Capítulo 2

Sempre gostei de surpresas.

Surpresas boas.

Só não imaginava que todas essas juntas pudessem ser assustadoras.

Acordei na manhã seguinte com o barulho da campainha do meu quarto na pousada. Num segundo, coloquei meu vestido e fui abrir a porta. Era Víctor.

— Oi, amor. Feliz aniversário! — Ele estava lindo, como em todos os outros dias, e carregava nos braços um buquê enorme com rosas vermelhas!

— Ah, Víctor, obrigada! — Ele entrou, e eu fechei a porta. — Está tudo bem com seu filho? — perguntei, ainda um pouco sonolenta.

— Sim, ele está ótimo. No fim do dia já estará em casa.

— Que bom.

— E você? — Ele me abraçou e deu um suave beijo no rosto.

— Estou bem.

Eu amava Víctor, e isto era um fato. Mas me preocupava muito com sua antiga família. Nem mesmo suas viagens me deixavam tão irritada quanto sua ex-mulher e seu adorável filho de oito anos. Eu também ficava imaginando várias situações que me deixariam furiosa, caso viessem a acontecer. Como, por exemplo, ter que conviver com a presença constante de Regina. Era óbvio que como ex-mulher, ela sempre estaria presente. Eu pensava muito sobre isso. E não gostava. Definitivamente, sabia que teria de me esforçar ao máximo para viver bem com a bagagem de Víctor.

— Me perdoe por ter te deixado na noite passada. Como você ficou?

— Fiquei bem. Carla é um amor e James foi muito gentil em me trazer até aqui.

— James?

— Sim, seu sobrinho. Ele me trouxe depois da queima de fogos. A festa realmente estava incrível.

Não revelei para Victor sobre minha corrida desenfreada com James até a montanha. Achei que tudo tinha sido infantil demais para se levar a sério, mas apesar disso eu tinha de confessar: foi muito divertido.

— Que bom. Fico feliz que tenham cuidado bem de você. O que quer fazer hoje? — ele perguntou, enquanto se dirigia ao pequeno bar que havia no quarto e se servia de uma dose de um líquido avermelhado de uma das muitas garrafas que estavam ali. Logo depois, sentou-se em um pequeno sofá próximo da sacada do quarto e provou a bebida.

— Não sei. O que você tem em mente?

— Bom, Carla está nos esperando para o almoço. Gostaria que você conhecesse a minha mãe. Ela não pôde estar na festa ontem, então achei que seria bom almoçarmos hoje. Mas não precisamos ir se você não quiser. À noite, voltaremos para o Rio e eu vou te levar para jantar. Vamos comemorar o seu aniversário. E depois, podemos comprar um vinho e ir para o meu apartamento. Ainda tenho mais dois dias para ficar na cidade, até voltar para São Paulo.

— Tão rápido! — eu disse, surpresa.

— Infelizmente, sim. Preciso o quanto antes buscar documentos para a análise de um processo que se encerra ainda no fim deste mês. E tenho que correr, senão terei que fazer hora extra em pleno Carnaval.

— Não, isso não! Você prometeu passar o feriado de Carnaval comigo, e não vai furar! — falei, querendo parecer irritada.

Víctor eu completaríamos um ano de namoro no Carnaval, e há mais de três meses eu estava planejando fazer uma viagem com ele. O Ano Novo não havia saído do jeito que eu havia planejado. Perder o feriado de Carnaval seria ainda mais desastroso.

— Então, meu bem — ele falou, tentando me acalmar, sem muito sucesso. — Por isso tenho que adiantar o serviço agora em janeiro, para que possamos aproveitar depois.

— Tudo bem. Desculpe. Acho que estou pegando no seu pé.

— Não está, não. Você é quem deve me desculpar por viajar tanto. Mas você sabe que é o meu trabalho. Preciso disso.

— Está certo — eu disse.

Víctor não é só divorciado e com um filho de outra mulher. Ele é também mais velho do que eu — mais precisamente, com dez anos de diferença. E eu ficava imaginando a cara de nojo da minha avó ao ouvir tudo isso! Mas não me importava. Com trinta e seis anos, Víctor era alto, forte e com os cabelos lisos e negros. Tinha a pele morena por causa das constantes corridas ao sol no calçadão de Ipanema, costas largas e em qualquer ocasião se vestia com terno — era uma marca registrada dele —, e isso com certeza tirava o fôlego das recepcionistas do escritório onde ele trabalhava.

— E então? Quer ir ao almoço na casa de Carla? — perguntou ele, depois de beber o último gole de sua bebida e colocando o copo vazio em uma mesinha que ficava ao lado do sofá.

— Tudo bem, eu vou. Mas é só por que é sua família, e eu quero te ver feliz. Sei que não passa muito tempo com eles, então… acho que podemos aproveitar o almoço. Mas, no jantar, você não me escapa. Quero você só pra mim à noite — eu disse, sentando no colo dele, que sorriu e me beijou.

— Tudo bem, minha querida. — ele sussurrou no meu ouvido. — Eu estava morrendo de saudades.

— Eu também — respondi.

***

Chegamos à chácara por volta das treze horas. O lugar estava menos movimentado, muito melhor do que na noite anterior, que me fez sentir sufocada com vários estranhos curiosos me encarando.

— Que bom que você voltou, Ana — disse Carla, indo nos cumprimentar na entrada da casa. — Me perdoe de não ter te dado a atenção ontem. Espero que entenda.

— Não se preocupe, eu entendo, sim. — Eu quis ser gentil.

— E você, Víctor? Como está o Vitinho? — Carla abraçou o irmão.

— Ele está bem — respondeu Víctor.

— Que bom. Vai voltar para o Rio hoje?

— Sim, depois do almoço. Vou ficar por lá mais dois dias.

A família de Víctor também sentia muito a ausência dele. Eram raras as oportunidades que ele tinha de ficar na companhia deles. Exatamente por isso fui ao almoço, caso contrário, teríamos ficado na pousada, ou então aproveitaria para conhecer um pouco mais o centro histórico da cidade e suas praias.

Sentamos no sofá da sala, o mesmo em que eu quase havia passado a noite toda esquentando, se não fosse James me carregar para fora da casa para ver os fogos de artifício. E sobre James, eu tinha apenas uma única teoria até aquele momento: a de que ele era louco!

— Onde está a mamãe? — perguntou Víctor para Carla, que ajeitava os talheres na mesa logo atrás de nós.

— James foi buscá-la.

Dona Helena morava na cidade havia anos, desde que ficara viúva.

— O cheiro está maravilhoso — falou Víctor.

— Espere só para sentir o sabor. — Surpreendeu-nos dona Elena, que naquele momento adentrou a porta principal da sala, fazendo minha pulsação se elevar.

— Mamãe! — disse Víctor, se levantando do sofá.

— Pensei que não viriam — ela disse calmamente, abraçando o filho.

— Dona Helena, esta é Ana.

— Olá, Ana. Como você está?

— Estou bem, obrigada. — Ela me deu um rápido beijo no rosto.

— Ainda bem que chegaram. Carla estava otimista quanto à vinda de vocês. Que bom que vieram.

Dona Elena era uma senhora de meia idade muito delicada, assim como Carla. Ambas usavam muitas joias, vestiam roupas caras e seus cabelos exibiam um penteado perfeito. Isto fazia com que meu vestido bege curto com alças largas se tornasse um tanto apagado.

Enquanto os três se cumprimentavam e trocavam afagos, notei que alguém nos encarava de longe, me virei e vi James em pé ao lado da bancada que separava a cozinha da sala. Ele também estava bem vestido, com uma calça social preta e camisa verde que combinavam divinamente com seus sapatos muito elegantes. James sorria com o braço levemente apoiado na bancada de mármore e, quando olhei nos seus olhos, ele me deu uma piscadela. Fiquei meio sem jeito, mas devolvi a gentileza com um meio sorriso.

— Olá, James. Como você está? — perguntou Víctor, quando viu o sobrinho.

— Bem. E você?

— Também.

— Vamos para a cozinha, Víctor. Eu guardei um pedaço de bolo para você. — disse Carla. — Você quer, Ana?

— Ah, não, obrigada. Acho que comi bolo demais ontem. — E, com certeza, nunca mais ia querer ver bolo na minha frente depois da noite anterior.

Víctor acompanhou a irmã e a mãe até a cozinha.

Eles passaram por James na porta, que caminhava em minha direção.

— Olá, Ana. Que bom que veio! — disse ele, se sentando ao meu lado no sofá.

— É, achei que Víctor ia gostar de ficar perto da família.

— Legal. Vejo que ele me arrumou uma tia bacana. — Sorrimos juntos.

— Sim, mas já disse que não sou sua tia. Por favor, me chame de Ana.

— Ok. Vou esperar até o casamento.

Dessa vez, era somente eu quem ria demasiadamente. Enquanto James ficou sério de repente.

— O que foi? — Ele quis saber. — O que eu disse de errado?

— Casamento — respondi.

— O que é que tem?

— Eu e seu tio Víctor somos apenas namorados. Não estamos de casamento marcado.

— Ah, me desculpe. Eu disse bobeira, então. — ele desviou o olhar, encarando o chão. Parecia meio sem jeito, então ousei perguntar:

— O que foi?

— O quê?

— Você pareceu constrangido de repente.

— Hã… não, é só que…

— O que foi? O que sabe?

— Não, eu não disse nada.

— Ah, disse sim!

— Não, eu não disse, não!

— Pare com isso e me diga logo o que sabe! — falei um tanto irritada.

— O que você quer que eu diga? — Ele deu de ombros.

— Não sei, mas você ficou diferente depois que eu disse que eu e seu tio estamos somente namorando. Ainda não vamos nos casar — James me encarava com receio no olhar — ou vamos?

— Eu não disse nada.

— Ah, meu Deus! — Eu apoiei o rosto com as mãos.

— Vou negar até o fim.

— O que ele está planejando? — perguntei, encarando-o novamente. Ele parecia perdido em seus pensamentos.

— Eu não sei!

— Ah, James, me diga o que sabe!

— Desculpe, Ana. Não sei o que dizer. — Seu semblante constrangido era verdadeiro.

— Será que ele vai…

— Desculpe, eu não sei. Desculpe — completou em tom penoso. Logo depois, ele se levantou e saiu.

Fiquei paralisada no sofá, sem querer acreditar no que estava prestes a acontecer. Víctor ia me pedir em casamento! Por isso a insistência dele em ir embora naquele mesmo dia. Com certeza havia para isso que ele havia reservado o restaurante. Ele ia me fazer uma surpresa, e seria naquela noite. Mas eu não estava preparada para me casar, e ainda mais com um homem que já tinha outra família na bagagem.

Eu sentia meu coração saltitar, só não sabia se era de felicidade ou de medo. Talvez fossem os dois.

— Ana, você está me ouvindo? Vamos almoçar!

Víctor estava do outro lado da sala me chamando, talvez há alguns segundos, mas minha voz embargada pela surpresa de James me impediu de responder atentamente:

— Sim. Já estou indo.

Levantei do sofá sem sentir o chão. O que eu ia fazer se aquilo fosse verdade? Eu não queria perder o Víctor, mas também não queria me comprometer com ele até aquele ponto. Ainda íamos completar apenas um ano de namoro, e eu havia acabado de terminar meu curso, ainda tinha muitas outras coisas para realizar antes de dar esse passo. O que eu podia fazer? Dizer não e acabar de vez com todas as expectativas que ele devia ter construído? Ou dizer sim e tê-lo apenas pela metade? Claro, pois uma parte do seu coração sempre estaria na sua primeira família. Definitivamente, eu não sabia o que ia fazer.

***

O almoço foi perfeito. Carla e Víctor conversaram o tempo todo e dona Elena de vez em quando interrompia os dois para dar seu ponto de vista sobre qualquer assunto que eles falavam.

Rodrigo, o marido de Carla chegou logo depois, porque estava na casa de parentes, naquele bairro mesmo. Ele me cumprimentou, também se sentando à mesa.

— Está tudo bem, querida? Você está tão quieta. — Quis saber Víctor.

— Está tudo bem. É que estou com um pouco de dor de cabeça, acho que dormi pouco essa noite — menti.

Víctor estava vibrante na companhia da família. James, assim como eu, estava quieto. Fiquei com pena dele e, pela sua cara, percebi que se sentia culpado por ter dado com a língua nos dentes. Mas eu também tive minha parcela de culpa naquela história, porque praticamente o pressionei para me contasse.

— Víctor nos contou que você mora sozinha na Lapa, Ana — afirmou Carla, que parecia querer puxar assunto.

— Sim. Moro no mesmo apartamento desde que vim para o Rio. Não acho ruim morar sozinha. Passo a maior parte do meu tempo no trabalho, são horas intensas de treino e som alto. Então, é bom chegar em casa e ter tranquilidade.

— Não sente medo por estar sozinha? O índice de violência tem aumentado no Rio de Janeiro e as notícias que vemos nos jornais são alarmantes.

— Tento não me preocupar muito com isso. Acho que todo lugar tem um lado bom e outro ruim. Só o que devemos fazer é nos prevenir no que puder.

— Claro. Isso é verdade. — concordou Carla.

Depois do almoço, fui para a cozinha com ela e dona Elena para ajudar a organizar as coisas, já estava cansada de fazer companhia para o sofá e achei chato o assunto de Víctor e Rodrigo sobre rotinas de escritório. James havia terminado o almoço rápido demais e sumido para algum outro lugar da casa.

— Então, Ana, como está a sua família? Víctor disse que já faz um ano que vocês não se vêm. — Quis saber Carla, me entregando os pratos do almoço para secar.

— Sim. Mas eu ligo sempre para eles. E agora que terminei o curso, ficarei com mais tempo para ir visitá-los.

— E sobre Víctor? — Quis saber dona Elena.

— O que tem ele?

— Eles sabem sobre ele?

Eu me sentia como uma criminosa em um interrogatório, mas isso já era de se esperar.

— Bom, eu disse para minha mãe que tinha um namorado aqui no Rio, mas ainda não entrei em detalhes.

— Pelo que sei, seus pais são bem tradicionais. — Cutucou Carla.

— Sim, realmente são. Minha família é de uma cidade pequena. É um pouco difícil convencê-los das modernidades do mundo.

Achei que as duas estavam loucas para me perguntar o que minha família acharia sobre a diferença de idade entre mim e Víctor. Então, já falei logo de cara.

— Eu demorei muito para conseguir convencê-los de que queria me formar em dança aqui no Rio. Quando cheguei, era muito nova, mas agora tenho independência suficiente para decidir sobre a minha vida. Gosto muito de Víctor, e ele é muito bom para mim. Tenho certeza que mesmo com a diferença de idade, eles não serão contra nosso relacionamento.

— Acho que a diferença de idade, minha filha, não é o problema maior. Carla e eu estamos realmente preocupadas com o fato de Víctor ser um homem divorciado, e com um filho para cuidar.

As duas olhavam para mim, esperando uma resposta.

— Tudo tem o seu tempo, dona Elena. Se não aceitarem agora, eu saberei esperar.

— Desculpe por te fazer tantas perguntas, Ana, mas você deve compreender que é tudo muito vago para nós. E nos preocupamos com a felicidade de Víctor — esclareceu Carla.

— Eu sei, Carla. Fique tranquila. As perguntas não me aborreceram. Eu já imaginava que vocês fossem querer saber. E é bom ver que vocês se preocupam com o Víctor. Eu também quero muito a felicidade dele.

As duas pareceram mais tranquilas. E eu também me senti aliviada. Só o que tirava a minha atenção era o jantar que Víctor havia programado para aquela noite. Eu já começava a achar que não seria uma boa ideia.

— Me desculpem, meninas, mas terei que roubar sua ajudante — disse Víctor, em frente à porta da cozinha com os braços cruzados.

— Ainda é muito cedo! — reclamou Carla.

— É o aniversário da Ana. Vou levá-la para jantar à noite.

— Olha, que lindo! Ouviu, Rodrigo?! — gritou Carla da porta da cozinha, tentando chamar a atenção do marido. — Víctor está precisando te dar alguns conselhos sobre romantismo.

Todos riram, enquanto saíam da cozinha em direção à sala, aonde deram início a algumas histórias engraçadas de quando Carla e Rodrigo começaram a namorar. Eles estavam se divertindo tanto, que nem perceberam o som que havia começado a surgir e que vinha dos fundos da casa.

Uma melodia suave invadiu o ambiente, baixa, mas foi o suficiente para eu perceber de que se tratava do som de um violino.

Aos poucos, fui me aproximando da porta da cozinha. As pessoas na sala, empolgadas com as histórias antigas da família, nem perceberam a minha saída em direção à porta que dava para os fundos da casa.

Lá fora, a grama era baixa e ao lado do lago havia algumas flores — rosas, crisântemos e girassóis — e gigantes palmeiras em um caminho de pedras brancas que saía da casa e contornava a água junto com alguns bancos de madeira envernizada.

Tudo era mais lindo durante o dia na chácara de Carla, eu estava encantada com a luz radiante do sol de fim de tarde que batia nas montanhas, contornando toda a extensão da casa.

James estava em um dos bancos, sentado com os olhos fechados, fazendo o arco de um violino dançar sobre suas cordas, rompendo o silêncio do lugar com a música.

Era realmente muito linda a melodia que ele tocava. Aos poucos e devagar, eu me aproximei. Quando ele notou minha presença, abriu os olhos, mas continuou a tocar.

Ele sorria ao mesmo tempo em que deslizava os dedos entre as cordas do violino. Então, depois de um último acorde, ele parou de tocar, me encarando satisfeito.

— Gostou?

— Parabéns. Eu não sabia que você era tão talentoso! — falei, em pé de frente para ele, com os braços cruzados.

— Não é a única artista da família — disse, deitando o violino no colo.

— É um lindo instrumento — declarei, me sentando no espaço vazio ao seu lado.

— O último presente que o meu avô, antes de falecer.

— Sinto muito.

— Está tudo bem. Ele foi violinista a vida toda. Não sabia fazer outra coisa. Tudo o que sei, aprendi com ele.

Vi no olhar de James uma espécie de devoção ao falar do avô.

— Ensaiando?

— Sim. Aperfeiçoando alguns Caprices! — ele disse, orgulhoso.

— Você é impressionante, James!

— Me desculpe estragar sua surpresa.

— Tudo bem, foi bom saber. — Tentei parecer otimista.

— Ah, não precisa mentir.

— É verdade, juro. Ser pega de surpresa com uma coisa tão séria como essa não é legal. Para essas coisas é bom ter um tempo para se pensar.

— Você não quer se casar com o Víctor?

— Shiiuu… Fale baixo! — critiquei.

— Desculpe — sussurrou.

— Não é isso. — Respirei fundo, procurando as palavras. — É só que eu ainda não me sinto preparada para me casar.

— Entendo — ele respondeu abrindo um curto silêncio entre nós dois.

Fiquei, por um momento, analisando a água calma do lago à nossa frente, tentando buscar uma forma de não me preocupar mais com a possível surpresa que me esperava. James também tinha o olhar fixo à sua frente, parecia não pensar em nada, apenas respirava devagar, sentindo o vento que começava a dançar por entre as árvores.

— Obrigada, James — falei, quebrando o silêncio.

— Por estragar a surpresa?

— Também. E por me fazer companhia ontem. Eu realmente estava me sentindo muito sozinha. Foi bom correr até as montanhas para ver os fogos com você. Foi… divertido.

— Eu sempre quis fazer aquilo depois de grande.

— Fez isso nos outros anos?

— Quando era menino, sim. Eu sempre tive essa teoria de que ver os fogos na mesma altura que eles seria bem mais interessante que ficar com o pescoço duro de tanto olhar para cima. — Ele riu. — São cinco minutos bem longos!

— É verdade — concordei.

— Só que eu subia até lá sozinho, porque os meus pais sempre estão ocupados demais com os convidados. Como eu não tive irmãos e a maioria dos meus amigos não curte passar a virada do ano em uma chácara cercada de mato, eu parei de subir até lá.

— Sei como é isso, eu também sou filha única. Mas e as namoradas? Não tem nenhuma?

— Ah, sim, muitas. Mas se elas viessem para cá juntas daria confusão — ele disse com um meio sorriso nos lábios.

— Seu bobo — falei, cutucando seu braço.

— Não, nunca tive uma namorada. Bom, paqueras, sim. Mas um namoro sério ainda não. Acho que estou como você. Não me sinto preparado para assumir um namoro.

— Sábias palavras.

— Ei, Ana! — gritou Víctor, da porta da cozinha. — Vamos?

— Sim. Estou indo — respondi.

Encarei James, que ainda acariciava o violino no colo.

— Vai lá — ele disse, apontando com o queixo para Víctor, que esperava impaciente. — Espero que volte no fim do ano. Vou colocar cadeiras para o próximo espetáculo.

— Então, coloque quatro. Tenho quase certeza de que estarei casada, e você, namorando.

— Tomara! — ele disse.

Deixei James na companhia do seu violino e me despedi de todos.

Víctor e eu pegamos a estrada em direção ao Rio. No fim do dia, já havíamos chegado. Ele me deixou no meu apartamento e prometeu voltar mais à noite para o nosso jantar.

Eu estava aflita.

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