IV - Primeira noite na casa nova

A jovem escritora vira sua inspiração retornar de forma mágica ao ter aquele caderno em suas mãos. Não era de seu feitio escrever manualmente. Como toda garota de sua geração, anotava o mínimo possível em papel com caneta. Até as listas de compras eram digitadas no celular ou notebook. Porém, não conseguia deixar a esferográfica de lado quando começava a esboçar um novo livro.

Escrevera até adormecer exausta. Havia sido um dia longo e conturbado.

Acordara com o som da campainha. Abrira os olhos devagar e percebera que sequer tinha apagado as luzes do quarto. A primeira coisa de que se lembrara fora do caderno de anotações e quando não o vira em lugar nenhum, se sentara na cama apavorada tentando lembrar onde o havia guardado.

Felizmente Sky tinha um jeito simples de organizar as coisas e lá estava o caderno na gaveta do enorme criado-mudo com o abajur de cor creme ao lado da cabeceira. Ouvira novamente o som da campanhia na porta e deduzira, contra a vontade, que não era um sonho. Puxara o notebook da bolsa ao lado da cama e ativara a câmera de segurança da porta da frente para ver quem era a pessoa que a incomodava em plenas duas horas da manhã.

Tinha se mudado para aquela casa justamente pela tranquilidade do lugar, pela vantagem de, com todo aquele isolamento, poder dormir e acordar quando bem entendesse sem ter de suportar o barulho de vizinhos.

Os lábios se descolaram lentamente enquanto a ruiva abria a boca, surpresa. Algo estava errado, muito errado. Estava vendo, mas acreditar no que seus olhos viam era outro caso. Aquilo era… impossível. Era a única palavra sensata que imaginava para descrever sua visão.

Determinada a conferir de perto o que estava acontecendo, a garota fechara o notebook e o guardara de volta na bolsa, saltando da cama no mesmo instante. Ficara em pé diante de um enorme espelho se encarando por alguns segundos. Arrumara o cabelo, a camisola mal havia se amassado, não tinha dormindo nada.

Saíra pelo corredor descalça, a passos largos no piso gelado. O coração no peito batia a mil, mas Sky havia adquirido o hábito de encarar tudo de frente. E lá ia ela novamente, torcendo para que as coisas ficassem bem.

Ao abrir a porta, descobrira que não estava sonhando.

E as coisas não poderiam ficar melhores.

O sujeito diante dela era forte, elegante e bonito. Tinha pose de modelo, era alto, com o olhar sério, misterioso, cujos olhos negros pareciam querer a devorar. Os cabelos lisos repartidos no meio eram escuros e brilhantes. Sky deduzira que deveria ter pelo menos um metro e noventa, pouco mais de dez centímetros mais alto que ela. Usava bigode e cavanhaque estilo Dom Juan, a barba por fazer e o semblante de um galante amante latino.

—Eu… – começara o sujeito.

—Teve problemas com o carro na estrada e seu celular está sem sinal.

O sujeito a encarara surpreso. Já era uma reação esperada.

—Como você…? – indagara curioso.

A garota apontara com o indicador para atrás dele, na direção da estátua.

—São onze quilômetros da estrada até aqui e veio caminhando a pé no meio da madrugada. Não teria feito isso se tivesse um lugar mais perto para recorrer. Só posso imaginar que está com problemas com o carro e sem sinal ou acesso à internet – dissera a jovem, embora tivesse outras deduções.

De fato, era a verdade e o sujeito sorrira para a ruiva diante de raciocínio tão rápido. Porém, em seu íntimo, Sky estava mentindo. Tinha outras ideias em sua mente e não acreditava que aquilo estivesse acontecendo. Desejava poder tocar aquele homem todo para sentir que era real.

E se tudo corresse como imaginava, o sentir dentro de si, profundamente.

—Então… – voltara a falar o homem, coçando de leve a barba – Você teria um telefone que eu possa usar? Ligarei para alguma oficina na cidade solicitando um reboque. Depois posso esperar no carro até que cheguem.

Esperar no carro? – pensara Sky. Por que isso quando ela tinha ali uma casa enorme onde poderia lhe fazer companhia até que o guincho chegasse?

—Claro, há um telefone na cozinha – respondera a garota – A propósito, me chamo Serenity e você? – soava sempre estranho pronunciar seu nome em voz alta, mas normalmente as pessoas gostavam.

—Ricardo Gomes – respondera o homem, esticando a mão para ela – Meus amigos costumam me chamar de Rick, é um prazer. Sou advogado.

Sky ficara tentada a se apresentar como escritora, mas isso só a fazia pensar mais no caderno guardado na gaveta do criado-mudo de seu quarto, no andar superior. E aquele homem não tinha interesse em saber sobre sua vida pessoal e nem ficaria o bastante para precisar saber.

Dando um passo para o lado, Sky pedira que o sujeito entrasse, dizendo que o acompanharia até a cozinha, onde estava o telefone. O advogado mal pisara para dentro da casa e um relâmpago deixara tudo em tons de cinza por alguns instantes. Em seguida um forte chuvisqueiro começara a cair e a garota, olhando uma última vez para fora antes de fechar a porta, comentara que o reboque agora demoraria um pouco mais para vir socorrer o carro na estrada.

Era estranho ver aquele homem pela primeira vez e parecer que o conhecia há tanto tempo. Por onde ele teria andado antes de a encontrar ali? Seria apenas coincidência? Não havia respostas para aquelas perguntas, mas não importava.

Para Sky, o que realmente importava era o momento, aquele momento.

A escritora fechara a porta, se vendo novamente no aconchego de seu novo lar, agora acompanhada de um homem que aparentemente havia saído de seus próprios sonhos eróticos. A sala piscara com a luz dos relâmpagos invadindo o ambiente pelas janelas, mas o frio e o barulho haviam sido fechados para fora.

Pedindo que Ricardo a acompanhasse, Sky seguira na frente em direção à cozinha, imaginando se estava certa em todas as deduções que tinha para as horas seguintes. A ruiva estava quase nua. A camisola que usava era curtíssima, mal cobrindo seu bumbum. Além disso, a peça de seda transparente deixava à mostra sua belíssima lingerie, calcinha e soutien negros com rendas.

O sujeito, logo atrás, notara também uma tatuagem que começava bem no meio do bumbum da moça e subia até quase o meio de suas costas. Tratava-se de um lindo dragão vermelho, com escamas da mesma cor de seus cabelos.

Sky fora direto até a geladeira e na metade do caminho, passando por uma grande mesa com quatro cadeiras, apontara para o telefone em cima no armário. Enquanto o advogado ia até o aparelho, a ruiva fizera questão de se agachar de costas para ele enquanto pegava uma garrafa de suco, exibindo o belo bumbum grande e redondo. Sua pele clara como leite destacava a lingerie negra.

Ricardo conferira algum número de telefone em seu celular e então fizera a ligação. Enquanto falava com a pessoa do outro lado da linha, Sky se servira de um copo de suco de laranja, deixando a garrafa e outro copo ao lado sobre a mesa. Se sentara medindo discretamente cada centímetro daquele belo homem como se fosse o último espécime no planeta.

—Eles estão preparando um reboque – dissera o sujeito, voltando o telefone no gancho – Irão enviar imediatamente, pois há previsão de uma tempestade em breve. Devem chegar dentro de duas horas.

Tempestade? – imaginara Sky. Quando viera para casa mais cedo naquela noite, o céu estava estrelado, sem sinal de chuva. No entanto, minutos atrás vira relâmpagos e um chuvisqueiro que começava. Agora ouvia a notícia de que uma tempestade estava a caminho. Era, no mínimo, estranho.

Mas estava em uma cidade portuária. Era possível que os ventos viessem do mar e trouxessem a chuva. Talvez ela só não estivesse acostumada.

Tudo naquela noite parecia estranho, de jeitos bons e ruins.

—Vai demorar um pouquinho – comentara a ruiva – Fique por aqui enquanto a chuva que cai diminui e te dou carona até seu carro depois. É melhor que sair agora e se molhar todo – a ideia de ver aquele homem molhado, no entanto, era bastante aceitável.

—Aceito a ajuda – respondera o advogado com um sorriso – Preciso chegar logo à cidade e conferir como está meu iate no porto. Se há uma tempestade se aproximando, preciso verificar a segurança urgentemente.

Então ele tinha um iate? Aquela era uma informação nova, mas bem-vinda. De certa forma, Sky sentira que não sabia tudo sobre o sujeito como pensava.

—É casado? – indagara a ruiva diretamente. Para essa pergunta, já sabia a resposta, mas era sempre bom ouvir a pessoa dizendo para confirmar se estava mentindo ou não. O radar de mentiras de Sky ficara afiado nos últimos anos.

—Solteiro no momento – respondera o advogado – Não tive muita sorte com as últimas mulheres quais me relacionei. Acabei bastante frustrado e elas com o coração partido, infelizmente – E você, casada? Felizmente, ao que parece, não acordei mais ninguém na casa uma hora dessas.

Um sujeito lindo com histórico de partir corações. Lembrava Robert de todas as formas. Talvez, se Robert tivesse sido sincero daquele jeito quando haviam se conhecido, Sky não estivesse ali naquele momento.

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