+ . • . Horas . • . +

Por Marina Allen.

Em casa, às três da madrugada. Quatro semanas depois.

As coisas parecem estar tranquilas, e de repente meu sono é perturbado. Me movo na cama e tento me aconchegar na almofada que para nada me ajuda com a barriga incômoda.

— Esse menino não deixa as coisas fáceis. — Digo afagando o ventre assim que o sinto se mover.

Abro a geladeira e penso que o bolo de cenoura com calda de chocolate cairá bem. Sento-me à mesa, e não demora nem cinco minutos para quê eu o devore todo.

— Céus, não é suficiente. — Olho horrorizada para o prato vazio à minha frente.

Nunca fui de ter muito apetite e em parte culpa de minha mãe, que me traumatizou com sua falta de atenção à comida.

Lembro-me de muitos perus de natal em cinzas, sopas secas e feijão queimado. Pelo menos o arroz parecia ser mais fácil para ela, mas isso não a impedia de trocar o sal pelo açúcar. 

Mamãe cozinhava terrivelmente – mas o que realmente vale é a intenção – ela queria tentar por mim.

Creio que faço o mesmo.

Para me tirar de meus devaneios, o telefone toca. Atendo sem precisar ler o identificador de chamadas, sei que o único ser tão detestável a ponto de ligar a tal hora é meu chefe.

— Sr. D'Angelo? Em que sou útil nesta madrugada? — Meu tom é irônico e espero que ele perceba e desligue.

— Sobre o projeto Aurora. — Ele começou, e então me preparei para ir a cama, sabia que não iria terminar tão cedo. 

— Sim?

— A Sra. Moore tem se mostrado bastante difícil em aceitar vender a propriedade no meio do campo... — Ele falava como se a culpa fosse toda da senhorinha.

As coisas são sempre branco no preto para meu chefe, pessoas assim não conseguem entender os demais, são egoístas. Meu pai também o era, e agradeço a coragem de minha mãe em deixá-lo e partir para vivermos eu e ela sossegadas e felizes.

Esse é um dos motivos, uma das razões para eu manter segredo. 

Ouvi-lo contar-me fatos atrás fatos, tomou vinte e cinco minutos da ligação e ainda não entendia a que se devia.

— Peço desculpas se não estou acompanhando, mas onde exatamente eu me encaixo, chefe? — Questionei-o já pressentindo ser coisa boa.

— A Sra. Moore parece valorizar a família e acredito que ela nos venderá se encontrar os mesmos valores na construtora.

A construtora destruía lares a fim de criar imensos shoppings, e no fim a única coisa boa em tudo isso eram os trabalhos gerados.

— A Sra. Moore também parece apreciar você, então lhe disse em nossa última conversa que iria comprar a casa para criar as nossas crianças e etc. — Sua forma tão fria e calculadora me fez perder a boa.

Desliguei na cara de meu chefe, do contrário o xingaria na ligação. 

Que espécie de ser engana uma pobre senhora para se sair com a sua? E como ele pôde ter me usado daquela forma?

Afim de me acalmar deitei-me na cama. Tentei não pensar em nada, não queria que o bebê sentisse meu estresse.

Virando-me sem poder encontrar uma posição confortável, levantei para pegar um copo d'água na cozinha, mas parei no caminho ao ouvir a campainha tocar.

Olhei no relógio pendurado ao lado da porta de entrada na sala, e avistei, quinze para as cinco.

— Isso só pode ser brincadeira. -Disse indo até a porta.

Mais uma vez a insistência do toque da campainha.

— Estou indo! — Gritei. — Que apressadinho... — Resmunguei acreditando ser algum vizinho.

Abrir a porta sem olhar antes no olho mágico, foi um erro, foi suicídio.

— Srta. Allen. — Ele havia se superado. 

Tranquei a porta de imediato, evitando que ele me visse de camisola. O pano deixava amostra o ventre avantajado.

— Sr. D'Angelo, pode esperar um pouco? Vou me vestir apropriadamente. — Disse pelo interfone.

— Não demore. 

Ordens, que novidade.

Me vesti rapidamente pegando um poncho sweater que esconderia o volume de meu ventre, calça legging básica e botas cano curto. Agarrei as chaves do apartamento e rezei para não estar tão frio assim. Abri a porta exibindo um sorriso gentil, mas falso. Por dentro temia que ele estivesse vindo me repreender por desligar em sua cara.

— Me desculpe chefe, o celular estava sem bateria e meu carregador não está funcionando bem. — Começo a mentir de cara lavada, mesmo antes dele entrar no assunto.

— Por quê conversar aqui fora? — Ele foi tão direto como sempre.

— Está... está uma bagunça no meu apartamento. — Digo.

Na realidade, não sentia-me segura perto dele em um lugar tão pequeno quanto meu apartamento. Mas não poderia simplesmente dizer isso, não é?

— Como quiser. — Ele dá de ombros. 

Nos colocamos a andar, vagarosamente, apenas para não termos de sentar.

— Mas ... em que sou útil? — Minha curiosidade se aguça.

Se ele não estava se importando com eu ter desligado em sua cara, por quê viria até minha casa às cinco horas da madrugada?

Ele parou seus passos.

— Quero que seja minha esposa. 

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