5 Os papéis do divórcio

Os papéis do divorcio chegaram na manhã seguinte. Eu não assinei nenhum deles de imediato, na verdade, passava o tempo sentada apenas olhando para eles. Li e reli aquelas malditas folhas algumas dezenas de vezes, as cláusulas eram claras e não havia espaço para nenhuma reivindicação, muito menos a possibilidade de conciliação, o tipo de documento redigido pela mente fria e calculista de uma advogado.

Em resumo, eu ficaria com o apartamento, que inclusive já havia sido transferido para o meu nome, alguma quantia considerável de dinheiro, e mais nada, não poderia recorrer aos danos morais do abandono, muito menos, entrar em contato com ele ou sua família.

Basicamente, eu era um problema do qual eles queriam se livrar o mais rápido possível. Isso eu já havia entendido, porém, havia algo de estranho nessa situação pois, Wolfgang continuava sem se pronunciar, e mesmo que eles tivessem total poder sobre a mídia, ela estava muito quieta.

Não era como se eu fosse uma pessoa difícil de encontrar, documentos vazam, e mesmo que nosso casamento tenha sido "escondido", isso nunca foi um impedimento para paparazzis curiosos e doidos por uma matéria bombástica, o que, sem exageros, era o nosso caso.

Além disso, eu ainda não conseguia entender o porquê de Wolfgang basicamente fingir ser outra pessoa, ele até usava o sobrenome de solteira da mãe. Quanto mais pensava, mais estranho ficava, pois, ele tinha amigos, um trabalho e uma esposa totalmente alheios à sua família.

Era agonizante, e de todas as coisas dolorosas que passei naqueles dias, chegar à última página e ver que havia de fato a assinatura de Wolfgang, foi a mais dolorosa. Era como se todas as minhas esperanças estivessem sendo soterradas e meu coração apunhalado inúmeras vezes.

Ficar sozinha naquele apartamento enorme, mesmo que Carlota viesse me ver constantemente, também estava sendo uma tortura, eu não sentia fome ou vontade de fazer nada, nem mesmo para me distrair, e para piorar, por uma ironia, a insônia havia retornado, e sequer sono eu tinha.

Esperei durante três longos e agonizantes dias pelo seu retorno, depressiva e muito magoada, quem me olhasse, não veria um terço da mulher que fui apenas 72 horas antes. Quando me cansei, decidi ir embora porque não suportava mais conviver com todas as lembranças de nós dois que haviam naqueles cômodos, e que lentamente, começavam a me deixar desconfortável, fazendo com que fosse impossível continuar vivendo ali.

No fim das contas, eu estava desempregada, tinha menos de mil reais em minha conta bancária e para completar, sentia que estava ficando doente.

Por alguma ironia cruel do destino, não era a primeira vez que me via sendo abandonada. Minha mãe havia me deixado com apenas quatro anos de idade, uma lembrança dolorosa que nunca consegui esquecer, principalmente o momento em que lembro de ter minhas mãos arrancadas de sua blusa, desprendendo um dos botões.

Quando tive idade para entender, minha avó contou que eu era filha de um homem casado, que não me registrou, e assim que minha mãe encontrou um marido que pudesse "assumi-la", simplesmente me abandonou aos cuidados dela.

Eu vivi com ela numa pequena comunidade rural até os dezoito anos - quando decidi me mudar para uma cidade maior para fazer faculdade -, foi ela quem me ensinou tudo que sabia sobre pequenas plantações, alimentos orgânicos e me educou para ser uma boa pessoa, tínhamos hortinhas, e até alguns poucos animais.

Mesmo morando longe, eu a visitava sempre que podia, passávamos os finais de semana juntas e eu retornava para São Paulo com algumas verduras e frutas orgânicas para fazer comidas saudáveis. Eu estava feliz, aqueles foram alguns dos melhores momentos da minha vida, e tudo parecia estar indo bem.

E então fui abandonada novamente. Ela faleceu quando eu estava no segundo ano da faculdade de nutrição, foi um momento tão doloroso, me sentia tão desamparada que quase larguei tudo, porém, uma professora sugeriu que me consultasse com a psicóloga da faculdade. Foi ela quem me deu a ideia de fazer algo em homenagem à minha avó, era uma forma de me conformar e aos poucos, me ajudou a aceitar a perda.

Com sua pequena herança, abri uma pequena empresa especializada em alimentação orgânica, comprando produtos cultivados por antigos conhecidos, de modo que estava sendo produtivo para todos os envolvidos. Quando conheci Wolfgang, ele estava administrando uma empresa de transportes, daquelas que entregam produtos das lojas online, e depois de algum tempo, iniciamos uma parceria, sendo assim surgiu a CW Company.

Fiquei perdida naqueles pensamentos por longos minutos, divagando provavelmente já alcoolizada, suspirei empurrando a garrafa para o lado e olhei ao redor, estava sentada na poltrona diante da mesa do escritório, onde geralmente eu o encontrava imerso em trabalho, fitando os documentos com seriedade por sob as lentes de seus óculos de grau, e lembrei-me que às vezes, ele pedia minha ajuda com a contabilidade, fazendo-me sentir mais íntima dele.

E agora estava ali, sozinha e me lembrando dele.

No fim, acabei recorrendo à antiga casa da minha avó que também ficou como herança e como tinha muito apego emocional, nunca consegui vendê-la. Por causa disso, o imóvel ficou meio abandonado por todo aquele tempo, então sabia que precisaria fazer muito quando chegasse lá.

Fiz apenas uma mala com poucas coisas, e chamei um táxi, afinal, eu estava sem carro pois, o meu deu perda total depois do acidente. O caminho foi longo, a propriedade ficava no limite entre os estados, então, para passar o tempo, já que o motorista não deu um pio em momento algum, chequei meus e-mails, notando que havia alguns na caixa de entrada, incluindo questionamentos do advogado sobre a conclusão do divórcio.

Foi quando cheguei à conclusão de que, estando aquela família tão abastada obcecada para acabar com meu casamento, eu precisava usar isso a meu favor. Inicialmente, eu apenas queria acabar com tudo o mais rápido possível depois que percebi que Wolfgang realmente havia me abandonado. Mas, agora, pensando melhor, eu havia mudado de ideia, e teria muito cuidado antes de aceitar a proposta, e assinar aqueles papéis.

 Eles não sabiam com quem estavam mexendo.

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