Capítulo 04

Montelite 

De cada lado daquela região fria e com “ar” de guerra, havia um caso diferente. Alana de um lado, Nathan de outro, Victor L de outro.

-Mãe a senhora precisa ser forte.- Alana enxuga do rosto da mulher algumas lágrimas. Mas de certa forma era impossível enxugar todas.

Helena Forgari não é capaz de responder nada à respeito. Apenas olhava com seu olhar avermelhado os restos do chalé em que viveram.

Alana caminha devagar até o que restou do humilde casebre. Alguns vizinhos tentavam ainda conter as chamas ao redor.

-Deuses- murmura, depois observa Miguy, a fadinha sentada em seu ombro.

Anda mais um pouco, recolhendo do chão imundo o pedaço de camisa surrada que encontra. Era de seu pai. Ela reconheceria as listras coloridas da camisa em qualquer lugar. Sua expressão de espanto é notável ao ver que no trapo há também restos mortais e sangue seco. Ela joga-o para longe, já sente as lágrimas quentes lhe rolando face abaixo.

“Ela só não me obedeceu mais uma vez”, a voz de seu pai ecoa em sua mente, lembrando de quando perguntara à ele sobre sua mãe.

De certo modo a raiva misturava-se à angústia e medo de agora em diante passarem fome. A fome era um monstro. Um dos piores. E Alana sabia que este monstro era capaz de corroer suas vísceras e o que ainda lhe restou de força.

-Miguy, não sei...papai trabalhava para nosso bem ou pensando somente nele?- diz ela para a fada.

A pequena criatura se irrita por ser muda e não poder dar para a amiga humana uma opinião. Forçava as pregas vocais, tentando de forma inútil dizer algo.

Em meio às lágrimas soltas lentamente Alana ri de leve.

-Eu sei que você não pode falar, Miguy.- diz – E também sei exatamente o que diria. Com certeza algo que me deixasse melhor.

A fada pigarreia, satisfeita. Logo percebe que Alana é muito mais inteligente do que sempre mostrou ser.

Alonso, seu irmão mais velho se aproxima. Sua expressão é de um horror misturado com confusão, seus olhos estavam lacrimejando, e com certeza sentia por dentro o estômago se revirar. Costumava-se ficar assim quando nervoso.

-Nós perdemos todas as nossas coisas. Eu não acredito que...

-Cale-se –Alana logo o interrompe.- Papai está morto...e no que você vem falar? – ela sorri em sarcasmo- Você vem me falar que perdemos nossas coisas?!

Alonso à encara como um gato encara um pássaro.

-Deveria ficar calada. O que uma mulher pode fazer? Nada ...Alana. Servem para parir e lavar chão. Para que este posto de guerreira? Se você não é! Você não pode sustentar a gente, você...

-Deixe- me em paz!

Ele à levanta a mão.

-Se atreva a encostar em mim,Alonso. Se iguale ao pai, para ver o que te acontece. Vai terminar morto com uma adaga enfiada nessa sua cabeça.

Alonso ri, porém parecia nervoso

-Idiota.- retruca, já saindo dos arredores dele.

-Espere.- ele à chama de volta.

Alana respira fundo e se volta para o irmão.

-Já que é tão esperta, sabe quem fez isso tudo?- aponta para a destruição que os cercava.

Ela permanece pensativa, querendo dar uma resposta mais concreta o possível.

-Creio que a corte Cleriana tenha a ver com isso. Prometeram que nos atacariam. E assim o fizeram.

- O filho de Rick Velásquez têm o acompanhado minuciosamente em tudo que o pai faz. – logo diz Alonso.

-Acho que o jeito seria matá-los. Mas precisaríamos de mais. Devíamos ser um grupo, sabe? Ou tentarmos um acordo, acha que daria certo?

-Não sei se é possível entrar em algum tipo de acordo com essa gente.

Apesar do irmão ter se mostrado estúpido, Alana reconhecia de que ele estava certo.

Pela tarde trataram de ir para uma clareira na mata. Alana, a família e mais alguns outros que perderam suas casas. Uma grande fogueira foi feita para esperar o cair da noite, seria um dia em que ninguém comeria nada.

Recostada em um caule de árvore,Alana sente a testa da mãe arder em febre.

-Mãe, o que está sentindo?

 Helena Forgari se revira, inquieta.

-Dor, Alana acho que... vou morrer.

-Não mãe, a senhora não vai – mais uma vez as lágrimas insistentes fizeram caminho pelo seu rosto. – Eu vou ajudar a senhora. Amanhã vamos procurar uma curandeira.

O restante da noite foi fria, e pela madrugada Helena tossia e agonizava, a febre também lhe causava delírios. Seu corpo inteiro tremia. Alana apertava-a como se assim fosse lhe impedir de ir.

Logo ao amanhecer havia um murmúrio de pessoas famintas e com frio pela volta. Até uma mulher se aproximar:

-Ela está muito doente moça. Seus olhos entregam uma infecção. Pupilas amareladas...é sua mãe?

Alana assentiu, com medo das informações dadas pela desconhecida.

“Deus, você existe?”, logo pensa ela, que jamais dirigira a palavra à este nome sagrado antes.

Não queria mais chorar e parecer fraca. De fato, ela era. Naquele momento ela era muito fraca.

-Conhece uma curandeira?-Ela logo pergunta.

A mulher morde o lábio superior, treme um pouco de frio. Alana observa o bebê que ela guarda nos braços, um recém nascido agarrado em seu seio direito.

Enquanto ajeita a criança, responde:

-Minha prima é uma bruxa. – ela abaixa o tom da voz.- Estamos indo para a casa dela. Se quiser vir conosco.

-Minha casa foi queimada.- ela olha para os irmãos- E... meu pai morreu. Acho que ela ficou assim por conta disso. - ela observa a mãe, acariciando seus cabelos sebosos.

-Ela vai morrer se não levá-la. Vocês que decidem. Eu e meu marido vamos arrumar nossas coisas, pode arrumar as suas se quiser vir. Resgatando do incêndio uma carroça – aponta para um veículo de rodas velhas.

Alana até se intimida de andar naquilo. Parecia muito pouco confiável. Mas era o que tinham se quisesse salvar a mãe.

-Vai ir na casa de uma bruxa?-Alonso diz- Essas criaturas são traiçoeiras. Pare com isso. Ela vai é matar a gente.

-Chega de dar opiniões no que eu tenho ou não que fazer.-ela se levanta e põe a cabeça  da mãe no colo do irmão.- Cuide dela enquanto eu arrumo tudo.

Na carroça apertada iam Alana,os dois irmãos, sua mãe, a mulher com o recém nascido e o marido.

Helena Forgari quase não respirava direito. Alana sentia que o coração da mãe estava fraco demais.

-Mãe...em falta de ti o que farei?

-V...você é mulher, filha. Não fique só nessas redondezas em minha ausência. – tosse- Os homens são nojentos e estúpidos. Cuide de seus irmãos. É só o que te peço.

A viagem seria longa, já estavam avisados. Alana cochilou, mesmo com os solavancos do terreno esburacado. Nesse meio tempo, um breve sonho lhe chegou.

Se via correndo em um campo de vegetação e flores altas, do tamanho de um adulto, todas elas brancas e amarelas. Havia um espelho imenso recostado no caule de uma imensa árvore. Parecia desproporcional para estar tal objeto, mas Alana não pensou muito nisso. Só queria ver seu reflexo exposto ali. Seus passos lentos lhe guiaram até a frente, revelando os enormes cabelos negros, as roupas impecavelmente luxuosas, um vestido longo e vermelho, que com finos raios de sol brilhava.

Ela passa as mãos pelo corpo,surpresa. Era a primeira vez que se via daquela forma. Após realmente ver o luxo em que se encontrava, o reflexo do espelho mudou sua forma. Uma jovem de cabelos castanho-claros cacheados a observava. Usava roupas douradas, seus olhos estavam fixos nela. Alana repousou seu olhar atento sobre a garota. Percebeu as orelhas levemente pontudas, os pulsos ensanguentados e as expressão triste.

De início pensou que era sua forma que havia mudado, mas depois notou que se tratava de uma outra figura.

-Quem é você? – sentiu sua voz ecoar nas montanhas.

-Sophia.

Foi a única coisa que ouviu da boca daquela figura jamais vista por ela. Então seu sonho acabou.

O despertar foi em um “baque”, com um trovão ecoando pelo céu. Os relâmpagos tomaram conta das fissuras da carroça. Helena Forgari estava gelada, quase não tinha mais pulsação.

-Por favor –Alana pede para a mulher com o bebê – Está muito longe? Ela está gelada e...

-Não estamos longe, senhorita. Mas acho que há um problema. – o marido responde no lugar da esposa.

O coração de Alana palpita. Qualquer coisa que lhe mostrasse atraso para salvar sua mãe, lhe apavorava.

-O-o que?

Mais um trovão.

-Estou vendo um grupo de cavalaria no mesmo caminho em que estamos. Porém em nossa direção.

Alana mistura as imagens do sonho com a dúvida de quem seria aquele grupo. Medo de ser alguém do rei.

A carroça foi parada para que os outros desconhecidos pudessem passar. Mas não foi o que fizeram. Agiram com violência já ao descer, seis homens vestindo capas negras. Em meio deles uma mulher. A luz dos candeeiros mal iluminavam aquela noite chuvosa. O olhar de Alana ficou mais atento, suas pernas tremeram como nunca.

De repente, Miguy a fada, aparece. Alana talvez até estivesse esquecido do minúsculo ser, já que aparecia e reaparecia a qualquer momento. Tentava gritar algo e brilhava além do normal.

Assim que o homem tentou argumentar,Alana viu uma espada lhe decepar a cabeça. Foi notável que não eram pessoas pacíficas. A mulher grita ao ver o marido cair morto tentando ao mesmo tempo proteger o filho. O sangue escorra pelas valas cheias de água.

Logo, a que parecia líder de todos aqueles seis homens, se aproxima.

-Posso ver seus olhos azuis –dize ela para Alana , focando uma chama de luz em seu rosto. –É Alana, não é? É de você que preciso.

Alana não fazia ideia de quem fosse, via apenas o cabelo volumoso da desconhecida, sem saber de sua voz, nada.

-Eu sou Alana – confirma

A indivídua ri.

-Eu saberia mesmo que negasse. Vamos homens! Matem todos e me tragam a garota! Não quero passar trabalho hoje.

Seu irmão Alonso vira em sua direção:

-O que você deve para essa maldita?

- Eu nem a conheço, irmão.

Os sentimentos de desgraça e dor inundam tudo. O pavor toma conta. Alana só escutava a mãe dizer que fugisse, que a deixasse porque afinal estava praticamente morta. Ela queria dizer para a mãe parar de falar idiotices, que estava parecendo Alonso. Mas a ocasião não lhe permitia. A tensão lhe torturava.

-Quem é você?! – pergunta

A assassina se volta para ela.

-Sou Stefânia Venax. Líder dos Cavaleiros Negros.

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