Capítulo 6

Mais um dia de faculdade, já falei que estou amando? A sensação de estar estudando algo que ama pra trabalhar com isso é muito bom. Faz pouquíssimo tempo que começamos o curso, mas já aprendi tantas coisas, já melhorei muito minha técnica e pretendo aperfeiçoar ainda mais. Meu sonho é ser uma grande estilista, quem sabe ter minha própria marca.

Infelizmente hoje recebemos a notícia que um dos professores precisaram faltar, ou seja, teremos duas aulas vagas. As meninas estão terminando um trabalho que eu já finalizei, então resolvo ir passar meu tempinho livre em um lugar fora da sala de aula.

Vou pra uma das várias mesinhas que tem pelo campus, espalho alguns materiais e começo a rabiscar qualquer coisa. Fico meio cabisbaixa ao lembrar da Emily cada vez mais perguntando pelos nossos pais, isso me deixa péssima, mas não posso fazes nada que eu já não faça.

— Não é que você tem talento mesmo pra coisa — alguém fala atrás de mim e tenho um susto.

— Obri— travo quando vejo quem é. — obrigada — agradeço.

Os olhos esverdeados do Thomas me encaram, fico totalmente sem jeito.

— Por que você não consegue agir naturalmente quando eu me aproximo? — Ele pergunta com uma cara maliciosa, nossa que chato esse cara. — Acho que eu não deveria tá te incomodando, desculpa, gatinha.

— Eu só não sabia que era você — tentei agir com indiferença fazendo alguns detalhes do meu desenho. — Aconteceria com qualquer pessoa.

            Ele sorri de lado e se senta perto de mim, seu corpo fica relaxado e passa a mão em seu cabelo deixando em um aspecto bagunçado. Não tinha reparado tanto nele, é magro, mas não tanto, digamos que ele tem onde pegar. AI MEU PAI, ELENA, POR QUE VOCÊ TÁ PENSANDO ISSO?

— Cadê sua amiga? Sophia o nome dela? — Thomas questiona tirando meus pensamentos sobre ele.

— Está tendo aula — como é possível alguém me desconcentrar tanto a ponto de eu não conseguir apontar o lápis? — Se me dá licença, vou ao banheiro — falo juntando as minhas coisas, pois eu não me sinto confortável perto desse garoto.

— Não — ele diz meio enrolado impedindo que eu arrume minhas coisas — fique, eu saio, eu sei que você vai sair por minha causa. Eu não queria te atrapalhar, mas já que eu te incomodo tanto, eu saio. Sem problemas. — Ele fala e sai de cabeça baixa.

— Espera Thomas — fico envergonhada pelo que acabou de acontecer. Ele vira e me olha. — Fica... — Suas pernas pensam em simplesmente seguir seu caminho, mas em três segundos depois já está sentando na minha frente de novo.

— Desculpa Elena, eu sei que fui um babaca com você no primeiro dia de aula, meio que eu estava estressado naquele dia — ele diz olhando pra baixo. — Não sei porque estou te pedindo desculpas, mas você levou muito mais a sério do que deveria.

— Eu diria que não se desconta estresse em ninguém, porém eu seria uma hipócrita — rimos, ele para e fica olhando fixamente pra mim. — Eu só defendi ela daquela forma porque a Sophia é uma das pessoas mais importantes na minha vida. Sem ela provavelmente eu nem estaria aqui. Se você tivesse falado comigo eu nem teria respondido.

— Se ela que abriu seus olhos pra esse talento, está certíssima — ele afirma abrindo uma pasta minha cheia de desenhos.

— Na verdade eu sempre gostei — que metido. Tomei a pasta dele (não gosto que ninguém olhe antes de estarem prontos). — Mas ela que me ajudou a superar uns momentos difíceis da minha vida, que disse pra eu não desistir do meu sonho.

— Que momentos? — Ele questiona sério. — É só curiosidade, se você não quiser falar...

Eu provavelmente não falaria, diria que não é da conta dele, realmente não é, mas não tenho nada a perder mesmo, só estou trocando uma ideia, não é?

— Tudo bem, eu não ligo. A quatro anos atrás minha mãe morreu em um acidente de carro, eu tinha catorze anos, estava passando por uma fase da minha vida maravilhosa quando um milésimo de segundo mudou tudo — sinto lágrimas escorrerem, apesar de eu ter falado o mais rápido possível pra evitar isso, mas não consigo.

— Elena, eu não sabia, me desculpe, não precisava falar, tudo bem não tem problema — ele fica preocupado, mas olho pros lados vi que não tinha ninguém por perto, então resolvi continuar.

— Ela foi ao supermercado fazer compras, tinha chovido a noite inteira e a pista estava molhada. Ela perdeu o controle, caiu em um barranco e o carro pegou fogo — as palavras saem como lâminas em minha garganta, nem olho pra ele se quer, enxugo uma lágrima perdida em meu rosto. — Eu pedi várias vezes pra ir com ela, queria sair de casa naquele dia, mas minha irmã chorou e fui ficar com ela já que meu pai não tinha jeito com ela — suspiro lembrando de cada detalhe daquele dia horrível.

— Eu sinto muito — ele fala depois de alguns segundos silenciosos. — Eu realmente não sei o que dizer. Mas e seu pai?

— Meu pai simplesmente desapareceu quando soube da morte dela, desde aquele dia não tenho notícias — um sorriso irônico escapa na minha expressão, agora uma raiva percorre todo meu corpo. — Ficamos eu e meu irmão mais velho cuidando de nossa irmãzinha mais nova. — Eu não deveria ter começado contar essa história. Por que mesmo eu aceitei entrar nesse assunto? Eu sempre evito ele, é minha forma de defesa, evitar esse assunto.

— Elena, você não está sozinha! — Thomas percebe meu desespero e me abraça tentando me acalmar (nunca pensei que ele fosse capaz de fazer isso por mim). — Vamos sair daqui, ok? Me desculpe, isso é culpa minha, eu sou um intrometido.

— Tudo bem, você não tem culpa — enxugo as lágrimas e forço um sorriso. — Thomas, não precisa se preocupar, isso já é passado, ainda dói, mas passa.

— Mas eu me senti culpado.

            — Não se sinta — tento passar calma pra ele, odeio quando essas coisas acontecem, as pessoas sabem dessa história e ficam mais mal do que eu só por ter me feito falar. — Pra onde vamos? — Digo me referindo a ele ter me chamado pra sair daqui.

Pego minha mochila, ele segura meu ombro e fomos até uma pracinha próxima da escola que está vazia.

— Obrigada, Thomas — agradeço e dou um leve sorriso quando chegamos lá, ele retribui e que sorriso bonito. — Desculpa meu desespero, é que esse assunto me deixa um pouco imprevisível, eu nunca sei se vou sentir raiva ou tristeza, as vezes os dois.

— Eu que pedi pra você falar, não tem que pedir desculpas — nos sentamos em um banco.

— Você não tinha como saber, ninguém sabe antes de eu contar e nunca dá pra saber como será a reação das pessoas, é uma história meio louca.

— Podemos mudar de assunto? — Ele pergunta em um tom diferente. — Prefiro bem mais sua versão barraqueira!

— Não ouse! — Falo ameaçadora.

— Não está mais aqui quem falou — ele levanta as mãos pra cima se rendendo e faz um zíper na boca. Eu começo a rir e ela ri também.

Como assim eu estou tendo uma conversa com ele? Com o Thomas. Esse é o mesmo cara metidinho de merda, salafrário que se acha o popular? Não acredito, chega a dá medo de eu estar sendo trouxa, enganada, sei lá.

Ele pede dois sorvetes em um carrinho daqueles de parque, e enquanto chega escuta um áudio que me parece ser uma música em seu celular.

— É uma das suas músicas? — Pergunto curiosa.

— Na verdade eu só faço covers, elas não são minhas — ele diz colocando um vídeo no Youtube, segura o celular na minha frente e presto atenção em cada detalhe de sua performance cantando.

Não é que ele canta realmente muito bem, deve ser por isso (e outros quesitos estéticos) todo esse sucesso. Ele estava fazendo um show e parece apaixonado no vídeo, talvez pela música, talvez ele tenha planejado atuar daquela forma, ou realmente estava apaixonado.

— Por quem você estava apaixonado quando gravou o vídeo? — Pergunto sorrindo quando o clipe acaba.

— Por ninguém, é apenas a música, ela me faz ficar assim — responde guardando o celular no bolso.

— Não é o que parece — brinco.

— Eu nunca me apaixono — fala orgulhoso e rio pela forma como isso sai da boca dele.

— Não é isso que todos os playboyzinhos riquinhos como você falam? Até achar alguém realmente interessante e se apaixonar? — Sorrio maliciosamente e ele revira os olhos.

— Não no meu caso, da onde tirou isso?

— Dos filmes, das séries, dos livros, das novelas, da vida... — agora ele ri e balanço os ombros concordando.

— Mas e você?

— Eu o que? — Questiono sem entender.

— Vai me dizer que na festa do sábado você foi só beber água e passou uma hora no banheiro? — Dou uma gargalhada e ele levanta as sobrancelhas.

— Eu só estava me divertindo — digo o óbvio. — Mas parece que em vez de fazer o mesmo, você estava prestando atenção em mim, ou essa era sua diversão? — Provoco dando a última mordida no meu sorvete.

— Não muda de assunto, você estava com um cara — fico boquiaberta com ele afirmando isso na cara dura.

— Cinderela nunca pediu por um príncipe, Thomas, ela só queria um vestido e uma festa — falo e ele fica calado sem respostas.

— Ok, sem nem mais o que dizer, vou embora depois dessa — bato de leve no braço dele rindo e ele continua balançando a cabeça negativamente incrédulo.

Ficamos lá por bastante tempo, só voltamos quando já ia começar a próxima aula. Depois disso as horas passam rapidinho. Descobri que ele faz o segundo período de administração, seus hobbies são cantar, ficar de boas com os amigos "e tomar banho em sua enorme piscina" (ah ele também adora ficar se achando).

O idiota gruda tanto na cabeça, parece chiclete. Passei boa parte da aula pensando em nossa conversa “civilizada”. Me sinto até meio mal, sou orgulhosa de mais pra ter chamado ele de babaca, estúpido, salafrário, metidinho e agora ficar tudo bem como se nada tivesse acontecido. Mas ele não deixa de ser essas coisas só por ter sido legal hoje.

Chego em casa um pouco tarde hoje pois ainda passei na casa da Nat pra adiantar um trabalho, então infelizmente pela hora a Emily já está dormindo (odeio não dá boa noite pra minha pequena), mas pelo menos o Eric tem se mostrado bem mais responsável.

— Boa noite, Elena — ele diz assim que chego e percebo que está fazendo sessão cinema com a Sara.

Entro fazendo a cara mais maliciosa que eu consigo, vou me aproximando escorada na escada e eles me observam e riem.

— Desculpem atrapalhar, podiam ter ligado pra eu não entrar pela porta da frente — o Eric joga uma almofada em mim e a Sara ri. — Que foi? Com vergonha da sua irmã, maninho? — Joga outra almofada, mas eu desvio dessa vez. — Tudo bem, vou saindo — subo as escadas de costas tropeçando em tudo ainda com a mesma cara. — Se protejam, gente, não estou podendo comprar presente de afilhado no momento — vou subindo rápido dessa vez e escuto a risada dos dois.

— Volta aqui, Elena — Eric grita e na mesma hora me viro e volto. — Preciso apresentar sua cunhada — olho pra Sara que está com um sorriso tímido no rosto.

— Muito prazer, Elena — ela levanta e me dá um abraço (gostei dela).

— O prazer é todo meu — respondo educada ainda olhando com cara maliciosa pro Eric que me mostra o dedo do meio sem a Sara perceber.

— Você divide seu irmão comigo? — ela pergunta e meu irmão tenta esconder a cara de constrangido

— Quer ele todo? Pode levar — digo e rimos (menos ele).

— Está me dispensando, é maninha? Valeu viu — dei um beijo em sua bochecha e resolvi deixá-los a sós.

Não acredito, ele está namorando. Fico sorrindo igual uma boba enquanto guardo minhas coisas, tomo um banho e visto um pijama confortável. Preciso fazer algumas coisas hoje ainda, então nada melhor que relaxar um pouco antes.

Fico estudando para um seminário até tarde, preciso me sentir mais segura com essas coisas de trabalho, eu sou muito nervosa.

Quando acho que já estudei bastante vou ver alguns covers do Thomas, até que não é tão ruim. Lembro de como ele foi legal comigo hoje e atencioso, mas ainda assim é um metidinho que gosta de se achar. Meus olhos começaram a pesar e resolvo ir dormir, amanhã é mais um longo dia e preciso descansar.

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