Capítulo 2 - Conhece-te a ti mesmo

"Quando somos amados, não duvidamos de nada. Quando amamos, duvidamos de tudo."

Sidonie Colette.

-Bom meninos, agora precisamos ir. Nosso avião sai daqui a duas horas. Até chegarmos ao aeroporto e passarmos por todas aquelas revisões, nosso voo já estará pronto pra sair. - dizia Tom.

Quando meu estresse não me impedia de ver as coisas como elas eram, Tom era um fofo, educado, elegante e bonito. Acho que poderia confiar minha mãe a ele. Isso é claro, se ela não tivesse uma crise de meia idade na viagem.

– Tudo bem, então. Só uma pergunta: onde fica meu quarto?

– Ah, sim. Desculpe por ter esquecido de falar. Seu quarto é no segundo andar, última porta, do lado esquerdo. Qualquer dúvida pergunte ao Daniel. Ele te ajudará no que precisar.

– Obrigada. Vou ajeitar minhas coisas. Boa viajem. Cuide bem da minha mãe, Tom.

– Fique tranquila. Não deixarei que ela faça nenhuma besteira. Voltaremos em alguns dias.

– Se ela fizer besteira, é só fingir que não a conhece. – Ela odiava ser ignorada. Fingir que não a conhecia e revelar ou comentar sobre sua idade era pior do que matar alguém.

– Tom, é melhor vocês irem logo, antes que acabem se atrasando. Podem relaxar. Eu cuido das coisas por aqui. Curtam a lua de mel de vocês. - disse Daniel.

– Tem razão. Helen, precisamos ir. Até mais crianças!

O mais novo casal seguiu seu caminho, deixando-me a sós com Daniel. Ele me encarava, esperando que eu dissesse algo.

– Vou pro meu quarto. Preciso tirar essas coisas de dentro das caixas e arrumá-las. Tenho certeza de que vou demorar. Então melhor começar logo. – falei enquanto pegava uma das caixas.

– Elisa, quer ajuda? – Daniel perguntou com aquela voz encantadora.

– Não precisa se incomodar. Fora que provavelmente vai ser algo demorado. – o alertava enquanto subia as escadas com cautela, por estar com a visão um pouco limitada devido a caixa que segurava.

– Não é nenhum incômodo. Quero te ajudar. Precisamos nos dar bem. Sem contar que se você fizer isso sozinha vai demorar muito mais tempo. – ele era tão gentil... como conseguia? As pessoas não costumavam ser gentis, elas não costumavam se preocupar comigo.

– Você quem sabe. Se quiser me ajudar, por favor traga as caixas pra mim. – disse a ele tentando mostrar indiferença.

Daniel começou a subir com as coisas enquanto eu as desempacotava e colocava no melhor lugar. Meu quarto era lindo e espaçoso. Os móveis eram branco e marrom escuro. Minha cama era de casal e de cada lado havia um criado mudo. Meu closet era perfeito e enorme. Era dividido em partes pra roupas, sapatos, chapéus, e joias. Fiquei encantada ao ver. Quase pulei de alegria, mas precisava me controlar já que não estava sozinha. Meu banheiro tinha uma banheira e um box, a pia era consideravelmente grande com vários cosméticos organizados em cima dela. Minha torneira tinha controlador de água quente e fria. As toalhas eram vermelhas e estavam bordadas com meu nome.

Apesar de ter dezessete anos nunca fui uma adolescente como as outras. Não tinha um monte de pôsteres de cantores e atores colados na parede, isso facilitava um pouco minha arrumação, já que não tinha que me preocupar com espaço pra eles. Não gostava de ir a boates, shows e qualquer outro lugar onde tivesse uma aglomeração muito grande de pessoas. Meu passatempo preferido era ver filmes com Ana, ir ao shopping fazer compras e ler livros. Principalmente livros. Devido a isso, quarenta e cinco por cento das caixas de mudanças eram livros, trinca e cinco por cento roupas e vinte por cento cacarecos que estavam no meu antigo quarto.

- Acho que você é a pessoa mais culta com dezessete anos que já conheci. Não tem nem uma foto de um cara musculoso sem camisa não? – deixei escapar um risinho.

- Nem sem camisa, nem com camisa.

- Pensei que as garotas da sua idade gostassem desse tipo de coisa.

- Devem gostar. – dei de ombros enquanto ajeitava os livros numa prateleira.

- Então, o que uma garota como você faz? – me passou um livro.

- Leio. E muito.

- Há algum motivo em especial? Pretende ganhar um prêmio Nobel?

- Não. Só gosto de ficar sozinha. Livros são uma boa companhia.

- Espero que isso não seja algum tipo de indireta. – sorriu de um jeito encantador.

- Ah, não, não foi. – ele deu um risinho.

- Deve ter sido difícil pra você deixar seus amigos para trás, não é mesmo?

- Por que está perguntando isso? – retruquei de forma automática.

- Nada. É só que... você parece triste.

Eu não tive coragem de falar algo sobre aquilo. Ele tinha razão. Ele tinha percebido enquanto minha mãe, a pessoa que supostamente deveria me conhecer, estava ocupada demais olhando para o próprio umbigo. A única coisa que eu pude dar em troca foi meu silêncio.

Para esquecer esses pensamentos, tentei colocar um livro na prateleira mais alta, mas mesmo na ponta dos pés estava difícil.

- Deixa que eu te ajudo. – Daniel parou atrás de mim e, segurando minhas mãos, empurrou o livro pra trás.

Me virei e o encarei. Meu coração começou a bater mais rápido. Ele sustentou meu olhar por alguns minutos e logo depois deu um sorriso torto.

- Bem melhor, não acha? – tudo que consegui fazer foi assentir.

A arrumação acabou sendo mais rápida do que pensei. Claro que a ajuda de Daniel facilitou as coisas. Mas isso não quer dizer que não tenha demorado.

–Terminamos. – disse me jogando na cama

– Nem fala. Nunca pensei que seria tão demorado arrumar um quarto. - disse ele se jogando ao meu lado.

– Isso porque não trouxe tudo, na minha outra casa tem muita coisa ainda. – expliquei.

– Eu não sabia que tinha uma irmã tão consumista. – brincou. Algo naquela frase me incomodou e eu não sabia dizer bem o que era. Talvez minha alma consumista tivesse sido desmascarada.

- Acho que meus hábitos de consumo são bem aceitáveis.

- Já parou pra contar a quantidade de livros nessa estante?

- Eu acho razoável...

- Con-su-mis-ta. – sorriu pra mim. – Mas tá tudo bem, eu te aceito do jeito que você é.

- Você é sempre assim?

- Assim como?

- Tão... crítico.

- Ah, não. Eu costumo ser pior em concursos de beleza.

- Concursos de beleza?

- É. Eu sou o jurado-voz-do-povo. Aquele cara bonito que fica lá só pra levantar o ibope do concurso. – deixei escapar um risinho. - Isso mesmo! Agora está bem melhor! Sabe, você fica muito mais bonita sorrindo. – deu uma piscadinha pra mim. Automaticamente senti um friozinho na barriga. Isso era pra acontecer, não era? – E então, o que quer comer?

– Vai comprar pronto? – perguntei, mesmo sendo meio óbvio...ou não.

– Não. Vou fazer. – falou enquanto fitava o teto.

– Ah, para. Você sabe cozinhar? Tudo bem. Vou pegar leve dessa vez. Pode ser miojo. - ele riu.

– É sério. Eu sei cozinhar. A empregada lá de casa me ensinou tudo o que eu preciso saber pra me virar. Cozinho bem, sei fazer muitas coisas e o que eu não sei aprendo. – me explicou.

– Nossa mãe não sabe nem fazer pipoca de micro-ondas. - comecei a rir. – Quem cozinha sou eu. O pior de tudo é quando ela está inspirada e decide fazer algum prato exótico. Sempre sobra pra mim. Não sei como ainda não morri intoxicada.

– Quanto a isso, não precisa se preocupar. Não vou deixar você morrer com a minha comida. Pelo contrário, tenho certeza de que você vai gostar. – falou enquanto se levantava. –Tome um banho e descanse um pouco. Logo o jantar estará pronto.

– Não preciso descansar. – falei imediatamente. Tão rápido que nem pensei antes de falar. – Hã... quero ter certeza de que você não vai me enganar. Quem me garante que você não vai ligar pra algum restaurante e dizer que foi você quem fez? – tentei disfarçar o que havia dito antes. Daniel começou a rir.

– Certo. Vamos fazer a comida juntos. Mas você lava os pratos! – disse em meio aos risos.

Descemos e fomos para a cozinha. O lugar era arrumado demais pra uma casa onde só havia homens. Estranhei.

– Aqui tem empregada? – perguntei desconfiada.

– Tem sim. – afirmou.

– E onde ela está? – enquanto perguntava procurava por algum sinal de vida além de nós dois.

– Está de férias, mas volta amanhã. Tom está pensando em reduzir seu horário durante as nossas férias, pra que ela só faça a limpeza da casa e cozinhe alguma coisa caso necessário. – ao menos haveria outra pessoa na casa para Daniel conversar e me deixar sozinha.

– Hum... – não consegui dizer mais nada. Sentei na cadeira que estava na bancada. Peguei uma maçã na fruteira e comecei a rodá-la de um lado para o outro, me distraindo com meus pensamentos.

– Achei! Aqui está o que comeremos! – ele segurava um pacote de macarrão nas mãos.

– Macarrão? - perguntei meio irônica. – Depois de tantos elogios à própria comida pensei que comeria algo exótico.

– E irá. Você com certeza já comeu macarrão. Mas nunca comeu o meu macarrão. O que o torna algo exótico. – um sorriso se estendeu de ponta a ponta em seu rosto, como se me dissesse: ”Nessa eu te peguei!”.

– Touché, meu caro. O que eu tenho que fazer?

– No momento esperar. Seus afazeres virão depois da janta.

Não pensei em insistir. Queria ficar me torturando com meus pensamentos e tentar consolar a mim mesma. Como Ana fazia falta nessas horas. Então pensei: ”Bom, com certeza não sou a única pessoa da face da Terra a ter um celular. Meu irmãozinho deve ter um.”

– Daniel, posso te pedir um favor?

– Mas é claro! Até dois se quiser!

– Pode me emprestar seu celular para eu ligar pra uma amiga? Mamãe jogou o meu pela janela do carro, então agora não tenho mais. Pobre celular, se foi tão cedo. - ele começou a rir.

– Por que está rindo? O que tem de tão engraçado?

– Me perdoe. É que eu estava imaginado a cena. Tome, pegue.- jogou o celular pra mim. - Faça bom uso. Pode passar a noite toda falando com sua amiga. - e continuou a rir.

– Obrigada. - Antes que saísse da cozinha Daniel me chamou.

– Não vai querer comprovar que fui eu quem cozinhou? – disse com um tom de ironia.

– Não. Confio em você. – não esperei uma resposta, mas pude sentir um sorriso em seu rosto.

Fui para meu quarto e me pus imediatamente a ligar para Ana. Precisava falar com ela, dar um sinal de vida depois de ter perdido o contato tragicamente. Acabei decidindo que não iria falar sobre o que estava sentindo em relação àquele novo ser que diziam ser parte da família. Ele era legal, divertido e extremamente lindo. Me perguntava de que lado da família tinha vindo toda aquela beleza. Não era da mãe, muito menos do pai.

Ana não estaria sempre a minha disposição para me dizer o que se passava comigo. Na verdade, nunca estaria, ninguém nunca estaria e eu já sabia disso. Só eu sabia meus medos, decepções e angústias como ninguém, então só eu poderia me entender. Tranquei a porta, fui ao banheiro, abri a torneira da banheira. Sentei no vaso e liguei para minha única amiga enquanto esperava a banheira encher.

– Alô? – ouvi a voz de Ana.

– Amiga, me perdoe por não ter terminado nossa conversa!

– O que houve? – perguntou. Respirei fundo e contei:

– Minha mãe jogou meu celular pela janela do carro.

Ela não sabia se ria ou se ficava preocupada.

– Eu não acredito que você deu esse mole! - falava em meio aos risos.

– Como se eu pudesse fazer alguma coisa. Você sabe muito bem como ela é. Graças a Deus a paz tem reinado, porque tem vezes que ela faz minha vida um inferno. Tipo agora. Como ela acha que eu vou ficar sem celular? Te liguei pra avisar que infelizmente ficaremos um tempo sem nos falar devido a esse incidente.

– Foi por isso que eu estranhei. O celular identificou como número desconhecido. De quem é esse aparelho? Não tá fazendo coisa errada não, né menina? – brincou.

– Mas é claro que não! Não sou aprendiz de mão leve. O aparelho é do Daniel. Ele me emprestou.

– Ah, sim. Falando em Daniel, e aí? Como ele tá? – obrigada por comentar sobre a parte que me toca.

– Tá bem. Estamos todos bem, apesar da viajem um pouco estressante. - tentei não tocar muito no assunto.

– Elisa, dá pra parar de cordialidade e me falar se ele é bonito, tem namorada, quantos anos ele tem. Quero todos os detalhes. – eu não queria falar sobre Daniel, eu queria falar sobre mim e como eu me sentia desconfortável naquela casa, como eu me sentia muito mais sozinha. Mas eu não queria dramatizar as coisas mais do que já fazia.

– Ele é legal, não sei se tem namorada, tem dezenove anos. - nesse exato momento o celular escorregou da minha mão e caiu no chão.

A partir daquela hora seria uma pessoa morta. Comecei a catar as peças do celular que haviam se espalhado pelo chão. Coloquei tudo onde deveria estar e por um milagre o celular voltou a funcionar. Não liguei para minha amiga, não era idiota o suficiente para querer sofrer um interrogatório que eu não estava disposta a responder.

A banheira já estava cheia. Fechei a torneira, tirei minhas roupas e entrei na água quente. Deixei o celular ligado, caso alguém telefonasse procurando por Daniel. Apoiei minha cabeça na borda da banheira e fechei meus olhos para tentar esquecer meus poucos problemas. Mas não era fácil.

Por que Elisa sempre tinha que ser a estranha e revoltada da família, da escola, dos cursos que fazia, de tudo? As pessoas não entendiam e nunca entenderiam. Mas elas não precisavam entender, precisavam apenas me deixar em paz. Mas por que aquele cara que se dizia meu irmão tinha que ser tão amável e prestativo? Por que ele tinha que cuidar de mim? Talvez se sentisse obrigado, como Helen se sentia.

Suspirei.

Existiria a possibilidade de viver enclausurada naquele quarto? Eu realmente não me incomodaria. Era até melhor não ver as pessoas, não ter que fingir perto delas, não ter que me preocupar com o que achavam.

Em algum momento acabei pegando no sono, só me dei conta de que já tinha passado da hora de sair do banho quando o telefone tocou.

– Alô? – falei meio atordoada.

– Elisa? Graças a Deus você está bem! Pensei que tivesse morrido afogada dentro do vaso. - senti o alívio em sua voz.

– Algum problema? - perguntei.

– Sim, nosso jantar já esfriou há muito tempo! Estou tentando falar com você há uma hora! Bati na porta e não ouvi nenhum sinal de vida. Liguei para o meu celular e dava ocupado, depois de dez minutos liguei de novo e dizia que estava desligado ou fora da área de cobertura, bati na porta uma centena de vezes e você não me atendeu! Pensei que tivesse acontecido algo.

– Não se preocupe, eu estou bem, acho que acabei cochilando. Vou me arrumar e já desço. Esquente a comida enquanto isso.

– Tudo bem. Mas não demore. - alertou-me.

Saí da banheira e vesti uma blusa regata branca com um leve decote e um short jeans. Calcei meus chinelos e penteei meu cabelo rapidamente. Dei um jeito no banheiro para que não ficasse bagunçado, coloquei o celular de Daniel no bolso e segui em direção à cozinha.

Depois de relaxada, consegui prestar mais atenção na casa. O corredor e as paredes do salão principal eram cobertos por quadros pintados por grandes pintores. Parecia um verdadeiro castelo. Havia um tapete enorme no corredor dos quartos e um espelho com uma cômoda exatamente entre as duas portas do meio. O salão principal era coberto por esculturas. Era definitivamente um sonho estar naquele lugar, me sentia uma princesa. Se minha mãe tivesse um gosto melhor para decoração poderíamos ter uma mansão tão linda quanto a de Tom, mas ela gostava da nossa casinha simples. Ela pensava: pra que gastar dinheiro com casa se posso gastar com roupas e viagens? Se a casa tem teto, cama, banheiro e comida já está ótimo!

Cheguei na cozinha e nosso jantar estava sobre a bancada com um jarro de flores no meio. O macarrão estava com uma cara convidativa e a minha fome intensificava mais ainda a aparência, quem diria o sabor.

– Aqui está seu celular. Obrigada. – disse colocando o parelho em cima da bancada.

– Ainda bem que você chegou, pensei que tivesse que esquentar novamente a comida. - disse Daniel colocando o vinho à mesa juntamente com as taças.

– Vinho? - perguntei.

– Sim. Vinho. Algum problema? - disse intrigado.

– Não, nenhum. Isso se você quiser embriagar sua irmã mais nova. - comentei.

– Por quê? Você é alcoólatra precoce ou não aguenta uma taça?

– Não é isso, só acho estranho meu irmão me oferecer uma taça de vinho. Geralmente irmãos normais tentam evitar que bebamos coisas alcoólicas.

– Aí que está! Não sou um irmão normal. - sorriu. - Elisa , se não quiser não precisa beber. Não lhe daria algo que lhe fizesse mal. E não se preocupe porque não vou te deixar bêbada. Só lhe darei uma taça. O vinho nos ajuda a apreciar melhor a refeição. Confie em mim. - disse em meio a outro sorriso, mas dessa vez, um sorriso sedutor.

Não pude resistir. Fui em direção ao meu lugar. Daniel puxou a cadeira para que eu pudesse me sentar. Assim que coloquei a primeira porção de macarrão na boca, fiquei com vontade de devorar toda a comida em questão de segundos, contudo não podia perder a classe que tinha.

– Preciso admitir, está realmente maravilhoso. Das duas uma, ou você cozinha muito bem ou a fome é realmente o melhor tempero. - provoquei.

– Acho que nesse caso um pouco das duas coisas influenciam consideravelmente na hora da refeição. - tomou um gole de vinho.

– Então, como estão as coisas? - perguntei.

– Ótimas. Daqui a alguns dias volto a estudar. Meu pai está bem, na medida do possível, e eu estou com minhas duas princesas. - nossa, me senti uma criança de dois anos.

– Mas como assim ”volto a estudar” ? Você já estava fazendo faculdade? - fiquei curiosa.

– Sim, estou morando com Tom desde o início do ano. Não poderia começar no meio do ano, era no início ou só no próximo. Não posso perder tempo. Então vim pra cá mais cedo.

– Por que não foi ao casamento? - coloquei uma porção de macarrão em minha boca, fingindo estar despreocupada.

– Quando estava no caminho para a igreja, meu pai me ligou dizendo que estava passando mal. Tive que ir imediatamente para casa. Acabamos parando no hospital nesse dia. Mamãe não te avisou?

– Não. Na verdade, ela não costuma me contar as coisas. Na maioria das vezes fico sabendo pelos outros ou quando ela me diz já é em cima da hora.

– Entendo. Ela tem tendência a esquecer coisas importantes. - Daniel deu uma garfada em sua comida e colocou-a na boca.

Passamos o resto do jantar em silêncio. Geralmente eu gostava do silêncio, mas naquele momento ele parecia ocupar todo o espaço a ponto de me prensar contra a cadeira.

Após terminarmos de comer, enquanto eu lavava a louça, Daniel ficou conversando comigo. Era estranho, mas com ele ficava fácil falar, as palavras simplesmente saíam. Ele parecia se importar com as coisas que eu falava, perguntava nas horas certas, contestava quando precisava e sempre sorria me incentivando a continuar. Daniel me entendia mesmo que eu não me entendesse.

Comemos sorvete de creme, meu preferido, de sobremesa. Rimos, cantamos, fomos felizes. Os momentos com Daniel foram únicos e eu queria guardar cada um deles comigo. Ele tinha me apresentado outra Elisa.

– Certo mocinha, já são duas da manhã. Você precisa dormir.

– É realmente necessário? – perguntei.

– Sim, você precisa descansar, seu dia foi muito exaustivo. E eu também preciso dormir. - dizia enquanto programava os sistemas de segurança da casa.

– Tudo bem. - disse por fim. Sabia que não ia sair vencedora se tentasse argumentar.

Subimos juntos. O quarto de Daniel era de frente para o meu. Abri a porta do meu quarto e dei boa noite. Ele desejou o mesmo e me deu um beijo na testa, descendo levemente a cabeça e falando ao pé do meu ouvido ”Durma com os anjos, minha querida Elisa.” E então foi para o seu quarto. E eu fiquei lá, deixando o “minha querida Elisa” ecoar na minha mente e quase me fazer ter taquicardia.

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