4. Continuação

Mayara olhou para ela com os olhos arregalados em reprovação, mas não falou nada.

Sorri de volta para Valentina, mas não consegui disfarçar por muito tempo o meu incomodo conforme me aproximei delas.

Mayara, o que houve com sua perna? Perguntei, finalmente compreendendo que o professor Roberto amarrava uma gaze suja de sangue em volta de sua coxa.

Mayara olhou para mim, intrigada pela abordagem repentina.

Ela não foi atacada. Cláudio quem respondeu, atrás de mim. Cortou a perna em um arame enquanto tentávamos sair do pátio. Estava sangrando bastante, mas não é nada sério.

Desculpa ser tão indelicada, é só que… comecei olhando nos úmidos olhos cor de mel da garota.

Não, tudo bem… ela olhou para a perna dando de ombros. Acho que é uma preocupação válida. Conversar parecia acalmá-la um pouco.

Então você conseguiu? Perguntou Anny olhando na direção de Guga e pondo um fim ao nosso assunto banal.

Guga novamente apenas sacudiu as chaves em sua mão, o tilintar chegando aos ouvidos de todos.

Desculpa naquela sala só ficam as chaves das salas do terceiro ano, não consegui procurar mais porque as coisas estavam subindo, ele se desculpou, olhando para ninguém em especial.

Alguém murmurou sem problemas, Anny bufou, mas não houve nenhuma reclamação. Guga ficou com uma chave e entregou a outra para o Cláudio que abrira as trancas das portas.

Percebi que naquele momento que estavam todos com seus celulares, enquanto apenas eu estava sem, porque deixei na sala no momento em que fui ao banheiro. Imaginei que houvessem chamadas perdidas da minha avó, ainda que raramente ela usasse o seu celular.

Assim que os garotos abriram as portas, os terceiranistas presentes se dirigiram para as devidas salas, atrás de seus pertences. Fui com pressa até a minha mochila roxa, buscando meu celular no bolso externo.

Os números do relógio digital brilharam 16:00 na minha cara. Pela primeira vez, tive alguma noção de horário. Incontáveis notificações poluíam a minha tela inicial, desde mensagens no W******p até, impressionantemente, SMS de conhecidos. 27 ligações perdidas estavam sendo notificadas e fui imediatamente para elas, assim que destravei o celular. 6 delas eram do número da minha avó, 13 do meu pai e as outras 8 se dividiam entre os números das minhas colegas e de parentes distantes. Sem surpresas, não havia nenhuma ligação do meu irmão, comecei a sentir o meu coração disparando, conforme uma ansiedade incomoda se espalhou por mim, sem saber exatamente o que eu deveria fazer.

Imaginei que tentar contato com a vovó fosse o mais importante no momento. Eu morava somente com ela e meu irmão, embora o visse poucas vezes na semana. Minha mãe faleceu quando eu tinha quatro anos, sendo a sua aparência só reconhecível por mim através de retratos antigos e algumas escassas memórias.

Eu e meu irmão mais velho, Vinner, fomos criados pela minha avó e pelo meu pai, um homem amável e presente. O destino o levou a aceitar um trabalho melhor em um estado vizinho ha dois anos, para sustentar mais facilmente a casa com a minha avó e meu irmão. Ele mandava dinheiro para mantermos a casa e nossos estudos, que era somado a quantia recebida pela aposentadoria da minha avó, e nos visitava em praticamente todos os feriados.

Eu tinha uma relação ótima com meu pai, mas desde que Vinner entrara na faculdade e começará a namorar, lentamente o seu contato, que já era escasso, com a família fora diminuindo cada vez mais. Nós nunca havíamos nos dado particularmente bem, mas praticamente abandonar a mim e minha avó só retornando para casa quando precisava de algo ou para deixar as roupas sujas, era algo que havia me enojado profundamente. Naquele ano, acho que eu não havia trocado mais de dez palavras com ele.

Após ficar mais de 7 horas sem fazer contato, cliquei rapidamente no nome da minha avó e coloquei o telefone na orelha, pouco preocupada com o que o resto dos meus colegas fazia. Ouvi aquele “tuu” continuou 6 vezes e quase desistindo, após o 7° ouvi a voz da minha avó.

Rutinha? Ela falava alto, sempre achando necessário gritar quando estava ao telefone. Aquele apelido que eu não gostava pareceu-me muito aconchegante agora. Sua voz era carregada de um desespero que me cortava o coração. Rutinha, você está bem?

Tô, vó… gritei, indiferente para os rostos que se viraram na minha direção. Meus colegas juntavam freneticamente seu material dentro das respectivas bolsas com pressa, mas eu não me importava. Eu fiquei presa no banheiro do colégio sem celular, você está bem? Não me importei com o quão bizarra essa frase soava.

A vó tá bem, Rutinha eu podia ouvir a sua respiração pesada e mil situações invadiram minha mente: estaria a minha avó correndo nas ruas, fugindo daquelas coisas? Haveria algum deles entrado em nossa casa e atacado ela?

Ela afarva porque sentia dores provindas de uma possível mordida?

Sacudi a cabeça de leve, tentando afastar aqueles pensamentos.

A gente tá indo para a casa da Maria continuou minha avó, eu sabia que com a gente ela referia-se as amigas de vizinhanças. Morávamos em um bairro calmo e afastado do centro, então bastante idosos tinha casas por lá. A Tery passou aqui em casa para me buscar, a gente acha que é mais seguro ficar lá porque é mais afastado. Estou levando a Mel, ela também está bem! Ela disse, trazendo-me uma agradável onde de alívio. Rutinha, você ainda tá no colégio?

Sim, vó! Eu acabei de pegar as minhas coisas e eu vou para casa agora! Falei enquanto me levantava e começava a guardar o material dentro da mochila e qualquer forma.

Não, Rutinha! Ela gritou e congelei no mesmo instante, tendo certeza que todos na sala também conseguiram ouvir. Eu vi na TV que o centro está uma loucura! Todas as ruas estão com quilômetros de engarrafamento e acho que os ônibus pararam de funcionar!

Minha avó gritava como quem proferia uma maldição. As ruas estão cheias de coisas… ela completou um pouco mais baixo. Procura um lugar seguro, liga para polícia e espera ajuda!

Pensei por alguns segundos, fechando o zíper da minha mochila e colocando ela nas costas. Aquilo era Cláudio mexendo nas mochilas de outras pessoas?

Tudo bem então, vó… você estará na casa da Maria, né? Ouvi a confirmação dela. Então eu vou ficar aqui e esperar ajuda, não se preocupa. Vou manter contato, fica com o celular, tá? Cuida da Mel! Pedi e nos despedimos com amor e desespero.

Quando guardei o celular na mochila, olhei ao redor e vi que Cláudio me fitava, curioso.

Você vai ficar aqui no colégio? Perguntou…

Não, eu vou para casa… com a mochila nas costas, segui para a porta.

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