Capítulo oito

Já se passou um mês e meio e nada de dona Guta e seu Zé voltarem, só não fico tão preocupada porque eles me ligam quase todos os dias. Hoje eles me disseram que iriam estender as férias mais um pouco. Logan apareceu novamente. Na verdade, tem se tornado um hábito tê-lo aqui todos os dias, pelo menos duas vezes ao dia.

Às vezes ele não come nada, apenas pede um café e fica conversando comigo, depois vai embora e deixa uma boa gorjeta. Já falei com ele  sobre isso, mas ele diz que faz em qualquer lugar.

Dona Branca chega e faz um pedido grande.

– Hoje a senhora vai querer cinco marmitas?

– Minha filha, meu netinhos vieram me visitar sem avisar e estou na correria, nunca vi um bando de crianças comerem tanto. E meu outro filho chegou também e não têm nada preparado e eles estão reclamando de fome.

– Nossa, dona Branca! Mas é bom rever os netinhos e estou vendo que a senhora está bem animada.

–  Animada até estou, mas eles comem demais. Já chegaram e acabaram com meu pote de biscoito. 

– Eles estão em fase de crescimento, é assim mesmo. Pode deixar que vou caprichar nas marmitas para a senhora.

Vou até a cozinha e quando retorno vejo Luz, Bia e Jô entrarem e as meninas vindo correr em minha direção para me abraçarem.

– Cada dia que passa sua filha está linda, uma verdadeira mocinha.

– Obrigada, Vó Branca. – Diz Luz sorrindo.

– Aqui está, dona Branca, seus pedidos bem caprichados. – Lhe entrego as sacolas enquanto dou um abraço nas minhas meninas.

– O que vocês acham de sentar ali e almoçar aqui hoje?

– Eba!! – as duas saem correndo e se sentam para esperar a comida.

– Olha aqui o dinheiro, minha filha. Você é tão trabalhadora e cria sua filha sozinha, já te disse que meu filho veio me visitar, ele é solteiro e tem a sua idade.

– Boa tarde! Ainda tem almoço? – vejo Logan entrar e ele está meio estranho.

– Tem sim, só um minutinho. Pode se sentar em algumas das mesas livres. – Ele me ignora e se senta no balcão.

– E então, minha filha? O que acha de conhecer meu filho? Te garanto que ele é um bom partido.

– Aqui seu troco, dona Branca. E em relação a isso, eu vivo apenas para trabalhar e para cuidar da minha filha, relacionamentos não estão em minha lista de prioridades.

– Mas se mudar de ideia, já sabe. – Ela pega a sacola e sai.

Pego comida para as meninas e Jô e quando chego na mesa, recebo um sorriso de minha amiga.

– O que foi aquilo? Até a dona Branca quer servir de cupido para você.

– O povo deve me achar uma encalhada. Aproveitem a refeição, não vou poder ficar com vocês porque tenho clientes para atender.

– Você tem um gostosão para atender. – Começo um excesso de tosse.

– Joziane, já pensou Ricardo, seu marido, ouvindo uma coisa dessas? – Digo de cara fechada e ela começa a rir.

– Eu amo o Ricardo e um certo gostosão ali está a fim de uma certa atendente. – Ela faz sinal com a cabeça para mim.

Deixo Jô com suas maluquices e vou atender Logan, mostro para ele a opção que temos e ele opta por carne assada. Vou à cozinha, lhe preparo o prato e retorno com uma garrafa de água antes que ele peça. Isso me faz lembrar de David, quando saíamos ele sempre pedia água para acompanhar as refeições enquanto eu pedia refrigerante e ele reclamava dizendo que água era muito mais saudável. Apesar do tempo, muitas coisas me fazem pensar nele.  

– Quer ajuda? – a voz de Logan tira-me do meu devaneio.

– Desculpe, seu Logan. – Coloco o prato e a garrafa de água do lado. – Deseja mais alguma coisa?

– Sim. Que, por favor, você pare de me chamar de senhor e vou querer um pouco mais de sal.

– Não adianta beber água e ficar se enfiando no sal. – Na hora eu me arrependo do que falei. – Desculpe mais uma vez, é que eu tinha o hábito de falar assim com meu ex namorado que, como você, bebia água, mas comia tudo muito salgado.

– Não precisa se desculpar, eu tinha alguém que costumava dizer a mesma coisa. – Ele diz sorrindo, como se estivesse lembrando de alguma coisa boa de seu passado. – Eu até tive curiosidade de saber onde está essa pessoa que ele falou, mas me contive a tempo.

– Aproveite a refeição. Sente nas mesas, é mais confortável.

– Pra quê? Se é do balcão que tenho uma vista privilegiada? – ele me olha e meu rosto se esquenta.

– Mamãe, posso tomar refrigerante? – Luz vem correndo e se agarra em minha cintura e a pego no colo.

– Você já acabou de comer?

– Sim! Comi tudinho e mais rápido que a Bia.

– O que eu falo para você sobre comer correndo.

– Que a gente tem que comer devagar e saborear a comida, mas mãe, eu queria muito refrigerante, por isso comi rápido.

– Igual a mãe. – Logan diz e sorri.

– Como disse?

– Apenas pensei alto. – Ele volta a comer e eu finjo que não ouvi nada, estava pegando o refrigerante para as meninas quando vejo Bia se aproximar do balcão.

– Conta pra tia Cindy, Luz.

– A mamãe vai ficar triste.

– Se você não contar para a tia Cindy, eu conto.

– O que vocês tem para me contar? – digo olhando para as duas, olho para Jô e pela sua expressão já sei do que se trata, mas quero ouvir delas.

– Mamãe, a Viviane implicou comigo de novo. – Luz diz fungando.

– E o que ela disse dessa vez? – Luz reluta em contar.

– Oh tia, ela ficou com raiva porque a tia Valeska escolheu a Luz pra cantar e a Viviane disse que não era justo a única menina da sala que não tinha pai, cantar. A Luz começou a chorar e correu pro banheiro, aí eu fui e dei um empurrão na Viviane.

Quando Beatriz termina de contar, eu já estou chorando e abraçando a minha filha, não é justo ela estar passando por isso. Respiro fundo e abraço minha princesa e depois abraço Bia.

– Obrigada, Bia. Por tudo e por ser amiga da Luz. E filha, olha para mim – levanto o rostinho dela, que está vermelhinho de tanto chorar. – Não importa se o seu pai vai estar lá ou não, eu vou estar lá pra ver você cantar, meu amor... e outros pais também, então ensaia bastante e me deixa ainda mais orgulhosa de você.

– Tá bom, mamãe. – Ela diz fungando.

Jô me abraça e pega as meninas para irem embora. Seco minhas lágrimas e quando olho para o balcão, vejo lágrimas nos olhos de Logan.

– Eu não sabia que vocês passavam por isso.

– Já passei coisas piores, mas minha filha nunca tinha passado por isso.

– E o que você vai fazer a respeito?

– Fechar mais cedo e ir na casa da Viviane conversar com a mãe dela.

– Quer uma carona? – ele me pergunta, solícito. Mas recuso.

– Isso é uma coisa que devo fazer sozinha.

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