1 Bastarda

Alana agarrou a rama esverdeada, puxando-a bruscamente do solo e encarou as batatas cheias de areia, se perguntando se estavam maduras o suficiente para o consumo, no fim, sem chegar a uma conclusão, deu de ombros, e as jogou no cesto. Todos naquele orfanato tinham funções, e as meninas mais velhas, como ela, cuidavam das hortas ao redor da catedral.

Foi tirada de seus devaneios quando, numa demonstração da ruptura que estava prestes a acontecer, de repente, começou a chuviscar, e o dia antes ensolarado, deu lugar a nuvens negras que “fechavam” o tempo, escurecendo rapidamente os céus.

“Parece que vai chover…” A moça pensou consigo mesma, olhando ao redor, ficando preocupada com as outras crianças que corriam no campo aberto.

– Entrem, o clima está ficando perigoso, pode haver raios! Gritou apontando para as nuvens escuras sobre sua cabeça. – Cuidado para não se machucar.

– Será que algum raio derrubará a velha árvore? Uma das meninas, questionou rindo, e contagiando as outras meninas que saltavam como pequenas gazelas, pouco se importando com a periculosidade da situação.

– Ora, suas pestinhas… – Alana resmungou, mas riu, pegando sua cesta e levando-a consigo.

Quando chegou ao salão, suspirou desenrolando seus cabelos úmidos para que secassem, e uma cascata de fios loiros escorreu por suas costas. Enquanto caminhava para a cozinha, planejando ajudar no preparo da sopa, passou por duas moças da sua idade e as ouviu cochichar.

– Tá vendo, de que adianta ser loira de olhos azuis e ninguém te adotar? Uma delas perguntou sussurrando em tom de deboche. 

– Ouvi dizer que o marido, daquele casal, queria fazer coisas com ela… – A outra concordou, sorrindo de forma maldosa. – Por isso que a diretora recusou o processo de adoção.

– Sério? Será que ela deu lugar? 

Alana não ficou para ouvir o resto da conversa, já estava cansada de todos aqueles burburinhos maldosos. Era verdade que todas as suas tentativas de adoção eram mal-sucedidas, mas não achava que realmente fosse por causa disso, ao menos, em seu coração, desejava que não fosse .

Estava lavando as verduras que havia acabado de colher quando ouviu seu nome sendo chamado, se virou e percebeu que era uma das freiras, então, secou as mãos no avental e respondeu obedientemente um “senhora?” 

– A Madre Superiora está te chamando na sala dela… – A mulher explicou e permaneceu esperando-a, se certificando que a moça realmente iria.

– Eu fiz alguma coisa errada, irmã Emma? Alana indagou confusa enquanto seguia a outra pelo corredor.

Ela não respondeu, deixando a menina ainda mais ansiosa, e então, quando ambas pararam em frente à porta do escritório da Madre Superiora, tocou duas vezes com as costas da mão, anunciando a presença de Alana, então sussurrou um “boa sorte”, indo embora em seguida.

Alana a fitou indo embora, mas não conseguiu perguntar mais nada, pois recebeu a permissão para entrar. Então, respirou fundo, empurrando a porta e quando se viu dentro do escritório, notou que havia um homem sentado numa poltrona de frente para a mesa da Madre Superiora. 

Ele era alto, usava óculos de aros finos e seus cabelos escuros eram penteados para trás no estilo Quiff, combinando com sua barba perfeitamente arrumada. Além disso, ele vestia um terno de corte fino, preto sem gravata, e ao seu lado havia uma pasta de couro preta.

Aos olhos da menina, parecia um advogado e estava certa.

– Este é Lorenzo Pellegrini! A Madre Superiora, uma mulher de meia idade, explicou erguendo-se, contornou a mesa e apontou o homem. – Ele será seu responsável a partir de agora.

 Ouvir aquelas palavras fez a menina engasgar com a própria saliva, tossiu algumas vezes e então, olhou confusa de um para o outro, piscando enquanto, inconscientemente, beliscava seu braço, conferindo se estava acordada mesmo.

– Eu fui adotada? Perguntou surpresa.

– Pode-se dizer que isso é um resgate... – Lorenzo explicou, mesmo suas palavras não dizendo muito, seu timbre era polido e sua voz suave.

– Desculpe, mas eu não entendi... – A menina murmurou envergonhada, e sem conseguir fitar o homem diretamente nos olhos. – Poderia me explicar mais?

– Conversaremos mais sobre isso no caminho… – Lorenzo respondeu, mas ainda de forma evasiva, então se levantou, pronto para ir embora. – E não se preocupe em fazer uma mala, seus novos pertences já estão em seu quarto novo.

Os joelhos de Alana começaram a tremer, a verdade era que ela estava mais assustada do que feliz pois, a falta de respostas só a deixava mais ansiosa. Olhou para a Madre Superiora novamente, mas recebeu um olhar de desaprovação, como se dissesse: “o que mais você quer?”, o que fez a menina se sentir solitária, no fim, sem opções, apenas abaixou a cabeça resignada.

Enquanto desciam a longa escadaria de pedras, ela olhava de soslaio para o homem, notando que, vez ou outra, ele checava seu relógio, como se estivesse com pressa. Suspirou, e quando estava prestes a entrar no carro, ouviu seu nome sendo chamado. Olhou para trás imediatamente, reconhecendo a voz e sorriu com lágrimas nos olhos.

– Estou tão feliz por você, Alana! Joana, uma das freiras, comentou enquanto a abraçava, apertando-a, agarrou seus ombros e a encarou nos olhos. – Comporte-se, está bem? 

Alana balançou a cabeça positivamente, então depois de receber um beijinho na bochecha, entrou no carro chorosa, mas em silêncio. Soltou um suspiro, apertando as mãos nos joelhos, e então, sentiu algo em seu bolso. Procurou pelo que poderia ser, e de lá, retirou um pedaço de papel, imaginando que Joana poderia ter colocado quando a abraçou.

Olhou novamente pelo canto do olho para Lorenzo, confirmando que estava ocupado numa ligação, e desdobrou o papel, percebendo que, na verdade, não era um bilhete como havia pensado, e sim, um pedaço de uma das folhas do caderno-registro de adoção.

Arqueou uma sobrancelha, se perguntando porque aquilo seria importante e então, percebeu que havia uma anotação rabiscada em vermelho sobre os dados digitados, mostrando que em seu nome havia um total de vinte seis tentativas de adoção, todas negadas, era como se alguém estivesse impedindo sua adoção.

“O que isso significa?” Alana pensou consigo mesma.

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