Mais que Desejo
Mais que Desejo
Por: J. P. HOOKE
Annelise

Levantei a sombrinha e a segurei firme, tão firme que notei que os nós dos meus dedos ficaram brancos. Eu esperei o carro passar, e a m*****a sombrinha ameaçou voar. Justamente nesse momento, quando tive a oportunidade de avançar, o carro cantou pneu e explodiu uma poça d'água. Eu me joguei para trás, murmurando palavrões que nem sabia que conhecia. O babaca ainda teve a audácia de colocar o braço para fora da janela e me mostrar o dedo do meio!

A raiva me atingiu naquele instante. 

Estreitei os cantos dos olhos e me preparei para correr, eu poderia facilmente alcançá-lo e jogar a sombrinha no seu precioso BMW preto. Eu ficaria realmente super feliz. 

Baixei os olhos e notei meu vestido ensopado. A chuva começara a me encharcar desde que saí de casa. Eu esperava não pegar carona com Brad hoje, meu vizinho. Ele teve uma queda por mim desde que mudei do apartamento em que estava para esse — o apartamento era menor e custava muito mais. Minha vida se reajustou desde que perdi meu emprego, e tive que avaliar tudo desde então. Eu sei que usar um cara que tem uma queda por você é ruim, mas falando sério, ele gosta de fazer isso. Ninguém foi preso por iludir um cara. 

Olhei para os dois lados e constatei que não viria nenhum carro. Corri, atravessando a rua, até chegar do outro lado. 

Encarei a fachada do Pet's Cute Shop e sorri. Era exatamente aqui. Olhei no papel amassado que segurava e entrei, verificando o lugar. Vi Abby afagando um cachorrinho. Ela vestia uma blusa rosa, laço da mesma cor e saia jeans. Quando me viu, sorriu. Fechei a sombrinha e a coloquei no meu pulso. Sem querer, esbarrei numa pilha de ração para gato "Hunger Cat" que estava na prateleira. Os sacos despencaram no chão, como dominó. Abby estreitou os olhos e levantou uma sobrancelha. Ela levantou e o cachorro choramingou, pedindo mais carinho. Ele se ergueu sobre as patas traseiras e apoiou as patas dianteiras no cercado amarelo. Um filhotinho fofíssimo! Abby  enfiou as mãos nos bolsos e o sorriso sapeca apareceu. Notei só então que a sombrinha estava pingando. 

Ai, Deus… você é terrível, Annelise! 

— Oi — ela disse. Eu corri para mais perto e pulei, agarrando-a num abraço apertado. — Alguém morreu? — brincou. 

Geralmente, eu quase nunca a visitava. No mês passado, lembro de tê-la visto por somente um dia na semana. A mudança me esgotou e passava o resto do dia procurando emprego. Era um inferno. 

Eu a soltei.  

— Tive tempo hoje — informei, passando o braço pelo seu e a puxando, guiando-a para dentro de sua própria loja, como se já soubesse o que cada cantinho daquele lugar guardava. — Então resolvi visitar a minha irmã favorita.  

— Eu meio que fiquei com medo agora. — Inclinou a cabeça. — O que aconteceu?  

Desde que eu fui demitida do meu antigo emprego, evitei falar com Abby. Ela era tipo a realização  de um sonho só que não imaginado por ninguém, sabe? Aos vinte e seis anos, estava casada com um cara lindo, Mike Montgomery, enfermeiro, tinha duas filhas lindas — duas pestinhas chamadas Hannah e Maryah — e conseguiu abrir o pet shop que sonhava desde que era pequena. E eu, aos vinte e cinco, não conseguia nem manter um emprego bobo de secretária! Nós éramos competitivas e isso seria declarar que eu tinha perdido a rodada. 

— Nada — garanti. Ela parou, franziu a testa e eu completei: — tá… eu meio que encontrei um emprego. O salário é bom, o emprego é bom… 

— Mas? 

— Mas o chefe é péssimo. — Disse com veemência. — Ele me ignora, é abusado e um babaca. — Ela assentiu.  — E eu não sei se… — as palavras morreram na minha boca. Ela pegou a minha mão e seu toque quente aqueceu meu peito. 

A Shaffer & Sheppard era o sonho de qualquer um. O emprego era perfeito e legal. Há uma semana, quando me candidatei à vaga de secretária de um tal de Chase Ward, não fazia ideia de que o cara era praticamente o pupilo do diabo. O desgraçado me mantinha até tarde todos os dias, mal aparecia no escritório e me obrigava a fazer suas exigências idiotas. Durante a entrevista, ele ficou me encarando como se eu não passasse de uma coitada pedindo esmolas. Mas se tem uma coisa que devo admitir, é que o cretino é terrivelmente sexy. A cara perfeita — que eu supostamente desejei lamber — era composta por olhos azuis vibrantes, um sorriso cheio de dentes dolorosamente atrevido e uma covinha que era puramente tentadora. Eu talvez possa ter imaginado como o corpo musculoso é por trás do terno feito sob medida. Mas nada disso apaga o fato de ele ser um babaca metido. Eu cogitei sair do emprego, mesmo fazendo apenas duas semanas e meia que estou nele. Eu precisava da opinião de Abby, porque ela era muito mais sensata do que eu jamais fui. 

— Você está pensando em sair do emprego? — ela leu minha mente, mas sua voz pareceu estranhamente surpresa, como se eu tivesse acabado de dizer que sequestrei um elefante. — Não. 

— Não? — ela fez que não com a cabeça. 

Eu segurei a bolsa debaixo do braço. 

O que eu queria? Afinal, ela era a sensata. 

— Você não pode desistir de um emprego por causa do seu chefe, Anne — ela disse, passando por mim e se abaixando. Pegou um dos sacos de ração e a colocou de volta na prateleira vermelha. Ela encaixou outra embalagem no gancho sobre a outra. Tamborilei os pés no piso de lajotas salpicado por patas e apoiei as mãos nos quadris, esperando o resto da resposta. — E, além do mais, você precisa do emprego. — Ela me olhou por cima do ombro. 

Estava certa. 

Abby levantou e atravessou a loja. Eu a segui. Ela se colocou na frente de um cercado cheio de gatinhos. Pegou cada um, deu um beijinho e desejou boa-noite.  

Meus ombros baixaram, mais leves. 

O dia foi longo hoje, mas meu chefe me libertou mais cedo, porque tinha uma festa chique e fútil para ir com o Sr. Sheppard, o irmão do Sr. Shaffer, que fundou a empresa. Eu mal podia esperar para chegar em casa e tirar meus sapatos de salto, que apertavam tanto o meus pés, que pensei que iriam explodir a qualquer momento. 

Abby beijou o décimo gatinho e olhou para mim. 

— O que ainda está fazendo aqui? — perguntou. 

Esse era outro ponto interessante da nossa relação: eu meio que só a visitava quando precisava de algo — que realmente nem precisava. Ela era a minha irmã mais velha, então era natural que qualquer dúvida maior que eu pudesse responder fosse tratada pelo filtro divino dos irmãos mais velhos. 

Me fingi de boba. 

— Quer que eu vá embora? 

— Não, mas geralmente você só me usa e j**a fora. — Um sorriso passou por meus lábios. — Quer jantar? O Mike fez macarrão com queijo.

Eu avaliei a ideia. 

Sim! Meu estômago gritou. 

Não. Minha mente decretou. 

— Não posso. Tenho que responder alguns e-mails, verificar as tarefas que meu chefe pediu que fizesse e organizar a agenda pela terceira vez num único dia — ela fez uma careta. 

— Que chato. 

— Pois é. 

***

Fui direto para casa depois de visitar minha irmã. Ela passou quase meia hora falando sobre Hannah e Maryah. Depois, corri para o metrô e cheguei em casa. Tomei um banho rápido, vesti um roupão e caí na cama, cercada de papéis, notebook e almofadas coloridas — o meu maior segredo desde o colegial. Respondi alguns e-mails, bebi uma caneca de café que preparei assim que cheguei e me aconcheguei debaixo do cobertor. Entrei no site de chat anônimo que descobri há um mês e falei com um estranho por quase uma hora. O Secret People Chat era quase um vício. Meu pai dizia que era errado conversar com estranhos, mas eu não o escutei, porque desde os quinze anos amo bater papo com pessoas desconhecidas. Antigamente, eu costumava m****r bilhetes para colegas de escola e sempre conversávamos por aqueles bilhetes. Isso evoluiu com o passar do tempo, e encontrei chats anônimos na internet. Mas então, no mês passado, quando me peguei no pior momento da minha vida, descobri o Secret People Chat. Era incomum. Único. Eu fui confortada por pessoas que nem conhecia, mas que pareciam estar do meu lado, me apoiando, desde que nasci. Era surreal.

Abri o notebook e procurei por alguém. Vi uma bolinha no canto superior. Sr. Bolas Azuis.

Sorri, achando engraçado. 

Eu abri o chat e digitei: 

Quanto tempo? — A. 

Perguntei, me referindo à última vez que gozou. 

As bolinhas começaram a subir e descer. 

A empolgação característica envolveu meu estômago. 

Sr. Bolas Azuis. disse: 

Depende. — Sr. Bolas Azuis. 

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