Klaus

As trombetas da guerra soavam alto no alvorecer.

Fuuuuuuuuuuuooooooonnnnn!!!!!

O raiar do sol esquentava suavemente seus corpos, jazidos no chão, enquanto mais e mais caíam por cima num mar ensanguentado a beira da costa. Areia manchada num escarlate profundo misturado ao suor e lágrimas de homens mortos, esperanças quebradas e familias destruídas. O sangue ao mar incitava ainda mais matança, num fluxo ininterrupto. Tudo ali se resumia a um único momento. Enquanto as espadas cantavam sem parar à margem da praia, ao fundo duas frotas dançavam ao som dos canhões, enquanto afundavam ainda mais, e mais...

—RECUAAAAR!!! TIREM SUAS MALDITAS BUNDAS DAQUI FILHOS DA PUTA, E RECUEM!!!

Simon bradava a ordem sem parar, estava sujeito a derrota no momento em que avistara o galeão ser partido em dois por um encouraçado, que avançava sem parar. Ver seu último navio afundado pela companhia das Ilhas Pratas com seus homens juntos fizera perder a coragem que havia em seu peito. Tudo que restava era a rendição. O que posso fazer é desistir e salvar o que resta da tripulação.

Podemos nos render senhores! E entregar nossas vidas aos militares de Ponta Dragão. OU LUTAR E MORRERMOS COMO HOMENS LIVRES!!!

Neste momento, o navio atracara à costa, Simon dera a ordem e todos que sobreviveram se organizaram, formando uma muralha de escudos, a medida que o encouraçado atravessava fogo e naufrágios sob as ondas.

As ondas que chegavam a areia eram de um vermelho vivo e os homens que deciam do navio inimigo usavam cores iguais em seus mantos chamativos, cercando por todos os lados o pequeno batalhão de piratas. Não demorou muito para que a coragem de todos se desfizesse e o fizessem jogar suas espadas ao chão.

—Imprestáveis!!—Exclamou Simon.—Foderei cada um de vocês na prisão.

O sol jazia alto o suficiente para que o calor aumentasse e sufocasse àqueles vestidos com cota de malha. O suor lhes escorria à testa e suas respirações começaram a pesar. Merda, está tão quente. Não pretendo ser pego aqui.

Do convés do navio, um soldado dizia algumas poucas palavras sem menor importância, enquanto um homem, trajado com uma pesada armadura dourada e branca descia com ajuda de prancha e escada.

Sob ordem da coroa, vocês estão presos por; assassinato, estupro, roubo, invasão de propriedades privadas, sequestros, tentativas de homicidios à nobreza,  dentre outros.—Não disse mais nada depois. Haizor nunca fora de muitas palavras, era um homem de rápidas ações.

Dera uma rapida olhadela aos trapos e esfarrapados prisioneiros, retorcendo o rosto de repúdio. Não vira mais do que meia dúzia de homens que serviriam para juntar o esterco de seu cavalo.Bastara uma única palavra sua para toda guarda se posicionar em forma.

Simon não via possibilidades de fuga ali, outrora, se estivesse sozinho, poderia te-lo feito e morrer tentando. Mas não ali. Não agora. Não se permitiria abandonar a tripulação a qual chamara de família nos últimos quinze anos.

Se vamos morrer, que seja.

Homens, levem-nos todos. Servirão de alguma coisa para os remos. Estamos em falta de bons escravos, não?Olhara para o lado e perguntara a um soldado novo parado ao seu lado.

—É claro...quer dizer, senhor. Lorde comandante senhor.

—Está nervoso rapaz? Deve estar. Parece jovem. Deixe-me contar uma história, é um tanto intrigante. Veja bem. Quando estava na sua idade, servi ao forte de Ponta Dragão, assim como você agora. É, foi uma coisa horrível, quase sempre gaguejava. Nunca sabia como dirigir a palavra aos meus superiores. A diferença é que eu cheguei até aqui provando meu valor à eles. E você? O que fez?

Não esperou resposta. Enfiou um punhal na garganta do rapaz, abrindo sua garganta e queixo, o deixou cair ao chão e retirou a lâmina, limpando-a sob o manto do jovem.

—Voltem ao navio, temos uma longa viagem de volta as ilhas. Deixem que os corvos trabalhem nos corpos.

O Vento negro, como era chamado o couraçado, era ainda mais temível quando se estava la dentro, como prisioneiro de guerra. Simon e o restante da tripulação foram acorrentados ao chão e onrigados a realizar todo o trabalho pesado, trabalho com remos, esfregar o chão. Por fora, Vento negro era poderoso, imparável. O maior navio de guerra daquele lado do mar. Por dentro, era como um forte vazio e frio, nada possuia além de espaço e homens sem voz. Era como se fantasmas caminhassem por ali.

Dia após dia e noite após noite remaram, com direito a uma concha d'água por dia e um pão velho que sobrava da janta da companhia das Ilhas Pratas.

Simon conservara seu naco de pão durante uns dois dias. Pretendera comer assim que atracassem, dizendo a sí mesmo que conseguiria mais forças para escapar, antes de ser vendido como escravo. Contudo, passara a viagem inteira ao lado de um sujeito que não comera. Não sabia dizer quanto tempo estava ali. Mas sabia que jazia tempo, pelo corpo magricela e rosto encovado, sabia que já não recebia mais comida. Um cão possuí mais honra.

— Aqui! Coma.— oferecera seu único alimento ao estranho.

Não pensou duas vezes, pegou o pão com pressa e comeu, antes que Simon pudesse se arrepender.—Qual seu nome? Perguntou.

— Klaus.

Algo naquele nome parecera estranhamente familiar a Simon. Além de que, nunca havia escutado aquele sotaque.

—Conheço muitos lugares Klaus, alguns até os deuses duvidariam. Mas ocê não é daqui. Digo, deste país. De onde é?

O silêncio tomou conta entre os dois. Nada mais dissera Klaus a Simon. Fora um agradecimento pelo naco de pão oferecido.

O navio atracara no porto da ilha principal de Pratas, famosa pela quantidade de prata encontrada em sua região em tempos antigos, que fizera com que as ilhas enriquecece facilmente.

A cidade portuária de Pratas possuía um aspecto paradisíaco, areias limpas e águas cristalinas, via-se claramente o recife de corais formados ao longo da costa. Isso e aquilo de algumas tendas alimentícias, alguns garotos brincando na areia. Mas Simon nao se deixava enganar. Sabia que as ilhas Pratas eram cidades escravocratas. E Klaus saberia em breve.

—Andem, filhos da puta! Rezem para que sejam comprados.— o soldado soltou uma longa gargalhada, carregada de mais escárnios.

Klaus já não se hidratava a muitos dias, e um único pedaço de pão não seria suficiente para mante-lo firme. Estatelou-se no chão como um saco de merda.

Que merda é essa? pensara Simon.

—Pelos sete infernos! Levante-se, inútil.—aproximou-se do corpo ao chão e o revirou.

Klaus enrolou suas correntes no pescoço do maldito soldado e arrastou-o junto ao chão.— Reze para que seu deus exista, e que ele seja misericordioso. Cochichou ao ouvido dele enquanto o enforcava.

O rosto do soldado tomou um aspecto roxo azulado, começou a contorcer-se,soltando de vez enquando um som esganido.

Aquela decisão de Klaus foi o estopim para outros escravos se juntarem à ele e a se revoltarem.

Simon correu ao corpo jazido morto ao chão e arrancou as chaves às pressas, libertando a sí e a seus companheiros. Klaus se soltara sozinho. Arrebentara a corrente na garganta do soldado e as correntes nos pés, usou a espada do mesmo.

—Agradeço por isso! Mas o que fará a respeito desta revolta? Pergutara Simon.— veja, mais e mais soldados armados contra escravos acorrentados e desarmados.

—Não pedi que me seguissem, fiz isso por mim. Não sou lider de nada.

Após metade do dia, a rebelião foi cessada e os escravos que participaram, foram pregados em postes com pregos do tamanho do punho de um homem. Grandes o suficientes para causarem dor. Foram chicoteados e aqueles que imploraram por perdão, tiveram seus olhos arrancados por soldados, usando uma faca cega e pontas de flecha. Num beco qualquer, alguns soldados estupravam algumas jovens garotas, todas escravas, choravam e gritavam sem parar. Ao passo que, um outro chicoteava uma criança. deveria ser filho de uma das moças. Usando-a como exemplo para aqueles que ainda sonhavam com a liberdade.

Klaus se encontrava em Nenhum -lugar. Uma curiosa estalagem afastada da cidade de Pratas. Sentou-se ao fundo, em um canto onde julgara que teria paz e pediu um caneco de cerveja preta, sopa e ovos cozidos. Estava exausto, tudo que desejava era uma boa comida e uma boa cama, se é que conseguisse ali. Observara na outra ponta alguns guardas, todos bêbados e alegres. Um havia pegado uma moça pelo braço e a colocou no colo, cortejando-a sem parar. Outro estava bêbado dmais, subia à mesa e fazia suas graças enquanto seus amigos alegravam-se e riam sem parar de suas piadas.

Trabalha melhor de bobo do que como cavaleiro.

—Três moedas de prata pela comida e um abrigo! Disse ao dono.

—Quatro!

O velho era uma coisa curiosa. Rosto severo e cansado, magro, alto e corcunda. Aparentava ter lá seus sessenta anos. Não viveria mais do que isto, muito menos, sairia daquela estalagem para mundo afora.

—Ofereço três pratas e duas de cobre. Nada mais!

Encarou o velho com aqueles olhos negros e tristes.

—Humpf! Feito.— o velho não saira contente, mas todo dinheiro seria bem vindo, não importava de quem. Era a única estalagem no meio daquela maldita ilha que não se importava se era escravo ou dono. E não iria querer problemas com alguém daquele tipo.

—E mais!Exclamou.— abra a boca àqueles guardas, e eu mato eles e você, velho.

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