Capítulo 3. Festa

O dia seguinte foi pior, mas também teve o seu lado bom.

As pessoas parecem que esqueceram do meu retorno a cidade, como também não me lembraram o quão meu pai era infeliz, aparentemente, ele nunca superou a separação, se fechando para as pessoas e não permitindo que ninguém chegasse ao seu coração.

Kalina sentou-se comigo nas aulas, uma coisa que as pessoas da cidade não seguiam eram regras. Descobrir que Natan e Pietro eram amigos, eles também não largaram do meu pé, na hora do intervalo, chegamos no pátio e seguimos em direção ao refeitório, enquanto eu esperava a minha comida chegar pude observar o lugar, tinha musgos pelas paredes e pequenas rachaduras no teto, não sei como a escola ainda funcionava. 

No canto mais afastado do refeitório pude ver o Davy comendo sozinho, ele vestia um moletom e estava com seus olhos presos no seu prato, até três jovens se aproximaram dele, era visível o seu desconforto, e mais ainda quando começaram a rir e empurrar ele — Foi doloroso ver a cena, como se eu estivesse levado um chute em meu estômago até porque um dia eu já estive no lugar dele.

Assim que peguei o meu prato, fui em direção a ele.

— Onde você tá indo? — perguntou Natan.

— Estou indo ver uma coisa, já volto.

As pessoas olhavam a direção para qual eu estava indo, e jurei ver algumas balançando suas cabeças. Procurei e quando o achei ele estava sentado no chão, fora do refeitório, e quando me viu sua reação não foi diferente do restante das pessoas, ele também balançou a cabeça.

— Oi — Falei sentando ao seu lado

— O que você quer aqui, Ester?

— Queria me desculpar por ontem — eu disse olhando o prato com um sanduíche e uma pizza, as aulas iam até três da tarde, eu evitava almoçar na escola, desde criança nunca gostei.

— Eu estou acostumado — Deu de ombros

— Com as pessoas te julgando e fazendo isso com você? Você não deveria deixar.

Assim que eu disse, ele me olhou nos olhos e deu um sorriso perverso, mesmo com as condições em que ele se encontrava, eu não podia negar que ele era realmente muito bonito.

— Acha que eu me importo? Me responda. — Falou autoritário

— Você deveria se importar, não acho correto as pessoas saírem falando mentiras sobre você e você também não deveria.

— Até agora não ouvi nenhuma mentira, Ester. E se eu for realmente o assassino da minha família? O que você tem a ver com isso? — Perguntou e na mesma hora senti minha garganta queimar.

— Você.. você não é — Minha voz falhou, mas eu acreditava na sua inocência.

— E como você tem tanta certeza?

Como eu tinha certeza sobre algo e alguém que eu nem sequer conhecia? Talvez seja pela infância, aquele menino super protetor com a irmã mais nova, amoroso com a mãe e amigo do pai, não era possível que ele tenha realmente matado, o seu olhar escondia algo, tinha dor, e eu conhecia bem.

— Por causa da infância — Disparei, eu ainda lembrava, pouca coisa mais lembrava.

— Você não mudou nada Ester, ainda é aquela garotinha curiosa, mas saiba que as pessoas mudam, volte para a sua vidinha perfeita e me deixe em paz — Disse disparando e em seguida se levantando e indo embora me deixando sozinha no chão sujo e frio, uma lágrima involuntária saiu do meu rosto, ele não sabe nem da metade da minha vida.

Sequei minha lágrima e voltei para os meus colegas, ninguém precisava saber disso. 

— Você demorou, foi pra onde? — Kalina perguntou assim que me viu chegar perto da mesa.

— Achei que tinha visto algo, mas me enganei.

— Então, eu estava comentando com o Pietro e o Natan, que a Nathalia dará uma festa na casa dela, você vem conosco? — Lançou o convite

— Eu não sei, tenho que perguntar ao meu pai primeiro — Avisei, já que fui alertada a não sair sozinha à noite se não fosse com ele.

— É só você falar que sairá comigo — Sugeriu Pietro e realmente era uma boa ideia, já que eu não aguentava ficar presa naquela casa.

— Talvez com você ele deixe — Eu disse mesmo odiando festa 

— Então combinado, pego você às 19:00 — Natan sorriu como se estivesse ganhado um prêmio.

— Que bom que vamos de carro, não sou de andar a pé — Kalina falou ironicamente me surpreendendo, desde quando o nathan tinha um carro?

— Essa é nova, você dirige? — Perguntei curiosa.

— Claro gata, me habilitei ano passado — Respondeu com um sorriso vitorioso nos lábios.

— E qual a sua idade exatamente? 

— Tenho 19, Ester. 

Ele aparentava ser um adolescente da minha idade, talvez fosse pelo seu rosto infantil e seu rosto sem nenhum vestígio de barbas. O sinal já havia tocado e fomos todos juntos para a sala de aula ainda conversando.

— Então é isso, você não tem nenhuma irmã ou irmão aqui, não é? — Pietro se pronunciou.

— Não, eu não tenho, é apenas eu e o meu pai.

— Mas você tem uma irmã, né? Pelo o que eu soube, ela já namorou o Daniel Williams — Kalina disparou e essa parte eu nunca soube.

Eu sabia e via quando criança a minha irmã com o irmão mais velho, já que são basicamente da mesma idade, mas que ambos já namoraram. Isso era algo novo para mim.

— Isso eu não sabia, mas tenho uma irmã sim

— E porque ela não veio para cá com você também? — Perguntou, eu estava preparada para contar o porquê da minha volta? Nem meu próprio pai sabia. 

— Porque ela está grávida, e é do meu ex namorado — Disparei arrependida.

— Ela é mais rápida que você Kalina — brincou Natan enquanto Pietro ria — Mas eu sinto muito por você. 

— Eu agradeço, mas foi melhor assim.

— Estou disponível para você a hora que quiser — Se atirou Pietro o que me fez rir.

— Também agradeço, mas você não faz meu tipo. 

Entramos na sala e o restante das aulas se resumiram do Davy me dando várias encaradas, pietro falando que estávamos quase namorando mesmo eu negando diversas vezes, Kalina rindo e o Natan dizendo que me viu primeiro e eu fiz questão de lembrá-los que eu não era um prêmio e que ambos não era do meu tipo. 

Voltei para casa novamente com o Natan, e dessa vez acompanhado da Kalina, já que ela morava na mesma rua do menino Davy, como ele conseguia sobreviver mesmo não tendo mais os pais? Essa foi a minha dúvida do dia.  

Quando cheguei em casa, tinha várias sacolas de compras espalhadas no chão da cozinha, e nenhum vestígio sequer do meu pai. Guardei todos os alimentos no armário e onde tinha espaço. Quando terminei subi para o meu quarto levando os livros que eu ia precisar para fazer umas atividades, e quando o meu pai chegasse, eu pediria permissão para sair essa noite. 

Depois que fiz as atividades pendentes, peguei meu celular para responder as mensagens, e entre elas tinha as da minha mãe

Que dizia…

Ester, você está muito ocupada aí com o seu pai? Como está sendo na escola? Sinto sua falta.

Suspirei mas não pude deixar de sorrir, eu sabia que ela se preocupava, mas ela estava sendo dramática demais.

Boa tarde, mamãe. Não estou ocupada, às vezes assistimos, fomos até a um jantar com um casal de amigos dele e o seu filho, a escola está legal. Também sinto sua falta.

Ela não estava online, mas assim que ela visse a minha mensagem eu tinha certeza de que me responderia de imediato. Como eu estava evitando a minha curiosidade de ir até a floresta outra vez, decidi reler orgulho e preconceito — Era o meu livro favorito desde que eu me entendo por gente, era só por puro prazer, a leitura me envolvia e a cada capítulo lido eu sentia que estava dentro da história, que loucura, e era isso que eu ainda estava fazendo quando o meu pai chegou em casa. Desci rapidamente para o andar debaixo e ao entrar na cozinha, comecei a preparar batata doce e carne seca, era algo que nós dois amávamos.

 — Ester?  — Chamou meu pai quando me viu na cozinha colocando as batatas no fogo.

 — Oi, pai, finalmente você chegou.  

 — Sim, finalmente, eu não gosto de te deixar sozinha por muito tempo.  — Ele tirou o seu colete e suas botas enquanto se sentou massageando seu rosto.

  Quando criança, meu pai sempre foi muito responsável com nossa proteção, nunca deixou as suas armas à mostra, e quando nós encontrávamos elas estavam sempre descarregadas, eu era muito desastrada, e era por isso, mas eu sabia que era ruim e errado pegar na arma, então eu nunca tentei, diferente da minha irmã.

— Batata doce e carne seca para o jantar, é o meu favorito!  

Ainda lembro da minha infância, sempre foi o seu prato favorito, minha mãe sempre preparava as quartas feiras e eu sempre a observava.

Minha mãe sempre foi uma cozinheira de mão cheia, e tudo o que sei agora eu aprendi com ela.

— Eu espero que goste, me lembrei que sempre foi o seu favorito.

— Obrigado por isso, filha.

Depois de trinta minutos o jantar estava pronto. Meu pai saboreava cada pedaço da batata e da carne seca que eu havia preparado, comi em silêncio, eu estava agoniada e inquieta, a festa começará às 20:30 e eu ainda não tinha pedido permissão.

— Pai, tem algo que eu gostaria de te perguntar. — Eu estava ansiosa, era visível, mas eu queria ir na festa.

— Pode perguntar, Ester.

— Hum, queria saber se posso sair com o Pietro e mais dois amigos nessa noite — Perguntei prontamente para receber um não.

No começo ele me olhou confuso enquanto franzia a testa, mas em seguida deu um leve sorriso de lado e eu tive a certeza de que ele deixaria.

— Pelo visto vocês realmente se deram bem, contanto que não volte tarde eu permito. Gosto do menino Pietro. — Autorizou e não pude deixar de sorrir.

Mandei a confirmação de que iria para cada um deles e em seguida fui para o meu quarto me arrumar — Eu vestia um suéter azul bebe e uma calça moletom cinza, meu velho amigo all-star e um cachecol apropriado para essa noite fria, eu nunca sabia o que vestir nesses eventos, mas sempre preferi roupas que cobrisse o meu corpo. Passei um leve rímel e um pó compacto, eu já estava pronta. 

Eu observava pela janela do quarto apenas esperando a hora deles chegarem, quando uma buzina me desperta e chama a atenção, e estava lá, um carro fiat vermelho chamativo, porém aconchegante para quatro pessoas. Desci as escadas como o flash e ao chegar no último degrau o meu pai me esperava com um olhar sério. 

— Sei que se sente presa aqui, mas não se acostume a sair muito, quero que se divirta filha, mas tenha cuidado. — Me aconselhou.

— É pelas coisas que acontecem aqui, não é? — Perguntei.

— Sim, mas não só aqui, as pessoas são más e cruéis, Ester.

— Eu sei pai, prometo tomar cuidado. Prometo voltar cedo.  — Disse saindo e passando pela porta,

Caminhei em direção ao carro do Natan, e assim que cheguei ele me olhou dos pés e em seguida deu um assovio, totalmente infantil. 

— Você tá linda! — Elogiou ele.

— Tá muito simples, esperava um estilo vadia — Kalina disse rindo — Mas realmente está linda.

— Minha futura namorada realmente está brilhante — Pietro se gabava de algo que eu desconhecia, mas não pude deixar de sorrir.

— Obrigada pessoal, mas apenas nos seus sonhos Pietro!

Assim que entrei no carro, Natan deu partida, não demorou para chegarmos, a casa era grande, diria que três andares no mínimo, ainda dentro do carro já podia ouvir a música alta, não era o meu estilo. Eu e a Kalina descemos do carro, enquanto Pietro acompanhou Natan para estacionar, combinamos que iríamos nos encontrar dentro da casa. Kalina vestia um vestido azul que valorizava as suas curvas e um salto pequeno preto, ela estava deslumbrante e por um minuto me senti feia perto dela, quando entramos, pude ver vários jovens se embriagando, eu realmente não gostava de festa. Quando procurei por Kalina a mesma já não se encontrava perto de mim, peguei um copo de bebida, mesmo não estando acostumada e praticamente engoli como se fosse água.

A vodka descia queimando minha garganta e não foi diferente quando chegou no meu estômago, minha cabeça deu leves giradas e na mesma hora pensei que morreria ou desmaiaria, No canto não tão longe de onde eu estava, Davy devorava um copo de bebida, tentei ignorar a sua presença, mas meus olhos estavam fixos nele, só quando duas garotas começaram a se beijar que eu acabei me distraindo. As únicas festas que eu realmente ia eram infantis, e de todo jeito não suportava, essa era a primeira festa de adolescente que eu realmente tinha sido meio que convidada para vim. 

Eu me sentia anestesiada, e jurei estar tendo alucinações quando senti a presença de uma pessoa se aproximando, franzi o cenho e não acreditei quem era. 

— Oi — a voz soava rouca e o cheiro de álcool marcava presença no lugar. 

— Oi, estou tendo alucinações ou você realmente está aqui? 

— Eu realmente estou aqui, Ester. Queria te pedir desculpas pelo modo como falei com você hoje. Eu não te conheço e não deveria ter te tratado daquele jeito.

— Tudo bem, eu não devia me intrometer na sua vida, meio que merecia.

— Você não é do tipo de garota que vem para esse tipo de festa, ainda me lembro da festa da minha irmã que você foi um dia, você chorou pedindo para voltar para casa — Lembrou rindo, isso era um acontecimento que eu lutava para esquecer, eu tinha medo de palhaço na época, e tinha me assustado com um.

— Não sou, e eu não imaginava que você ainda se lembrava disso, foi o dia mais traumatizante da minha vida! — Me chacoalhei sentindo calafrio — Mas você não parece do tipo que é convidado para as festas — Eu disse recebendo um sorriso sarcástico.

— E realmente não sou. Suas sobrancelhas têm traços ruivos, porque pintou o seu cabelo de azul? — Perguntou notando cada detalhe do meu rosto me fazendo ficar envergonhada. 

— Eu queria mudar.

— Você nunca gostou do seu cabelo — Afirmou.

— E você parece se lembrar bastante da nossa pequena parte da infância — Disse percebendo que algumas meninas que estavam basicamente do nosso lado não parava de encará-lo — Parece que alguém está roubando os corações das donzelas daqui — Falei batendo levemente em seu braço e ele riu. 

— Acho que estão se perguntando o que um esquisito como eu faz com uma garota tão bonita como você — minhas bochechas queimaram na mesma hora em que as palavras saiíram da sua boca. 

— Eu não acho que seja isso — Disse enquanto percebi que uma menina loira caminhava até onde estamos e no mesmo instante baixei o olhar para encarar meus pés. 

— Você quer dançar? — Perguntou a garota e na mesma hora Davy levantou o meu rosto, me fazendo olhar para ele.

— Já estou acompanhado! — Disse ele e no mesmo instante a garota fez cara de nojo e me olhou. Idiota.  

— Não estou vendo ninguém aqui — Ela procurava o que estava me deixando chateada. 

— Realmente, você não está acompanhado de ninguém — Falei baixo e a loira deu um riso irônico.

— Estou sim, estou acompanhado de você! — No mesmo instante ele colocou a mão na minha cintura e me puxou para mais perto dele, senti minha cabeça se chocar contra o seu peito, seu perfume se misturava com o cheiro do álcool o que fez minhas pernas fraquejarem. 

— O que você tá fazendo? — Gaguejei 

Ele começou a balançar o nosso corpo, e percebi que estávamos de certa forma dançando.

— Tem alguns caras te olhando, balança o seu corpo e sorria, assim eles vão parar. 

— E porque exatamente eu tenho que fazer isso? — Perguntei não entendendo a sua atitude.

— Porque não são caras bons, porque você não vai me abandonar aqui, e também porque você não quer ficar com ninguém. 

Ele estava certo, não era a minha intenção de ficar com ninguém, ainda mais quando eu tinha acabado de sair de um relacionamento, eu não vi mais meus colegas desde que chegamos, eu tinha passado o restante da festa com o Davy me fazendo companhia, ele era agradável, e quanto mais eu o conhecia, mas eu tinha certeza da sua inocência.

— Bom, vai dar 00:00 noite, preciso voltar para casa — Avisei ao davy

— Tudo bem, eu te acompanho

— Não é preciso.

— Espero que seu pai tenha lhe alertado que é perigoso essa cidade, e ainda mais a noite. — Sorriu 

— Não quero ser um incômodo.

— Você nunca será um incômodo para mim. — Disse e eu cedi

Caminhamos em silêncio, a casa não era tão longe da minha, a rua deserta e fria me fazia ter medo do desconhecido, quem em sã consciência dava uma festa no meio da semana, não sei porque aceitei, provavelmente eu levarei um belo castigo.   

— Está entregue — Disse me despertando, eu realmente perdi a noção do tempo e de quanto já tínhamos andado.

— Bom, muito obrigada!

— Não precisa me agradecer, a gente se vê por aí, Ester — se despediu e eu o vi caminhar na rua escura até ele sumir da minha visão.

Adentrei na minha casa e ao passar pela sala tive uma visão assustadora do meu pai, ele se encontrava na poltrona olhando fixamente para mim sem falar palavra alguma, será que ele estava vivo?

— Pai? — Chamei me aproximando.

— Isso é hora de chegar em casa e ainda mais acompanhada por Davy Williams? — Perguntou aborrecido — Você desobedeceu a única coisa mais importante que eu te pedi, e se algo estivesse acontecido com você? E cadê os seus amigos? Ester, a partir de hoje você está de castigo e sem notebook, suba para o seu quarto agora — Ordenou-me e fui calada para o meu quarto.

Eu não pude contestar, eu sei que eu não havia obedecido o meu pai, mas ele também não conhecia o Williams, confesso que eu também não, mas ele não era ruim como todos achavam, eu acreditava na sua bondade, como aceitaria todo o castigo que a mim fosse dado. 

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