Capítulo 5

Diário do fim do mundo

Ano: 2025

Dia: 548

Status: Vivíssima! Chorem haters! Haters gonna hate!

Nuvens encobrem todo o céu. Já faz um ano que sol não é visto nesse mundo. Sei que devido as minhas experiências do passado, existem outros mundos e outras realidades. Creio fortemente que alguma doppelganger minha esteja em uma situação bem melhor.

Está certo que Gabriel falou que todas as realidades sofrem do mesmo mal. Embora algumas bem mais que outras, mesmo assim, prefiro ter fé que em algum lugar desse emaranhado de realidades, existe alguma que esteja em paz.

Infelizmente estou presa nesse mundo decadente e não posso como no passado, viajar entre as realidades. Sei que boa parte disso tenha a ver com a minha decisão. Já que um ano e meio atrás, quase ajudei a destruir o mundo. Hoje não vivemos melhor, porém ainda estamos vivos e com capacidade de luta. Infelizmente, sou a única que restou do meu grupo.

Me lembro de algumas semanas atrás quando meu nome foi citado pela última vez por aquela que tanto amei. Débora... Debby, minha Debby! Morreu com o beijo da morte, um beijo que suga a tua alma. Uma espécie de dementador. O que me deixa sem dormir é o fato de eu estar lá. Eu vi tudo e não fiz nada. O que eu poderia ter feito? Deixado ela se tornar um zumbi que nem aqueles dos filmes? Débora já estava morta e sua alma precisava ser liberta.

Mas o que importa esses pensamentos? Alguém vai chorar pela alma da Débora? No mundo em que vivemos essas coisas acontecem direto. Então devemos pensar no futuro, não no que passou. E eu tinha uma missão. E vou cumprir. 

Hoje estou em uma caverna bem arejada e com luz. Tem comida a vontade e pessoas de bom coração. Tudo de mais útil nesse mundo. 

Isso só foi possível porque desmaiei na rua. Meu estômago reclamava de fome, a sede batia forte. Minhas pernas estavam sem forças. Minha visão fraca. Tudo isso no meio de uma tempestade de terra fina como areia. Eu tinha e tenho a porcaria de uma tecnologia alienígena. Sou a última humana com uma tecnologia desse tipo. Mas ela não está adaptada para o fim do mundo, o que me obriga a usar em casos específicos. E me ajudar depois de ter acabado a comida e a água, não era a coisa específica. Mas ainda estou viva. O que aconteceu? Após desmaiar, acordava de momentos em momentos e notava que era carregada. 

No princípio pensei que eram anões, mas então notei que eram crianças. Eu estava sendo salva por crianças... A última lembrança antes de tudo acontecer, foi de uma menina negra vindo em minha direção. Por um momento acabei citando o nome dela.

- Débora?

Não era a minha Débora. A menina colocou as mãos sobre a minha cabeça e então eu vi.

Uma garota asiática brincava com uma garota negra. As duas eram de mundos iguais e suas famílias eram amigas. Mas elas demoraram para se encontrarem. Tudo começou num consultório médico. A mãe da asiática era psiquiatra e atendia a menina negra. Foi naquele lugar que ambas se conheceram. Anos depois viveriam um romance. A asiática seria expulsa de casa, pois seu pai não gostaria de ter uma filha lésbica. As duas viveriam juntas e apesar de alguns problemas, seriam felizes. Até o dia que uma explosão separou as duas por três anos. E mesmo após se reencontrarem, ainda ficariam mais de um ano sem serem as mesmas de antes. Quando então tudo parecia em paz, o mundo veio abaixo. Mais um ano depois e a menina negra, agora uma mulher adulta, estava na cama. A asiática estava sentada ao lado. Ela pegou um aparelho ao seu lado, um aparelho parecido com um telefone e passou pelo corpo da mulher negra. Era como se estivesse tirando raio x, mas a intenção era outra. A mulher negra abriu os olhos e sorriu.

- Vejo que ainda mantém a esperança.

- Se ninguém mantém a esperança, o que será de nós?

- Emma, isso só vai fazer mal pra ti.

- E desistir de ti? O que será de mim sem você?

- Viveu muitos anos sem mim.

- Porque a Nathália e o Mikael não me deixaram morrer. Se não fosse por eles, eu já estava morta.

- E o mundo nunca teria sido salvo.

- Salvo do quê? Criamos uma nova realidade e um novo mundo, mas esse? O que foi que nós fizemos? E até onde eu tô sabendo, não existe nenhum mundo onde não tenha pessoas desesperadas pela cura.

- Isso é uma verdade. Mas pelo jeito você é mais importante para o mundo. Eu não sou.

- Não fale isso...

- Não falar o quê? Eu fui muito importante para o mundo. E sabemos que até nossa morte é importante. Se morremos, morremos porque a nossa morte é importante. Se não somos nada, que nem a nossa morte importa, o que nós somos? Eu sei que vou morrer e estou em paz com isso.

Naquele momento, a mulher negra grita. A asiática tenta fazer alguma coisa. Mas não tinha nada que podia fazer. No mesmo tempo, um homem e uma loira surgem correndo para dentro do quarto. A loira pega uma espada e crava no chão. Seu corpo desmorona, mas ela continua segurando a espada.

- Nathália, o quê...

- O tempo acabou. - a loira disse com suor no rosto. Quando a asiática retorna seu olhar para a cama, vê a mulher negra de forma calma. Antes doente e defiando, agora ela olhava para o corpo curado e forte.

- Eu... 

- Chegou a hora, Débora. - o homem falou. No mesmo momento, o quarto recebia novos personagens. Um homem branco e uma negra chegavam juntos. Eles olharam para a loira caída e segurando a espada e voltaram os olhos para a cama.

- Débora! - A mulher negra falou com lágrimas nos olhos.

- Oi mãe! E oi pai!

A mulher mais velha, correu e abraçou a que estava na cama. Suas lágrimas saiam sem nenhum pudor. O homem que foi chamado de pai, estava com os olhos todo molhado. A cor vermelha denunciava o que se passava em sua mente. Todos ali sabiam que o tempo tinha acabado. A quarta dimensão cobrava o seu preço e não aceitava fiado. A loira apenas segurava o tempo para que todos tivessem chances de se despedir. Mas a loira chegou no seu limite e desmaiou. O outro homem no mesmo momento fez o mesmo com a sua espada e também caiu.

- Não vai se despedir? - a garota negra fala para a asiática. A asiática não aguenta e salta na outra e a beija. Suas bocas se unem em uma paixão ardente e de despedida. 

- Esperei tanto tempo para um novo beijo e é o último?

- Não dá pra ter tudo na vida, Haruno.

A asiática sorri.

- Sabe que odeio esse apelido!

- Eu sei. Vai fazer o quê? Bater em mim?

A asiática dá uns tapinhas na outra e novamente abraça a amada.

- Eu não quero te perder.

- Quem disse que vai me perder? Se tu me ama, eu sempre vou estar aqui. - Ela encosta no peito da asiática. - Sei que meu pai é a tua doppelganger. Ou seja, não é você. Sei que está sentindo que está perdendo a filha novamente. Mas assim como ela, sinto orgulho de te chamar de pai. - Ela falava olhando para o homem mais velho e de olhos vermelhos. - Sério! Sou filha do arcanjo Rafael e da Haniel? O anjo da cura e o do amor são os meus pais. Quem poderia ter sido tão abençoada assim em vida? - Ela sorri e balança a cabeça em direção ao outro homem segurando a espada. Em segundos, a mesma cai no chão. A mulher negra abaixa a cabeça. A asiática então chama pelo nome da outra. A outra levanta a cabeça. Seus olhos estão cinzas, sua pele que até segundos atrás estava negra, agora estava em estado de putrefação. A negra então atacou.

Mas não foi longe. Segundos depois estava totalmente congelada no lugar. A asiática ainda se aproximou mais. Sabia o que estava para acontecer. Ela olhou para trás e viu a loira abaixando a mão. Sem dizer nada, a loira pegou uma coisa semelhante a um batom e entregou para a asiática. Ela também não disse nada. Pegou o batom e passou na boca. Um vermelho escuro. Seria algo belíssimo se não tivesse uma função sinistra. Se esse era o destino que foi reservado para a Débora, ela seria quem desse o último beijo. O beijo da morte.

Ela chegou até a garota zumbi e sem mais nenhum pensamento, deu o beijo na amada. Em sua mente, foi projetada imagens do passado da morta e em todos os melhores momentos, a asiática teve presente. Enquanto o beijo não chegava no fim, a asiática chorava. A amada nunca escondeu um único segredo dela. Todas as imagens eram apenas confirmações do que a namorada, esposa, tinha vivido. Teve segredos que só a asiática sabia. Quando terminou de beijar, ela libertou o ar de sua boca e a garota negra surgiu na sua frente, bela como sempre foi. Deu um sorriso e partiu em definitivo.

Acordei nesse quarto logo depois disto. Vi o meu aparelho e procurei saber quantos dias se passou. Com alegria notei que eram apenas algumas horas. Vi que o meu diário estava fechado e perto de mim. Ninguém tinha aberto ele. Agradeci aos céus por isso e comecei esse relato. Não sei quem eram as crianças. Não sei onde estou. Acredito que seja mesmo uma caverna, mas isso é apenas uma teoria. Suspeito que aquela garota me fez ver tudo isso novamente. Como? Não sei. Em breve vou sair daqui. Vejo a porta aberta. Descobrirei onde estou e quem são essas crianças e o que fizeram comigo. Então vou voltar para a minha missão.

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