Capítulo 5

     A sala da casa era simples.

    Havia apenas dois sofás de dois lugares velhos e uma televisão perto da janela.

     Pelo menos podia assistir.

     De vez em quando, ouvia a televisão de Valdirene de casa, principalmente a novela. Não conhecia as pessoas, mas sabia reconhecer suas vozes.

     O chão estava tão limpo, que dava até para ver o reflexo.

     Uma mulher alta, corpo com curvas generosas se aproxima.

     Ela lembrava Valdirene, mudando apenas a cor do cabelo num tom mais escuro que castanho–  claro.

–  É essa aí? – pergunta olhando para Lidiane e depois para mim.

      Lidiane assenti.

–  Maria, essa é minha tia Jô.

      Sorrio, arrumando a alça da mochila no ombro.

–  Prazer em conhecer a senhora.

–  Espero que a Lidiane já tenha explicado tudo.

–  Ela ainda não me disse nada não – digo olhando para Lidiane, que estava desconfortável ao meu lado – No que vou trabalhar? – pergunto para Jô.

–  Não disse nada mesmo à ela? – Jô pergunta irritada para Lidiane.

–  Não – diz sem olhar para ela.

     Jô solta o ar dos pulmões bruscamente, colocando as mãos na cintura.

–  Vai trabalhar como prostituta, querida.

      Franzo o cenho confusa.

–  Mas dona Valdirene não disse nada sobre isso não.

–  Se ela dissesse, você e outras não estaria aqui.

–  Não quero trabalhar com isso não – digo rapidamente – Ainda sou moça...

       Ela ergue uma sobrancelha, sorrindo de canto.

       Lidiane me olha arregalando um pouco os olhos.

–  Melhor ainda. Vai valer mais.

–  Eu não quero e não vou vender meu corpo! – digo o mais alto que posso, girando os calcanhares em direção da porta.

–  Acha mesmo que vai simplesmente embora? – diz Jô entre dentes, antes de sentir seus dedos em meus cabelos e meu corpo ser puxado para trás – Não vai mesmo! – Ela me arrasta sobre o piso – Vai me pagar cada centavo que a trouxe até aqui. Toda a comida que comeu e toda bebida que bebeu!.

–  Tia, solta ela! Você vai machucar ela! – diz Lidiane assustada.

      Arranho e belisco o braço de Jô tentando me soltar.

      Ela me solta, para me bater.

–  Se não quer aprender por bem. Vai aprender por mal – Ela desfere um tapa no meu rosto, que o faz virar para o lado. Seguido por um murro e outro tapa.

       Não conseguia chorar, só gritar para ela parar.

      Inclinada sobre meu corpo, ela me segura pelo cabelo, me fazendo sentar e a olhar nos olhos.

      Meu rosto estava ardendo e tinha quase certeza que tinha uma parte que havia algum corte.

–  Você vai trabalhar para mim, até quando eu quiser. Até este dia, vai ser uma das minhas prostitutas e vai me dar lucro – diz entre dentes, antes de soltar meu cabelo.

      Meu corpo tremia levemente, quando Lidiane se aproxima em passos silenciosos, depois que a tia se afasta.

      Olho para ela com os olhos arregalados e com lágrimas molhando meu rosto.

–  Não era pra minha mãe ter mandado você pra cá – diz baixo – Aqui não é lugar para você não, Maria.

–  Por quê sua mãe mentiu para mim? – questiono em meio ao choro, abraçada as minhas pernas.

       Lidiane pisca algumas vezes, evitando que alguma lágrima escapasse seu rosto.

–  Minha mãe ganha por cada menina que ela manda pra cá.

       Meus lábios tremem, quando lembro de minha mãe dizendo que não conhecia a maldade humana.

–  Quero ir embora, Lidiane.

– Também queria que fosse embora. Mas não como. Não tenho dinheiro o suficiente para m****r você embora.

       Só havia 100 reais na minha mochila. Só conseguiria chegar na rodoviária, não sabia nem quanto custava a passagem para o Ceará.

        Baixo a cabeça chorando.

        Lidiane se aproxima mais, estendendo a mão em minha direção.

–  Vem.

       Seguro sua mão, sentindo meu corpo reclamar ao levantar.

       Ela amarra meu cabelo, passando ás mãos em meu rosto.

       Em seguida, pega minha mochila e caminha em direção de uma escada oval.

       Passamos pelo segundo andar, onde algumas meninas circulavam, fingindo não ter visto a cena de Jô. Ocupadas com uma espécie de limpeza.

       Paramos no terceiro andar, sem ninguém por perto.

       Há pelo menos seis portas no corredor.

       Lidiane abre a quarta porta do lado direito, mostrando um cômodo um pouco espaçoso com duas beliches.

–  É aqui que você vai dormir – Entro no quarto, notando duas cômodas uma do lado da outra e um guarda– roupa de duas portas – Também durmo aqui, naquela cama ali – Ela aponta a beliche do lado esquerdo – Pode dormir na cama de cima. Marcela dormia lá.

–  E onde ela está?

       Lidiane caminha até a beliche, tirando o lençol e a fronha do travesseiro, virando o colchão por último.

–  Vou ver se encontro um lençol e uma fronha limpa, e um cobertor – diz andando até a porta – Essas duas gavetas de cima, ainda têm roupa da Marcela. Vou ver se arrumo uma caixa, pra colocar. Só não mexe nas coisas das outras meninas e nem no guarda roupa, as coisas da Kauane fica lá.

     Ela sai, me deixando sozinha.

 

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