Capítulo III - A Encosta de Capricórnio

Após três semanas de intenso trabalho, o grupo de especialistas formado pelo Dr. Filipe Meine finalmente iria se reunir para discutir as primeiras informações decifradas pela força-tarefa.

Aproveitando o feriado prolongado de Carnaval, o encontro se daria na casa de Dru Ruver, para que os especialistas pudessem fazer uma incursão na Encosta de Capricórnio, na única casa de arandelas niqueladas, com a intenção de conhecer o lugar exato onde ela havia encontrado o livro.

Todos os detalhes foram organizados por Meine: o grupo partiria de sua casa rumo ao litoral por volta das dez horas da noite. Logo, a campainha soou e a primeira especialista a chegar foi a Dra. Vitina Almén, acompanhada de sua chow-chow Wendy.

 - Olá, será que não vou mesmo incomodar trazendo minha cachorra? – perguntou a tradutora antes de atravessar a porta.

A Dra. Almén era professora, tradutora de Línguas Arcaicas e uma das mais conceituadas especialistas em Mitologia Grega e Romana. Vitina era alta, elegante, com belos cabelos curtos e pretos, tinha a pele bronzeada e era muito carismática.

Sem hesitar, Dru respondeu:

- Claro que não! Vai ser ótimo para a Dolly ter uma companhia para brincar!

Não tardou muito para o Dr. Kupis chegar acompanhado de sua esposa Ada, uma mulher vibrante, com um jeito falante e simpático de ser, que foi se apresentando:

- Boa noite, muito prazer! Achei incrível a ideia de passar o Carnaval fazendo uma investigação científica! Sou bióloga e para não perder tempo, trouxe comigo coletores de amostras, quero examinar tanto o livro antigo, como o local. Quem sabe possamos coletar alguma evidência forense ou algum material genético?

Todos ficaram surpresos com a atitude de Ada, que era uma mulher de rosto redondo e cabelos castanhos bem cortados, que veio decidida a não perder qualquer oportunidade.

Tanto Dru quanto Roddie reconheceram de imediato o Dr. Kupis, que era um eminente cientista que estava sempre concedendo entrevistas a jornais e revistas. Na televisão participava de talk-shows, falando de seu trabalho científico acerca da Teoria das Cordas, um cientista brilhante que tentava decifrar a implicação dos nanons como fonte de controle para o avanço e retrocesso no tempo. O Dr. Kupis era um sujeito alto com cabelos ruivos encaracolados, pele muito clara, óculos de lentes grossas, porém muito mais simpático pessoalmente e também muito magro.

Logo a campainha soou novamente, desta vez era o este é o Dr. Takei, astrônomo brilhante e reconhecido estudioso das primeiras cartas celestes do período antigo. O Dr. Takei carregava com esforço duas malas grandes, contendo um aparato de parafernália eletrônica: microscópio de alta resolução, lâmpadas ultravioletas e até mesmo um binóculo de visão noturna. Ele era um homem tímido com traços orientais, estatura média, cabelos grisalhos e sem dúvida, o mais sério do grupo.

Era exatamente nove horas e quarenta e cinco minutos, quando o último especialista do grupo chegou. O Sr. Felpes era professor, um estudioso autodidata e renomado especialista de Línguas Antigas. Ele um homem alto, com um rosto simétrico, olhos azuis, com cabelos castanhos claros bem penteados; além de inteligente, era um homem muito bonito.

Contudo, o Sr. Felpes estava acompanhado por uma convidada. Dra. Lítica: uma mulher linda de cabelos pretos presos a um coque, especialista e tradutora de Línguas Antigas. Para a surpresa de todos, ninguém conhecia a Dra. Lítica e com extremo mau humor, o Dr. Meine retalhou:

- Felpes, isto não é uma excursão turística! Não há ingressos à venda.

- Estou ciente de suas observações, Meine. Mas a Dra. Lítica é notável tradutora e deve participar do grupo.

- Você esqueceu de um único detalhe: quem recruta os membros do grupo sou eu! E nunca pedi a sua ajuda para decidir quem deve ou não participar dele!

- Peço desculpas por não tê-lo consultado! Mas agi por impulso! Não queria perder a oportunidade de ter Lítica conosco! Por favor, confie em mim!

Os argumentos de Felpes não convenciam Meine. O clima ficava cada vez mais tenso. Na tentativa de amenizar a situação o Dr. Kupis arriscou:

- Meine, talvez seja uma boa ideia! Afinal, a tanto o que fazer! Eu concordo que Felpes foi precipitado, mas...

- Precipitado e irresponsável! – o cartógrafo interrompeu.

- Precipitado, sim! Irresponsável, não! – se ofendeu Felpes

– Trago comigo uma excelente profissional que pode nos ajudar! Lítica já trabalhou na tradução de documentos medievais, livros raríssimos, pergaminhos...

Felpes passou a próxima meia hora, explicando ao grupo a sua decisão e seus motivos em trazer os convidados.

Após muita conversa e acertadas as diferenças. O Dr. Meine ficou convencido do trabalho e experiência da Dra. Lítica na tradução de importantes documentos. Por decisão unânime, o grupo concordou com a entrada dela como membro da força-tarefa.

Aos poucos, todos iam se enturmando. Meine após uma longa conversa com Lítica ficou mais animado e bem disposto, demonstrando a sua gentileza e hospitalidade em nome do grupo. Até hoje não se sabe ao certo se foram os atributos profissionais ou físicos que fizeram o Dr. Meine se derreter por Lítica.

Resolvidos todos os contratempos, por volta da meia-noite o grupo pegou a estrada, seriam cerca de três horas e meia de viagem até a casa de veraneio de Dru Ruver, perto do Trópico de Capricórnio.

Por volta das quatro horas e dez minutos da manhã, o cansaço já se fazia sentir visivelmente, e Dru se apressou em acomodar os visitantes o mais confortavelmente possível. Cada hóspede foi para o aposento indicado. Dru desejou boa noite a todos, avisando que o café da manhã seria servido às dez horas.

Ela então subiu as escadas com Dolly em seu colo, rumando diretamente para o quarto. Após vinte minutos o alvoroço se dissipou, tudo estava quieto e silencioso, e todos, aparentemente, dormiam.

O cheiro de café quente, as conversas miúdas e provavelmente o latido de Dolly na varanda perseguindo borboletas foram mais do que suficientes para despertar o grupo.

Aos poucos, todos se reuniram espantados com a quantidade de comida para o caprichado café da manhã que a Sra. Lile servia. Somando o fato da casa cheia ser realmente uma novidade e a intensa curiosidade dela acerca dos convidados de Dru Ruver, a Sra. Lile não media esforços para agradar, o que lhe garantiu soltos elogios.

Mas como sempre acontece, nem todos do grupo estavam tão animados e despertos: o Dr. Kupis, o Dr. Meine e Dru Ruver permaneceram à mesa mais calados do que de costume, somente após a ingestão do café da manhã ficaram realmente bem despertos e animados; nitidamente os três fazem parte de uma pequena parte da população que começa o dia sem tagarelar muito.

Como tudo mesmo é relativo, o oposto acontecia com o restante do grupo, que entre um café e outro, um bolinho, um sanduíche ou uma fatia de queijo, comentavam animados sobre a qualidade do ar, o feriado prolongado, a justa contemplação da natureza.

Claro que todos concordavam e davam opiniões, reforçando o quanto não estamos mais acostumados a uma vida simples. Dru pensou consigo mesma - mas não ousou dizer uma palavra - sobre a qualidade do silêncio, e como ele é precioso, principalmente quando alguém do grupo começa a tagarelar sem parar, neste caso era a Sra. Kupis que falava pelas ventoinhas.

Cerca de uma hora após o café da manhã, com a certeza de que todos estavam satisfeitos e bem alimentados, Dru sugeriu uma caminhada em direção a casa cinza com arandelas niqueladas no declive sul. A Dra. Vitina gostaria de levar os cães no passeio, ficou muito desapontada quando Dru frisou:

− Nem pensar, doutora. Eu sinto muito, mas Dolly e Wendy estarão bem mais seguras em casa!

A Dra. Vitina não disfarçou o espanto:

− Se for esta a situação, eu compreendo. Jamais me perdoaria se algo acontecesse às pequenininhas! Deus me livre!

Dru nada respondeu. Afinal, há dois meses ela tinha estado naquela casa e não sabia ao certo o que esperar; mesmo calada, sua boca ficou seca e um calafrio lhe percorreu a espinha.

Por volta do meio dia o grupo se colocou em marcha caminhando animado até a casa de arandelas niqueladas no declive sul. Trajando roupas mais leves e sapatos confortáveis, levaram apenas o indispensável para o passeio: água, algumas barras de cereais, três câmeras digitais, quatro lanternas comuns e uma lanterna especial de luz infravermelha.

- É ali! − anunciou Dru , apontando para a imponente e desolada construção.

Todos por um minuto olharam em volta, talvez, procurando indícios de que ali, naquele local, entre tijolos velhos e aparente abandono, pudessem coletar dados que ajudassem a decifrar aquele livro antigo e misterioso.

Logo, o grupo se dirigiu ao atalho de entrada. Tudo estava quieto e tranquilo, Dru não notou nenhuma mudança de sua visita anterior ocorrida há dois meses, até mesmo a vegetação rasteira e o extenso jardim não expressavam diferença.

Já perto da porta de entrada, Dru retirou do bolso a chave extraordinariamente comum que abria aquela porta, mesmo percebendo que cada um do grupo contemplava e analisava a seu modo o lugar, ela deu dois passos em direção à porta, dizendo:

− Estou com a chave. E então, vamos entrar?

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