas do João Pedro não batiam com os meus horários, eu voltasse para casa com ele, que morava ali perto.

Percebia que ele tinha um certo interesse em mim, mas nunca o incentivei. Apesar de ser um cara muito legal e gentil, eu não queria me envolver com ninguém no momento, pois meus planos eram a minha prioridade e só depois eu poderia pensar em relacionamento amoroso.

- Se precisar de carona para a universidade amanhã, é só me ligar.

- Não precisa se preocupar comigo, Arthur. Não vou ficar te tirando do seu caminho para passar aqui em casa.

- Não vejo problema algum em ajudar uma amiga.

Ele falou em amiga, mas a sua expressão indicava que ele esperava mais que amizade de mim, e como sempre acontecia, fiquei constrangida.

Ele era um cara lindo, com um corpo atlético e belíssimos olhos negros como a noite. Seu cabelo era cortado em um estilo militar, o que acabava por lhe dar uma aparência de garoto certinho.

Se meu coração já não estivesse ocupado por um idiota, talvez eu pudesse gostar do Arthur, pensei quando paramos em frente a mansão.

- Eu sempre vou com o João Pedro, como você sabe. Mas quando eu preciso de carona para voltar, você sempre percebe e cá estamos, como hoje. - Falei e comecei a retirar o cinto de segurança.

Me despedi dele com um beijo no rosto e um forte abraço e depois saí do carro com um aceno. Quando me virei, vi um outro carro parado do outro lado da rua, e logo percebi que era o carro do Felipe.

Ele deve ter apertado o comando para abrir o portão da garagem, pois este se abriu quando eu me aproximava da entrada de serviço.

Quando passei pelo portão, vi que ele parava o carro e acenava para que eu me aproximasse de onde estava.

- O que você quer? - Falei de forma grosseira. Não seria educada com alguém que só me tratava com frieza e distância. Estava cansada desse joguinho.

- Ter estudado em escolas tão caras não adiantou de muita coisa. Você é muito mal-educada hein, garota! - Falou e levantou os seus óculos escuros. Parecia bastante irritado. Pois então éramos dois.

- Trato as pessoas da forma que me tratam. - Respondi sem me intimidar.

- Você sabe que eu sou o patrão aqui, não é mesmo? Acho melhor me respeitar. - Disse de maneira um tanto brusca. Acho que não esperava a minha resposta tão altiva e decidiu revidar.

- Meus pais trabalham para os seus pais. Apenas. E já que não tem nada de agradável para me falar, estou seguindo meu caminho. - Falei e já ia saindo quando ele me fez dá a volta, ao ouvi-lo dizer.

- Não quero você se agarrando em frente à minha casa. Tenho certeza que seus pais não aprovariam tal comportamento também. - Falou e saiu com o carro, sem me dá mais nenhuma oportunidade de resposta.

Ele só podia ser louco, pois eu não estava me agarrando com o Arthur. Balancei a cabeça sem conseguir entender a atitude dele e segui meu caminho.

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