Capítulo 06

Lorenzo Rivera 

Meu jantar do dia anterior com a minha irmã me fez refletir, Sarah tinha uma novidade, estava dedicando seu tempo as crianças abandonadas no orfanato, as histórias que ouvi me fizeram sair de lá envergonhado, senti vergonha porque sabia que não era diferente dos pais daquelas crianças. Um segredo escondido poderia mudar o jeito que minha irmã me enxergava, eu tinha uma filha que nunca quis ter, ela estava há alguns quilômetros de distância em um internato. Não lembrava do seu rosto, aquela criança era apenas uma bebê quando a deixei. O DNA foi feito duas vezes porque eu não queria aceitar aquele resultado. O que eu fiz? Chorei e entrei em desespero, estava me sentindo derrotado, porém, algo ainda poderia ser feito, pensando nisso paguei um bom advogado, e obtive a guarda definitiva da minha filha. 

Uma das poucas coisas que fiz por ela foi escolher seu nome, no começo pensei que conseguiria cuidar dela sozinho, entretanto, ao trazê-la para minha casa, meu rancor por sua mãe foi maior. Fiquei com a pequena Sibele apenas uma semana, olhá-la era tortura, então, tomei a decisão de colocá-la em um internato. Não senti amor pela minha filha que era fruto de uma tentativa de golpe, a mãe dela pensou que se daria bem engravidando de mim. Era vergonhoso demais se alguém soubesse que eu tinha uma filha que nunca quis, portanto, segui em frente, fingindo que nada havia mudado. Ter uma família não estava nos meus planos, somente queria fazer sucesso na minha carreira profissional, e continuar me divertindo sem hora para chegar em casa. 

Devido ao jantar com Sarah estava me sentindo um cretino. Por que rejeitei aquela criança? Ela não tinha culpa de nada, uma criança inocente estava vivendo uma vida sem o amor de sua família, pensar nisso me fez sentir um aperto no coração. Eu não pensei nela durante anos, só pensei no que era melhor para mim. Usei meu dinheiro para afastar Sibele, não queria vê-la, muito menos pensara na possibilidade de um dia revê-la outra vez. Minha irmã sem saber naquele jantar me abalou, uma vontade forte de visitar minha filha no internato despertou em mim, porém, estava com medo, não sabia qual seria sua reação ao me ver, talvez me odiasse. 

Não conseguindo tirar a ideia fixa de ir visitá-la, busquei coragem de onde nem sabia que tinha. Pedi um dia de folga do trabalho, enquanto eu estava na estrada mais ansioso ficava. Pensei em tantas coisas, mas nenhuma delas encontrava o melhor jeito de conversar com minha filha. 

Quando cheguei ao internato procurei pela diretora, ela ficou surpresa com minha visita repentina após anos. 

— Vou buscá-la senhor Lorenzo. Sua filha tem sido muito bem tratada todos esses anos, ela ficará feliz com sua presença. Espere um pouco, imagino que esteja ansioso, acalme seu coração. — concordei balançando a cabeça, ela sorriu antes de caminhar pelo corredor, logo desapareceu quando entrou em uma das portas. Minhas mãos estavam suando, meu medo de ser rejeitado só aumentava, eu não merecia ser chamado de papai, um pai que nunca veio vê-la não merecia seu amor. Naquele momento descobri um lado meu que ainda não conhecia, parte de mim, dizia para virar as costas e ir embora, já a outra parte queria muito ver o rostinho da minha filha, não encontraria palavras para descrever tudo que estava sentindo. 

Fiquei no corredor do internato olhando por uma das janelas. Me perguntei se minha filha era feliz, aquele lugar era tão bonito, tinha tantas crianças se divertindo no jardim. 

Meu pai nunca demonstrou amor pela minha irmã e nem por mim. Recordava às vezes das surras que levei dele desde os meus doze anos. Sarah apesar de ser só uma criança naquela época, sempre estava cuidando do seu irmão mais velho, crescemos nos apoiando um no outro, meu amor pela minha irmãzinha sempre foi grande, a ideia de deixá-la decepcionada me doía o peito. 

Respirei fundo, soltando o ar pela boca, olhei para o lado após ouvir passos, meu coração bateu forte, meus olhos foram diretamente para a garotinha de uniforme e fita rosa no cabelo. 

— Sibele, esse senhor é seu papai. Por que não vai até ele? — a diretora disse olhando nos olhos da pequena. Ela me olhou assustada e depois voltou a olhar para diretora.

Quando a pequena começou a caminhar na minha direção em passos lentos, meu coração disparou mais uma vez, aquela menininha era minha cópia, seus cabelos negros, olhos, nariz, boca, não tinha como alguém dizer que não era minha filha. 

— Oi. — ela disse tímida estendendo sua mãozinha, sorri segurando sua mão. Eu estava emocionado com nossa aproximação. 

— Você é muito linda! É ótimo te conhecer de novo, está tão crescida. — ela mexeu em seu cabelo e pareceu pensar, enquanto não tirava seus olhos de mim. 

— O senhor é meu papai mesmo? — me surpreendi com sua pergunta, sim, eu era seu pai, um pai que não a merecia.

— Sim, sou seu pai. — respondi me agachando para ficar a sua altura. — Sei que demorei muito tempo para vir te encontrar, me desculpe! — falei sentindo um nó na garganta. 

Ela me olhou parecendo me analisar e depois colocou suas mãos no meu rosto. 

— Eu te desculpo, papai! Não fica triste tá? — suas palavras foram um alívio, sorri instantaneamente. 

Embora aquela situação ainda fosse estranha pra mim, aquela garotinha merecia um pai, um de verdade. Eu conseguiria dar isso a ela? Me questionei. 

— Eu não sei muito bem como ser um pai. — confessei, e recebi seu abraço com doçura, retribui o carinho acariciando suas costas. 

— Não se preocupa tá, papai? Eu te ensino! Sou sua filhinha e estou tão feliz por ser! — ela era uma garotinha tão esperta, tocou o fundo do meu coração. 

Sibele conseguiu de mim o que ninguém tinha conseguido há muito tempo, fiquei completamente emocionado. Não queria nunca mais deixá-la, tentaria ser seu pai, um que ela realmente merecia ter. 

— Filha, gostaria de morar com o seu pai inexperiente? — perguntei, esperando sua resposta ansioso. 

Minha garotinha deu um largo sorriso, e eu senti que a partir daquele dia seríamos nós dois, não estaria mais sozinho. 

[...] 

Em exatamente quatro dias me tornei pai assumidamente, bom, pelo menos para quem trabalhava pra mim, eu tinha que escolher o melhor jeito de contar para minha família sobre ela. Sibele já tinha ganhado meu coração, deveria ter sido assim desde a primeira vez, mas dessa vez não decepcionaria ela. 

Minha filha ficaria aos cuidados da minha governanta enquanto eu estivesse fora. Por que contratar uma babá? Não queria uma estranha educando ela. Eu estava curtindo ser chamado de papai, transformei o antigo quarto dela com coisas adequadas para sua idade. 

Marilu continuava desaparecida, provavelmente, esperando que eu fosse me rastejar aos seus pés, isso não aconteceria. 

Estava feliz de chegar em casa depois do trabalho e encontrar minha garotinha, mesmo sem saber Sibele acalmava meus nervos, meu trabalho estava a cada dia pior, a causa dos meus problemas se chamava Amira Garcia. Por que eu estava deixando ela me afetar? Também gostaria de saber! Meu trabalho não era o mesmo, até troquei um dos ingredientes uma vez, deixando um bife doce, estava ficando louco porque não conseguia me livrar de Garcia. Eu merecia aquele castigo? Penso que não, antes dela aparecer tudo estava indo muito bem! Minhas tentativas de frustrá-la fracassei sempre. De onde ela tinha saído, afinal? Quando precisei que ela olhasse uma das panelas no fogão, não pensei que ela fosse ser tão desastrada, queimando a palma de sua mão direita. 

Recordo bem daquele momento em que ela gritou chamando atenção de todos que estavam na cozinha…

— Puta que pariu! — gritou sacudindo sua mão. Tudo nela me deixava extremamente irritado, me aproximei puxando seu braço. 

— Nunca mais grite na minha cozinha! Se não serve para olhar uma panela no fogão, peça demissão! — ela me fez perder o controle, vi seus olhos lacrimejarem, soltei seu braço e ela saiu correndo em direção ao banheiro.

Aquela situação só deu mais motivos para falarem mal de mim. No dia seguinte ela apareceu no restaurante obedecendo todas as minhas ordens, algo estava errado, a Garcia não era normal porque qualquer um em seu lugar já teria pedido demissão. Quando o expediente acabou ela foi a primeira a ir embora, e eu logo descobriria com desgosto a razão. 

— Não! Você não fez isso! — rosnei, chutando o pneu do meu carro que estava vazio, aquela era sua vingança. Por que ela me enfrentava tanto? Em uma das janelas do meu carro estava escrito: Poste Ambulante! Esse apelido fazia meu sangue ferver. 

Quando consegui finalmente chegar em casa estava exausto.

Minha filha veio me receber com alegria, aquela raiva que estava sentindo passou na hora. 

— Papai! A tia me deu um copo grandão desse tamanho de leite. — sorri com seu gesto exagerado. 

— Hum, não sabia que a minha garotinha fosse tão gulosa assim. — falei tocando a ponta do seu nariz. 

— Vou crescer forte, papai. — Sibele disse gesticulando com as mãos. 

— Claro que vai! — baguncei um pouco seus cabelos. Sua gargalhada era gostosa de ouvir, saber que estava deixando ela feliz, me deixava feliz também. 

Minha filha era a primeira criança que cheguei perto depois de muito tempo, e estava adorando nossos momentos juntos. Como eu pude afastá-la por anos? Estava realmente louco. Um sentimento paternal nascera, o que antes era tanto faz, se tornou impossível viver sem, no caso sem ela. 

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