2- Millena

7 anos antes .....

Me chamo Millena, tenho 22 anos e sou uma garota de programa, não estou nessa vida porque eu quis e sim porque precisei, não tive uma infância normal como as outras crianças mas tive o amor da minha amada mãezinha, apanhei a minha infância inteira e nem na minha adolescência eu tive paz, meu pai era um alcoólatra e chegava em casa bêbado todos os dias e agredia a mim e minha mãe, mesmo sem motivo algum.

Quando alguém me pergunta pelos meus pais eu apenas digo que só tenho mãe e não tenho pai, não entro muito em detalhes pra ninguém saber do pai miserável que eu tinha, prefiro ser apontada como uma prostituta do que como filha daquele monstro sem coração que um dia eu chamei de pai, não sei onde ele está e nem me interessa saber, não sei o que ele faz e muito menos se está vivo, nós fugimos dele e não temos interesse em ter notícias daquele homem. 

Aos 18 anos de idade eu já estava nas ruas correndo atrás de um trabalho que me ajudasse a me sustentar e sustentar a minha mãe, eu queria livrá-la de todo aquele sofrimento, ela não merecia passar por tudo aquilo, uma mulher carinhosa, amorosa e dedicada como ela não merecia ser maltratada pelo homem que ela sempre amou. Infelizmente eu não consegui o trabalho que eu tanto precisei e procurei, a única coisa que me restava era bater nas portas de uma casa noturna.

Não sou uma mulher feia, tenho uma boa aparência e tive certeza de que conseguiria um trabalho de balconista ou atendente ali dentro, e não deu outra, o dono da boate ficou encantado comigo e quando percebeu o meu desespero para conseguir um trabalho me contratou na mesma hora, mesmo eu não tendo experiência alguma, mas ele só fez isso porque já tinha planos pra mim, ele não me queria como uma simples balconista porque sabia que poderia lucrar muito mais comigo fazendo outro tipo de serviço.

Depois de dois meses trabalhando como garçonete Raul percebeu o interesse dos clientes sobre mim, e não demorou muito para ele abrir o jogo comigo, ele sabia que eu não podia perder esse emprego e por isso me chantageou, ele disse que me anunciaria como uma das garotas de programa da casa e se eu não aceitasse eu estaria fora da boate, eu sabia que teria dificuldades para conseguir outro trabalho, e justo naquele momento a minha mãe estava em um estado de depressão forte por conta de tudo que passou com meu pai, e não pode parar com os tratamentos, e além disso os seus remédios são caros e estamos morando em uma pensão onde pago um aluguel não muito caro, mas se eu perdesse o meu emprego provavelmente seríamos despejadas por falta de pagamento, e minha mãe não poderia passar por isso naquele momento. 

Me vi obrigada a aceitar as condições do Raul para não perder o emprego e no mesmo dia tive que começar a fazer programa, e por ser virgem meu primeiro cliente pagou ao Raul uma grande quantia em dinheiro só para tirar a minha virgindade, depois disso eu não me senti mais a mesma pessoa, eu me senti suja, me senti impregnada pelo suor daquele homem nojento em corpo, mas eu teria que me acostumar com isso se não quisesse perder o emprego, por sorte eu fiz amizade com algumas meninas da boate e me apeguei muita a Elisa, hoje nós somos mais que amigas, somos quase irmãs, quando eu cheguei aqui ela já estava e logo de cara nos tornamos amigas, e era ela quem me orientava e me aconselhava sobre o que fazer e o que não fazer.

Todas nós aqui temos um nome de guerra e o meu e Safira, a minha melhor amiga é a Luna e ela é linda, chama muita atenção por onde passa e dança divinamente bem, as vezes eu tenho uma certa inveja dela mas é uma inveja boa, ela é uma das garotas mais procuradas da boate e só aparecem homens bons e cheios da grana pra ela, enquanto eu não tenho a mesma sorte, sou muito procurada também, mas pelos coroas e até que tem alguns coroas inteiros e bons para coçar o bolso na hora de pagar, não sou de dançar no palco como a Luna mas tem alguns clientes que até pagam a mais só pra mim dançar antes do programa, e é claro que eu não me recuso pois é um extra a mais no meu bolso, e apesar do Raul ficar com boa parte do nosso dinheiro até que dá para tirar uma grana boa pra me sustentar e sustentar a minha mãe e os seus tratamentos. 

Essa semana eu estou me sentindo um pouco sozinha sem a minha amiga aqui comigo, ela saiu com um cliente pra ficar três dias com ele fora do Rio e eu já estou com saudades, esses dias que ela está fora eu me atrevi a dançar algumas vezes junto com algumas das garotas e até que não fui tão mal, consegui dois programas com dois gatinhos lindo que me deu até vontade de miar para eles, atendi o primeiro e depois atendi o segundo que pediu meu telefone pra marcar outro programa depois, fora da boate.

A casa hoje está cheia como sempre, muitos novinhos circulando mas também tem muitos velhos me encarando aff! Acho que preciso tomar um banho de sal grosso pra ver se espanta um pouco desses velhos da minha cola. Ando pelo salão a procura da minha próxima vítima e a verônica vem me avisar que o Raul quer falar comigo, me direcionei até o seu escritório e entrei sem bater já que ele está me esperando, assim que entro vejo o seu cofre aberto e ali tem dinheiro o suficiente pra mim não precisar trabalhar nunca mais, mas como o dinheiro não é meu vou ter que continuar trabalhando, é o jeito. Raul fecha o seu cofre indo para sua mesa me analisando de cima abaixo.

— Queria falar comigo Raul? Algum problema? — Pergunto me aproximando da sua mesa.

— Problema nenhum minha querida, pelo contrário... Tenho um book-rosa pra você no final da noite então esteja pronta até as 23hs, o motorista do cliente vira te buscar. — Diz enquanto olha alguns papais.

— Tudo bem, pode deixar comigo... Mas Raul! Amanhã eu vou precisar sair um pouquinho mais cedo, minha mãe está muito sozinha em casa e ela não está bem de saúde, eu não tenho ninguém pra ficar com ela. — Digo meio triste ao me lembrar da minha mãe.

— Negativo Safira! Eu não posso te dispensar mais cedo, a Luna não está aqui e na ausência dela as minhas melhores garotas são você, verônica e a Paola, a casa está enchendo mais a cada dia e não tem como dispensar nenhuma de vocês mais cedo, ok? — Ele me encara sério e eu me seguro para não chorar de raiva.

— Mas Raul eu preci... — O infeliz me interrompe antes que eu conclua a minha frase.

— Não tem mais e nem meio mais Safira! Não vou te dispensar e ponto final! Agora voltei ao trabalho! — Esbraveja em um tom rude e eu tenho vontade de esganar esse cretino filho da mãe.

- Tudo bem Raul... Como você quiser, com licença! - Digo já saindo do seu escritório rezando para cair um raio na cabeça desse monstro. Infeliz!

Volto para o salão puta de ódio por não poder ficar mais tempo com a mamãe amanhã, eu preciso arrumar alguém para ficar com ela mas isso seria mais um custo pra eu pagar, mas por outro lado a mamãe não iria mais ficar sozinha e a pessoa poderia me avisar sempre que ela não estiver bem. Mal dou uma volta pela boate e já aparece um cliente, ele vai acertar o pagamento com o Raul e volta rapidamente, até que o cliente não é feio e nem velho demais, da pro gasto. 

Depois do programa eu vou me preparar para o book-rosa, o mal desses book-rosa é que nem sempre a gente sabe quem está nos esperando, e nem se vai ser um programa prazeroso ou doloroso, porque tem muitos clientes violentos e fora da boate nós não temos segurança nenhuma. Fui para o meu programa no horário combinado e me surpreendi ao descer do carro na frente de um dos hotéis mais luxuosos do Leblon, eu nunca tinha vindo nesse hotel mas, vamos lá, e seja o que Deus quiser.

Até que o programa não foi tão ruim, pelo contrário, foi ótimo, o cliente era gatinho e foi bem generoso comigo, ele queria me dar um valor a mais só para beijar a minha boca mas eu não aceitei, eu, a Luna e algumas das outras meninas fizemos um acordo que nenhuma de nós beijaria os clientes, por mais que o sexo fosse bom não tem como se apaixonar se não rolar um beijo, "pelo menos é isso que nós pensamos", e o nosso lema é "transar sim, se apaixonar nunca."

Como eu saí do hotel já muito tarde eu vou direto pra casa, estou preocupada com a mamãe tanto tempo sozinha, por mais que moramos em uma pensão os inquilinos não vão com a nossa cara, alguns deles suspeitam que eu seja garota de programa e o dono da pensão deixou bem claro que não quer esse tipo de gente lá, ele fala como se nós tivéssemos uma doença contagiosa "cretino". 

Minha mãe sabe o que eu faço, eu abri o jogo com ela e falei a verdade, afinal nós precisávamos de grana e eu não conseguia nenhum outro tipo de trabalho, minha mãe não tem condições de trabalhar fora então sobrou pra mim me virar sozinha, mas pela minha mãe eu faço tudo, ela é a minha vida e eu só tenho ela e mais ninguém, no começo ela me criticou e não quis aceitar o que eu faço, mas depois que ela viu que esse era o único dinheiro que entrava em casa e não tinha como conseguir de outro jeito, ela começou a aceitar aos poucos mas ainda diz que eu mereço coisa melhor, ela sempre diz o mesmo para Luna que tem um carinho muito grande pela minha mãe, e até a chama de tia, minha mãe conhece a história de vida da Luna e ficou horrorizada com tudo que ouviu, ela também não gosta de nos ouvir chamando uma a outra pelos nossos nomes de guerra, ela sempre nos repreende quando fazemos isso mas é apenas pela força do hábito.

Chego na pensão onde moro e já está tudo escuro, o dono dessa pensão é tão pão duro que não deixa nem a luz da entrada acesa. Entro em casa e minha mãe já está dormindo e vez ou outra ouço ela tossir mas continua dormindo, eu não posso mais deixar minha mãe nessa situação, eu preciso arranjar um lugar melhor para morarmos e um trabalho descente pra mim, mas o fato de não ter a escolaridade concluída dificulta ainda mais as coisas.

Na manhã seguinte quando acordo minha mãe já tinha se levantado, o cheirinho de café entra pelas minhas narinas me dando mais ânimo pra sair da cama, me levanto para fazer minha higiene pessoal e logo me sento a mesa ao lado da mamãe.

— Toma logo o seu café filha, ou vai esfriar. — Me alerta séria olhando para o horizonte, já faz tempo que não vejo minha mãe sorrindo e isso já está me magoando por dentro.

— A senhora está bem mamãe? Está precisando de alguma coisa? — Pergunto tomando o meu café e como um pedaço do bolo que ela havia posto pra mim.

— Sim filha, eu estou bem não se preocupe. — Diz me encarando com carinho.

— Como não vou me preocupar mamãe, você passa muito tempo sozinha e eu estou me sentindo culpada por isso. — Relato em um tom triste e ela pega a minha mão.

— Já pedi pra você não se preocupar tanto comigo filha, se preocupe um pouquinho mais com você meu amor, você passa o dia todo dentro de casa comigo e a noite naquela boate, isso não é vida pra ninguém, nós já conversamos sobre isso, Millena. — Diz com um olhar de preocupação.

— Eu sei mamãe, e como sempre você tem razão mas infelizmente nesse momento eu não posso mudar isso, eu preciso cuidar da senhora pra que a senhora melhore logo, aí sim poderei dar um jeito nisso... Mas mudando de assunto, como foi a sua noite de ontem? Quando eu cheguei você estava tossindo muito e isso me preocupou. — Pergunto analisando-a.

— Não é nada demais filha, e só a garganta que está um pouco irritada, acho que vou ficar resfriada. — Diz enquanto ajeita os cabelos.

— Se cuida direitinho ouviu mamãe? Por favor...? Olha, aqui está o dinheiro do aluguel e o dinheiro das suas sessões com o psicólogo, e amanhã eu te dou o dinheiro do mercado. — Digo entregando para ela uma quantia em dinheiro e como sempre ela reluta em pegar, mas pega.

— Tudo bem minha filha, Obrigada. — Ela me dá um beijo no alto da cabeça e vai para o quarto.

Termino de tomar o meu café e volto para o quarto também, vou dormir um pouco mais e descansar para trabalhar a noite.

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