Vaslui

András foi para seu quarto, assim que deixou Oliver no salão de refeições. As paredes de pedra endossavam o frio que se arremetia contra a fachada do castelo naquela época do ano. Vaslui possuía um inverno rigoroso, e aquele não seria o mais brando deles, a julgar pela tempestade que sibilava lá fora. Retirou a grossa pele dos ombros lentamente, seus verdes perscrutavam o escuro, sentindo uma presença que não era bem vinda. Atirou o casaco sobre a cama ao mesmo tempo em que os braços delicados invadiram seu pescoço, enlaçando-o e unindo os lábios úmidos dela a sua orelha.

Seus olhos cerraram e um suspiro partiu de seus lábios. Sentiu as unhas lhe arranharem a pele do peito sob a camisa, que inutilmente tentava servir de barreira para suas ambições, enquanto sugava-lhe o lóbulo insistente. O louro não se movia; seus músculos todos em alerta sem provar do veneno que ela reverberava, agora, sobre a linha do maxilar até ficar de frente para ele. Os lábios rubros, lascivos, gotejando desejo sob duas contas da mesma cor.

Ainda assim, ele se manteve imóvel, ignorando-a até que as mãos alvas escorreram pelo seu dorso, alcançando-lhe a borda das calças. Os vermelhos dela nos seus verdes e a mão forte dele sobre a dela, impedindo-a de prosseguir.

Deseja-me... — Sorriu-lhe diabolicamente, passeando a língua sobre os lábios delicados. O corpo delgado sob a camisola de algodão fino, quase transparente e os cabelos ruivos, que serpenteavam ao seu redor. — Não negue! — Tentou mover sua mão e incitá-lo, mas András a apertou forte, desfazendo a malícia em seu rosto.

Deixe-me Katina — despejou, empurrando-a para longe.

Fitou-o furiosa enquanto acarinhava a mão maltratada e András passava por ela, retirando a camisa. Os músculos bem feitos tomando seu campo de visão enquanto sentava-se à beira da cama, de costas para ela, e começava a retirar suas botas.

Silenciosamente, esgueirou-se pelos lençóis, cínica, provocante, alcançando-o novamente. As unhas rasgando veios de sangue na pele clara dele, sendo consumidos pela boca faminta dela até alcançar-lhe a base do pescoço e os caninos se tornarem salientes. Pronunciando-se sob os fios louros. O frenesi que tomou seu corpo no prenúncio de sorvê-lo. Os movimentos de András suspensos. Os olhos cerrados em busca do controle que ameaçava deixá-lo.

O colo que ela alcançou sem permissão, molhando insistente o local da mordida enquanto se encaixava ao corpo dele. Esfregando pele na pele, suando. A camisola erguida até suas coxas, suas mãos retendo-lhe o rosto conforme buscava-lhe a boca. Os caninos rangendo-lhe a entrega... E os olhos de András que se abriram, rubros como o sangue, encarando-a.

A luxúria exposta em cada centímetro desnudo de pele dela e a força dos braços dele, atirando-a contra a janela a sua frente. Erguendo-se violentamente da cama e preparando-se para um novo golpe enquanto ela se segurava às cortinas, arrancando-as da parede para caírem ao chão junto com seu corpo num baque seco.

Os olhos rubros dela erguidos aos dele.

Saia Katina! — ordenou em rubros intensos enquanto ela se levantava do chão. — Não quero machucá-la... Apenas saia daqui como entrou.

Ela arfava, a raiva pelo repúdio dele consumindo-lhe as entranhas.

Não é indiferente a mim, András.

Não sou seu brinquedo, é isso que não entendes! — esbravejou.

Um sorriso aflorou nos lábios dela.

Então é isso... — Andou até ele num bailado generoso, parando a sua frente. — Não quer me dividir com ninguém.

Os olhos rubros dele nos dela, incrédulos.

Você perdeu a razão!

Calmamente, Katina levou as mãos aos ombros e deixou que a camisola escorresse por seu corpo, revelando sua nudez.

Eu lhe dou permissão. — Estendeu os braços para ele. — Tome-me.

Atordoado, ele desviou dela indo até a janela.

Você já se humilhou demais, irmã. — Apoiou os braços esticados contra o peitoril de pedra. — Melhor fingir que nunca esteve aqui. Vá embora, eu lhe peço.

Os vermelhos dela agora faiscavam.

Não pode me desprezar dessa forma, András!

Você é incapaz de entender um não, Katina — disparou num resfolego. — Não suporto mais ficar nesse castelo por sua causa, porque não há uma noite que não me procure! — Voltou-se para ela, seus rubros tornados em verdes novamente. — Basta com isso!

Ela se atirou em seus braços, abraçando-o. O rosto molhado em lágrimas contra seu peito.

Não quero lhe perder!

Segurando-a firme pelos pulsos, András se soltou dela, fitando-a em verdes carinhosos.

Não pode perder o que nunca teve Katina — deixou no ar calmamente. — Eu nunca a amei — disse pausadamente vendo-a despejar mais lágrimas. — Nunca a desejei.

A mente dela ainda assimilava cada palavra quando András pegou o casaco sobre a cama e vestiu-o rápido, sentenciando:

Vai ter tempo para entender que seu futuro é com Oliver, e não comigo, enquanto eu estiver fora. — Ela o fitou entre fios translúcidos, a dor correndo-a. — Perdoe-me, irmã, mas é melhor assim.

Ele estava à porta quando ela derramou:

Jamais será feliz ou encontrará paz nos braços de outra mulher. — Havia fúria em seus olhos verdes quando finalizou: — Eu juro!

András apenas a fitou preocupado, vendo-a cair ao chão em prantos enquanto deixava o quarto, fechando a porta atrás de si.

***

As primeiras horas do dia o surpreenderam ainda no retorno ao castelo. Passara a noite longe daquelas paredes, da tormenta que era Katina. Talvez tivesse sido precipitado ao sugerir aquela viagem rumo ao inimigo desconhecido, porém sentia que sua mente começava a dar sinais de cansaço frente à insistência da irmã.

Parou diante da fachada do castelo e a admirou, tão sólida e inexpugnável, mas ainda que se empenhasse em ser igual, a cada dia sentia-se mais falho. Cerrou os punhos. Não por temer sua falta de nobreza ou caráter, e sim por não suportar mais fingir que a presença de Katina o afetava.

Jamais a tomaria para si, nunca tivera a mínima atração por ela, ainda que a irmã fosse considerada extremamente bela e sedutora. Contudo, aprendera que a determinação de uma mulher era algo a ser encarado com precaução e vigília, e nesse sentido, estava falhando implacavelmente. Seus sentidos já não o precaviam de atitudes como a da noite passada, nem respondiam como deviam. Fora bruto com ela e, se não tivesse percebido a tempo a força que impetrara no golpe, teria a machucado seriamente.

Estava perdendo o controle sob si mesmo, e isso significava que ela poderia vencê-lo no próximo lance. Passou pelo pórtico de cabeça baixa e foi surpreendido por um par de olhos verdes belíssimos com cascatas ruivas a emoldurá-los.

Bom dia, meu filho. — Ela se aproximou e beijou-lhe a testa. — Soube que partem hoje à noite...

Não posso dizer que me sinto descontente com a notícia, mamãe. — Segurou-lhe as mãos pálidas e beijou-as suavemente, levando-as ao rosto num carinho medido. — Eu preciso ir o mais rápido possível.

Os olhos verdes dele se fecharam enquanto os dela o fitavam, preocupados.

Sua irmã... — foi escondido. Havia tanto receio do que a frase toda poderia conter, que ela não queria lê-la nos olhos dele. Porém, assim que András a encarou teve a certeza que gelou seu coração.

Não há mais o que ser feito, estou a um passo da loucura — ele proferiu baixo. — Vaslui não me mantém mais seguro.

Os olhos ternos dela enquanto acarinhava seus cabelos em compreensão, escureceram assim que encontraram outros verdes ao pé da escadaria. O brilho que luziu ao ver o irmão ao lado da mãe. O sorriso que moldou seus lábios quando se aproximou e András, desviando seu olhar, despediu-se da mãe sem lhe dirigir uma palavra.

Katina fez menção de segui-lo, porém a mãe se interpôs:

Quero falar-lhe, Katina.

Ela refreou o passo enquanto via o irmão sumir na direção do grande salão. Os olhos voltando aos da mãe, gelados.

Sim, mama... — rosnou entre os dentes. — Imagino que...

Leonora Valuescu era uma figura austera, incapaz de ser ignorada por qualquer pessoa, principalmente pelos filhos.

Não quero que imagine Katina. — Dirigiu-se à entrada do castelo e sentenciou ao abri-la: — Vamos aos jardins, há algo que devemos conversar.

A senhora do castelo saiu à frente, ondulando seus lindos cabelos acobreados sobre sua cintura fina. Katina a fitou intensamente, desviando seus verdes uma última vez para onde András saíra e seguiu-a em silêncio.

A entrada de András no grande salão foi feita no meio de uma discussão entre Nicolai e Robert. A Oliver, coube apenas observar, assim como Sindel, a discussão dos dois chefes de clãs.

Seu pai é irascível! — determinou um russo enfurecido.

O jovem Valuescu desviou seus verdes para os do pai.

Seu tio insiste que peguemos a estrada a oeste... — explicou ao filho. — Enfrentaremos mais de um metro de neve!

Nicolai, entretanto, foi até András, parando ao seu lado e sentenciando:

Diga a ele que isso nos dará cobertura, caso o inimigo ainda esteja à espreita. Duvido que conheçam os Alpes tão bem quanto nós!

E nos atrasará pelo menos em três dias, a viagem! — retrucou Robert mal humorado.

Os olhos azuis de Nicolai cravaram-se no cunhado.

Não estou com pressa de morrer, e você? — sugeriu a András.

Não seja tolo, Nicolai! Eles já estão com o que queriam! — bradou Robert. — Seriam tolos se esperassem por nós. — E seus olhos verdes completaram ao espetar: — Ou se ilude que não sabem quem e o que somos?

O ruivo avançou de punhos fechados para Robert, mas András se interpôs entre eles.

Se eles realmente pegaram Anna...— sentenciou. — Não tem razão para ficarem à espreita.

Mas isso é trabalhar com suposições — interveio Oliver.

Está me decepcionando — cantou Nicolai ao ouvido de András.

Tudo o que temos são suposições — determinou Robert. — Não temos notícias de Sibiu.

Então devemos adotar toda e qualquer cautela — replicou András. — Se formos pela Transilvânia, contaremos com muitas aldeias pelo caminho. Teremos aliados e abrigo, caso seja necessário.

Não quero envolver mais de nós nessa história.

Receio que se o Conselho descobrir a morte de Vlad, teremos mais problemas — ponderou Oliver.

Não tenho muita certeza se podemos afirmar que não estão envolvidos — retrucou Sindel.

Por ora, tudo são conjecturas — cortou-os Robert. — O estrategista aqui é András. O que me diz filho?

Eu concordo com Nicolai, é melhor nos precavermos. Não sabemos quem ou o que enfrentamos. Podem ser só sacerdotes, como indica aquele pedaço de pano... Mas também pode haver algo mais. — Olhou firmemente o pai. — Iremos pelos Alpes.

Houve um grande murro em seu ombro e a voz de Nicolai sobressaiu ao silêncio de seu pai:

Assim que se fala garoto!

Os verdes de seu pai o encararam sérios enquanto todos deixavam o grande salão, mas András foi impedido de segui-los como desejava.

Fique, há algo que quero lhe dizer... — Quando a porta dupla se fechou, Robert prosseguiu com cuidado: — Tenho que lhe pedir algo, András.

Sim, meu pai — assentiu o jovem.

Seu tio era um grande amigo de Vlad, e por mais que amasse meu irmão, minha sede de vingança não chega aos pés da dele — disse Robert ao filho. — Não pretendo ensinar-lhe a ter juízo, porque é algo que não lhe falta. Contudo, não quero que seja inflamado pelas palavras de Nicolai.

Creia-me, pai, nada do que disse foi feito sem ponderação — retrucou o louro mais jovem.

Eu sei, confio em você András ou não o levaria comigo, nem o deixaria se dirigir aos nossos homens. Entendo sua posição, mas não quero que esqueça o juramento que fez como um Protettori — sentenciou o pai em verdes escuros.

E não o pus de lado um segundo sequer.

Você possui uma missão muito maior que a nossa, deve ter a certeza de que Anna está morta — determinou Robert para surpresa do filho.

Quer mesmo que isso seja verdade? — devolveu András perplexo.

Ela é uma imortal, e em mãos erradas, pode ser nossa sentença de morte.

Está admitindo a possibilidade do Conselho estar por trás disso como certa?

São conjecturas apenas — explicou Robert sob um sorriso.

E se ela estiver viva? — devolveu András.

Robert soltou um longo suspiro.

Iremos buscá-la — e emendou frio: — É por isso que a prefiro morta.

Era capaz de entender a posição do pai, pois resgatar Anna poderia ser desde um gesto de nobreza a uma insanidade. Entretanto, era também algo imprescindível.

Eu a encontrarei, pai — assentiu András. — Mesmo que dela só restem histórias.

***

A noite chegou ágil como o dia se foi, estivera tão envolto com os preparativos da viagem que não tivera tempo de pensar em Katina, sequer a havia visto nas horas que seguiram até ali. Seu projeto de mantê-la longe parecia funcionar, sorriu para o fardo sob a cama.

Ajeitou o casaco de pele sobre a grossa roupa de couro, se iriam pelas montanhas, qualquer roupa a mais era bem vinda. O inverno já sobrevinha aos últimos dias de outono, e era certo que a neve se despejaria sobre eles antes do fim da jornada. András torcia para que só ocorresse nos últimos dias, mas temia que não fosse tão fácil assim.

Pôs o fardo sobre os ombros e saiu do quarto na direção das escadas. Seus pensamentos estavam aliviados de qualquer presença sombria quando entrou no corredor que daria aos fundos do castelo. Em sua mente, traçava as rotas alternativas do caminho quando chegou ao estábulo. Largou o fardo ao chão e dirigiu-se ao cavalo castanho ao seu lado.

Seu pelo era lustroso e grosso, e sua crina possuía uma tonalidade marrom bem escura. Uma longa mancha branca cobria-lhe a parte esquerda do rosto e sua musculatura forte se contraiu conforme se inclinava para receber o carinho de seu dono, que sentenciou ao seu ouvido:

Mina... — Ela respondeu esfregando o focinho contra a palma de sua mão num carinho. — Faremos um longo passeio menina.

András sorriu e ela relinchou baixo em aprovação. Ele começou a afivelar os arreios, verificando-os um a um, quando a voz de Katina surgiu doce por cima de seu ombro:

Não se despediu...

Ele ponderou o que dizer, sem se abalar com a presença que julgava banida de sua vida, ao menos por algum tempo.

Ainda não parti. — Prosseguiu ajustando as fivelas.

Eu poderia fazê-lo mudar de ideia, se me desse uma chance.

András fechou o cenho e suspirou alto enquanto Mina se inquietava com a presença da ruiva.

Não creio que seja algo que você possa manipular, Katina.

Voltou seus olhos verdes aos dela. Sua irmã era uma criatura linda, devia admitir. E o branco lhe cairia muito bem, se a pobre alma que ela tentasse seduzir não lhe conhecesse as artimanhas como ele. Tentou passar por ela e pegar o fardo, mas a mão dela espalmada contra seu peito, impediu-o.

Ele jogou a cabeça para trás, contando até dez. Estava no limite de tudo, até da paciência que tanto prezava. Contudo, se deixasse aflorar sua ira, poderia causar um estrago muito maior do que o que ocorrera no quarto... E como explicaria a situação a qualquer um? Teria que revelar o caráter duvidoso de sua irmã? Oliver não aguentaria a decepção e, muito provavelmente, se questionariam se ele não mentia. Katina era ardilosa quando queria, e a não ser por sua mãe e sua aparente idoneidade, uma queixa dela teria muito peso junto ao seu pai.

Não podia por tudo a perder, faltavam-lhe apenas algumas horas. Ela continuou se aproximando dele até que não restasse um só centímetro entre seus lábios, sublinhava um beijo quando a voz grossa de Oliver os afastou:

András?

Katina o olhou com desfaçatez e ele devolveu o olhar com repúdio, respondendo:

Aqui, meu irmão.

A figura de Oliver surgiu por trás de um corcel preto, correndo seus verdes de um para outro.

Reunião de família? — brincou, fixando seu olhar em Katina.

András passou por Katina na direção do fardo e o ergueu do chão enquanto dizia:

Sabe como Katina é... — Fitou-a de canto ao voltar-se à égua. — Está sempre preocupada com todos.

Oliver sorriu para ela apaixonado. Os verdes dele brilhavam quando a irmã sentenciou:

Não gosto das montanhas... — murmurou, deixando que seu corpo bailasse até o ruivo e se aninhasse em seus braços, recebendo o calor de seu abraço ao completar: — Tenho medo do que pode acontecer. Prometa-me, Oliver, que não deixará meu coração em desespero como András... — choramingou.

Nunca — determinou o ruivo, apertando-a contra si. — Eu sempre estarei por perto para protegê-la.

Ela cerrou os longos cílios avermelhados enquanto András guiava a égua para fora do estábulo. Quanto antes partisse, melhor seria.

***

Não demorou muito para que seu tio se unisse a ele na frente do castelo. András evitava pensar em qualquer outra coisa que não fosse a viagem, e seu tio certamente facilitaria para que assim continuasse quando introduziu a conversa entre eles:

Quanto antes formos, melhor — deixou no ar. — Sei que Robert não gosta da ideia, mas Vlad era meu amigo e se uma cria dele pode estar viva no meio dessa lambança toda, quero-a comigo.

Desde que era pequeno sempre ouvira Nicolai se referir a eles como crias, isso nunca o assustou ou pôs em dúvida o carinho que o tio nutria por eles. Porém, refletindo melhor sobre a promessa feita ao pai e a sentença do tio, buscava em sua memória alguma imagem de Anna. Se iria ao seu encalço, utilizando-se de toda sua experiência como um Protettori, era de esperar que ao menos conhecesse o rosto de sua prima.

Inacreditavelmente não havia um resquício de como ela era em sua mente. Lembrava-se de Mirela e Andrea, seus primos mais velhos, ambos tinham cabelos castanhos e intensos olhos violetas. Imaginava que Anna seguiria o mesmo biótipo, ou poderia ter olhos verdes como o pai, mas incomodava-o não lembrar-se, ao menos, do motivo dela não estar em suas memórias.

A pergunta que seguiu a essa descoberta, foi inevitável:

Tio... Anna...

Sim? — atendeu-o, o homem grandalhão.

Havia algo de errado com ela?

Por que pergunta isso? — Nicolai se inquietou e seu cavalo deu sinais de apreensão.

Não consigo me lembrar de seu rosto, apesar das fisionomias de Andrea e Mirela serem bastante claras.

O ruivo controlou o cavalo, estreitando as rédeas.

Bem... Seus tios sempre a protegeram — determinou com cuidado. — Era uma menina bem magrinha com grandes olhos castanhos e muito quieta. Acredito que Vlad e Tess não a deixassem brincar junto com os outros. — Nicolai riu gostosamente, completando: — Mas era astuta como o diabo!

Definitivamente nunca vira sua prima, embora a descrição coubesse na mesma dos outros dois primos, exceto talvez por ser magricela. Andrea era o garoto forte e Mirela tendia a ser gordinha. E isso dificultava a formação de uma imagem adequada a jovem em questão.

Ainda estava refletindo seus pensamentos quando o trote de mais cavalos se anunciou e o fez perceber a presença de Sindel e seus dois filhos, e a chegada de mais um homem ruivo. O único herdeiro dos Pankovs, Yuri.

Com um cumprimento leve de cabeça, e poucos abraços, entre os quais naqueles que mais conviviam com ele, Klaus e Mikail. Ambos humanos, e filhos do primeiro casamento de sua esposa. András admirava seu tio pela escolha que fizera: desposar uma jovem que não teria uma nova chance na vida, e que ao mesmo tempo, havia realizado o sonho de procriar, coisa que era impossível entre eles; mesmo com o amor mútuo que possuíam. Sindel chegara a suas vidas muito cedo, pegando-os ainda no berço. E tinha sido seu pai por todo o sempre.

András se acostumara à presença deles e sempre brincavam juntos, mais recentemente, partilhavam os treinos com Robert. Eram dois dos homens mais valorosos que tinha sob seu comando. Já Yuri era grandão como o pai, Nicolai, e possuía um olhar escuro como a noite, indecifrável. Não havia muito que dizer sobre ele, exceto que era um guerreiro extremamente forte.

Todos prontos? — a voz de seu pai interrompeu o fluxo de seus pensamentos.

Ele vinha dos estábulos, onde pegara seu corcel preto, acompanhado de mais três homens de seu exército particular e sua esposa, que o seguia lateralmente ao animal. No seu elegante porte de suserana daquelas terras, ela roubava até mesmo o brilho da lua, que naquela noite estava plena.

Diante do assentimento de todos, ele inclinou-se para erguê-la até os lábios e selá-los carinhosamente. Com um mínimo sorriso, sugeriu ao devolvê-la ao chão:

Demorarei o mínimo possível, minha senhora.

Leonora retirou um pequeno lenço bordado de suas vestes e o passou às mãos do marido, contrapondo doce:

E eu o esperarei o quanto for necessário, meu amor.

Robert apertou o lenço entre os dedos e o beijou, guardando-o em suas roupas. Ela se afastou, caminhando na direção do filho, e ergueu sua mão para que ele a beijasse. András o fez imediatamente.

Tome cuidado... — sugeriu baixo, num carinho.

Tomarei mãe.

Mal terminou a frase, e viu Katina surgir no limiar da entrada do castelo ao lado de Oliver. Seus olhos verdes sugeriam uma provocação e ela entrou em sua mente sussurrando:

Volte para mim...

Um leve arrepio correu sua espinha, mas a voz de seu tio quebrou por completo o magnetismo daquelas palavras:

Está tudo muito lindo, mas eu não quero me atolar em neve até ossos e morrer congelado salvando uma donzela em perigo. — Passou por András e Robert e tomou a frente do grupo, despedindo-se da irmã: — Pode deixar Leonora que trarei seu herói coberto de glória. Estou farto delas.

Tenho certeza disso, Nicolai — respondeu a irmã sob um meio sorriso.

O grupo de homens deixou Vaslui em silêncio, alcançando a estrada para os Cárpatos nas primeiras horas da manhã.

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