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Ao sul da Isla de los Sueños, Hank abriu os olhos cristalinos. Fechou-os logo depois, ofuscado pela luz do sol. Cobriu o rosto com o antebraço esquerdo e esticou preguiçosamente a mão direita para acariciar o corpo da mulher. No entanto, a mão que procurou pelo corpo feminino encontrou apenas a rocha lisa e molhada pela água.

Ele voltou a cabeça. Girou o corpo, sentou-se. Escrutinou com cuidado toda a superfície do rochedo. A sensação de abandono era terrível. Estava sozinho, acompanhado apenas pelos cilindros de oxigênio e as nadadeiras...

Apesar das evidências, se recusou a acreditar que ela o havia deixado; que sumira da mesma maneira que aparecera, como se tivesse vindo e voltado para o nada.

Ergueu-se de uma vez, equilibrando-se mal e mal nos pés descalços. Precisou se apoiar em uma das pedras, por causa do zumbido nos ouvidos e da visão turva. Ergueu a cabeça, respirou fundo, esperando o mal estar passar. Felizmente foi rápido. Em poucos minutos estava novamente bem. No entanto, uma ardência incômoda se espalhava pelo corpo. Além disso sentia sede e muita fome!  

Apesar do desconforto, não deu atenção aos pedidos do corpo. Insistiu em correr os olhos pelos rochedos, na esperança de ver a mulher brincando com os pés na água... Ou penteando os cabelos, absorta com sua imagem no espelho, como as sereias das histórias infantis...

Esticou os olhos para o mar. Só enxergou a vastidão das águas... Ainda caminhou pelos rochedos. Voltou novamente os olhos para o mar. Observou insistentemente toda a natureza a seu redor. Nada. Além dele, apenas a lancha sustida pela âncora, balança preguiçosamente ao sabor das ondas...

−Droga!

Queria chutar e esmurrar as pedras. Mas não fez nada disso. Ficou parado, enfiando as duas mãos nos cabelos, segurando a cabeça, os olhos perdidos no horizonte...

Onde ela estaria e quem era aquela mulher?! Uma turista encantada com a beleza do mar, a ponto de tirar toda a roupa e sair nadando como viera ao mundo...? Ou seria uma nativa? Uma mulher que morasse ali mesmo, na ilha, conhecedora das praias e do oceano, capaz de aparecer e desaparecer sem deixar vestígios, só para brincar de enlouquecer recém chegados, como ele...?

Certo. Talvez estivesse se enganando. Mas era-lhe custoso admitir que uma mulher fosse capaz de fazer amor daquele jeito só para se divertir e depois sumir!

Estava se sentindo tão sozinho, tão sem par que a única decisão que lhe pareceu sensata foi determinar-se a encontrá-la. Se fosse necessário iria virar aquela ilha de pernas para o ar....! Iria se apresentar a cada um dos turistas, providenciar um retrato falado, pregá-lo em cada uma das árvores e pedir informações até para as gaivotas!

− Eu vou te encontrar!!! − Hank berrou. – Se precisar, eu vasculho cada centímetro desse mar! Nem que eu precise drenar toda essa água e revirar as pedras do fundo! Nem que eu precise chegar no inferno! Mas eu garanto que vou te encontrar!!!

Apanhou seu equipamento de mergulho e se jogou no mar, para nadar em direção à lancha Ácqua II.

Depois que colocou o equipamento no interior da lancha, içou-se para dentro da embarcação com a força dos braços. De imediato, levantou a tampa do frigobar e procurou pela água.

Estava sedento e bebeu imediatamente um generoso gole de água. Mas a ardência no corpo era tão grande que lhe exigiu um banho improvisado. De repente, uma voz levemente rouca ecoou em sua cabeça, como num sonho longínquo: Tome um banho. Você precisa tomar um banho... Não se esqueça... Tem que tomar um banho...

Esparramou a água pelo rosto, pelos braços, ombros e peito. A operação para se livrar da ardência era quase dramática. Porém, um sorriso satisfeito se desenhava em sua boca. Seus pensamentos o levaram de volta à sofreguidão dos beijos, da fome com que ela se dera e com que o exigira...

−Moça...! Ah, eu vou te encontrar! − murmurou risonho, perdendo os olhos no mar. – Pode apostar nisso, garota! E eu vou fazer amor com você de novo! E de novo... e de novo...

O rádio da lancha chiou e a voz do operador do Karista emergiu do painel:

– Acqua II... Aqui Karista I, Karista I...

Hank respirou fundo. Sabia que só mesmo um assunto muito sério faria Dick Vanderbuild entrar em contato pelo rádio. Retirou imediatamente o rádio do suporte e respondeu:

Karista I. Aqui Acqua II, Acqua II, escuto.

Hank se reclinou sobre o painel, recebendo com prazer o calor do sol sobre o corpo nu. Enquanto esperava que o operador alterasse a transmissão para um canal de trabalho, procurou se lembrar onde havia deixado o calção de banho. Quando o localizou ao lado do banco, ouviu a inconfundível e pausada voz do Comandante Dick Vanderbuild:

– Acqua II, aqui Karista I. A bordo, Doutora Juliet Blair, do Centro de Preservação da Vida Marinha. Solicita esclarecimentos sobre a expedição, sob pena de embar...

Foi de repente, sem mais ne menos. Uma voz feminina se sobrepôs à do Comandante. E quebrando todo e qualquer protocolo de comunicação náutica, uma mulher visivelmente transtornada berrou do outro lado:

– Eu não desejo esclarecimentos de nada, seu cretino!

Hank chegou a afastar o corpo para trás, surpreendido pela voz e pelo tom imperioso com que ela gritava pelo rádio!

– Você está executando uma operação ilegal! Estas águas são protegidas pela Legislação Ambiental dos Estados Unidos! Se vocês não saírem daqui imediatamente, eu vou chamar a Guarda Costeira pra te colocar atrás das grades! Cretino!

Hank olhou para o rádio como se uma cobra fosse pular dali e picá-lo direto na jugular. A mulher havia arrancado o rádio das mãos de Dick! Não apenas contrariava os protocolos como passava a quilômetros do bom senso! Aquela louca estava berrando um amontoado de impropérios para ele!

A situação era ridícula. Ao ponto do próprio Dick encerrar o chamado com uma frase igualmente fora do padrão:

– Ouviu a moça, Hank. Estamos aguardando.

Era inegável a nota de divertimento que coloria a educada voz do Comandante. Se fossem outras circunstâncias, o próprio Hank também teria se divertido! O problema é que ele estava tão angustiado, se sentindo tão sozinho e abandonado, que bastou o falatório daquela Doutora Blair maluca para que a angústia se transformasse em irritação. Em segundos a irritação cresceu para uma raiva surda, absurda, explodindo de dentro dele como lava em erupção. Quando pilotou a lancha de volta ao navio, estava quase cego de tanto ódio!

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