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Alguns dias atrás

No último domingo antes de voltar para as faculdades, Clara sentiu-se totalmente indisposta para sair com os amigos de Nathan. Na noite passada, eles foram para uma balada noturna e, quando Nataly e Jonas saíram para dançar e Nathan e Alan foram comprar as bebidas, Anastacia e Helena ficaram conversando e falando mal dela de forma maldosa, como se ela não estivesse por ali. Ouviu que seu corpo era feio, sua carinha de santa era falsa, seu vestido era de mau gosto. Após a volta do “namorado”, ela encolheu-se nele e ficou a noite toda em silêncio. Mais legal foi que, quando voltaram para casa, Nathan nem perguntou se havia algo errado; só beijou sua testa e foi dormir.

Por isso, quando ele chamou-a para ir a um restaurante, recusou educada e falou a desculpa que mais funcionava com as mulheres: cólica menstrual.

Encolhida no sofá, comia um hambúrguer que Lorena ensinara a fazer. Pensava em como a ruiva havia sido amorosa por todas essas semanas e fora a única que conversou abertamente sobre Helena com ela.

— Não posso negar que Helena foi uma namorada fantástica para Nathan, Clara — confessara a Zanford enquanto terminava de cortar os legumes. — Na época que começaram a namorar, eu e Luiz demos indício de uma separação e foi ela que não fez nosso filho entrar em depressão.

— Mas vocês parecem ser um casal tão saudável... — sussurrou a morena e corou ao notar ter falado alto. — Hã... Qu-quer dizer...

— Não tem problema, Clara — o sorriso da mulher lhe acalmou, mas não fez que suas bochechas voltassem a coloração normal. — Antes de Nathan ir embora, ele havia comentado que queria pedir Helena em casamento... E, de um dia para o outro, ele desapareceu. Ela não esperava, nenhum de nós! Quando conseguimos achá-lo, ele está morando com outra. Nada contra você, Clara, mas foi um choque muito grande para todos, principalmente quando ele chamou-a de... De vadia.

Voltando para seu momento de solidão, Clara queria entender Helena. De verdade! Queria ver que a loira era apenas mais uma apaixonada que não poderia ter seu amado de volta porque ele havia se tornado gay. No entanto, seu consciente fazia questão de relembrá-la de todas as falas cruéis da outra e, exatamente por isso, não sentia nem um pouquinho de pena dela.

Faltando pouco para terminar, a Dunsley é arrancada de seus pensamentos pelo telefone. Lembrou a si mesma que era domingo, ou seja, sua mãe e sua irmã estavam com saudade. Elas queriam ligar todos os domingos, porém queriam dar um espaço para a morena e o amigo; então, preferiam ligar um ou dois domingos por mês.

— Alô! — falou com a boca cheia.

— Clara, nós temos que conversar — a voz do outro lado a fez engasgar com a comida... — Respire, filha.

O que Hilton estava fazendo? Engolindo o orgulho Dunsley e falando com ela? Como assim? Afastou-se do telefone e começou a bater no peito para parar de tossir. Quando conseguiu respirar novamente, olhou para o aparelho e, hesitante, colocou-o no ouvido.

— papai ... Eu não esperava sua ligação — comentou e limpou a boca com as costas da mão. A mão que ainda tinha algumas marcas, mas estava bem melhor com a queimadura.

— Nem eu esperava ligar, mas a situação está séria, filha.

Hilton, seu pai, não parecia, contudo, era um ótimo pai. Por ser sempre muito sério e exigente, as pessoas o viam com maus olhos... Enganavam-se amargamente, pois o moreno era um pai maravilhoso.

— O que houve? Aconteceu algo?

— E... — Dunsley Hilton sem palavra? Lá vinha merda. — Clara, sua irmã sofreu um acidente.

A tigela de vidro caiu de seu colo e quebrou em pedaços ao atingir o chão, espalhando cacos de vidro e sopa para todos os lados. No entanto, a morena estava importando-se mais em apertar o telefone contra a orelha com força e segurar suas lágrimas. Caramba, de umas semanas para cá, as lágrimas pareciam surgir sem qualquer autorização dela!

— Yaraline? E-Ela está bem? Foi muito grave? Qu-quer que eu volte para casa? — ficou perguntando e mordeu o lábio inferior que não parava de tremer.

— Não, Clara, quero que me ouça. Ah, odeio falar essas coisas por telefone! — ouviu-o resmungar e respirar fundo. — O acidente foi grave... Yaraline foi para o hospital e está tendo que fazer uns tratamentos caros para sobreviver.

— M-mas dinheiro não é o problema para nós, né? — uma pontinha de esperança brotou no coração dela e logo morreu com as palavras de seu pai.

— Bom... O problema é o dinheiro, Clara. A empresa está falindo e estamos ficando sem dinheiro. — Hilton ficou mudo para que a filha assimilasse as coisas e voltou a falar de uma vez só, como se estivesse ficando sem fôlego para isso. — Você vai ter que se casar, minha filha... Perdoe-me.

Atualmente

— Ei, Clara, está no mundo da lua? — perguntou alguém e balançou a cabeça, acordando da lembrança. Na sua frente, estava Tamara, sua melhor amiga. Elas haviam ido juntas para um café próximo à Universidade e, enquanto a outra ia comprar os cafés, a Dunsley viajou!

— Gomen né, Tamara — sorriu e pegou o seu cappuccino, dando um pequeno gole. Ah, do jeito que ela gostava. — Muita coisa na cabeça.

— Quer conversar sobre isso ou prefere falar com Nathan? — a dona dos cabelos castanhos chocolate arqueou uma sobrancelha e Clara riu do ciúme da amiga. Algo extremamente desnecessário.

— Estamos passando por uma crise, eu acho — comentou e deu de ombros, ainda pensando na notícia que recebeu do pai. — Nós não estamos nos falando direito e acho que é por causa dos amigos dele que vieram vê-lo.

— Aqueles que você comentou na segunda?

— sim! Comentei que estamos namorando até ele ter coragem de contar para os pais que é gay?

— Não brinca! Mas eles não vão embora nesta segunda?

— Sim sim e ele ainda não contou, aquele viado — riram e continuaram a conversar.

Clara contou que Helena tinha uma implicância especial com ela, já que a mesma era uma ex-namorada. Não comentou que ela vinha ameaçando-a ou nada parecido... Ela havia aturado por três semanas inteiras sem contar para ninguém, a loura não passaria de seu limite.

Mas passou...

Quando estavam saindo do café, Nathan estava esperando-a do lado de fora e encostado em seu carro. Aquela cena era linda, no seu ponto de vista, porque, quando ele ficava de braços cruzados, ressaltava todos os músculos. Sem falar no sorriso... Ah, por que ele tinha que ser gay? Se ele fosse um dos rapazes que ela tivesse que se casar para salvar a empresa, ela não se importaria!

— Quer ir ao cinema com o pessoal hoje? — perguntou o loiro assim que se aproximaram. — Como vai, Tamara?

— Tenho estágio para ir — começou e suspirou. Em letras, nem precisava do estágio, mas em economia...

— E trabalho de literatura para fazer comigo! — gritou Tamara, indignada, porque a amiga havia esquecido.

— E trabalho de literatura para fazer com a Tamara — sorriu envergonhada. Havia esquecido mesmo.

— Já liguei para o seu chefe e ele deixou você faltar — Nathan deu de ombros e a morena bufou.

— Nathan, assim, vou perder meu estágio!

— E ela pode chegar depois das cinco para o trabalho, Tamara? — ele abraçou a outra morena com carinho e fez uma cara de cão que caiu da mudança. — Por favor... Prometo que a deixo dormir na sua casa!

— Tudo bem! — afastou-se do abraço. — Mas sem atrasos!

— Nathan, como você consegue? — perguntou, já dentro do carro, vendo a amiga cada vez mais distante.

— Ninguém resiste a minha carinha!

Encontrando o grupo, Clara sentiu falta de Luiz e Lorena e o rapaz respondeu que era um programa para jovens. Almoçaram e ficaram passando um tempo andando pelo shopping, pois o filme que queriam começava mais tarde. Quando chegou a hora, compraram as entradas, as pipocas e os refrigerantes e entraram na sala escurecida. No meio do filme, ela arrependeu-se de ter comprado o refrigerante maior e sussurrou para o “namorado” que iria ao banheiro. Ele estava tão ligado ao filme que apenas assentiu enquanto a morena passava na sua frente e ia para o banheiro que ficava do lado de fora da sala.

A cabine era pequena e suja, mas dava para o gasto. Ao terminar, lavou suas mãos e pensou em retocar a maquiagem. Só pensou mesmo.

— Você ainda está namorando o Nathan, sua puta? — perguntou Helena, surgindo das sombras e assustando Clara. — Não percebe que ele não te quer mais?

— Olha, Helena, segunda-feira vocês vão embora — respondeu e virou-se, encontrando-a apoiada em uma cabine. — Fico triste por Nathan, mas acabou! Pare de tentar colocar minhocas na minha cabeça!

— Não estou colocando minhocas, estou fazendo você abrir os olhos — ela começou a se aproximar. — Você não percebeu que ele está te evitando? Não notou que quase não liga para você?

A moça ficou alerta. Clara vinha percebendo isso, sim, porém ficou na dela.

— Não viu que Nathan faltou a duas aulas na faculdade na quarta? Ele estava comigo neste dia! — Helena sorriu ao ver a boca da Dunsley se abrir de surpresa, contudo, não parou. — Ele continua maravilhoso na cama, não é mesmo? Aquele corpinho todo desenhado com aquele olhar malicioso... como me deixa excitada!

— É... É mentira — sua postura era rígida e sua voz fraca, lembrando-se perfeitamente bem que o Zanford não havia ido para as aulas naquela manhã.

— Quando terminamos de fazer amor, sabe o que ele me disse? — a morena nem precisou respirar para ter uma resposta. — Que você era apenas um divertimento. Que estava pensando em pedir transferência para a Universidade de Los Angeles e terminar os estudos por lá, perto da casa dele, perto da família dele... Perto de mim!

Aquela atingiu-a como um soco no estômago. Transferência? Não, não! Ele prometeu que nunca sairia de sua vida, nunca! Ainda que estivesse distante, a promessa valia, certo? Só que, desta vez, as cenas que viveu esses dias passaram como um filme em sua cabeça. Nathan realmente ficara mais próximo de Helena e será que iria voltar para ela? Mesmo estando três anos sendo gay?

Foi, então, que outra verdade a acertou: será que ela era tão feia para não fazê-lo gostar de mulher? Helena ficou apenas três semanas com ele, três semanas, e ele parecia mais homem do que nunca. E eles moravam três anos juntos, três anos, e ele nunca se mostrou atraído por ela.

Como ele era um mentiroso, falando que ela era a garota mais linda que ele conhecera. Como ela era uma idiota por acreditar e se apaixonar por ele!

Quando deu por si, as lágrimas desciam por suas bochechas e a loira encarava-a com um sorriso vitorioso. Era isso que ela queria? Acabar com o seu coração? Pois conseguira! Pegou sua bolsa e saiu do banheiro, secando as lágrimas. Bem a tempo, porque Nataly quase vira.

— Clara, tudo bem? Você parece pálida! — a rosada era outra que foi um amor com ela pelas últimas semanas. Ou talvez estivesse encenando também? Quando ela iria colocar a mão em sua testa, desviou e sorriu fraca. Não queria mais veneno, já estava de saco cheio.

— Sim... Avisa para o Nathan que fui fazer o trabalho com a Tamara para mim? — “Não estou a fim de olhar para a cara daquele viado!”, completou mentalmente.

— Não vai ver o filme? Está quase acabando!

— Acho melhor não, Tenho que fazer esse trabalho da faculdade ou, então, essa minha amiga me mata! até mais, Nataly.

Pouco se importava se ele iria gostar ou não, pouco se importava! Só queria ir embora de uma vez!

Assim que entrou no táxi, os olhos arderam e colocou as mãos no rosto para que o motorista não precisasse ver a sua dor descer em lágrimas. Pensou nesses três anos que passou com Nathan e não conseguia acreditar na amizade deles, não queria mais acreditar. Por dois anos, ela o amou e, mesmo sabendo que era um amor impossível, não deixou de acreditar que, um dia, ele viraria para ela e diria “Eu te amo”, o eu te amo de um namorado; diferente do “Eu te adoro”, o eu te amo de melhor amigo.

“Acorda, Clara, você perdeu!”, gritou para si mesma e soluçou, tomada por uma tristeza horrível. Foi quando o seu celular tocou.

— Alô...

— Clara? Meu deus, que voz é essa? — merda, era Tamara! — Aconteceu algo?

— hmm... Só tive um pequeno acidente — mentiu e claro que a outra perceberia.

— Clara, o que houve?

— Nada, nada! — sorriu entre as lágrimas. — E-escuta, amiga, não irei poder fazer o trabalho... Desculpa...

— Clara, aonde você vai? Por favor, não faça nenhuma merda!

— Tamara, já estou grande — lembrou-se de uma música e citou-a: — “E garotas grandes não choram”.

— Clara...

No entanto, a Dunsley já havia desligado.

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