Ela seria manipulada e atraída para mim – a aranha no centro da teia, pronto a dar o bote. E depois, por fim, eu a mataria.

O sol incidiu no quarto de Vincent. Ele acordou se sentindo bem. Depois de tanto tempo, finalmente tinha dormido sem aquele maldito peso pela impunidade daqueles que haviam tirado a vida de seu irmão.

Vincent

Eu tomei um banho demorado e depois, só de cueca, com o sol da manhã incidindo sobre o meu corpo, acendi um cigarro e, deitado na cama, comecei a pensar.

Não demoraria muito, a notícia da morte de Ramon chegaria aos meus ouvidos. Aí viria a segunda etapa. Renata.

Eu seria o monstro sedutor sorrindo para ela. Ela não entenderia a escuridão em meus olhos, pois isso a aterrorizaria. Eu a seduziria em teias de mentiras com meu charme. Logo ela se veria presa. Aos poucos tomaria o controle da situação sem que ela percebesse... ou resistisse.

Eu iria despi-la de seu controle. Ela seria manipulada e atraída para mim – a aranha no centro da teia, pronto a dar o bote. E depois, por fim, eu a mataria.

A imagem dela numa revista da alta sociedade, sozinha, exibindo um lindo vestido vermelho e um colar de rubis, surgiu na minha mente.

Ah, ragazza, eu estou a caminho... os meus lábios começaram a se curvar até formarem um sorriso.

Me sentindo animado, me levantei da cama e coloquei uma calça preta, camisa branca e mocassins, feitos à mão, pretos. Saí do quarto e caminhei pelos corredores até a sala de jantar. Ao me ver, a empregada se aproximou de mim, séria.

— O senhor vai tomar café agora?

— Sim — sorri para ela.

Ela engoliu em seco e eu sabia por que, eu não sorria. Talvez achasse que eu aprontava algo. O que era uma realidade. Com um sorriso nervoso, ela se inclinou e sumiu no corredor que levava até a cozinha.

Meu pai, o Don, sentado à cabeceira da mesa, observava tudo.

— Antony me deu uma ótima notícia. Finalmente a encontramos — falei, exibindo minha felicidade.

Meu pai sorriu.

— Ele me falou.

— Como sabe, vou ter que me ausentar.

Sorrindo para meu pai, me sentei perto dele.

— Filho, ontem ela estava falando com Ramon Sebastian. Acabe logo com isso. É só darmos a ordem. — Meu pai falou com um sotaque intenso, como sempre acontecia quando ele estava irritado.

Eu coloquei a minha mão sobre a mão do velho.

— Não. Vou me ausentar para resolver esse assunto, pessoalmente. Pai, confie em mim. O senhor pode fazer isso?

Meu pai sabia que ninguém no mundo me fazia mudar de ideia quando eu colocava algo na cabeça. Isso era contra a minha própria natureza.

Antony surgiu na sala.

— Está feito. Ramon está morto!

Eu aprumei meus ombros dizendo:

— Ótimo. — Sorri aberto, como há muito não fazia.

Como um tônico, a notícia me deu fome. A empregada colocou meu suco de laranja feito na hora. Peguei um croissant e mordi. Mastiguei com satisfação, sentindo o queijo derretido, pois eles ainda estavam quentes, tinham acabado de sair do forno.

Vitor entrou na sala.

— Filho, sente-se. Tome conosco o café.

Vitor tinha sua própria casa onde morava com sua esposa e seus dois filhos. Todo dia ele vinha até nossa casa, que era uma espécie de quartel-general.

Vitor, sorrindo, se uniu a nós, assim como Antony.

Mamãe surgiu na sala e pousou as duas mãos carinhosamente nos ombros do meu pai e lhe deu um beijo no pescoço antes de se sentar no seu lugar. O amor dela pelo meu pai era comovente, sincero. Eu fiquei a olhar a cena. Queria uma esposa assim. Queria que ela me amasse como minha mãe amava meu pai. Incondicionalmente.

Don bateu numa das mãos dela e disse:

— Os croissants estão quentinhos.

Renata

Passei o dia trancada em casa. Não consegui comer nada, e praticamente não dormi. Só, um pouco antes de ir ao trabalho, eu consegui dar uma cochilada.

A noite chegou, e com ela o meu medo também. Quando Evie buzinou em frente à minha casa, livrei a mente de todos os pensamentos a respeito de mim mesma, de toda rebelião e vontade de fugir. E fui ao encontro dela, me sentindo robotizada.

— Está tudo bem? — Evie me perguntou, pouco tempo depois, ao me ver quieta olhando para a janela.

— Não dormi nada. Estou com cara de sono?

— Você me parece abatida, isso sim. O que está acontecendo com você?

— Estou cansada. — Do recesso mais profundo da minha alma eu suspirei. — Mas, graças a Deus, faltam dois dias para eu tirar férias.

— Não é descanso que está precisando. Está na hora de abrir seu coração, não acha?

Eu sorri para ela.

— Você fala, ter um encontro?

Ela ultrapassou um carro dizendo:

— Você já se olhou no espelho? Querida, se eu fosse tão linda e jovem como você, eu já estaria namorando um daqueles bonitões que frequentam a boate.

Evie tinha quarenta e cinco anos. Viúva como eu. Não era bonita. Uma excelente profissional. Ela que me ensinara tudo sobre misturas de bebidas na boate.

Fiquei a pensar nas palavras dela. Tinha realmente uns rapazes jovens. Que sempre tentavam puxar assunto comigo, entre um drink e outro. Mas quando eles viam o meu desinteresse, desistiam.

— Eu os acho uns playboys — eu disse, enfim.

— Tem uns homens mais velhos na boate.

Sim, havia. Outros, mais velhos, quarentões. Mas esses estavam fora de cogitação.

— Eles podem ser casados. — Respondi, justificando o porquê eu não me envolvia com eles.

Era difícil encontrar um homem maduro solteiro.

— E o rapaz que me falou?

— Jake?

— Sim.

— Ele é legal, mas meu coração não foi arrebatado. Apenas um amigo.

Eu sei por que, eu tinha chegado com tantas reservas que levantei uma barreira entre nós. E acabou virando amizade. Eu precisava, sim, de um cara rico, que eu gostasse, é claro.

Não pelo que ele poderia me oferecer no quesito riquezas. Isso não me fazia falta. Mas pela segurança que ele me proporcionaria.

Eu fitei Evie, um pouco antes de ela estacionar seu Fusca perto da boate.

— Ficarei antenada. Quem sabe encontro alguém interessante?

Quando entrei no meu local de trabalho me senti mais animada com essa conversa. Ela estava certa. Eu era um alvo fácil. Eu deveria ter alguém ao meu lado que me protegesse. Eu ansiava por proteção.

Vincent passou à tarde em reunião com seu pai, com Vitor e Antony. As coisas estavam indo bem. Eles tinham conseguido o carregamento de volta.

Ficou acordado que depois que ele voltasse, eles fariam uma reunião com as famílias que tinham interesse em ser associadas. Entre elas, escolheriam uma para passar seu contato com a Bolívia. O que nenhum deles mencionou foi o fato de que Vincent teria de cortar seus laços íntimos com a família. Eles não compreendiam a vontade dele agir pessoalmente nesse assunto. Mas a resposta era simples. Desde que seu irmão morrera, ele pegara esse assunto para si. Ele se sentia culpado por isso. Já havia se separado deles uma vez, quando ficara em Las Vegas. Se o seu irmão tivesse tomando conta do cassino, com certeza ele estaria vivo.

 Vincent

Ainda não tinha desenhado o perfil de Renata. Tudo era muito confuso ainda. Precisava entrar em sua vida para entender tudo o que acontecera. Esse foi um dos argumentos que usou com sua família: “Precisamos entender nossos inimigos para não cometer erros futuros”, ele dissera.

Sentiu o corpo ficar gelado só em pensar nisso, dentro dele um grande pesar pela morte de seu irmão e uma raiva fria pelos seus inimigos.

Uma coisa ele tinha a seu favor. Renata não o conhecia, ela nunca o tinha visto. Segundo sua mãe, nessa época em que ele estivera fora, seu pai proibira todos de falar seu nome. Todas as fotos dele foram tiradas da casa.

Se era parecido com um de seus irmãos?

Não.

Seus olhos eram azuis-esverdeados. Quando pequeno, brincavam que Vincent tinha sido trocado na maternidade.

Depois de se vestir, pegou a mala que havia preparado. A princípio ficaria em um hotel. Mas se tudo desse certo, logo estaria instalado em uma casa, perto de Renata. Segundo seus homens, havia algumas naquela região para alugar. E, por ironia do destino, tinha uma grande ao lado dela. Eles dividiriam a mesma praia. Levaria dois soldados com ele.  Ficariam em outra casa, mas sempre por perto. Se passariam por turistas.

Pensando em tudo que arquitetara, Vincent esboçou um sorriso frio.

Se ele visse nela a culpa , ele lhe daria o golpe de misericórdia, mas antes ela precisava sofrer...

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