3 - Complicações

SAMANTHA

Um pouco mais tarde eu ouvi o barulho de um carro parar em frente à mansão e buzinar.

— É o Chuck. — disse Clara dando um pulo do sofá.

Eu pulei junto e ela caminhou rápido até a entrada pra ir ajudar Chuck colocar os meninos para dentro. Eu fui atrás dela e saímos juntas. Avistei Chuck logo de primeira. Ele estava debruçado no banco traseiro tirando o cinto de segurança das crianças.

— Mamãe… — ouvi Lucas dizer.

— Já conversamos sobre isso, Luke. Mamãe viajou. — disse Chuck sem perceber que eu estava ali há poucos metros de distância.

— Não, papai. Mamãe… — Amanda apontou na minha direção. Fazendo Chuck se virar devagar.

Assim que ele me viu ficou paralisado. Não movia um músculo. Seus olhos azuis ficavam cada vez maiores e mais abertos. Ele me olhou de cima a baixo, enquanto Clara descia para tirar as crianças do carro. Chuck se aproximou lentamente, com os braços caídos de lado. Fiquei parada no mesmo lugar. Sorri sem mostrar os dentes pra ele. E então ele apertou o passo. Mas quando chegou a um degrau de mim. Parou de novo.

— É você mesmo? — perguntou incrédulo. — Como…

— Sim, Chuck, sou eu mesmo. — respondi descendo o degrau que faltava e o abraçando.

— Meu deus… — o ouvi dizer enquanto me apertava forte.

— Também senti sua falta. — respondi soltando uma gargalhada.

— Como você… O que aconteceu? — perguntou como todos os outros.

— Te explicamos lá dentro. — disse Clara carregando Amanda no colo e segurando a mão de Lucas.

— Mamãe!

— Mamãe!

Gritaram os dois juntos.

Peguei Lucas do chão e Amanda se jogou em cima de mim. Eles me abraçaram tão forte e tão gostoso que eu desejei congelar aquele momento pra sempre. Não precisava mais de nada. Só deles ali.

— Meu deus, a mamãe sentiu tanto a falta de vocês. — falei sentindo as lágrimas caírem dos meus olhos. — Senti tanto, tanto, tanto…

— Mamãe, como foi a viagem? Estava com o papai? Onde ele está? — perguntou Lucas.

Eu me senti tão grata por estar de volta. Feliz, radiante. Por um momento, quando senti minhas forças indo embora quando eu fui pega, pensei que nunca mais os veria de novo. Pensei que os perderia para sempre. Mas aqui estávamos nós nos abraçando de novo. Meu mundo todo em meus braços. 

Eu acho que estava emocionada demais. Pois comecei a me sentir fraca e o sol quente em cima de mim incomodava minha pele. Foi quando comecei a ver tudo roxo.

— Peguem eles. — disse meio tonta pra Chuck e Clara.

— O que está havendo? — perguntou Clara.

— Sam, você está bem? — Perguntou Chuck.

— Peguem logo! — disse novamente. Eles não pensaram duas vezes.

Minha cabeça parecia que ia explodir. Minha barriga doía muito. Senti que fosse cair. Estava muito fraca. Minha pele queimava. Tentei me segurar no corrimão das escadas da entrada, mas não estavam próximos o suficiente então caí. Mas senti alguém me segurar antes que eu pudesse encostar no chão. Era Thomas, que correu com sua velocidade paranormal e me pegou antes que eu me machucasse. Minha cabeça doía mais.

— Amor, o que está acontecendo? Fala comigo! — disse Thomas. — Levem os dois pra dentro! Agora! — ele completou gritando. — Amor?!

— Tá doendo muito! — gemi de dor.

— O que? O que está doendo? — perguntou me erguendo no colo.

— O Sol. Tá me queimando. — respondi mostrando a ele minha pele vermelha. Eu comecei a me engasgar com algo pastoso, sentia gosto de ferrugem, passei a mão na boca e percebi que era sangue. De novo.

Ele correu para dentro comigo. E em segundos eu estava deitada no sofá. Não estava vendo as crianças. Clara devia estar no quarto com elas.

— Querida, ainda dói? — perguntou Thomas.

Eu balancei a cabeça, negando. Não doía mais. E eu sentia minha pele voltando ao normal. Foi quase que instantâneo.

— O que aconteceu com você? — Perguntou Josh. — Que sangue é esse?

Eu o encarei antes de pensar no que dizer.

— Não sei. O sol estava me queimando. Minha cabeça parecia que ia explodir. Eu podia sentir cada órgão meu doer. Eu não sei o que foi isso.

— Talvez você precise de um médico, ainda não viu nenhum desde que voltou pra casa. — sugeriu Tyler.

— Sim, precisa ver isso agora. — Completou Chuck.

— Ela não vai a um hospital. — disse Thomas se levantando.

— O que? Por que não? — perguntou Chuck.

— Um médico não vai poder ajudá—la no que está acontecendo.

— E você vai? — perguntou Chuck com o tom irônico.

— Não. — Thomas respondeu.

— Thomas, o que está acontecendo comigo? — perguntei assustada.

— Você se lembra quando eu te disse como me transformei no dia que aquele Calerva me deu o sangue dele? — perguntou preocupado.

— Sim. — falei sem entender onde ele queria chegar.

— Na manhã do dia em que finalmente acordei, após ter bebido o sangue dele. Cinco meses depois. Eu estava sensível ao sol. Estava com muita fome. E ficar exposto a luz solar me causava dor de cabeça e todos os meus órgãos falhavam. Fiquei assim até conseguir andar na luz do dia. — ele dizia isso com cautela. Mas eu não podia acreditar no que estava ouvindo.

— Você está dizendo que ela tá se transformando? — disse Tyler confuso. — Se transformando em que exatamente? — continuou.

— Como você não sabia disso, Sam? Não sente nada de diferente? Fora o sofrimento. — Perguntou Thomas.

Eu me lembrei que diversas vezes me senti com o ouvido apurado. Talvez um pouco disposta demais em certos momentos e do nada me sentia cansada demais. Barulhos muito altos me incomodavam. Consegui ouvir a respiração de Thomas a metros de distância quando o vi pela primeira vez assim que voltei. Mas nada que eu achasse incrível. Achava que era a adrenalina.

— Não percebi muito bem… — respondi com dificuldade. — O que está acontecendo comigo? Como posso estar me transformando se não tenho nenhuma recordação de que eu possa ter sido… infectada…?

— Podem ter induzido enquanto estava desacordada. — disse Thomas

— Covardes. — murmurou Tyler saindo de perto se referindo a quem quer que tenha feito isso comigo.

— Não tem sentido sede? — perguntou Thomas.

— Sede? Tipo… de sangue? — perguntei me sentindo nauseada.

Thomas assentiu.

— Não! — respondi me sentindo ofendida. Apesar de ter estado com sede demais ultimamente. Mas nenhuma vez passou pela minha cabeça beber sangue humano. — Senti sede de água. Somente. Eu acho.

— Alguma vez a água matou sua sede? — me perguntou. E eu não quis responder. Pois a resposta seria ''‘não’''. Não matou nenhuma vez.

Chuck rapidamente pegou uma faca que estava em sua bota e fez um corte fundo em seu braço. Deixando o sangue pingar no chão.

— Que porra você tá fazendo? As crianças estão no quarto ao lado. — disse Tyler tentando sussurrar, mas com a voz forte e grossa.

Em segundos o cheiro do sangue tocou meu nariz. E o que antes eu achava nojento e sentia o cheiro de ferrugem. Agora tinha um cheiro bom e agradável. Minha garganta secou. Que porra tava acontecendo com meu corpo? Eu engoli seco. E senti meu corpo reagir ao sangue e tremer. Olhei para Thomas piscando com dificuldade. Ele percebeu o que estava prestes a acontecer.

— Chuck, pare! — disse Thomas sem tirar os olhos de mim.

Eu senti as veias em volta dos meus olhos incharem.

— Que porra é essa, Samantha?! — gritou Josh assustado. — Seus olhos…

Ainda tentando me segurar pra não pular em cima de Chuck eu agarrei com força nas almofadas do sofá e meus dedos entraram rasgando o tecido.

Me levantei rápido e fui direto em direção ao Chuck, correndo. Ele não se moveu. Mas senti Thomas me agarrar pelo cabelo e me jogar contra o chão.

— Filho da puta, eu falei pra parar com o sangue. Se ela pega seu pescocinho de cachorro ela quebra com uma porra de uma mão. — gritou Thomas enquanto me prendia no chão com o joelho e eu me sacudia como um animal selvagem.

Eu estava sentindo a extrema necessidade de beber aquele sangue. Sentia minha garganta secar cada vez mais.

— Thomas, me solta! — gritei.

— Você tem que se controlar, Samantha. Eu sei que não é fácil. Mas você não pode beber sangue de um lobo agora. Precisa ser humano. Ou seu organismo só vai aceitar esse tipo de sangue. — disse Thomas ainda me segurando contra o chão.

— Me solta! Eu não ligo! — gritei de novo.

— Josh, vá até o laboratório ou sei lá o que vocês têm por aqui e tira um pouco de sangue seu ou do Tyler e traga pra mim. — disse ele me erguendo do chão. Mas ainda segurando com força. — Charles, vá com eles e coloque um curativo até que esse corte suma daí.

Todos foram. E ficamos só nos dois na sala.

— Tom, o que está acontecendo comigo? — eu disse sentindo minhas lágrimas molharem meu rosto. — Eu estou com sede.

— Eu sei, baby. Eu vou alimentar você. Mas tem que confiar em mim. — disse ele me soltando aos poucos. — Vou soltar você agora. Mas, por favor, nossos filhos estão no andar de cima. Se comporte.

Alguns minutos depois, os três voltaram lá de baixo com um copo de 500 ml, não sei se estava cheio, mas senti o cheio de sangue. Era diferente do sangue de Chuck. Talvez menos atrativo. Era como se o sangue de lobisomem cheirasse a suco de maracujá e o de humano cheirasse a suco de beterraba. Tem quem goste, mas todos sabem que o cheiro do maracujá é mil vezes melhor. Mas eu aceitei assim mesmo.

— Aqui, misturamos um pouco de cada um. — disse Tyler entregando o copo na mão de Tom.

Tom fez cara de nojo.

— O que? — perguntou Josh.

— Dois sangues misturados? — disse Tom com nojo.

— É, sangue é sangue. — disse Tyler.

— Refrigerante é refrigerante, vocês misturam Coca—Cola com Dr. Pepper?

Os meninos se olharam sem querer dar o braço a torcer. E juntos assentiram.

— Vocês humanos são nojentos… — Completou Thomas.

Tom pegou o copo que estava com uma tampa e um canudo grosso.

— Querida, beba com calma. Se beber de uma vez vai sentir enjoo. E me escuta — disse ele segurando meu queixo. — Eu te amo, não importa o que você faça. — e me entregou o copo.

Eu coloquei o canudo na minha boca e puxei, na mesma hora senti meu corpo absorver o sangue e todas as minhas veias ficaram eletrificadas. Chuck fez cara de nojo, mas eu estava muito ocupada me deliciando com aquilo pra dar bola. Bebi até a última gota. E a sede incessante que eu tinha desde ontem simplesmente desapareceu. Eu estava me sentindo mal por gostar do que estava fazendo. Beber sangue? Não era tão ruim assim. Era?

— Isso é muito nojento, Lobinha. — disse Josh fazendo cara de nojo.

— Shiu, Josh. — Respondi completando com um sorriso forçado. — Não estou feliz com isso, se é o que acham. 

— Thomas, como consegue andar no sol?

— Eu sou um híbrido. Então é diferente. Mas deve ter algo a ver com Tatuagem e um ritual.

— Como conseguimos isso? — perguntei

— Vou providenciar isso. Mas preciso ir até Nova Orleans. E preciso que se comporte aqui. Principalmente porque estará com Amanda e Lucas.

— Eu sei. Eu vou. Mas pode deixar isso pra amanhã. Eu quero você aqui hoje. Comigo e as crianças. Por favor. — falei abraçando.

Eu não podia acreditar no que estava acontecendo.

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