Capítulo Dois

Tess substituiu o catre pela macia cama e travesseiros de plumas. O quarto não fedia tanto a ferro quanto ela imaginou.

Mas foi a pequena e retorcida escultura de ferro que chamou sua atenção.  Ela a encarou durante horas, se perguntando se o ferro ainda queimava.

Por fim, Tess saltou da cama e parou na frente da cômoda,  onde se encontrava a escultura. 

Receosa, ela tocou devagar a peça.  Nada. Apenas um leve formigamento no ferimento que cicatrizava em sua coxa.

Seldha continuou vindo. Sempre a obrigando a comer, tomar banho e trocar de roupa.  Era uma mulher de poucas palavras,  ao que parecia, e Tess agradecia por isso. 

Passaram-se seis dias. No total, quatorze. Quatorze dias naquele castelo.

Quatorze dias desde que Alek morrera. Tess gostaria de saber se Krisa e Liam estavam bem. Quem mais teria morrido.

" Seu amigo não morreu." Uma voz soou do canto mais escuro de seu quarto.

A silhueta dele se moveu para ficar à mostra na luz.  Damian a encarava.

" Seu laço e sua magia eram um só e foram cortados.  Ele pensa que está morta assim como você pensa que ele está. " Ele disse. " Mandei que minhas forças recuassem assim que peguei o que queria."

Quem  ele queria, ela o corrigiu mentalmente. 

" Se divertiu vendo sua irmã morrer? " Ela perguntou,  a voz era ácido. 

Mas Damian sacudiu a cabeça. " Não matei Cassaey.  Assim que ela perdeu sua utilidade, eu desfiz o controle mental. E posso ver que meu querido irmão mais velho não perdeu tempo ao dizer quem eu sou."

A raiva voltou a ferver seu sangue. " Rowan fez isso porque você  me ameaçou por bilhetes. "

Ele deu de ombros.  " Sempre gostei do drama e não poderia perder a chance."

Gostou do drama ao matar meus pais?, ela se perguntou.

" Saia." Ela disse entredentes.

" Não. Este castelo é meu e vou e faço o que quiser." Ele retrucou.

" Muito bem, eu saio então. " Ela se levantou e foi em direção ao banheiro, onde poderia se trancar e esperar que ele saísse. 

Mas Damian se colocou no caminho dela, aqueles olhos negros indecifráveis.  " Indo a algum lugar? "

"Sim, para bem longe de você. " Ela grunhiu para ele. Teria sido um rosnado se sua voz humana não fosse tão patética. 

" Não pode fugir de mim no meu próprio castelo. Não pode fugir de mim no meu próprio reino. "

Ela bufou e teria dado um tapa em seu rosto se sua mão não parasse, ainda levantada, a centímetros do rosto dele.

Perplexa,  ela o encarou.

" Péssima idéia. " Ele disse, a voz estava séria mas os olhos brilhavam com humor.

" Para um ser imortal e poderoso, não passa de um idiota com tempo livre demais." Ela disse. " Então pare de me atormentar e vá fazer algo útil,  como governar o reino ou destruir mundos."

Um pequeno e torto sorriso surgiu no rosto dele e Tess sabia que se não estivesse segurando a respiração,  a teria perdido.  Damian ficava ainda mais ridiculamente lindo com aquele sorriso e aquele brilho em seus olhos cor de ébano. 

" Sempre tem dificuldades em ficar de boca fechada?" Ele perguntou,  chegando ainda mais perto.

" Sempre tenho dificuldades em segurar minha língua quando alguém merece ouvir." Ela devolveu,  entredentes. 

Ele riu baixo e se afastou. Tess sentiu frio com o corpo quente dele se afastando, mas ignorou.

" Saia." Ela repetiu.

" Não. " Ele disse, se sentando numa poltrona creme que ela não percebera.

" Muito bem, então me responda. Porque você me sequestrou? " Ela cruzou os braços na frente do corpo e se encostou na parede. 

Ele colocou a longa mão no peito, num ultraje fingido. " Você não é uma prisioneira,  é apenas uma convidada que não pode escolher deixar o castelo. "

Ela bufou. " Ótimo,  tenho um piadista ruim no meu pé. "

Ela se afastou dele e se deitou na cama, puxando o edredom pesado para cobrí-la por inteiro. 

Uma risada sombria soou pelo quarto. " Que infantil."

Tess revirou os olhos debaixo do edredom.  " Você está sendo bem adulto ao me perseguir no meu próprio quarto, não é? "

Ela sentiu que ele se aproximou da cama e encolheu um pouco. " Primeiro,  meu castelo portanto meu quarto.  Segundo, não sou eu que não consegue lidar com problemas sem se esconder debaixo das cobertas. O que fará em seguida?  Chamará a mamãe e pedirá um copo de leite?"

Gelo e fúria percorreram o corpo de Tess. Ela empurrou a coberta para que Damian visse o quanto ela o odiava.

" Não chamarei a mamãe porque ela está morta. " Ela teria acusado-o, mas não pareceu o momento certo.

Damian a encarou com o rosto sério e indecifrável.  Então se afastou,  indo até a porta. Por fim, virou para trás.  " Vou pedir à Seldha que lhe confira uma aparência melhor. Não quero meus brinquedos andando por aí como mortos-vivos."

Então saiu porta afora.

Tess estava boquiaberta pela frieza e indiferença dele e soube que o odiaria enquanto vivesse.

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