Capítulo 4 - Prova

   Levanto às 6:30 da manhã, tomo um banho relaxante passando e repassando várias vezes o plano que criei antes de dormir. Serei rápido hoje e não a forçarei a nada para conseguir a confiança dela, já que seu histórico diz que não tem muita confiança em ninguém e que agride muitas pessoas sem que elas tenham feito algo contra ela, menos o tal paciente Liam que parece adorar irritá-la.

   Não demoro muito para comer, normalmente de manhã não me dá muita fome, só como porque minha mãe fez eu me acostumar com o hábito de comer pouco durante o café, ela me dizia que é melhor do que nada.

   Pego a estrada às 7:15 eu havia marcado de chegar às oito para a consulta e como não há transito para chegar em Santis Lorde não tenho com o que me preocupar. Além do que poderá acontecer hoje. Eu não espero nada de mais hoje com certeza não conseguirei nada, mas com o tempo talvez eu descubra o motivo de ela ser como é. Acho que se a garota fez muitas agressões no Manicômio tem que ter um motivo.

   Isso sempre me cai muito mal, sempre esperar o melhor das pessoas mesmo que elas não mereçam um pouquinho de esperança, mas enquanto em algumas pessoas isso falta, tem esperança até demais em mim.

   Meu irmão mais velho o Juiz Elliot Price, por exemplo, ele nunca entraria em uma cidade como Santis Lorde, mesmo que isso ajudasse nossos pais, meu irmão é muito esnobe nessa área. Nunca fomos muito amigos ou até mesmo próximos.

   Chego mais cedo e fico esperando no meu carro até dá a hora. Quando faltam apenas cinco minutos bato a porta.

     — Bom Dia, Dr. Prince — Samanta atende a porta com um belo sorriso no rosto, parece estar de bom humor — Estávamos esperando o Doutor chegar.

     — Bom Dia, Samanta.

   Ela dá espaço para que eu entre. Bridget está no balcão e acena para mim quando me vê, sorrio de volta educado.

   Samanta pega alguns papéis sobre o balcão e os entrega a mim, ainda sorrindo. Seu sorriso me faz lembrar do que Bridget me disse ontem, sobre Samanta dormir com um dos pacientes e lembro automaticamente de perguntar quem é o famoso Liam.

     — A Sra. Del Monte me pediu para entregar a você esses papéis, você terá que preenchê-los assim que a primeira consulta terminar — Ela explica e aceno com a cabeça, concordando — Abrimos hoje a ala de jogos mais cedo, sua paciente está junto com os outros. Há algo que gostaria de saber?

     — Na verdade tem sim. Eu gostaria que me mostrasse o paciente Liam, se não me engano é esse o nome.

   Os olhos de Samanta se arregalam novamente como ontem, parece que caiu a ficha. Liam é o paciente que dorme com Samanta. Ela tenta fazer seu sorriso voltar ao lugar, mas ela não tem sucesso com isso, Bridget se levanta do seu lugar e me espera próxima a pequena escada que há após o balcão querendo evitar o que está por vir.

     — Desculpe-me, mas por que quer vê-lo? — Ela suspira, ainda tentando sorrir.

     — Ontem quando estava lendo as ocorrências de minha paciente, percebi que havia um nome que se repetia constantemente e se quiser que eu prove, elas estão aqui na minha mão, o nome do paciente é Liam — Termino de falar e Samanta solta o ar que parecia estar prendendo.

     — Tudo bem, Bridget levará você para a ala de jogos o senhor o encontrará lá.

     — Obrigado — Viro-me para olhar Bridget, esperando — Bom Dia, Bridget.

     — Bom Dia, Dr. Price.

   Não preciso segui-la dessa vez, me recordo do caminho que tomamos ontem, então consigo andar alguns passos à frente de Bridget. Não nego que meu coração está saltando de nervosismo, espero que ele continue batendo e que não saia do meu peito.

   Estou nervoso e ansioso demais para ver e falar com a minha primeira paciente desde que sai da faculdade. Eu cuidei de pequenos casos durante a faculdade, mas nunca de casos como esse em que a pessoa talvez sofra mesmo de alguma coisa séria.

   Espero novamente Bridget entrar antes de mim e ouço também seu nome ser chamado por vários pacientes, mas ela espera ao lado da porta que eu entre. Encontro John novamente ao lado do mesmo sofá que estava ontem e o paciente alto e normal está no sofá conversando com John. A garota continua na mesma posição que estava ontem, mas hoje não está chovendo para que ela fique ali observando o nada, o que para mim é a mesma coisa que ficar observando a chuva.

   É claro que não contarei isso a ela já que ela quer olhar a chuva que olhe, mas espero que ela me escute e me ajude a tratá-la. Ambos sairemos ganhando com isso.

     — Eu explicarei a Catarina que ela terá um psicólogo a partir de hoje e depois deixarei vocês a sós e cuidarei dos outros.

     — Tudo bem — Concordo, mas antes que ela se afaste me lembro de algo — Bridget, antes me mostre quem é o paciente Liam?

     — Claro, é aquele ao lado de John no sofá — Ela aponta com um pequeno aceno de cabeça em direção ao paciente alto de barba e cabelo escuros.

   Agora entendo um pouco melhor o que acontece. Deixarei isso para discutir depois assim que tirar outras conclusões com a consulta com Catarina.

   Bridget se aproxima dela sem ter medo, o que de acordo com o depoimento de Samanta é impossível, porque Catarina é uma aberração e pode matar qualquer um apenas com o toque por ter se aproximado dela.

   Com passos pequenos e lento me aproximo também, Bridget sorri para a garota e espera eu estar mais perto para disser alguma coisa.

     — Oi, Catarina. Tudo bem? — Bridget pergunta, simpática. Catarina concorda balançando a cabeça — Bom, eu só vim aqui para avisá-la que a partir de hoje você terá um psicólogo que ajudará você com os seus... problemas, — ela explica e a cabeça de garota se movimenta na direção dela — sei que não gosta muito de conversar sobre isso, mas isso é necessário.

   Há outra poltrona diante da que Catarina está sentada e assim que Bridget se afasta sento-me nela sentindo o tecido macio e fofo sob mim. Então concluo que está inteira. Ela não deve ser muito usada, pois ninguém deve se aproximar muito de Catarina. Será que todos têm medo dela?

   Seu rosto está novamente na mesma direção de sempre e seus olhos estão voltados para a janela, onde por incrível que pareça agora está chovendo. As gotas da chuva atingem os vidros da janela fazendo pequenos barulhos quase inaudíveis e suaves. Chega quase a ser gostoso de ouvir.

   Não sei o que a faz olhar tanto para fora, como se fizesse muito tempo que ela não sai e quisesse estar lá.

   Assim que penso isso seu rosto se volta para suas pernas, como se ela tivesse ouvido meus pensamentos e não quisesse que eu saiba o que sente, ela sente falta de estar do outro lado dessas paredes.

     — Oi, Catarina. Eu sou o Dr. Ian Price — Apresento-me e ela continua olhando para sua perna — Poderia me disser seu nome completo? — Pergunto e ela nega — Por que?

   Catarina está segurando a manga de sua blusa e só consigo ver a ponta de seu dedo indicador quando ela aponta para os papéis sobre a mesa entre nós. Ela tem razão eu sei seu nome completo e mesmo que não soubesse os papéis diriam isso por ela.

     — Tudo bem, sei que apontou para os papéis porque sabe que neles está a maioria dos seus dados. Então irei perguntar algo que não está neles, qual é o motivo de você agredir tantos enfermeiros?

   Novamente ela aponta para os papéis, mas não sai nenhum som ou gemido de sua boca e graças ao capuz da blusa não consigo ver seus olhos e cabelo.

     — Você não irá falar comigo?

   Ela olha para outra direção, para o sofá onde Liam parece estar dormindo, então olha novamente para mim e balança o dedo indicador que não estava mais coberto pela manga da blusa. Ele se move para os lados depois ela levanta a cabeça permitindo que eu veja seus olhos e rosto, ainda não consigo distinguir a cor por causa da escuridão, mas vejo seus olhos se moverem para o lado como se fossem uma resposta.

     — Se eu fazer perguntas de sim ou não você me responde? — Pergunto mais animado e dessa vez ela mexe o dedo para baixo e seus olhos também, junto com um movimento leve de cabeça — Tentarei ser exato então, você tem vergonha de falar em público? — "Não", essa foi a resposta pelo mexer do dedo para os lados — Se eu levar você para uma sala, onde só haverá nós dois, você se expressaria melhor?

   Sua resposta foi "Sim". Sei que com isso não terei problema a senhora Del Monte me disse por telefone quando me contratou que eu teria uma sala a meu dispor se eu precisasse e como virei uma vez na semana vai ser bom conversar com Catarina em um lugar onde ninguém a conheça e que não há vários olhares sobre ela, como se a pressionassem.

     — Então semana que vem quando eu voltar nos encontraremos no meu consultório temporário aqui mesmo no Santi's, tudo bem? — Eu explico e ela diz sim com os movimentos e o olhar para baixo — Não a forçarei a responder o que não quer, mas eu gostaria que se esforçasse a me provar que você não é uma aberração como dizem e que tem um porquê para você olhar a chuva cair.

   Vejo a ponta de seus lábios se curvarem em um sorriso, ela me entendeu e sorriu, isso é um avanço muito útil para meu relatório. Que não terá muito o que escrever já que nossa conversa foi minimizada a perguntas de sim ou não.

     — Foi bom conversar com você, Catarina. Mesmo que só eu tenha falado por aqui — Agradeço e o sorriso permanece — Até a próxima consulta.

   Aceno para Bridget que está conversando com John pois a maioria dos outros pacientes estão ocupados jogando e não precisam da sua ajuda.

     — Já acabou? — Ela pergunta.

     — Nem tem muito o que falar já que ela não se expressa com todos aqui. Farei o relatório e deixarei no balcão na entrada e avise a Sra. Del Monte que usarei minha sala na próxima semana e se tiverem problemas com Catarina não esqueçam de me ligar.

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