Prólogo

Não devemos achar que a natureza se comporta de maneira tão diferente nos vários pontos do universo. Há um ciclo que sempre é mantido, quer estejamos próximos ou distantes de seu centro... A vida é gerada da mesma forma, em qualquer planeta, quer você seja uma planta ou um animal... Pensante ou não. O que é pensamento para você? Eu já me questionei isso milhões de vezes, e até hoje, mesmo depois de tudo o que já vi e senti, ainda o acho complexo demais. Dele surgem nossas memórias, nossas ideias... O conhecimento. Será que você sabe quem é mesmo?

Você está em tudo a sua volta, está relacionado às pessoas, ao solo, à água... Está em mim. Há anos eu vago por essa terra, conheci o início e o meio da sua história. O fim, entretanto, ainda está longe, talvez mais certo do que antes. Quem sabe? Diga-me você, depois que ouvir a minha história...

Treze Clãs partiram de Sinai há doze mil anos, atravessando o espaço em direção ao Sistema Solar, nem todos seus membros estavam completamente amadurecidos. De sete dos Clãs, apenas poucos viajaram adultos, traziam consigo muitos embriões, que se desenvolveriam em sua “terra prometida”. Desta forma, quando caíram na Terra, apenas dois anciões sobreviveram e cuidaram dos embriões, que, através de uma manipulação genética, se adaptaram ao planeta, tendo apenas um contraponto: uma anomalia num gene que lhes amaldiçoava com uma sede de sangue.

Ainda que os anciões tentassem minimizar os efeitos dessa mutação, o máximo que conseguiram, foram manter-se no anonimato enquanto esperavam pelo amadurecimento da nova espécie: os imortais. Seres que não eram daqui, mas que jamais poderiam voltar ao seu planeta de origem, Sinai, pois também não pertenciam mais a ele. Não sobreviveriam lá com as mutações que sofreram, e muitos não seriam bem vindos pela sociedade que os expulsara de lá. Até que os primeiros embriões alcançassem a fase adulta, os anciões os guardaram, cuidaram, sem saber que na escuridão do que acontecera aos terrestres, outra raça nascia.

Aos poucos, o desejo de colonizar o planeta foi abortado pelos anciões, e outro o substituiu com igual afinco: o desejo de sobrevivência. Infelizmente, a queda da espaçonave na Terra teve um efeito devastador sobre os que viajavam amadurecidos, seu tempo de vida foi abreviado em muitos milhares de anos em relação aos embriões e, quando os primeiros destes se tornaram adultos, os anciões pereceram, levando consigo todo o passado em Sinai para o esquecimento.

Os que nasceram aqui, não conheciam o passado de párias que os cercavam, e mantiveram-se em segredo em meio aos nativos, que se reorganizavam e reproduziam, povoando novamente o planeta. A idade madura de um imortal é diferente da humana, o tempo para procriação de sua espécie viria em um ou dois mil anos, enquanto os mortais, surgiam de todos os lados, dominando cada centímetro de terra.

Quando os primeiros nascidos aqui alcançaram a idade para reprodução, surgiram as famílias secundárias e a necessidade de que se criasse uma sociedade com regras a serem seguidas, já que os humanos possuíam um grau diferente de evolução. Eram muitos, mas muito primitivos. De longe, os imortais os observaram evoluir. Como um pai que vê o filho dar seus primeiros passos, e se acostumaram a andar oculto entre eles.

Foi, então, que a primeira era das trevas se fez, e com ela, parte do passado de Sinai veio à tona na sua face mais hostil. Um novo massacre de humanos corrompeu face da Terra, e preocupados, os imortais buscaram pela causa, assustando-se ao se deparar com seus semelhantes. Seres que ainda almejavam colonizar o planeta, e tinham pressa para isso, pois o fim de sua espécie estava cada vez mais próximo. Um ser que também possuía sede de sangue, parte da evolução condicionada aquele planeta, mais que diante do sangue humano em suas veias, perdera completamente a capacidade de longevidade. Na descoberta de uma sociedade de semelhantes, os seis clãs restantes elegeram um representante junto aos sete Clãs imortais, para que trabalhassem um acordo e trouxessem a pretendida paz aos humanos.

O Clã Hakkinen foi o escolhido dentre os seis, por seu líder ser considerado o mais esperto, e de fato o era. O acordo estabelecido com os imortais proporcionava-lhes o direito ao sangue imortal, o que líder desconfiava ser o passaporte para recobrarem a imortalidade perdida. Assim, de fato, a imortalidade lhes foi devolvida, porém os anos de caçadores, não foram apagados de sua memória, nem a sede de sangue abonada de seus dias. Os seis Clãs continuaram matando humanos, em menos quantidade, mas rompendo as regras dos imortais.

Sua sede de sangue era como ser párias em Sinai, uma sina. E bondade dos imortais se mostrou ineficaz e estes lhes negaram o sangue. Porém, um mal maior havia sido feito, mas ainda não descoberto, e quando os seis Clãs buscaram se reproduzir, suas fêmeas geravam natimortos1. A imortalidade cobrava seu preço àquele corpo híbrido que buscara a vida eterna. Quando ainda se alimentava de sangue mortal, ele respondia com funções mortais, mas quando buscou a imortalidade, a reprodução foi perdida.

Novamente o peso da extinção pesou sobre suas cabeças, porém com um agravante, a inveja fora plantada em seus corações. Havia seres que possuíam tudo que almejavam, e que jamais sucumbiriam como eles, à inexistência. E a pergunta reverberou na escuridão: não teriam os imortais, planejado se livrar deles desde o início? E com a dúvida plantada, o mal se espalhou nos corações daqueles temiam o fim. E do medo, se fez a força, quando descobriram que podiam criar seguidores, humanos que quando mordidos e não drenados até o fim, podiam ser comandados. Os renegados. E um exército se ergueu na escuridão contra os imortais. O ódio e a vingança corrompendo suas veias.

E, desta vez, a guerra que varreu a Terra foi silenciosa. Estava em cada sombra, em cada suspiro de escuridão, nas pequenas dobras do tecido da noite. Todavia, o que surgiu com o propósito de por fim a uma espécie, mostrou-se ser o momento derradeiro de outra. Autodenominados como vampiros, os membros dos seis Clãs viram sua criação cair por terra ainda no primeiro ataque. Apesar de muitas baixas do lado dos imortais, os renegados foram praticamente extintos. Seu tempo de vida era menor que o de um humano comum, sua sanidade se esvaía com a mesma rapidez, tornando-os impossíveis de controlar. E o numeroso exército dos vampiros se viu aniquilado em suas próprias bases.

Uma vez mais os imortais os procuraram e um novo acordo foi feito, agora envolvendo a criação de um Conselho e uma sociedade única, e reservando um lugar nessa nova célula regente para um Clã vampírico. Novamente os Hakkinen se ergueram como líderes e aceitaram seguir as regras impostas pelos imortais. Os renegados restantes foram caçados e exterminados...

Seis dos sete Clãs imortais hibernaram para recuperar suas forças. Elegendo o mais forte deles, naquele momento, para governar. A Sociedade de Órion passou a agir juntamente com os Protettori, ambas as organizações criadas para proteger humanos e imortais. A primeira, formada pelos próprios terrestres, homens e mulheres que abdicaram de seus rostos para manter a segurança do mundo. A segunda, formada primeiramente por imortais de famílias secundárias e vampiros. Para proteger as famílias principais dos sete Clãs, apenas o Clã que fosse despertado, saberia a localização do Clã seguinte. Os imortais cerraram seus olhos seguros de que haviam deixado a Terra em paz.

Ao menos era no que todos acreditavam até que os Oslen fossem atacados e extintos, depois de uma longa era de paz. Inexplicavelmente, histórias de seres da noite se ergueram nos quatro cantos do mundo. Histórias sobre seres sugadores de sangue... de alma. Preocupados, o Clã Duprat passou a promover uma caçada sigilosa àqueles que também os caçavam, e a segunda era de trevas surgiu. E, desde então, o prazo do descanso de cada Clã foi reduzido em muitos séculos, para que não tardasse uma reunião entre os seis que restaram e uma nova era surgisse.

A cada cem anos um dos clãs será despertado até que todos estejam juntos novamente e um novo acordo seja tecido entre humanos e nós. Um acordo definitivo, que exponha nossa existência e determine o fim dos Renegados, e traga uma convivência pacífica entre todos. Para os que manipulam o Conselho, só há necessidade de um imortal vivo, que possa preservar o gene de sua espécie e manter a sociedade vampírica de pé. E dentro da sociedade dos imortais, não há mais a necessidade da existência do Conselho, um grupo que não mais representa os valores para o qual foi criado. Esperam somente o despertar do Clã dos Reis, o mais antigo deles. Aquele que os promoverá a paz definitiva na Terra.

Para a maioria dos que habitam a Terra, no entanto, ainda somos apenas lendas...

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1 Natimorto ou nado-morto são denominações dadas ao feto que morreu dentro do útero ou durante o parto, ou seja, quando ocorre óbito fetal.

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